Logotipo do Wikipedia ZeroVídeo sobre acesso livre à Wikipédia (em inglês)
OWikipedia Zero foi um programa de parcerias daFundação Wikimedia que tinha o objetivo de fornecer acesso àWikipédia de forma gratuita emtelefones celulares, especialmente empaíses em desenvolvimento.[1][2] O programa foi inaugurado em 2012,[3] e em 2013 ganhou o prêmioSXSW Interactive Award for activism.[4] O objetivo do programa era reduzir as barreiras do acesso ao conhecimento livre, eliminando o custo do acesso a informação.
Depois de enfrentar críticas ao longo dos anos por violar o princípio daneutralidade da rede, em Fevereiro de 2018,[5] a Fundação Wikimedia anunciou o fim da iniciativa, afirmando que seria necessário uma nova abordagem em parcerias.[6]
O programa de parcerias, inspirado noFacebook Zero,[7][8][9] foi lançado inicialmente naMalásia em Maio de 2012.[10] Em Outubro de 2012, foi lançado naTailândia e naArábia Saudita com aDTAC e aSaudi Telecom Company respectivamente e, em seguida, foi lançado noPaquistão com aMobilink em Maio de 2013.[11] Em Junho de 2013, foi lançado noSri Lanka com aDialog Axiata.[12] O acesso gratuito foi disponibilizado naÍndia através daAircel.[13] Em Outubro de 2013, foi lançado naJordânia com aUmniah. Em 25 de Outubro de 2013, foi lançado noBangladesh com aBanglalink.[14][15] Em 28 de Abril de 2014, foi lançado emKosovo na redeIPKO.[16] Em maio de 2014, foi lançado noNepal com aNcell.[17] Em 19 de Maio de 2014, foi lançado noQuirguistão com aBeeline.[18] Em Dezembro de 2014 foi assinado um acordo entre a Fundação Wikimedia e a operadoras angolanaUnitel, possibilitando o acesso gratuito à Wikipédia aos clientes destas operadoras, ambas líderes no mercado deAngola.[19] Em novembro de 2015, o programa foi estentido à operadora angolanaMovitel.[20]
Em janeiro de 2014, o programa de parcerias era dirigido por Carolynne Schloeder.[21] Ao longo do ano de 2014, mais 32 parcerias foram adicionadas ao programa, totalizando 56 operadores em 48 países, num universo de 450 milhões de potenciais consumidores, segundo o relatório da Fundação desse ano. O relatório assinalava, no entanto, a falta de evidência sobre o programa estar atingindo os seus objectivos, e "o facto da Wikipédia não ter sido originalmente desenhada para oSul Global".[22] Ainda assim, quando oPrémio Erasmus 2015 foi atribuído àcomunidade Wikimedia, uma das três pessoas escolhidas para subir ao palco em Amsterdão representando a comunidade foi Adele Vrana, funcionária daFundação Wikimedia, como integrante da equipa das parcerias Wikipédia Zero, consideradas então uma iniciativa emblemática da Fundação.[23] Vrana integrava a equipa Wikipédia Zero desde janeiro de 2014, sendo encarregada dos programas do Oriente Médio, África e Brasil no início desse ano.[21]
O programa de parcerias foi alvo de críticas constantes desde que surgiu em 2012 por violar oprincípio da neutralidade da Internet, por promover uma abordagemneocolonial à difusão do conhecimento, e a desigualdade no acesso à Internet nos países em que foi implementado.[24] O programa acabou sendo descontinuado pela Fundação Wikimedia em Fevereiro de 2018, com término completo programado para final desse ano. A Fundação justificou a decisão com baixo interesse por parte de potenciais parceiros neste tipo de parceria, notada a partir de 2016, que atribuiu em parte a alterações de dinâmica na indústria das comunicações móveis, e baixo custo de pacotes de dados.[25]
ASubsecretaria de Telecomunicaciones doChile determinou que os serviços acusto-zero como o Wikipedia Zero, Facebook Zero e o Google Free Zone, que subsidiam o uso de dados móveis, violam as leis deneutralidade da rede e deviam finalizar seus serviços até 1° de junho de 2014.[26][27]
Uma das críticas ao programa foi este limitar o acesso à Internet a uma espécie de "jardim murado" para grande parte dos seus utilizadores, oferecidos e controlados por pesos pesados da Internet, como a Wikipédia e o Facebook, ao ponto de, para muitos, Wikipédia e Facebook passarem a ser sinónimo de "Internet".[28] Em 2015, uma pesquisa sobre como o programa semelhanteFacebook Zero, ele próprio inspiração para o Wikipedia Zero, moldava o uso dastecnologias de informação e comunicação nomundo em desenvolvimento, revelou que 11% dosindonésios que usavam o Facebook afirmava igualmente não usar a Internet. 65% dosnigerianos e 61% dos indonésios concordavam com a afirmação "o Facebook é a Internet", comparados com apenas 5% nosEstados Unidos.[29]
Um artigo publicado na revistaVice em 2017 mostrava que o acesso livre via Wikipedia Zero havia transformado oWikimedia Commons no hub depirataria digital predilecto dos utilizadores doBangladesh,Angola e outros países, que o usavam para o tráfico de material com direitos de autor, causando problemas significativos ao projecto, no qual somente conteúdo comlicença livre é permitido. O artigo criticava a situação gerada pelo Wikipedia Zero, e as repercussões causadas entre os editores do Commons: "Por não conseguirem pagar o acesso aoYouTube e ao resto da Internet, a Wikipédia tornou-se a Internet para muitos habitantes do Bangladesh. A loucura desta situação é que neste momento um punhado de editores mais ou menos aleatórios que por acaso combatem a pirataria no Commons estão ditando o acesso à Internet a toda uma população."[30]
EmAngola, o programa de parcerias iniciou-se em Dezembro de 2014, chefiado por Adele Vrana, encarregada da Fundação Wikimedia das parcerias móveis para os mercados emergentes deÁfrica eMédio Oriente, negociando com operadores telefónicos a inclusão de um pacote Wikimedia a custo zero em pacotes de operadores telefónicos semplano de dados, em conjunto com oFree Basics do Facebook. Inicialmente firmou parceria com aUnitel,[19] a que se juntou aMovitel em novembro do ano seguinte.[20] Quatro meses após a parceria com o segundo operador, em março de 2016, o programa havia mudado drasticamente a cultura deInternet em Angola, generalizando o pirateamento de conteúdos protegidos pordireito de autor, sobretudo músicas, vídeos e filmes, entre uma população até aí sem acesso ou acesso muito reduzido à Internet. Os conteúdos eram carregados na Wikipédia e noWikimedia Commons de forma clandestina, e depois divulgados e compartilhados no Facebook, em grupos enganosamente identificados com a Wikipédia ou com afiliados Wikimedia, como a inexistente "Wikimedia Angola", com milhares de membros, usando como chamariz imagens eróticas, usando os programas de parcerias para acesso a custo zero. A criatividade dos habitantes de países em desenvolvimento foi apontada como um dos factores por trás da elaboração dos esquemas de pirataria angolanos funcionando sobre a Wikipédia.[31][32][33][24]
Apesar dos reportes de abuso generalizado originário do programa Wikipédia Zero em Angola, Adele Vrana, coordenadora das parcerias, recusou sequer considerar a hipótese de impedir os utilizadores angolanos participantes do programa de editar conteúdo, afirmando que o problema radicava na inabilidade por parte da comunidade em lidar com um súbito afluxo de novos editores.[33][32][24] Cansados de combater os abusos, administradores da Wikipédia e outros projetos Wikimedia começaram bloqueando em massa os IPs angolanos,[32][31] causando, comoefeito colateral, o bloqueio da comunidade Wikimedista angolana, que até aí editava livremente e de forma construtiva a enciclopédia acedendo da forma convencional. No Wikimedia Commons, por exemplo, foi necessário solicitar a liberação de bloqueio a um fotógrafo angolano, cujo trabalho era de grande interesse para os projetos Wikimedia, impedido de carregar imagens devido aos bloqueios derivados dos acessos via Wikipedia Zero.[31][32][24]
O programa de parcerias Wikipedia Zero em Angola foi percebido por alguns, como a organização ativistaAccess Now, como uma interferência de países desenvolvidos num país em desenvolvimento numa lógicacolonial, alertando sobre os perigos da limitação do acesso à Wikipedia aos angolanos e outros cidadãos de países onde o Wikipedia Zero estava ativo.[24]
A Fundação iniciou o seu programa de parcerias no Gana em Dezembro de 2014, envolvendo acordos com as operadoras Airtel e MTN. Um estudo publicado em 2016 sobre o impacto dos pacotes Free Basics e Wikipedia Zero noGana revelou que a parceria era geralmente percebida entre os clientes das operadoras como promoções das empresas de telecomunicações, com alguns utilizadores avançados classificando a sua utilização como experiências deinfoexclusão. Os participantes que tentaram usar tanto o Free Basics como o Wikipedia Zero reportaram dados inconsistentes com o programa sobre como obter e usar as aplicações, incluindo a necessidade de ligar para um número de telefone para fazer o download da aplicação. Membros doGrupo de Utilizadores Wikimedia do Gana relataram que para fazer o download da aplicação era necessário ter balanço positivo no plano de dados do cliente da operadora, contrariando as expectativas de que os clientes conseguiriam usar a aplicação mesmo sem dados no plano. Um funcionário de uma ONG deHo mostrou-se totalmente confundido sobre como usar o serviço sem gastar créditos do plano de dados. Em alguns casos, foi reportada confusão entre a Wikipedia e o Facebook. Muitos participantes do estudo responderam que nunca utilizaram os pacotes devido a barreiras tecnológicas e educacionais, além da incerteza sobre como deveriam ser usadas. Finalmente, os motivos que levaram os participantes a optar por pacotes com aqueles serviços não tinham relação com os pacotes a custo zero, prendendo-se com optimização dos seus gastos gerais com telecomunicações.[34] A própria Fundação Wikimedia revelou em 2018 que pelo menos desde 2016, o programa de parcerias havia se revelado de pouco interesse para as operadoras.[6]