Shemá Israel no texto massorético, à direita, e no Targum Onkelos, à esquerda
Targum (emhebraico earamaico: תַּרְגּוּם, pl.targumim outargumin; significado: tradução, interpretação, paráfrase ou versão)[1] é um termo usado para se referir, em geral, a traduções e comentários em aramaico dasEscrituras Hebraicas, produzidos entre operíodo do Segundo Templo e aIdade Média. Ostargumim começaram a ser necessários após oexílio babilônico, devido àassimilação linguística que osjudeus exilados sofreram, causando a perda do domínio da língua hebraica por parte destes e a adoção do aramaico como idioma comum. A princípio, quando ainda não existia targum escrito, havia nassinagogas alguém que interpretasse e traduzisse conforme a leitura daTorá,[2] este era chamadometurgeman outurgeman.[3] O tradutor frequentemente expandia sua tradução com paráfrases, explicações e exemplos, tornando-a uma espécie demidraxe.
OTalmude estabelece algumas limitações para as traduções no serviço das sinagogas.[4] NoTalmude Babilônico, nos tratados de Meguilá e Nedarim, é citado Neemias 8:8,[5] que diz: "E leram no livro, na lei de Deus; e declarando, e explicando o sentido, faziam que, lendo, se entendesse"; aguemará explica que onde está escrito "explicando o sentido" significa "traduzindo". Portando, segundo a guemará, já nos dias do exílio babilônico havia necessidade de uma tradução do texto.[6][7]
Ostargumim são escritos muito importantes para entender as visões do judaísmo pré-medieval, pois muitos deles não são apenas traduções exatas, mas comentários e interpretações acrescentadas à tradução. Os acréscimos contidos nostargumim preservaram diversas tradições orais da época doJudaísmo do Segundo Templo, o que faz com que ostargumim sejam amplamente estudados em matérias de criticismo bíblico e história do judaísmo. Ostargumim são, portanto, fontes de muitasagadot, assim como o Talmude e osmidrashim, sendo, porém, algunstargumim até mesmo anteriores a estes.
As traduções da Torá para o aramaico são alguns dostargumim mais preservados e importantes na história do judaísmo. Há três destes que se destacam pelo seu valor histórico e pela preservação do texto. São estes: Targum Onkelos, Targum Neofiti e Targum Pseudo-Jonatã.
Texto hebraico daparashá bereshit no canto superior direito, a mesma parashá na leitura do Targum Onkelos no canto superior esquerdo e os comentários de Rashi na parte inferior
O Targum Onkelos é uma tradução clássica da Torá ao aramaico que, segundo o Talmude Babilônico, foi escrita por Onkelos, ogentio, com base nos ensinamentos deEliezer ben Hirkanos eYehoshua ben Chananya, seusrabinos. Críticos não são muito seguros sobre essa atribuição e datam a sua redação final entre os séculos III e V, justificando essa hipótese devido à reutilização da linguagem de outrosmidrashim compostos naquela época e, portanto, não poderia ter sido composta por Onkelos, que viveu no século II.[8][9] Outros, discordando, concluíram que a tradução aramaica de Onkelos se originou naSíria Palestina no início do segundo século, mas que sua redação final foi feita naBabilônia, provavelmente no quarto ou quinto século.
O livro exerceu muita influência no judaísmo babilônico, sendo considerado como o targum oficial da Babilônia e chamado no Talmude Babilônico de "nosso targum".[10][11] Foi e continua sendo impresso emchumashim junto dotexto massorético, dos comentários deRashi e das meguilot. É considerado também que a tradução de Onkelos teve algumainspiração divina. Rashi, que em seus escritos cita amplamente o Targum Onkelos, diz em seu comentário ao tratado de Kiddushin, usando como referência o tratado de Meguilá, que os acréscimos na tradução de Onkelos são a exata revelação dada noSinai que foi esquecida com o tempo.[12]
Além de Rashi, vários outros rabinos proeminentes usam o Targum Onkelos em seus escritos, comoRamban, oBaal HaTurim, oMaharal de Praga,Bahya Ben Asher, Malbim, entre outros. OShulkhan Aruch, compilação deleis haláquicas do século XVI, ordena que aparashá da semana seja lida duas vezes em hebraico e uma vez na versão do Targum Onkelos, tornando a leitura de Onkelos obrigatória para algumas comunidades judaicas.[13]
Ainda há um debate sobre em qual dialeto aramaico o Targum Onkelos foi inicialmente escrito, mas é bem aceita nas discussões acadêmicas a hipótese de que sua redação original seria em aramaico galileu, um dos dialetos aramaicos ocidentais, e que com suas edições pelos rabinos babilônicos este sofreu alterações para aproximar o texto da fala oriental do aramaico.
O Targum Neofiti ou Neophyti, também conhecido em hebraico como Targum Yerushalmi Hashelem, é o maior dostargumim ocidentais ou palestinos. Sua única cópia sobrevivente, com somente alguns versos ilegíveis, contém 450 fólios dos cinco livros doPentateuco. Até a compra do seu manuscrito peloVaticano em 1886, permaneceu noColégio dos Neófitos, uma instituiçãocatólica emRoma para novos convertidos (neófitos) doislamismo e do judaísmo, de onde o nome do targum procede. Naquela época, Targum Neofiti foi intitulado incorretamente como um manuscrito do Targum Onkelos, e permaneceu sem comentários até 1949, quando o professor José Maria Millas Vallicrosa e Alejandro Díez Macho notaram que diferia significativamente do Targum Onkelos. Foi traduzido e publicado de 1968 a 1979 e desde então tem sido considerado o mais importante dostargumim palestinos, pois é de longe o mais completo dostargumim ocidentais e talvez o mais antigo também.
Ocolofão do manuscrito data a cópia de 1504, mas não se sabe a época exata de quando começou a ser escrito. É pressuposto, com base em análises linguísticas, que tenha sido escrito por volta do primeiro ou segundo séculos. Macho argumenta que o targum contém material pré-massorético, anti-haláquico e pré-cristão; concluindo também que o aramaico do Targum Neofiti é anterior à padronização do texto massorético.[14] Os principais fatos que contribuem para essa visão são: passagens contrárias à halacá; interpretações messiânicas comuns com o cristianismo; outros paralelos com o Novo Testamento; redação característica do período helenístico, etc.[15] Observações posteriores concluíram que o texto do Targum Neofiti reflete as leituras do texto massorético por diversas vezes.[16]
O Targum Pseudo-Jônatas ou Pseudo-Jonatã, também chamado Targum Jerusalém I, é, assim como o Targum Neofiti, um targum de tradição ocidental palestina. Desde o século XIV é frequentemente atribuído de forma errônea a Jonatã ben Uziel, umtanaíta discípulo deHilel, devido a uma confusão envolvendo o targum dosprofetas, também atribuído ao sábio judeu. É especulado que isto se deve a uma leitura incorreta da abreviação T"J, que seria lida originalmente como "Targum de Jerusalém", sendo posteriormente mudada a leitura para "Targum Jonatã". É, portanto, chamado no mundo acadêmico de "Targum Pseudo-Jônatas".[17]
O Targum Pseudo-Jônatas costuma acrescentar agadot ao texto do Pentateuco que os outrostargumim da Torá, usando tradições babilônicas contidas no Targum Onkelos e tradições palestinas contidas nos outrostargumim palestinos, como também leituras doPirkê deRabbi Eliezer,[18] o que sugere uma datação mais posterior que os outrostargumim da Torá. De fato, a maioria dos acadêmicos tem considerado que o Targum Pseudo-Jônatas foi escrito depois do advento doislã, isso, pois há no seu texto uma menção às mulheres deIsmael, apresentadas comoAixa eFátima, os mesmos nomes da esposa deMaomé e de sua filha, respectivamente. Além de se basear nesses escritos, o Targum também apresenta passagens similares ao texto da Crônica de Moisés, datada do século XI.[19]
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