O escopo da neurociência tem sido ampliado para incluir diferentes abordagens usadas para estudar os aspectosmoleculares,celulares,de desenvolvimento,estruturais,funcionais,evolutivos emédicos do sistema nervoso, ainda sendo ampliado para incluir acibernética como estudo da comunicação e controle no animal e na máquina com resultados fecundos para ambas áreas do conhecimento. As técnicas usadas pelosneurocientistas têm sido expandidas enormemente, com contribuições desde estudos moleculares ecelulares deneurônios individuais até do imageamento de tarefas sensoriais e motoras nocérebro. Avanços teóricos atuais na neurociência têm sido auxiliados pelo estudo dasredes neurais ou com apenas a concepção de circuitos (sistemas) e processamento de informações que tornam-se modelos de investigação com tecnologia biomédica e/ou clínica.
Dado o número crescente de cientistas que estudam o sistema nervoso, várias proeminentes organizações de neurociência têm sido formadas para prover um fórum para todos osneurocientistas e educadores. Por exemplo, aInternational Brain Research Organization[5] foi fundada em 1960, aSociety for Neuroscience[6] em 1969, aSociedade Brasileira de Neurociências e Comportamento[7] em 1976 e aSociedade Portuguesa de Neurociências[8] em 1992.
Estudos daesquizofrenia com imagens obtidas com oPET Scan[9] revelam uma relação entre uma menor ativação dos lobos frontais (vermelho) e aumento anormal dadopamina no c. striatum (verde)
Observe-se que a maioria dos vocábulos com prefixo neuro podem ser substituídos ou associados ao prefixo psico, a moderna neurociência tende a reunir as produções isoladas face ao risco de perder a visão global do seu objeto de estudo: o sistema nervoso, contudo a complexidade deste, e em especial do sistema nervoso central da espécie humana, exige o estudo isolado de cada campo e o exercício da inter-relação de pesquisas.Existem pelo menos 5 maneiras ou áreas de estudo da relação entre sistema nervoso e comportamento e/ou sua fisiologia:
Oespectro animal – diversidade de modelos que a natureza oferece e os padrões reconhecíveis de comportamento e de estrutura anatômica e bioquímica. Atividade também denominadaNeuroetologia[10][11]
As diversaspatologias e lesões anatômicas e suas consequências funcionais. Paradeficiência mental, por exemplo, já se conhece pelo menos 300 causas.[12][13][14]
Efeito dedrogas em diferentes sítios anatômicos, Existe certo consenso quanto a 3 formas básicas de efeito farmacológico de drogas nosistema nervoso. As substâncias psicoativas podem ser classificadas comolépticas (estimulantes);analépticas (depressoras) e dislépticas (modificadoras). É nesse último grupo que se enquadram as substâncias conhecidas comoalucinógenos ouenteógenos.[18][19]
Estudo da mente (psique), ainteligência,capacidade cognitiva e/oucomportamento (neuropsicologia). Para um grande conjunto de alterações comportamentais estudadas pelapsicopatologia e criminologia ainda não existe consenso sobre suas causas biológicas e psicossociais. O mesmo pode ser dito para alterações psiconeuroendócrino fisiológicas da experiência religiosa ou êxtase religioso e estados alterados deconsciência induzidos por técnicas como meditação e yoga,[20][21][22][23] bem como demais alterações funcionais do sistema nervoso em a sua interação na cultura estudados na ótica daneuroantropologia[24]
Uma forma distinta de conceber a diversidade de metodologias com que podemos estudar o cérebro é, como proposto por Lent, 2004,[25] acompanhar, em princípio os distintos níveis anatômicos – funcionais que a biologia utiliza para o estudo dos seres vivos. Estabelecendo então:Neurociência molecular;Neurociência celular como níveis de análise equivalentes as bem estabelecidas disciplinas da bioquímica e citologia; ANeurociência sistêmica orientada pelos princípios histológicos, estruturais e funcionais dos aparelhos e sistemas orgânicos; ANeurociência comportamental em princípio acompanha os níveis de organização básica do indivíduo ou seu comportamento equivalendo aos estudos da Psicobiologia ou Psicofisiologia e finalmente aNeurociência cognitiva ou estudo das capacidades mentais mais complexas, típicas do animal humano como a linguagem, autoconsciência etc. que também pode ser chamada deNeuropsicologia.
O estudo do sistema nervoso central se dá por meio de diversas perspectivas, estando presentes desde técnicas de análises comportamentais e cognitivas, até análise de mecanismo moleculares e celulares.[26]
À nível molecular, existem questões primordiais a serem respondidas como, por exemplo, mecanismos pelos quais neurônios expressam e respondem às demais sinalizações moleculares. Outro exemplo da aplicação de análises moleculares na neurociência é aprimorar o entendimento de como os axônios podem gerar uma rede complexa e interconectada. Nesse contexto, ferramentas de biologia molecular e genética podem ser utilizadas para compreender como ocorre o desenvolvimento de um neurônio e quais são as influências moleculares, diretas ou indiretas, que são capazes de afetar funções neurobiológicas.
À nível celular, a neurociência visa compreender mecanismos pelos quais os neurônios processam informações fisiológicas e eletroquímicas. Estas questões incluem o entendimento e a correlação de estruturas neuronais com suas funções. O corpo celular, por exemplo, é a região que contém o núcleo do neurônio e, portanto, toda a informação genética da célula. Os dendritos, por sua vez, são funcionalmente especializados com a função de recebimento da informação sináptica. Finalmente, os axônios são especializados na condução do impulso nervoso. Dessa maneira, o entendimento de como ocorre a neurotransmissão e a sinalização elétrica são de extrema importância para a compreensão das funções neuronais.
Outra área das neurociências que recebe destaque para aplicação estudos moleculares e celulares é a investigação direta de mecanismos envolvidos com o desenvolvimento do sistema nervoso central.[27] Dessa forma, a elucidação de padrões de organização neuronal, bem como do desenvolvimento de novas células nervosas e da glia proporcionam um melhor entendimento de mecanismos migratórios das células nervosas, bem como do desenvolvimento dendrítico e axonal.[28][29]
Por fim, a modelagem computacional baseada em neuro-genética é uma área em ascensão para o estudo dos mecanismos celulares e moleculares neuronais normais e patológicos, se embasando nas interações dinâmicas da forma como os genes influenciam a dinâmica das redes neurais cerebrais.[30][31][32]
Além da tarefa ainda não concluída em milhares de anos de pesquisas, especulações, tentativas, erros e acertos sobre a anatomia e fisiologia do cérebro e de suas funções, sejam o comportamento/pensamento (psique) ou os mecanismos de regulação orgânica e interação psicossocial alguns problemas se impõem aos pesquisadores, destacando-se entre estes os que podem ser reunidos pela patologia.
Ressalte-se, porém, a inconveniência de reduzir a neurociência à clínica e anatomia patológica como na história da medicina já se fez, e perdermos de vista a possibilidade de construção de um conhecimento da saúde (não redutível ao oposto qualificativo da doença) considerando também as dificuldades de aplicação dos conceitos da patologia às variações genéticas e bioquímicas das espécies e natureza da psique e/ou comportamento.
Assim esclarecido temos duas estratégias básicas para abordar os problemas da mente-cérebro e/ou a principal aplicação prática da neurociência na clínica médica:[33][34]
Se não considerarmos que o conhecimento de métodos de tratamento invasivo comotrepanações das medicinas antigas e pré colombianas; utilização deplantas psicoativas e outras técnicas de modificação da consciência e anestesia (similares à yoga e acupuntura) fazem parte da neurociência, podemos tomar como data de criação desta interdisciplina a publicação deDe morbis nervorum em 1735 , de autoria do médico holandêsHerman Boerhaave (1668 - 1738), considerado o primeiro tratado de neurologia.[35]
Observe-se porém que alguns autores consideramThomas Willis, (1621-1675), autor do "Cerebri anatome: cui accessit nervorum descriptio et usus" (1664), como também, um possívelfundador da neurologia, a exemplo deCharles Scott Sherrington, (1852-1952). Entre outros méritos atribuídos a ele, estão as perfeitas de descrições anatômicas publicadas, entre as quais, é conhecido de todos ocírculo arterial na base do cérebro até hoje identificadoo como "polígono de de Willis"[36]
Pode-se ainda marcar seu início com a descoberta da função cerebral[37] atribuída ao gregoAlcmaeon daescola Pitagórica de Croton em torno de 500 aC, que discorreu sobre as funções sensitivas deste. Suas observações foram confirmadas por Herófilo, um dos fundadores da escola de medicina deAlexandria (século III aC.), que descreveu asmeninges e a rete mirabile (rede maravilhosa) de nervos (distinguindo este dos vasos) e medula com suas conexões com cérebro, cujo conhecimento foi sistematizado e demonstrado empiricamente, através do corte seletivo de nervos, porGaleno (130-211 aC.).
Para Bear et al[38] o estudo do encéfalo é tão antigo quanto a ciência e entre as disciplinas que o estudam inclui amatemática, destacando ainda as reflexões deHipócrates sobre esse órgão no clássico da medicina, atribuído a ele, "Acerca das doenças sagradas" (Hipócrates Séc V a.C.).[39]..o homem deve saber que de nenhum outro lugar mas do encéfalo, vem a alegria, o prazer, o riso, e a diversão, o pesar e o ressentimento, o desânimo e a lamentação...por esse mesmo órgão tornamo-nos loucos e delirantes, e medos e terrores nos assombram...Nesse sentido sou da opinião de que o encéfalo exerce o maior poder sobre o homem... Ressalta, porém que a palavraneurociência é jovem e que a primeira associação de neurociência foi fundada somente em 1970.
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