Fora nomeado porNero governador daLusitânia em58, permanecendo no cargo durante dez anos. Apoiou a ascensão deGalba ao trono, mas veio a promover o golpe de Estado que culminou no assassínio do idoso imperador. Teve de enfrentar a rebelião do exército deVitélio, que derrotou as suas tropas naPrimeira Batalha de Bedríaco. Perante a derrota, Otão cometeu suicídio.
Era filho deLúcio Otão, cuja mãe era uma mulher pertencente aopatriciado e relacionada às famílias mais influentes da capital. O seu pai gozou do favor doimperadorTibério, ao qual se parecia muito fisicamente;[nota 1] desempenhou com rigidez diversos cargos dentro da administração imperial. Descendia de umanobre e antiga família estabelecida emFerentino, embora de origemetrusca. Os seus antepassados foram príncipes daEtrúria.
Apareceu pela primeira vez nos escritos dos historiadores clássicos quando entrou a fazer parte do círculo do imperadorNero, sendo qualificado como imprudente e extravagante.[2] Apesar disso, a amizade entre ambos quebrou-se quando a esposaPopeia Sabina foi conhecida por Nero numa ceia. A partir desse momento e após divorciarem-se, começou uma relação entre Nero e Popeia que terminaria com a morte dela. Antes de falecer, enviou o seu ex-marido para o exílio, ao que foi concedido por dez anos ogoverno daprovíncia daLusitânia[nota 2] na qualidade dequestor.[3]
Após dez anos de administração moderada, insólita nessa época, o destino ofereceu-lhe uma oportunidade de vingar-se de Nero.Galba,governador daHispânia Tarraconense sublevou-se contra Nero em68 d.C., tendo Otão como um dos seus fiéis adeptos; o ressentimento pelo trato recebido, bem como a ambição pessoal decidiram o governador da Lusitânia a unir-se ao seu vizinho; além disso, Galba não tinha descendência e estava numa idade muito avançada, pelo qual Otão aspirava a ser nomeado o seu sucessor.[4]
Embora a sua lealdade parecesse inquebrantável, Otão começou a negociar com aguarda pretoriana após a nomeação deLúcio Calpúrnio Pisão Frúgio Liciano como sucessor do seu aliado. Apesar de ser o estado das suas finanças desesperado, encontrou dinheiro suficiente para comprar os serviços de todos os membros do corpo. Na manhã de15 de janeiro, apenas cinco dias depois da adoção de Pisão, acudiu, como de costume, a apresentar os seus respeitos ao imperador. Após isso foi escoltado aoacampamento dospretorianos, onde, após uns breves instantes de indecisão, foi aclamadoimperator.[5]
Depois disso voltou para oFórum com uma importante força e ali encontrou Galba, que, alarmado pelos rumores do ocorrido, dirigia-se através de uma confundida multidão para os quartéis dos pretorianos. Acohors que rondava peloPalatino e que acompanhava o imperador, desertou. Indefensos, Galba, Pisão e outros homens foram brutalmente assassinados pela Guarda.[5] Após o término do breve combate, ossenadores investiram Otão com o título deaugusto, com opoder tribunício (tribunicia potestas) e com outras honras exclusivas do imperador. Otão devia o seu sucesso ao ódio que suscitava a figura de Galba entre os soldados como consequência da sua famosa recusa ao esbanjamento monetário. Os habitantes, também descontentes com tal gestão, concederam-lhe o seu apoio.
Ao ascender ao trono, aceitou ou pareceu aceitar acrescentar ocognome deNero ao seu nome, conferido pelos gritos da plebe, pois sua juventude e pelo seu aspecto efeminado lembrava-os de Nero, que era favorito dos mesmos.[6] As estátuas de Nero foram erguidas novamente, seus libertos e oficiais foram reinstalados (incluindoEsporo a quem Nero havia se casado e com quem Otão também tornou-se íntimo), e foram finalizados certos projetos urbanísticos impulsionados durante o seu reinado, como aCasa Dourada.[6] Paralelamente, para acalmar os receios dos cidadãos mais respeitáveis, foi anunciada uma administração liberal e moderada, além de uma clemência criteriosa paraMário Celso, cônsul designado e um adepto dedicado de Galba. Otão logo percebeu que era muito mais fácil derrubar um imperador do que governar como um: de acordo comSuetônio, Otão durante uma cerimónia religiosa logo após o sacrifício murmurava "O que tenho eu a ver com tocar astubas?".[nota 3]
O novo imperador compreendeu a verdadeira dimensão da revolução naGermânia após ler a correspondência privada de Galba; ali tinham-se rebelado váriaslegiões no comando deVitélio e avançavam para aItália.[7] Após uma vã tentativa de reconciliação preparou-se para a batalha com uma força inesperada.[7] Das províncias que se declararam ao seu favor pouca ajuda podia aguardar, exceto aslegiões que avançavam desde aDalmácia,Panônia eMésia. Com estas tropas formou uma força formidável e, com a suaarmada tomou o controle dos mares italianos.
Otão enviou de imediato a sua frota a fim de assegurarLigúria. A14 de março iniciou um avanço à cabeça das suas tropas visando a evitar a entrada do seu adversário naItália.[nota 4] Apesar disso, não chegou a horas e enviou parte do seu exército a guarnecerPlacência. Estes soldados defenderam a cidade com sucesso frente aosítio ao que a impôsAulo Cecina Alieno; após o combate, os efetivos do comandante viteliano foram forçados a mudarem-se paraCremona. Apesar desta vitória na chamadaBatalha de Locus Castrorum, o avanço deFábio Valente mudou o curso doconflito.
Oslegados de Vitélio resolveram travar umabatalha decisiva emBedríaco. Paralelamente, o alto comando de Otão era totalmente dividido: os comandantes mais experientes estimavam que era preferível aguardar pelas tropas que vinham daDalmácia; porém, o seu irmão,Lúcio Sálvio Otão Ticiano, e oprefeito pretoriano,Licínio Próculo, impulsionaram o seu líder a avançar de imediato, invalidando assim qualquer oposição. Pela sua vez, Otão permaneceu à frente de um considerável exército de reserva emBrixelo, território situado à beira doPó. Quando se tomou a decisão, as suas tropas já tinham cruzado o rio e acampado em Bedríaco, uma pequena povoação localizada nas imediações daVia Postúmia, situada por onde os soldados dálmatas assistiriam.[8]
Abandonando a sua vantajosa posição, as suas forças avançaram através daVia Postúmia em direção aCremona. No seu caminho, encontraram as forças do seu adversário, que forçaram a travar batalha desde uma situação desvantajosa. Após uma debâcle militar, as suas forças marcharam atéCalvatone. As forças de Vitélio perseguiram-nos, porém, foi alcançado um acordo pelo qual foi permitido o acesso das tropas de Vitélio aoacampamento de Otão.
Apesar de esta batalha não inclinar a balança do conflito para nenhuma direção, o efeito no acampamento de Brixelo após receber a informação relativa à batalha foi devastador. Otão estava ainda à frente de um exército formidável e as legiões procedentes da Dalmácia já atingiramAquileia; assim mesmo, o moral dos soldados e oficiais deste destacamento era muito alto. Porém, é provável que o imperador optasse por aceitar o veredito de uma batalha provocada pela sua própria irreflexão. Num solene discurso despediu-se daqueles que se uniram a ele exclamando:
“
É muito mais justo falecer um por todos que todos por um.[9]
”
Após estas palavras retirou-se para a sua barraca de campanha a fim de descansar. Essa manhã decidiu suicidar-se cravando uma daga no coração; quando os seus assistentes entraram nos seus aposentos já tinha falecido. Após a sua morte, colocaram as suas cinzas num simples mausoléu. Um simples túmulo foi erguido na sua honra em Brixelo; em cima do monumento havia uma inscrição que rezava:
“
Diis Manibus Marci Othonis.
”
Muitos historiadores defenderam a teoria de o suicídio de Otão ter como objetivo evitar oconflito fratricida.
Otão regira o império por apenas três meses, porém, demonstrara muita mais sabedoria durante o desempenho deste cargo do que o esperado.
O físico e as maneiras de Otão não correspondiam a tanto valor. É dito que era pequeno, que tinha os pés malfeitos e torcidas as pernas. Era cuidadoso do seu traje, quase tanto como uma mulher; mandou depilar todo o corpo, e levava na cabeça, quase calva, cabelos postiços, fixados e arranjados com tanta arte que ninguém o notava. Afeitava-se diariamente com sumo cuidado e esfregava-se com pão molhado, costume que adquirira na puberdade, com objeto de não ter nunca barba.[10]
↑Ou seja, algo além de capacidade para fazê-lo. O sentido seria algo do tipo: "porque estou eu a fazer cerimónias religiosas enquanto minhas mãos estão manchadas de sangue (do sacrifício)?"[6]
↑As fontes clássicas afirmam que este avanço se iniciou com numerosos augúrios adversos