Ogênero neutro não deve ser confundido comgênero-neutro, enquanto o primeiro é um gênero gramatical, paralelo aos masculino e feminino, o outro é um adjetivo que atribui a diferenciaçãogenérica, embora no inglês haja a distinção deneuter paraneutral, ambos são traduzidos comoneutro, ou neutral em casos raros, no português.[9]
Ogênero comum (emsueco:utrum), semelhante ao que chamamos em português desobrecomuns, denominalexemas que se aplicam seres independente dosexo, como em sobreviventes, personagem ou profissionais (eminglês:suvivors,character eprofessionals).[25][26]
Ogênero vacilante denota substantivos que vacilam em gênero, aqueles que podem serdenotados tanto no masculino quanto no feminino, comomoral, alguns podem mudar de significado, quando mudam de gênero, comocapital, ou quando viram adjetivos, comopessoal, que viraria comum de dois gêneros na forma adjetivada.[27] Em espanhol, usa-se o termo género ambíguo para se referir asubstantivos de gênero vacilante, definindo palavras que admitem indistintamente artigos feminino e masculino, comoacmé eazúcar.[28]
Atualmente naregião Nordeste do Brasil é comum a supressão deartigos antes denomes, de modo que os nordestinos costumam substituirna eno porem, utilizampor ao invés depelo epela, bem como suprimem os artigoso ea, sendo que a língua portuguesa já admite o uso facultativo de artigo diante de nomes de pessoas ou antropónimos. NoCentro-Sul do Brasil, em geral, bem como emPortugal, pode ser observada com frequência a utilização de artigos antes dos nomes.[29]
Tanto em espanhol quanto em português, o gênero feminino é geralmente marcado por -a:cirujano, cirujana (es; cirurgião, cirurgiã);abogado, abogada (emcastelhano: advogado, advogada);el doctor,la doctora (emcastelhano: o doutor, a doutora).
Aslínguas neolatinas determinam que oplural dos substantivos, quando abrange indivíduos do gênero feminino e masculino, é feito com base no masculino: "vinte editoras" e "dez editores", juntos são "trinta editores". Essa forma de formação do plural é considerada sexista por certos grupos e indivíduos,[30][31] daí resultando propostas por um gênero plural neutro a ser adotado em português e em espanhol.
Na tentativa de ressaltar a inclusão de mulheres, discursos muitas vezes têm usado "todos e todas", "brasileiros e brasileiras", entre outras frases reforçando ambos os gêneros.[32][33][34][35] Esse desdobramento é ainda mais comum nofrancês,[36][37][38] em que denomina-sehendíade,[39][40] uma forma de epicenidade.[41][42][43]
Historicamente,barra eparênteses são os símbolos mais utilizados com essa função, como emcandidato/a. Em exemplos como esse, no entanto, seu uso mantém a marca de separação entre os dois gêneros. Ela é muito observada em textos em que a utilização danorma culta é necessária, como documentos e informações oficiais. Ativistas defendem que tal forma deveria ser preterida em várias ocasiões e recomendável apenas em situações em que não é possível fazer asíntese de letras: "el/la estudiante"(es), "o(a) estudante"(pt); ou quando um dos dois vocábulos é formado não por substituição de uma letra, mas por seu acréscimo/supressão: "o vencedor será escolhido pelo juiz", logo, deveria ser grafado, de forma neutra, "o(a) vencedor(a) será escolhido(a) pelo(a) juiz(a)", "os(as) senhores(as) alunos(as)".[44][45]
A proposta mais conhecida para neutralidade de gêneros em relação àortografia é o uso do sinal gráfico arroba (@) no lugar de -o, -a ou mesmo -e: "@s trabalhador@s"(pt), "l@s niñ@s"(es). Esse uso do [sinal] arroba é observado sobretudo entre os falantes de espanhol, apesar de condenado explicitamente pelaReal Academia Espanhola,[46] que regula oficialmente a língua. No mundolusófono, o uso do arroba como neutralizador de gênero é muito menos difundido; vem, no entanto, crescendo, como observado por exemplo em certas faculdades deciências humanas de universidades brasileiras, como aUniversidade de São Paulo (USP), aUniversidade de Brasília (UnB) e aUniversidade Estadual de Campinas (Unicamp).[47][48][49]
Terminações e sufixos emx também vêm sido adotados para neutralizar palavras,[50] como emtodxs em vez de "todos e todas",[51]meninxs para "meninos e meninas",[52] nopronomeelx em vez deele eela,[53] e noadjetivolatinx em vez delatino oulatina.[54][55] Porém a opção pelox vem sendo criticada devido ao histórico de utilização desta letra para menosprezar e taxar como exótico e inferior elementos das culturas africanas, indígenas e árabe: a opção anterior de utilizarx ao invés dech em palavras trazidas de línguas tidas pelos colonizadores comoexóticas, ou em palavras que simplesmente possuíam uma origem não erudita.[56]
O pronome "éle" é uma alternativa vinda do espanholelle, por vezes escrito com acentoélle, que é a junção, tanto de pronúncia quanto de escrita, deella eél, pronome que ainda é tido como neologismo, noutras palavras,neopronome.[74][75][76]
Outra proposta é a do emprego do "a anarquista" (Ⓐ), usado da mesma forma que "@" em substituição a "a/o", sobretudo em textos políticos radicais: (¡CompañerⒶs, hay que ocupar y resistir, hasta la victoria!). Também se observa, com essa mesma função, o emprego da da letra "x" (por exemplo, em certos manifestos domovimento zapatista).[77]
Há o símboloæ, proposto em Português com Inclusão de Gênero (PCIG)[78][79] em substituição a "e/a". A proposta é igualmente válida para o espanhol. Assim, "escritoras e escritores" ou "escritores/as" deveria ser substituído por "escritoræs". O sufixo-ae também foi proposto, bem comoelae eelæ.[80] Zapatistas vêm empregando as sufixações de "oa" como, por exemplo, emotroas (outroas),unoa (um(a)) eloa (o/a), especificamente para designar umgênero natural parapessoas não binárias, em vez de ser apenas uma ambiguação de gênero.[81][82]
Há também a proposta de difusão do chamado "arrobaminúsculo", por razões estéticas e a fim de diminuir a impressão negativa que um @ em tamanho natural no interior de palavras costuma causar aos leitores. Como as fontes gráficas padrões não trazem um arroba minúsculo, a sugestão feita pelo PCIG é a de manualmente escolher uma fonte menor para o arroba (a sugestão é de algo entre 25% e 40% menor que a fonte das demais letras).[78] Exemplo: "muit@s menin@s". Há registros do uso de arrobas desde adécada de 1990, como na palavra "unid@s".[83][84]
Com ambiguação doe-agudo deéla (sonoro de ela) e doe-circunflexo deêle (sonoro de ele), forma-seéle (pronunciado[ˈɛ.le]), consequentementeéste (proximal ambíguo de este e esta),ésse (medial ambíguo de essa e esse) eaquéle (distal ambíguo de aquele e aquela). Outra sugestão é o pronomeêla (pronunciado[ˈe.lɐ]).[96][23] Um neopronome possivelmente mais antigo e sem uso amplo foielo, que surgiu inicialmente para se referir atravestis nadécada de 1970.[97]
Oponentes do uso doarroba eæsc como letras consideram-nas como uma forma de degradação das línguas. Levanta-se também, com frequência, a questão sobre como se pronunciar essas duas novas letras.
O PCIG possui sua própria proposta de pronúncia neutra: segundo eles, o som do @, em substituição aa/o, poderia ser pronunciado como um "ó aberto" ([ɔ], como em "pó", "morte", "sogra") e o æ, no lugar dea/e, como um "é aberto" ([ɛ], como em "pé", "mel", "testa").
Isso se explica porque o som /ɛ/, chamado "é aberto" em português, é foneticamente intermediário entre o /a/ e o /e/, o chamado "ê fechado". Similarmente, o som /ɔ/ (em português conhecido como "ó aberto") é um intermediário em termos fonéticos entre os sons /a/ e /o/ ("ô fechado").
Assim, "duas garotas" e "dois garotos", juntos, seriam "quatro garot@s" - pronunciado[ga'rotɔs], isto é, como o último "o" aberto.
Várias "professoras" e "professores" juntos, igualmente, seriam vários "professoræs", pronunciado[pɾofeˈsoɾɛs], com o último "e" aberto, ou váries "professories".[98][99]
Em espanhol, no entanto, essa proposta parece fadada ao fracasso, uma vez que o sistema fonético espanhol não abrange diferentes pronúncias, mais abertas ou fechadas, para as vogais "e" e "o". Assim, a maioria dos falantes de espanhol não perceberia uma diferença na pronúncia de "niñ@" (/'niɲɔ/) daquela de "niño" (/'niɲo/), ou entre a pronúncia de /ɛ/ "neutro" e a do /e/ "masculino".[100][101][102]
Frente àsnecessidades de pessoas com as mais variadas dificuldades deleitura, comodislexia,[105]processamento de dados visuais também acabam não conseguindo ler e compreender os textos, ou também no caso de pessoas que necessitam deleitores de tela quando há a substituição de vogais por @, x, Ⓐ ou æ, existem ainda formas alternativas.[106][107][108]
Para isso, certos estudos[109][107][108] sugerem formas mais simples, tornando acessível a todas pessoas:
Mudar a estrutura da frase, o que não é relativamente simples, acessível e não é incômodo para quem lê;[110]
Usar generosamente hiperônimos sem gênero: termos como “pessoa”, “indivíduo”, “sujeito” (esse está se começando a generificar, principalmente em círculosfeministas),[111] “gente”, “população”, etc., para poder generificar a palavra de acordo com essa, sem perder o sentido e a concordância. Por exemplo: em vez de “todos os presentes concordaram”, usar “todas as pessoas presentes concordaram”;
Suprimir pronomes e artigos desnecessários ou repetir onome. Em muitas frases o pronome está lá meramente por costume. Por exemplo, em “A Maria nasceu dia cinco”, pode-se dizer “Maria nasceu dia cinco”. Em “Todo mundo esperou até que ela chegasse”, pode-se dizer “Todo mundo esperou até que chegasse”;
Usar alguns termos sem gênero que geralmente ignoram. Tente usar “de” (em vez de da/do) e “lhe” (em vez de a/o). Na Bahia, por exemplo, usa-se muito o “de”. Nada impede usar essa linguagem em qualquer lugar do Brasil. Em vez de dizer “Essa é a blusa dx Juno”, pode-se dizer “Essa é a blusa de Juno”;[112]
Utilizar ogerúndio e avoz passiva, entre outras mudanças, são formas interessantes de degenerificar: dosemântico: "Os estudantes não poderão receber visitas femininas nos dormitórios", optar pela alternativa: "Não se permitem visitas nos dormitórios";
Mudar a estrutura dosverbos nafrase: em vez de "Você está cansada?" opte por "Você se cansou?", em vez de "Você está linda", optar uma das opções: "Você está uma pessoa linda" / "Que lindeza você está" / "Sua roupa está linda" / "Seu corpo é lindo".
Esse tipo de proposta é conhecida comolinguagem inclusiva,[113][114] ou ainda como "linguagem não discriminatória",[115] muitas vezes sendo descrita como distinta da linguagem neutra, ou como uma variação dela.[116][117][118] Esse tipo de linguagem visa umacomunicação que nãoexclua ou diminua algumgrupo de pessoas, mas sem modificar o idioma.[119] Por vezes, é referida comosintaxe neutra.[120][121]
Certos políticos têm começado a policiar-se fortemente a fim de evitar sexismo em seus discursos. O ex-presidente mexicanoVicente Fox Quesada, por exemplo, utilizava-se extensivamente da repetição de termos em seus dois gêneros (ciudadanos y ciudadanas). Além de condenado pelaReal Academia Espanhola, que o considera desnecessário e redundante, esse estilo de discurso logo tornou-se alvo de sátiras. Muitos imitadores do ex-presidente Fox efetivamente criavam palavras novas unicamente para poder contrastá-las em termos de gênero: "Estamos, todos y todas, muy contentos y contentas, muy felices yfelizas", ou "eso lo verificaron mujeres y hombres de gran valor, verdaderas especialistas y verdaderosespecialistos".[122][123][124][125]
OConselho Económico e Social (CES) de Portugal propôs um manual de "linguagem neutra e inclusiva" para reger a comunicação interna e externa. A proposta sugere substituir termos masculinos genéricos por expressões neutras, como "população trabalhadora" em vez de "trabalhadores".[184] No entanto, essa iniciativa enfrentou objeções de algumas organizações, levando ao adiamento da sua implementação.[185][186]
Diversos seriados, documentários,[187] filmes e programas de televisão estrangeiros possuem personagens cujo pronome pessoal éthey singular,[188][189] em muitos casos traduzem em dublagens ou legendas com adaptações neolinguísticas esocioléticas.[190][191]
AAssociação Brasileira de Linguística manifestou-se múltiplas vezes contra a proibição da linguagem neutra,[195] publicando uma nota repudiando a aprovação do PL 6.256/2019 pelaCâmara dos Deputados, alegando que o projeto desvirtua seu propósito original e impõe restrições linguísticas inadequadas, incluindo a proibição da linguagem neutra, criticando a falta de embasamento científico das medidas adotadas e defendendo umacomunicação pública mais inclusiva e eficaz.[196][197]
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↑Silveira, Éderson Luís; Santos, Merylin Ricieli dos; Cardoso, Maísa; Nitek, Ivete Oczust; Guilherme, Maria Lígia Freire; Puppi, Bárbara Branco; Denardin, Jaqueline Angelo dos Santos; Rebelo, Ana Cecília Trindade; Rucinski, Vilson Rodrigo Diesel (6 de janeiro de 2020).Pesquisar em tempos de resistência: a balbúrdia de quem faz Linguística Aplicada. [S.l.]: Pimenta Cultural
↑FRANCO, Paki Venegas & CERVERA, Julia Pérez.Manual para o uso não sexista da linguagem. UNIFEM e REPEM (Rede de Educação Popular entre Mulheres da América Latina). Dezembro de 2006. Consultado em 10 de setembro de 2020.
↑Pérez Cervera, Julia; Venegas Franco, Paki (dezembro de 2013).«Manual para o uso não sexista da linguagem».Observatório Brasil de Igualdade de Gênero. Consultado em 10 de setembro de 2020. Arquivado dooriginal em 5 de julho de 2013