Manuel I Comneno (emgrego:Μανουήλ Α' Κομνηνός;romaniz.:Manouēl I Komnēnós,28 de novembro de1118 –24 de setembro de1180) foi umimperador bizantino doséculo XII que reinou em uma época difícil e importante da história doImpério Bizantino e doMediterrâneo. Ávido por reconstruir seuimpério e torná-lo, como no passado, uma superpotência do Mediterrâneo, Manuel estabeleceu uma política estrangeira ativa e rigorosa. Durante seu reinado, fez alianças com opapa e o ocidente, invadiu apenínsula Itálica, administrou eficazmente a passagem daSegunda Cruzada através de seu império e estabeleceu um protetorado bizantino sobre osestados cruzados doultramar. Deparando-se com os avanços dosmuçulmanos naTerra Santa, aliou-se aoreino de Jerusalém e invadiu oEgito dosfatímidas. Manuel reestruturou o mapa geopolítico dosBálcãs e do leste do mediterrâneo, colocando os reinos daHungria e de além-mar sob ahegemonia do Império Bizantino, e lutou violentamente contra seus vizinhos europeus e do leste. Entretanto, no final de seu reinado, suas conquistas no leste ficaram comprometidas com a derrota emMiriocéfalo, quando resolveu atacar o impérioseljúcida, uma área considerada bem protegida.
Conhecido comoo Grande (emgrego:'o Μέγας') pelosgregos, Manuel é conhecido por ter inspirado um forte sentimento de lealdade naqueles que o serviram. Ele figura, ainda, como o herói de uma história escrita por seu auxiliar,João Cinamo, na qual toda virtude é atribuída a ele. Manuel, que foi influenciado pelasCruzadas, era conhecido como "o abençoado imperador deConstantinopla" não só dentro de seus domínios, como também em algumas partes domundo latino.[2] Contudo, historiadores não concordam com o que se atribui a Manuel. Alguns deles afirmam que o poder que possuía não advinha de seus próprios méritos, mas provinha dadinastia Comnena. Argumenta-se, ainda, que o poder bizantino caiu muito rapidamente com a morte de Manuel e que, para se conhecer as causas desse declínio, é necessário observar atentamente o seu reinado.[3]
Quarto filho deJoão II Comneno ePiroska da Hungria, Manuel I Comneno não tinha qualquer possibilidade de suceder seu pai.[4] Seu avô materno eraSão Ladislau. Destacando-se na guerra promovida por seu pai contra osturcos seljúcidas, foi escolhido, em 1143, como seu sucessor ao trono, no lugar de seu irmão mais velho,Isaac. Com a morte de seu pai em 8 de abril de 1143, Manuel foi consagrado imperador por seuexército.[5] Entretanto, sua sucessão ainda estava ameaçada: no leito de morte de seu pai, emCilícia, territórios muito afastados de Constantinopla, constatou que deveria retornar à capital imediatamente. Antes disso, deveria cuidar do funeral de seu pai e a tradição exigia que se organizasse a fundação de um mosteiro no local onde seu pai havia morrido. De forma rápida, enviou seu secretárioJoão Axuco à capital com ordens para prender seu mais perigoso rival, seu próprio irmão Isaac, que residia no palácio imperial e possuía acesso irrestrito ao tesouro real. Axuco chegou à capital antes mesmo da notícia da morte do imperador; assegurou a lealdade da cidade com relação a Manuel e, quando este chegou à cidade, em agosto de 1143, foi coroado pelo novopatriarca,Miguel II Curcuas. Dias mais tarde, sem mais nada a temer e com a posição de imperador assegurada, Manuel ordenou a soltura de seu irmão Isaac.[6] Mais tarde, ordenou ainda que fossem dadas duas peças de ouro (moedas) a cada morador de Constantinopla e 200 libras de ouro (incluindo, ainda, 200 peças de prata (moeda) anualmente) àIgreja Ortodoxa.[7]
O império que Manuel herdou de seu pai passou por muitas mudanças desde sua fundação porConstantino I, oito séculos antes. A mudança mais importante ocorreu noséculo VII, quando os soldadosislâmicos invadiram oEgito, aPalestina e grande parte daSíria, tomando-os para si de maneira irrevogável. Logo após, esses soldados rumaram para o oeste, para as províncias ocidentais doImpério Bizantino, assim denominadas no tempo de Constantino, nonorte da África eEspanha. Desde então, os imperadores governaram sobre um domínio que consistia, em sua maior parte, daÁsia Menor ao leste, e os Bálcãs a oeste. Desde a época de seu predecessor,Justiniano(r. 527–565), os imperadores também governaram partes da Itália,África e Espanha. Ainda assim, o império que Manuel herdou continuava a sofrer imensos desafios no que dizia respeito ao seu regime político. Ao final doséculo XI, osnormandos daSicília conquistaram aItália, na época parte doImpério Bizantino. Os turcos seljúcidas fizeram o mesmo com aAnatólia central e, noLevante, uma nova força aparecera - osestados dos Cruzados - os quais desafiaram o império. Neste momento, mais do que em qualquer outro durante os séculos precedentes, a tarefa que o imperador encarava era imensa.[8]
A primeira prova pela qual Manuel passou em seu reinado deu-se em 1144, quando o príncipeRaimundo de Antioquia reivindicou os territórios daCilícia. Contudo, ainda naquele mesmo ano, oCondado de Edessa assolado por umaguerra santa islâmica, iniciada porZengui. Raimundo percebeu que qualquer ajuda imediata do ocidente estava inteiramente fora de questão. Com o seu flanco oriental perigosamente ameaçado por esta nova guerra, não havia muitas opções a não ser uma humilhante visita a Constantinopla. Engolindo a seco seu orgulho ferido, dirigiu-se ao norte a fim de dialogar a respeito da proteção do imperador. Após seu pedido a Manuel, foi-lhe prometido o apoio requisitado e sua lealdade ao Império Bizantino estava garantida.[9]
No ano de 1146, Manuel iniciou uma expedição punitiva contra osultão de Rum,Maçude I, o qual violava repetidamente as fronteiras do império emAnatólia eCilícia. Não houve qualquer tentativa de se conquistar sistematicamente o território, entretanto as forças bizantinas atingiram a capital de doSultanato de Rum,Icônio, destruíram a área em torno da cidade, porém não conseguiram transpor seus muros. Manuel destruiu a cidade fortificada deFilomélio, retirando de lá a população cristã ainda existente. Um de seus motivos para elaborar esse ataque era o desejo de ser visto, no oeste, como alguém que verdadeiramente abraçou o ideal das cruzadas; Cinamo atribuiu a Manuel, ainda, o desejo de mostrar o seu poder marcial e sua valentia a sua nova noiva.[10] Durante essa campanha, Manuel recebeu uma carta deLuís VII de França, a qual anunciava a intenção deste de liderar um exército para socorrer os estados dos cruzados.
Manuel foi impedido de seguir com suas sucessivas vitórias no leste por conta de outros eventos que ocorriam no oeste e, por isso, deveria seguir para osBálcãs imediatamente, onde sua presença era importante. Em 1147, Manuel concedeu uma passagem através de seus domínios a dois exércitos daSegunda Cruzada, sob o comando deConrado III da Germânia eLuís VII de França. Naquela época, ainda existiam membros da corte bizantina que relembraram a passagem daPrimeira Cruzada, a qual foi um momento determinante na memória coletiva da história e que fascinouAna Comnena, tia de Manuel.[11]
Muitos bizantinos tinham medo das cruzadas por causa de seu vandalismo e dos roubos praticados pelo exército sem lei, conforme marchavam através do território bizantino. Tropas bizantinas seguiam os cruzados com o intuito de policiar seu comportamento e outras tropas eram formadas em Constantinopla e estavam preparadas para defender a capital de qualquer ato violento. Esta medida de segurança foi amplamente difundida, porém os numerosos incidentes por conta do abrigo oferecido pelos bizantinos e a profunda hostilidade entre os francos e os gregos quase principiaram um conflito entre Manuel e seus convidados, neste caso, os cruzados que atravessavam seu território. Manuel tomou suas precauções - as quais seu avô não tinha tomado - reparando as muralhas da cidade, e pressionando os dois reis por garantias com relação à segurança de seu território. O exército de Conrado III foi o primeiro a entrar no território bizantino no verão de 1147, o qual aparece mais proeminentemente nas fontes bizantinas, sendo, portanto, o queofereceu mais problemas dentre os dois que penetraram esse território.
Entretanto, após 1147, as relações entre os dois líderes tornaram-se mais amigáveis. Por volta de 1148, Manuel percebeu que poderia obter uma aliança com Conrado, cuja cunhada,Berta de Sulzbach, ele esposara; na verdade, ele persuadira o rei alemão a renovar sua aliança contraRogério II da Sicília.[12] Para a infelicidade do imperador bizantino, Conrado morreu em1152 e, apesar de todas as tentativas, Manuel não conseguiu alcançar um acordo com seu sucessor,Frederico I Barbarossa.
Em 1156, Manuel voltou sua atenção novamente paraAntioquia, quandoReinaldo de Châtillon, opríncipe de Antioquia, afirmou que o imperador bizantino não cumpriu sua promessa de pagá-lo uma importância em dinheiro, e prometeu atacar a província bizantina deChipre.[13] Ele mandou prender o governador da ilha e sobrinho do imperador, João Comneno, e o general Michael Branas.[14] O historiador latinoGuilherme de Tiro lamentou a guerra contra os cristãos e descreveu detalhadamente as atrocidades cometidas pelos homens de Raynald.[15] Tendo sido a ilha saqueada e todos os seus bens pilhados, o exército de Reinaldo de Châtillon mutilou os sobreviventes antes de forçá-los a comprar seus próprios produtos a preços altíssimos com apenas com o dinheiro que lhes havia restado. Enriquecidos com o espólio que faria a Antioquia rica por muitos anos, os invasores embarcaram em seus navios e partiram para sua pátria.[16] Raynald enviou, ainda, alguns dos refens mutilados a Constantinopla como uma demonstração de sua desobediência e seu desprezo pelo imperador bizantino.[14]
Manuel respondeu a este ultraje de uma forma muito enérgica. No inverno de 1158-1159, marchou paraCilícia, à frente de um numeroso exército; a velocidade em que seu exército caminhava (Manuel acelerou o passo com 500 cavaleiros à frente do exército principal) era tão grande que conseguiu surpreender oTeodoro II da Armênia, o qual participou do ataque a Chipre.[17] Todas as cidades e vilas renderam-se imediatamente a Manuel, sendo Toros forçado a fugir para as montanhas; diz-se que sobreviveu abrigando-se sozinho sob as pedras das colinas, onde um pastor lhe trazia comida para mantê-lo vivo.
Enquanto isso, as notícias do avanço do exército bizantino chegaram rapidamente aAntioquia. Percebendo que não teria como derrotar Manuel,Reinaldo de Châtillon sabia que não poderia contar com qualquer ajuda de reiBalduíno III de Jerusalém. Balduíno não aprovava o ataque de Reinaldo aChipre e, de qualquer forma, já tinha feito um acordo com Manuel. Então, isolado e abandonado por seu aliados, Reinaldo decidiu que a submissão seria a sua única saída. Ele apresentou-se diante do imperador, vestido em um saco e com uma corda amarrada em seu pescoço e clamou por perdão. Manuel, em um primeiro momento, ignorou o pedido de Reinaldo, enquanto conversava com seus cortesãos;Guilherme de Tiro diz que essa cena deprimente continuou por um bom tempo, fazendo com que todos os presentes ficassem "enojados".[18] Finalmente, Manuel perdoou Reinaldo com a condição que se tornasse um vassalo do Império, fazendo com que a Antioquia se rendesse ao Império Bizantino.[4]
Com a paz restabelecida, uma grande celebração foi organizada no dia 12 de abril de 1159 para receber triunfalmente o exército bizantino na cidade, com Manuel montado em seu cavalo, enquanto o príncipe da Antioquia e orei de Jerusalém seguiam-no a pé. Manuel mostrou justiça aos cidadãos e presidiu jogos e torneios para a população. Em maio, reuniu um exército cristão e partiu paraEdessa, porém abandonou a campanha, quandoNoradine libertou 6 000 prisioneiros cristãos, capturados em várias batalhas desde a segunda cruzada.[19] Mesmo com o glorioso fim da expedição, pesquisadores dizem que Manuel recebeu muito menos do que esperava em termos de compensação imperial.
Satisfeito com seus sucessos, Manuel retornou a Constantinopla; entretanto, no caminho de volta, suas tropas foram surpreendidas pelos turcos. Apesar disso, Manuel e seu exército venceram a batalha, derrotando o inimigo, causando-lhe imensas perdas. No ano seguinte, Manuel expulsou osturcos seljúcidas deIsáuria.[20]
Sul da Itália em 1112, antes do período deRogério II da Sicília, com os estados e as cidades principais. A fronteira doReino da Sicília em 1154, quando da morte de Rogério II, está na área compreendida pela linha escura que envolve a maior parte do sul da Itália.
No ano de 1147, Manuel travou uma guerra comRogério II da Sicília, cuja frota capturou a ilha bizantina deCorfu e saqueou as cidades gregas. Entretanto, apesar de ter sido distraído por um ataquecumano nosBálcãs, Manuel conseguiu uma aliança com Conrado e o auxílio dosvenezianos, conseguindo derrotar Rogério e sua poderosa esquadra. Em 1149, Manuel, contando com 500 navios, 1 000 navios de transporte de soldados e em torno de 30 000 homens, recuperou a ilha de Corfu e preparou-se para a ofensiva contra os normandos.[21] Ele já havia concordado com Conrado em realizar uma invasão conjunta e com a divisão do sul da Itália e Sicília. A renovação da aliança germânica foi o ponto principal da política de relações exteriores de Manuel por todo seu reinado, apesar da divergência gradual de interesses entre os dois impérios, após a morte de Conrado.[12]
Com a morte de Rogério em fevereiro de 1154 e a sua sucessão porGuilherme I da Sicília, bem como as rebeliões espalhadas contra as leis do novo rei na Sicília eApúlia, a presença dos refugiados apulianos na corte bizantina e o erro cometido porFrederico Barbarossa (sucessor de Conrado) ao lidar com os normandos encorajaram Manuel a tirar vantagem das várias instabilidades existentes napenínsula Itálica.[22] Ele enviouMiguel Paleólogo eJoão Ducas, os quais possuíam o alto cargo desebastocrator, com as tropas bizantinas, 10 navios e uma grande quantidade de ouro para invadir a Apúlia (1155).[23] Os dois generais receberam instruções para apoiarFrederico Barbarossa, uma vez que era hostil aos normandos da Sicília e estava ao sul dosAlpes naquele momento, porém ele recusou o apoio porque seu exército desmoralizado desejava chegar ao norte dos Alpes o mais rápido possível. No entanto, com a ajuda dos barões menos afeiçoados a ele, incluindo-se o condeRoberto de Loritello, a expedição de Manuel obteve um progresso bastante rápido no momento em que todo osul da Itália rebelou-se contra a coroa siciliana e o rei Guilherme I.[12] Houve uma sucessão de eventos espetaculares conforme muitas fortalezas rendiam-se ou por força ou pela sedução do ouro.[19]
A cidade deBari, que foi a capital por séculos doCatapanato bizantino do sudoeste da Itália antes da chegada dosNormandos, abriu seus portões ao exército do imperador e os cidadãos conseguiram destruir a cidadela normanda. Com a queda de Bari, as cidades deTrani,Giovinazzo,Andria,Taranto eBrindisi também foram capturadas e Guilherme, que chegou com seu exército para combatê-las (seu exército possuía 2 000 cavaleiros), foi derrotado.[24]
Encorajado pelo sucesso, Manuel sonhou com a restauração doImpério Romano através da restauração entre aIgreja Ortodoxa e aIgreja Católica, uma perspectiva que seria freqüentemente oferecida ao Papa durante negociações e planos de aliança.[25] Caso houvesse uma oportunidade de reunir as igrejas ocidentais e orientais, e reconciliar-se com o Papa de forma permanente, este seria, provavelmente, o momento mais favorável. OPapado nunca se deu a bons termos com os normandos, exceto quando sob a coação estabelecida pela ameaça da ação militar direta. Ter o "civilizado"Império Romano do Oriente em sua fronteira do sul era infinitamente preferível ao papado do que ter de lidar constantemente com os incômodos normandos da Sicília. Era do interesse doPapa Adriano IV alcançar um acordo de qualquer forma, uma vez que, caso ocorresse o acordo, aumentaria substancialmente sua influência sobre todos os seguidores cristãos ortodoxos. Manuel ofereceu uma imensa quantia em dinheiro ao Papa a fim de provisionar as tropas, com o pedido ao Papa que garantisse ao imperador bizantino poder sobre três cidades costeiras em troca de assistência na expulsão de Guilherme da ilha da Sicília. Manuel também prometeu pagar 5 000 libras de ouro ao Papa e àCúria.[26] Negociações foram apressadamente feitas, e uma aliança foi formada entre Manuel e Adriano.[22]
↑B. Hamilton,William of Tyre and the Byzantine Empire, 226 *Guilherme de Tiro,Historia, XVIII,23
↑abZ.N. Brooke,A History of Europe, from 911 to 1198, 482 * P. Magdalino,The Empire of Manuel I Komnenos, 67 * J.H. Norwich,A short history of Byzantium
↑K. Paparrigopoulos,History of the Greek Nation, Db, 134