Os Países Baixos já eram uma região rica desde o século XII, com Flandres e Brabante como o centro comercial do NoroesteEuropeu. A cidade deBruges vendia produtos de luxo comoseda eespeciarias, vindos doOriente Médio através de ligações com as cidades portuáriasitalianas deGênova eVeneza. A passagem pelos centros têxteis da Flandres eram a última e mais rentável etapa produtiva dos tecidosingleses, em que eram tratados e tingidos. Contudo, a governança dos Países Baixos se provava difícil para seus soberanos; por constituirem entidades distintas, cada província possuía sua própria estrutura política e tradições distintas além de uma grande influência da burguesia urbana, o que exigia constantes negociações entre as províncias e a coroa.[5] Ademais, províncias como aFrísia,Groninga,Guéldria,Utreque eOverissel só foram incorporadas ao domínio Habsburgo posteriormente, já no reinado deCarlos V.[6][7]
Movimentos daReforma Protestante iniciaram cedo nos Países Baixos, com críticas à conduta moral doclero sendo anteriores à ruptura. Como um centro deimprensa localizado noestuário doReno, os Países Baixos encontraram ampla circulação dos textos deLutero,[nota 2] sobretudo em regiões anexadas tardiamente, como a Frísia, e em centros urbanizados comoAntuérpia eDelft.[9] O imperadorcatólico Carlos V, com o apoio doPapa Adriano VI, iniciou a perseguição ao protestantismo em 1522 com o apontamento deFrans van der Hulst comoinquisidor-geral dos Países Baixos. As primeiras execuções ocorreram 1523, emBruxelas, contra dois fradesagostinianos e foram as primeirascondenações à morte pela aderência ao protestantismo naEuropa Ocidental.[10] Simultaneamente, o governo de Carlos V aplicava reformas centralizadoras que buscavam conectar as províncias conquistadas à capital regional em Bruxelas, limitando direitos à autonomia.[11] Em 1549, aPragmática Sanção unificou pela primeira vez os Países Baixos sob uma única entidade política monárquica e hereditária, asDezessete Províncias.[12][13]
Na década de 1550, a instabilidade era crescente nos Países Baixos. Décadas deguerras contra a França e abertura de uma frente de batalha na Flandres aumentavam o fardo político e fiscal sob a região,[14] o que foi piorado pela abdicação de Carlos V em favor de seu filho,Filipe II de Espanha.[15][16] Além disso, as tensões religiosas entre católicos e protestantes alcançavam níveis críticos,[17] com nobres peticionando a regenteMargarida de Parma pela maior tolerância ao protestantismo em 1565 e uma revoltaiconoclasta, oBeeldenstorm, eclodindo em 1566. Essa facção de oposição ao regime espanhol é nomeada deGueux (mendigos).[18] O movimento foi reprimido pelas forças de Filipe II e iniciou-se uma onda ainda mais intensa de perseguição religiosa pelo apontamento deFernando Álvarez de Toledo, Duque de Alba, conhecido à época por sua rigidez e ódio ao protestantismo, comogovernador dos Países Baixos junto a dez mil soldados.[19][20][21]
A repressão sobAlba foi intensa, com o fechamento de igrejas, perseguição de pastores, ocupação militar das cidades e prisão de nobres. Na superfície, o país parecia retomado pelocatolicismo, Entretanto, não foi possível erradicar a atividade ou a fé protestante, com muitas figuras emigrando ou operando clandestinamente.[22][23]
Após o fracasso da revolta de 1566,Guilherme de Orange e a maioria dos nobres protestantes se refugiaram naAlemanha, onde continuaram discussões sobre a situação neerlandesa.Henrique de Bederode, líder das revoltas de 1565-1566 tentou convencer Orange de uma nova revolta armada contra o regime de Alba, mas sem sucesso. Foi somente em 1568, tendo descoberto de sua condenação e confisco de toda propriedade nos Países Baixos, que Orange aceitou a causa da revolta. Com apoio doPalatinado e de outros soberanosprotestantes, Orange reuniu os exiladosneerlandeses e acumulou uma fortuna para o movimento, financiando uma máquina de propaganda contra o que chamava de "tirania espanhola". Apesar disso, o foco narrativo estava nas políticas "cruéis" do Duque de Alba, negando a existência de uma revolta contra Filipe II e ocultando a dimensão religiosa dos conflitos.[24][25]
O objetivo de Filipe II era transformar os Países Baixos em um bastião do poderHabsburgo. AEspanha sofria pressões daFrança, que, apesar de derrotada, ainda compunha oposição à supremacia espanhola, e doImpério Otomano, que avançava sob oMediterrâneo, negligenciado há décadas. Era, portanto, crucial para essa agenda política a imposição de novos impostos. Assim, em 1569, Alba convocou osEstados Gerais para a aprovação de três medidas fiscais: 1% de imposto sobre o patrimônio; 5% em tarifas de importação; e 10% de imposto sobre as vendas.[nota 4] Os benefícios para o regime espanhol seriam imensos, sobretudo por garantir os fundos para a manutenção do exército que ocupava osPaíses Baixos, mas também por contornar os direitos tradicionais das províncias sob suas próprias rendas.[26][27]
Os Estados Gerais aprovaram as novas medidas, mas elas foram rejeitadas nasassembleias provinciais econselhos municipais. Um termo temporário foi aplicado até sua expiração em 1571, quando Alba retomou a insistência sobre os impostos, aplicando-os unilateralmente por decreto. Além da insatisfação gerada pelo atropelamento do processo legal, o método adotado para forçar a implementação das medidas foi o de instituir multas abusivas aosburgomestres emagistrados que não se adequassem. A resposta popular aos novos impostos, sobretudo aos 10% sobre as vendas, dificultou seriamente a posição política da Coroa, ao invés de fortalecê-la. Nobres e bispos leais ao regime espanhol tentaram, sem sucesso, convencer Filipe II e Alba a suspenderem o novo imposto. Apesar disso, os impostos foram raramente coletados, sendo o símbolo de um governo que ignorava as leis das províncias mais do que uma política de pressão econômica.[28]
O estopim da revolta foi em abril de 1572, quando seicentosGueux expulsos daInglaterra capturaram a cidade portuária deBrielle. A cidade era pequena e pouco importante, mas isso deu oportunidade aosGueux, antes exilados, de perceberem a fragilidade espanhola e explorá-la com apoio popular. Cinco dias depois da captura de Brielle, os cidadãos deFlessingue tomaram a cidade estratégica, expulsando os contingentes espanhois e convidando osGueux a ocupá-la; o mesmo ocorreu emVeere. Em agosto, comGuéldria eOverissel, além de enclaves naHolanda eZelândia, sob controle dos revoltosos, Guilherme de Orange pessoalmente liderou 16 mil soldados numa invasão aBrabante.[29][30][31]
A partir da primeira metade do século XVIII, teve início o declínio das Províncias Unidas. Leis mercantis daGrã-Bretanha e daFrança e asGuerras Anglo-Holandesas contribuíram para o declínio.[36] Com a mortes deDe Witt e de De Ruyter, a república holandesa perdeu sua hegemonia marítima e, com ascensão deInglaterra,Amsterdã perdeu a sua posição de principal centro económico europeu. Em 1795, a república teve seu território ocupado pela França, sendo substituída pelaRepública Batava.[36]
Israel, Jonathan (1995).The Dutch Republic: Its Rise, Greatness, and Fall 1477-1806 [A República Neerlandesa: sua ascensão, grandiosidade e queda 1477-1806] (em inglês). Oxford: Oxford University Press.ISBN978-0-19-873072-9
Onnekink, David; Rommelse, Gijs (2019).The Dutch in the Early Modern World: A History of a Global Power [Os Neerlandeses no Mundo do Início da Era Moderna: Uma História de uma Potência Global] (em inglês). Cambridge: Cambridge University Press.ISBN978-1-316-42413-1
Prak, Maarten (2023).The Dutch Republic in the Seventeenth Century [A República Neerlandesa no Século XVII] (em inglês) 2 ed. Cambridge: Cambridge University Press.ISBN978-1-009-24059-8
Tracy, James (2008).The Founding of the Dutch Republic: War, Finance, and Politics in Holland, 1572-1588 [A Fundção da República Neerlandesa: Guerra, Finanças e Política na Holanda, 1572-1588] (em inglês). Oxford: Oxford University Press.ISBN978-0-19-170613-4
Schama, Simon Michael (1998).The embarrassment of riches: an interpretation of Dutch culture in the Golden Age [Desconforto da riqueza: a cultura holandesa na época de ouro, uma interpretação]. Londres: Collins.ISBN978-00-02178-01-3
Strum, Daniel (2012).O Comércio do Açúcar: Brasil, Portugal e Países Baixos. 1595-1630. Rio de Janeiro: Versal.ISBN978-85-89309-46-2
de Vries, Hubert (1995).De historische ontwikkeling van de heraldische symbolen van Nederland, België, hun provincies en Luxemburg [O desenvolvimento histórico dos símbolos heráldicos dos Países Baixos, Bélgica, suas províncias e Luxemburgo] (em neerlandês). Amsterdã: Uitgeverij Jan Mets.ISBN9053301038