Nas redes sociais, a notícia dacondenação definitiva deJair Bolsonaro a 27 anos e aprisão de generais golpistas virou piada. Tem figurinha, montagem, dancinha, decreto de queo "Brasil venceu". Como cidadã, me peguei com um sorrisinho safado no canto da boca; como jornalista, só penso no grau de esgotamento coletivo que essa frase esconde.
Não é só o ex-presidente que sai dessa história com uma certa "confusão mental". SeAlexandre de Moraes fosse, de fato, impiedoso, aumentaria a pena pelo trauma nacional causado por ele.
Foram anos de uma sequência de impeachment, presidente preso, ascensão da direita, presidente solto, flerte com ditadura, quartel com pose de poder moderador. Instabilidade política envelhece. Num país com Estado de Direito tinindo, eu seria uma gostosa com a ioga e o colágeno em dia e não uma senhora cansada e meio corcunda de tanto ler, escrever e viver essa distopia em looping.

Há motivo para alívio, claro. Ver Bolsonaro e seus generais começando a cumprir pena fere o mito da impunidade eterna. Mostra que golpe tem custo. Mas também escancara o tamanho do estrago: foi preciso chegar ao ponto de uma trama golpista explícita para o país aceitar olhar para suas fissuras democráticas.
E agora vemos um gesto mínimo de justiça virar uma catarse nacional. A risada vem fácil porque estamos exaustos. A comemoração vem rápida porque seguimos desconfiados de tudo: das instituições, dos acordos de bastidor, das brechas que costumam aparecer na penúltima página do Diário Oficial. Somos um país emocionalmente quebrado, politicamente traumatizado, tentando encenar normalidade.
O Brasil venceu? Tenho dúvidas. Talvez tenha apenas evitado uma derrota ainda mais humilhante. Prender golpista deveria ser o básico, não o auge da democracia. Vitória seria o dia em que esse tipo de decisão não parecesse épica e responsabilizar conspiradores deixasse de ser exceção histórica. Pode ser só o peso da idade, mas me falta entusiasmo para gritar "vencemos" junto com ainternet, quando, na verdade, remendamos nossas feridas cívicas em silêncio.




