A maioria dos colonos europeus que se estabeleceram no Cabo nos séculos XVII e XVIII provinha dosPaíses Baixos, mas muitos também eram alemães, com um número considerável ainda de franceses e uns poucosescoceses. Este grupo humano desenvolveu uma língua própria, a partir do neerlandês falado na altura emAmesterdão, que passou a chamar-seafrikaans. A Companhia Neerlandesa das Índias Orientais trouxe também para a região muitos trabalhadoresmalaios,indonésios emalgaxes, que aprenderam esta língua rapidamente, incorporando-lhe uma série de vocábulos dos seus idiomas originais, e contribuindo para uma simplificação estrutural do afrikaans. Essa foi também a língua de contato com as populações africanas locais, pertencentes aos povoscoissãs. Uma pesquisa feita porJ. A. Heese indica que até 1807, 36,8% dos ancestrais dos falantes de africâner eram de origem neerlandesa, 35% alemã, 14,6% francesa e 7,2% de origem não europeia. No Cabo formou-se uma comunidade rapidamente crescente de mestiços (kleurlinge, em neerlandês e africâner), de ascendência europeia e não europeia (africana, asiática) que esmagadoramente adotou oafrikaans como a sua língua materna — de modo que no momento atual (desde os anos 2000) mais da metade dos falantes do africâner não são brancos.
O vernáculo da colônia tornou-se conhecido na Europa comoholandês do Cabo. Posteriormente, foi chamado tambémneerlandês africano. O africâner era considerado umdialeto doneerlandês até o início do século XX, quando começou então a ser reconhecido como uma língua distinta, em função das alterações que entretanto tinha sofrido desde a sua origem. Convém salientar que o neerlandês e o africânder continuam até hoje a ser mutuamente inteligíveis.[9]
O vocabulário do neerlandês do Cabo divergiu daquele falado nos Países Baixos após absorver palavras usadas pelos colonizadores europeus não neerlandeses, escravos trazidos do sudeste daÁsia e africanos nativos. Em meados do século XIX, ampliou-se o uso vernáculo do africâner quando milhares de pioneiros africâneres, fugindo do domínio britânico da Colônia do Cabo, migraram para as regiões central e norte-oriental da África do Sul onde, após conflitos com oszulus, estabeleceram as repúblicasbôeres independentes deOrange eTransvaal.
No material impresso entre os africâneres, originalmente se utilizou somente o neerlandês padrão europeu, enquanto o africâner propriamente dito era relegado à condição de língua oral apenas. As primeiras gramáticas e dicionários em africâner foram publicados em 1875 naCidade do Cabo pelaGenootskap vir Regte Afrikaanders (Sociedade para Verdadeiros Africâneres), com o objetivo de fixar um padrão escrito para a língua. Em 1910, as antigas repúblicas bôeres, agora também sob domínio britânico, foram oficialmente incorporadas àUnião Sul-Africana (junto com as colônias do Natal e do Cabo) e reconheceram-se o inglês e o neerlandês como línguas oficiais do novo país. Em 1925 porém, o governo autônomo sul-africano proclamou o africâner uma língua distinta e elevou-o à condição de idioma oficial substituindo na prática o neerlandês.
Pela sua origem histórica, o africâner élinguisticamente semelhante ao neerlandês do século XVII e, por extensão, ao neerlandês moderno. Outras línguas semelhantes incluem obaixo saxão falado no norte da Alemanha e nosPaíses Baixos, o próprioalemão padrão e oinglês. Além do vocabulário, a mais sensível diferença entre o africâner e o neerlandês europeu é a sua gramática muito mais regular, que, na opinião da maioria dos linguistas, é resultado da interferência mútua durante o período de formação do idioma com uma ou maislínguas crioulas faladas por um número relativamente grande de habitantes da Colônia do Cabo cuja língua materna era diferente do neerlandês (coissã, alemão, francês,malaio, ou diferentes línguas africanas). A chamadaescola africâner mantém entretanto o ponto de vista alternativo de que a regularização da gramática africâner foi uma evolução natural dos dialetos sul-neerlandeses, minimizando assim o papel exercido pelo contato com outras línguas.
Em termos de vocabulário, o africâner é muito próximo aoneerlandês sendo usualmente mutuamente inteligível com este, ao menos na sua variedade escrita (a inteligibilidade é geralmente menor na língua falada). Como esperado, há ainda um grau considerável de sobreposição entre o léxico básico do africâner e de outraslínguas germânicas ocidentais, especialmente oalemão e, em menor escala, oinglês. Contudo, apesar de suas semelhanças e origem comum, o alemão e o inglês não são em geral mutuamente inteligíveis entre si e os falantes de cada uma dessas línguas normalmente precisam ter algum conhecimento prévio formal do vocabulário, gramática e fonética das demais para poder compreender até mesmo sentenças simples.
O africâner, juntamente com o neerlandês e o inglês, diferencia-se do alemão pela ausência da segunda mutação de consoantes germânica: compare, por exemplo, afr.maak, neerl.maken, ing.make com alem.machen, ou afr./neerl.dood e Ing.dead com Alem.tot, ou Afr.oop, Neerl./Ingl.open e Alem.offen. O africâner diferencia-se ainda, não só do neerlandês como de outras línguas germânicas, por alguns fenômenos evolutivos peculiares como, por exemplo, a perda de certas consoantes em posição final ou em posição intervocálica.
Comparado com o neerlandês, o africâner adota uma ortografia simplificada e mais fonética. Consoantes mudas em neerlandês como-n final não são escritas em africâner. O ditongo neerlandês /ɑi/ grafado "ij" é escrito "y" em africâner com o mesmo valor fonético. Outra característica do africâner é a inexistência da consoante fricativa alveolar sonora /z/ (grafada "z" em neerlandês) que é substituída pela sua variante surda /s/, grafada"s" (por exemplo, afr.Suid-Afrika vs Neerl.Zuid-Afrika). O grupo consonantal neerlandês "sch" corresponde por sua vez ao africâner "sk".
A tabela abaixo ilustra algumas diferenças e semelhanças entre o africâner, o neerlandês, o alemão e o inglês. Palavras em inglês de origem latina/românica são indicadas por um asterisco.
Africâner
Neerlandês
Alemão
Inglês
Português
Espanhol
aksie
actie
Aktion
action
ação
acción
appel
appel
Apfel
apple
maçã
manzana
asseblief
alstublieft
bitte (als es dir beliebt)
please (*)
por favor
por favor
bed
bed
Bett
bed
cama/leito
cama
beter
beter
besser
better
melhor
mejor
dood
dood
tot
dead
morto
muerto/finado
dorp
dorp
Dorf
village (*)
vila/aldeia
villa/aldea
droog
droog
trocken
dry
seco
seco
eggenoot
echtgenoot
Ehegatte
husband
esposo/marido
esposo
gee
geven
geben
give
dar
dar
goeienaand
goedenavond
guten Abend
good evening
boa noite
buena noche
help
helpen
helfen
help
ajudar
ayudar
koop
kopen
kaufen
buy
comprar
comprar
leer
leren
lernen
learn
aprender
aprender
lê
liggen
liegen
lie
ficar
quedarse
lughawe
luchthaven
Flughafen
airport(*)
aeroporto
aeropuerto
maak
maken
machen
make
fazer
hacer
my
mijn
mein
my
meu
mío
nie
niet
nicht
not
não
no
oop
open
offen
open
aberto
abierto
oormôre
overmorgen
übermorgen
the day after tomorrow
depois de amanhã
pasado mañana
opstaan
opstaan
aufstehen
stand up
levantar-se
levarse
reën
regen
Regen
rain
chuva
lluvia
saam
samen
zusammen
together (cf. same)
juntos/juntamente
juntos
ses
zes
sechs
six
seis
seis
sewe
zeven
sieben
seven
sete
siete
skool
school
Schule
school
escola
escuela
slaap
slapen
schlafen
sleep
dormir
dormir
sleg
slecht
schlecht
bad (cf. slight)
mal/mau
malo
tyd
tijd
Zeit
time (cf. tide)
tempo
tiempo
uitbrei
(zich) uitbreiden
(sich) ausbreiten
expand (*)
expandir(-se)
expandir/ampliar(-si)
vir
voor
für
for
para
para
voël
vogel
Vogel
fowl (bird)
pássaro/ave
pájaro/ave
vry
vrij
frei
free
livre
libre
vyf
vijf
fünf
five
cinco
cinco
waarskynlik
waarschijnlijk
wahrscheinlich
probably(*)
provavelmente
probable
winter
winter
Winter
winter
inverno
invierno
ys
ijs
Eis
ice
gelo
hielo
Apesar de a maioria do vocabulário africâner refletir sua origem do sul-neerlandês do século XVII, ele também contém palavras emprestadas delínguas indonésias,malaio,português,francês,as línguas cói e sã, inglês,xossa e muitas outras. Consequentemente, algumas palavras em africâner são muito diferentes do neerlandês, como demonstrado pelos nomes de diferentes frutas:
Gramaticalmente, o africâner caracteriza-se por ser o idioma maisanalítico entre aslínguas indo-europeias. Comparado com oneerlandês padrão, destaca-se pela sua simplicidademorfológica: os verbos não se conjugam em número, pessoa e modo; os substantivos não têm gênero; não há distinção morfológica de casos gramaticais (exceto alguns resquícios no sistema pronominal); e os diferentes tempos verbais são indicados primordialmente por construções perifrásticas ao invés de flexões dos verbos. Quase a totalidade dos verbos africâneres são ainda regulares.Sintaticamente, porém, o africâner apresenta características semelhantes a outras línguas germânicas ocidentais e características próprias, como adupla negação, que é peculiar ao africâner e tem origem ainda não esclarecida. Influências dofrancês e docói, assim como de dialetos baixos-francônios da Flandres ocidental e de vilas isoladas no centro da província da Holanda (Garderen) foram sugeridas como possíveis origens da dupla negação africâner, mas nenhuma dessas sugestões até hoje se mostrou plenamente satisfatória.
O africâner distingue pronomes pessoais por número (singular ou plural), pessoa ( primeira, segunda e terceira) e, ocasionalmente, caso (pronomes usados como sujeito e pronomes usados como objeto direto/indireto). Na terceira pessoal do singular existe ainda uma distinção por gênero entre pronomes masculinos, femininos e neutros (como eminglês,neerlandês ealemão). Na segunda pessoa do singular, como em inúmeras outras línguas indo-europeias, há também umadistinção t-v entre tratamento formal e informal. Em geral, não se distinguem pronomes pessoais de objeto direto/indireto de pronomes adjetivos possessivos, exceto na terceira pessoa do singular e, ocasionalmente, na segunda e terceira pessoas do plural.
Pessoa/número
Pronomes pessoais de sujeito
Pronomes pessoais de objeto
Pronomes adjetivos possessivos
Pronomes substantivos possessivos
Primeira pessoa do singular
Ek
my
my
myne
Segunda pessoa do singular
Jy (informal),u (formal)
jou (informal),u (formal)
jou (informal),u (formal)
joune (informal),u s'n (formal)
Terceira pessoa do singular
Hy (masc.), Sy (fem.), Dit (neut.)
hom (masc.),haar (fem.),dit (neut.)
sy (masc.),haar (fem),dit (neut.)
syne (masc.),hare (fem.)
Primeira pessoa do plural
Ons
ons
ons
ons s'n
Segunda pessoa do plural
Julle
julle
julle/jul¹
julle s'n
Terceira pessoa do plural
Hulle
hulle
hulle/hul¹
hulle s'n
¹ As varianteshul ejul são frequentemente utilizadas distinguir o pronome possessivo dos correspondente pronome pessoal de sujeito/objeto.
Os adjetivos em africâner não são flexionados em gênero e número. Existe entretanto uma diferenciação morfológica entre adjetivos predicativos (que se seguem ao substantivo a que se referem) e atributivos (que precedem o substantivo que modificam). Como em alemão e neerlandês, os adjetivos predicativos em africâner nunca são flexionados. Aos adjetivos atributivos polissilábicos, adiciona-se normalmente o sufixo-e. Os adjetivos atributivos monossilábicos por outro lado podem ou não ser flexionados e, quando flexionados, podem sofrer outras alterações morfológicas de acordo com um conjunto complexo de regras fonológicas. A tabela abaixo ilustra a morfologia do adjetivo africâner.
Predicativo
Atributivo
Inglês
Português
hoog
hoë
high
alto, alta, altos, altas
laag
lae
low
baixo, baixa, baixos, baixas
leeg
leë
empty
vazio, vazia, vazios, vazias
sleg
slegte
bad
mau, má, maus, más
reg
regte
right
certo, certa, certos, certas
koud
koue
cold
frio, fria, frios, frias
goed
goeie
good
bom, boa, bons, boas
jonk
jong
young
jovem, jovens
doof
dowe
deaf
surdo, surda, surdos, surdas
oud
ou
old
velho, velha, velhos, velhas
nuut
nuwe
new
novo, nova, novos, novas
groot
groot
big/great
grande, grandes
swart
swart
black
preto, preta, pretos, pretas
draagbar
draagbare
portable
portátil, portáteis
Como nas outraslínguas germânicas, o adjetivo africâner é também flexionado em grau, indicandocomparativo esuperlativo. Nesse caso, as mesmas regras fonológicas ilustradas na tabela acima se aplicam, e.g.,koud -kouer (compar.) -koudste (superl.);reg -regter (compar.) -regste (superl.);goed -beter (compar.) -beste (superl.);nuut -nuwer (compar.) -nuuste (superl.).
Ao contrário do neerlandês e do alemão, o africâner não distingue substantivos por gênero. Há porém uma distinção de número (singular ou plural). Na maioria dos casos, o plural dos substantivos africanos é formado adicionando-se o sufixo-e à sua forma singular. Há entretanto uma classe grande de substantivos que formam o seu plural alternativamente com a adição do sufixo-s como em inglês. Vários substantivos apresentam também plurais irregulares ou, quando flexionados em número, sofrem as mesmas alterações morfológicas que se verificam na flexão dos adjetivos. A tabela abaixo ilustra algumas classes comuns de plurais de substantivos africâneres.
Singular
Plural
Inglês
Português
voet
voete
foot/feet
pé(s)
vraag
vrae
question(s)
pergunta(s)
leef
lewe
life/lives
vida(s)
oog
oë
eye(s)
olho(s)
minuut
minute
minute(s) (*)
minuto(s)
tyd
tye
time(s)
tempo(s)
nag
nagte
night(s)
noite(s)
stad
stede
city/cities (*)
cidade(s)
ei/eier
eiers
egg(s)
ovo(s)
lied
liedere
song(s)
canção/canções
kind
kinders
child/children
criança(s)
tafel
tafels
table(s) (*)
mesa(s) (cf. tábua(s) )
voël
voëls
fowl(s) (orbird(s))
pássaro(s), ave(s)
Além de não apresentarem gênero, os substantivos africâneres tampouco são flexionados por caso. Construções perifrásticas são usadas como no neerlandês coloquial para designar o caso genitivo, por exemploOom Gert se winkel (a loja do tio Gert, inglês, uncle Gert's shop/store). Outras distinções de caso são indicadas sintaticamente através da ordem das palavras na oração ou pelo uso de preposições, por exemplovan (de),vir (para), edeur (equivalente ao Port.por usado para marcar o agente da passiva, cf. Neerl.door, Al.durch).
O africâner possui um único artigo definido,die, que não é flexionado em gênero, número ou caso (cf. Ing.the, Port.o, a, os, as). Analogamente, há também um único artigo indefinido invariável, 'n (cf. Neerl.een, Port.um, uma, uns, umas).
Diferente de várias outras línguas indo-europeias, os verbos em africâner não são conjugados em número, pessoa ou modo. Quase a totalidade dos verbos africâneres sãoregulares e apresentam apenas duas formas: uma forma não flexionada usada como infinitivo e empregada também para indicar tempo presente, e umparticípio passado distinto do particípio germânico usual e obtido acrescentando-se o prefixoge- ao infinitivo , e.g. infinitivo/presentemaak, particípiogemaak. Verbos com prefixos não separáveis (e.g.verkoop,ontmoet) têm a mesma forma tanto para o infinitivo quanto para o particípio passado. Em verbos com prefixos separáveis (e.g.reghelp), o particípio é formado inserindo-sege- entre o prefixo separável e a raiz principal do verb (e.g.reggehelp).
Como noalemão suíço, nobávaro e noídiche, não existe em africâner o pretérito sintético germânico (equivalente aosimple past ou passado histórico inglês). A função do pretérito sintético foi absorvida, tanto na língua oral como escrita, pelo pretérito composto, formado morfologicamente com verbo auxiliarhet + particípio passado. Em contraste com outras línguas germânicas, não existe também no africâner moderno o pretérito mais-que-perfeito composto. Assim, por exemplo,
Afr.ek het gebreek = Ing.I broke,I was breaking,I have broken,I had broken = Port.eu quebrei,eu quebrava,eu estava quebrando,eu tenho quebrado,eu quebrara/tinha quebrado.
Como exceções à regra anterior, citam-se os verboswees (ser/estar) ehê (ter) que mantêm quatro formas distintas respectivamente para o infinitivo, presente, pretérito (passado histórico) e particípio passado. Outros exemplos menos freqüentes de verbos que retêm pretéritos simples e/ou particípios irregulares sãoweet (saber/conhecer) edink (pensar). A distinção morfológica entre presente e pretérito é mantida também nosverbos modaismoet,kan,sal ewill. A tabela abaixo mostra um resumo da conjugação dos verbos irregulares ou modais em africâner.
Infinitivo
Presente
Pretérito
Particípio
wees
is
was
gewees
hê
het
had
gehad
weet
weet
wis
geweet
dink
dink
dag
gedag/gedog
moet
moes
kan
kon
wil
wou
gewil
sal
sou
O tempo futuro por sua vez é indicado em africâner pelo auxiliarsal + infinitivo, e.g.ek sal kom =Port.eu virei.
O condicional (ou futuro do pretérito na terminologia gramatical brasileira) é indicado pelo pretéritosou + infinitive, e.g.ek sou kom = Port.eu viria.
Como outras línguas germânicas, o africâner mantém ainda umavoz passiva analítica que é formada no presente pelo auxiliarword + partícipio, e, no pretérito, pelo auxiliar is + particípio, i.e.
Afr.word gemaak = Ing.is made/is being made = Port.é feito/está sendo feito.
Afr.is gemaak = Ing.was/was being/has been made = Portfoi/era/estava sendo/tem sido feito.
O africâner literário admite ainda a construçãowas gemaak para indicar mais-que-perfeito na voz passiva, cf. Ing.had been made ou Port.tinha sido/fora feito. Essa construção entretanto é pouco comum na língua coloquial falada.
Nota: O exemplos desta seção mostram também que se perdeu em africâner a distinção existente nas outras línguas germânicas entre verbos fracos e fortes (compare Afr. gebreek versus Ing. broken ou Alem. gebrochen). Entretanto, as formas (fracas e fortes) do particípio passado original germânico ainda são preservadas em africâner quando os particípios são empregados como adjetivos. Compare por exemplo ek het 'n brief geskryf (eu escrevi uma carta) com 'ngeskrewe brief (uma carta escrita).
A ordem das palavras na oração africâner segue regras semelhantes às encontradas no neerlandês padrão e outras línguas próximas como o alemão, i.e. os verbos normalmente aparecem na segunda posição em orações principais, orações coordenadas ou períodos simples, e em posição final em orações subordinadas. Em construções perifrásticas (por exemplo, perfeito, futuro, voz passiva, etc…) o infinitivo ou o particípio passado do verbo principal aparecem em posição final nas orações principais ou períodos simples, enquanto os verbos auxiliares aparecem na segunda posição. Em orações subordinadas, a construção perifrástica aparece sempre na posição final havendo certa liberdade (como em neerlandês) na colocação relativa entre o verbo auxiliar e o infinitivo/particípio. Por exemplo:
Hy is ryk.
Port. "Ele é rico".
Ek weet dat hy ryk is.
Lit. "Eu sei que ele rico é "
Port. "(Eu) sei que ele é rico."
Hy moet ryk wees .
Lit. "Ele deve rico ser"
Port. "Ele deve ser rico."
Ek dink dat hy ryk moet wees/wees moet.
Lit. "Eu penso que ele rico deve ser/ser deve"
Port. "Penso que ele deve/deva ser rico."
Ek wil 'n auto hê.
Lit. "Eu quero um carro ter."
Port. "Eu gostaria de ter um carro."
Ek het 'n huis gekoop.
Lit. "Eu tenho uma casa comprado"
Port. "Comprei uma casa."
As ek geld gehad het, kon ek 'n auto koop.
Lit. " Se eu dinheiro tido tenho, pude eu um carro comprar"
Port. "Se eu tivesse dinheiro, podia/poderia comprar um carro".
Orações subordinadas adjetivas em africâner iniciam-se normalmente pelo pronome relativowat, usado tanto para antecedentes pessoais e não pessoais. Alternativamente, uma oração subordinada adjetiva pode ser iniciada com uma preposição +wie, quando se referir a um antecedente pessoal, ou por uma aglutinação entrewaar e uma preposição (e.g.waarvan,waarin, etc…) quando se referir a um antecedente não pessoal. Em qualquer um desses casos, aplicam-se as mesmas regras de colocação dos verbos válidas para orações subordinadas em geral, e.g.
Die man wat hier gebly het was Amerikaner.
Lit: "O homem que aqui morado tem era americano.
Port: "O homem que morava aqui era americano."
Die man met wie ek gepraat het was Suid-Afrikaner.
Lit: "O homem com quem eu falado tenho era sul-africano."
Port. "O homem com quem eu falei era sul-africano."
Uma característica sintática particular do africâner é o uso dadupla negação, ausente em outras línguas germânicas. Exemplo:Hy kan nie Afrikaans praat nie. (literalmente "Ele pode não africâner falar não"). No africâner moderno, a dupla negação segue um conjunto bem estruturado de regras relativamente complexas, como ilustrado nos exemplos abaixo deBruce Donaldson:
Ek hetnie geweet dat hy sou komnie.
Port. "Eu não sabia que ele vinha/viria."
Ek het geweet dat hynie sou komnie.
Port. "Eu sabia que ele não vinha/viria.
Ek hetnie geweet dat hynie sou komnie.
Port. "Eu não sabia que ele não vinha/viria."
Hy salnie komnie, want hy is siek.
Port.Ele não vai vir/virá, porque (ele) está doente.
Dis (=Dit is)nie so moeilik om Afrikaans te leernie.
O africâner é a primeira língua de aproximadamente 60% dos brancos da África do Sul e cerca de 90% da chamada populaçãomestiça (oucoloured) daquele país. Uma grande população composta por negros, indianos e anglo-sul-africanos também o falam como segunda língua. Dentro da República da África do Sul, os falantes nativos do africâner são a maioria da população nas províncias doCabo Ocidental e doCabo Setentrional, na porção ocidental do país. Importantes minorias de falantes de africâner são encontradas também nas províncias doEstado Livre e deGautengue, sobretudo nas regiões metropolitanas deBlumefontaina ePretória. O africâner é ainda amplamente falado naNamíbia, onde, desde a independência em 1990, tem reconhecimento constitucional como língua nacional, mas não oficial. Antes da independência, o africâner e o alemão tinhamstatus igual como línguas oficiais da Namíbia. Há um número muito menor de falantes do africâner entre a minoria branca doZimbábue, mas a maioria deixou o país em 1980. Um número aproximado de 20 000 falantes também se localiza no sul deBotsuana, formado por agricultores que emigraram da África do Sul, ou mais recentemente, por pessoas que saíram da África do Sul para atividades de serviços no país vizinho.
Na África do Sul, o africâner foi reconhecido pela primeira vez como língua oficial em 1925, juntamente com o inglês. Sob aconstituição multirracial de 1994, o africâner manteve-se como língua oficial da África do Sul, mas há agora nove outros idiomas além do inglês que têm o mesmostatus. Essa nova situação sugere que o africâner vem perdendo importância no país, seja em favor do inglês, ou para acomodar as novas línguas oficiais. Em 1996 por exemplo, aSouth African Broadcasting Corporation (SABC) reduziu o tempo no ar da suaprogramação televisiva em africâner, enquanto a companhia aérea Suid-Afrikaanse Lugdiens mudou o seu nome para South African Airways. De forma semelhante, as missões diplomáticas sul-africanas no exterior agora exibem o nome do país em inglês e no idioma local, mas não mais em africâner. Universidades em que o africâner era usado no passado como língua predominante, por exemplo aUniversidade de Pretória, aUniversidade do Estado Livre e aUniversidade de Stellenbosch, hoje oferecem instrução também em inglês, gerando dúvidas sobre o futuro do africâner como língua de ciência.
Apesar dessas mudanças, o africâner tem se mantido forte na África do Sul através de jornais e revistas nessa língua que têm vasta circulação, destacando-se os diáriosDie Burger,Volksblad eBeeld. Um canal de TV paga exclusivamente em africâner chamadoKykNet é visto por um número grande de assinantes em todo o país e a SABC mantém ainda uma popular emissora de rádio em língua africâner (Radio Sonder Grense). Numerosas estações privadas de rádio mantêm programação que mescla inglês e africâner nos noticiários e mesmo nas conversas entre locutores. O africâner possui também uma vasta literatura escrita, tanto em poesia como em prosa, e é amplamente empregado na África do Sul como língua literária. A variedade falada pela população branca das antigas repúblicas bôeres serviu historicamente como base para a língua padrão escrita. O dialeto conhecido comoKaapse Afrikaans é usado por sua vez sobretudo pela população mestiça da Cidade do Cabo e, na sua forma vernácula, difere consideravelmente do africâner padrão.
O africâner tem influenciado também o desenvolvimento dalíngua inglesa sul-africana. Muitos empréstimos do africâner são encontrados noinglês sul-africano, comoveld,braai,boomslang elekker. Algumas palavras do inglês padrão são derivadas do africâner, como por exemplotrek,spoor e, naturalmente,apartheid.
A transcrição fonética está emAFI. É requerida uma fonte que suporte símbolos AFI emUnicode como Arial Unicode MS; caso contrário você verá as letras incorretamente.
O africâner é uma língua muito centralizada, significando que a maioria das vogais são pronunciadas centralizadas (i.e., comoxuá). Há muitos diferentes dialetos e diferentes pronúncias - mas a transcrição deve estar próxima de um padrão.
Hallo! Hoe gaan dit? [ɦɑlo ɦu xaˑn dət] Olá! Como estás?
Baie goed, dankie. [bɑjə xuˑt dɑnki] Muito bom, obrigado.
Wat is jou naam? [ʋɑt ɛs jɑu naˑm] Qual é seu nome?
Die kinders praat Afrikaans [di kønər praˑt ɑfrikaˑns] As crianças falam africâner.
Was my pen in my hand? ([ʋɑs mɑi pɛn øn mɑi hɑnt]) Minha caneta estava em minha mão? (esse é um exemplo onde a frase coincide com sua correspondente em língua inglesa).
↑«Português de Moçambique».DicionarioeGramatica.com. 29 de abril de 2016. Consultado em 10 de maio de 2016. Arquivado dooriginal em 15 de julho de 2016
↑«africanse».infopédia. Consultado em 10 de maio de 2016