Afreguesia é a menorcircunscrição administrativa emPortugal,Cabo Verde eMacau. No passado também se usava a expressãoparóquia civil. Historicamente, existiu também noImpério do Brasil e em outros territórios do antigoUltramar Português.
Como circunscrições administrativas, surgiram apenas noséculo XIX, ocupando as mesmas áreas territoriais das já existentescircunscrições eclesiásticas igualmente denominadas "freguesias" ou "paróquias". As freguesias ou paróquias civis passaram então a existir em paralelo às freguesias ou paróquias eclesiásticas, mas geralmente coincidindo territorialmente.
Asparóquias civis existem também como unidades administrativas em alguns países e territórios nãolusófonos, as quais podem ter características variáveis.
Etimologicamente, o termo "freguesia" resulta de "freguês" adicionado aosufixo "-ia". Por sua vez, "freguês", bem como o seu arcaico "filigrês" resultaram da aglutinação da expressãolatinafilius ecclesiae, significando "filho da Igreja", que se referia a um paroquiano, que era, por assim dizer, "freguês do pároco".[1][2])
Por sua vez, o termo "paróquia" tem origem no termo latinoparochia, por sua vez derivado do gregoπαροικία, que significa "vizinhança".
No território que hoje abriga Portugal, crê-se que, antes daconquista romana, os povos viviam em comunas praticamente autónomas, que tanto podiam ter uma praça-forte a servir de centro do governo, como consistir apenas de casas dispersas. Após a conquista romana, foi aplicado o regime da vila, unidade agrária e fiscal, embora ainda houvesse terras indivisas.[3]
Com ainvasão muçulmana e aReconquista, as populações foram-se agrupando à volta de pequenas igrejas rurais e assim formando paróquias, que, embora não cobrissem inicialmente todo o território, cresceram exponencialmente nos séculos que se seguiram.[3]
Até ao início doregime liberal, os termos "freguesia" e "paróquia" eram equivalentes, ambos designando a circunscrição territorial daIgreja Católica que estava a cargo de umpároco e sedeada numaigreja paroquial. Ao nível da freguesia, não havia então uma estrutura de administração civil separada da estrutura eclesiástica.[4]
A freguesia como circunscrição laica apenas viria a nascer na sequência das grandes reformas do sistema político implementadas durante amonarquia constitucional. Em Portugal, a paróquia civil surge assim na reforma administrativa de 1835, consagrando-se na reforma de 1878 e passando a denominar-se oficialmente "freguesia" em 1916.[5]
A primeira tentativa tentativa de criação de paróquias como circunscrições administrativas foi feita através do decreto nº 25 de27 de novembro de1830, emitido peloGoverno da Regência emAngra do Heroísmo, o qual previa o estabelecimento de umajunta para cada paróquia, uma vez que considerava necessária a existência, em cada uma delas, de uma autoridade local que possuísse a confiança dos vizinhos e assegurasse os interesses particulares dos mesmos. Contudo, a famosa reforma administrativa dirigida porMouzinho da Silveira e implementada pelo decreto de16 de maio de1832, viria a dividir o Reino apenas em províncias,comarcas e concelhos, já não prevendo portanto a existência de paróquias civis. As freguesias surgem no entanto como circunscrições judiciais, constituindo as subdivisões das comarcas que serviam de áreas de jurisdição aos juízes pedâneos e aosjuízes de paz.[5]
O surgimento definitivo das freguesias como circunscrições administrativas só ocorrerá na sequência da sua previsão na carta de lei de25 de abril de1835. A reforma dirigida porRodrigo da Fonseca, através do decreto de 18 de julho de 1835, estabelece assim a existência, em cada freguesia, de ummagistrado administrativo designado "comissário de paróquia" ("redesignadoregedor" em 1836), assistido de umcorpo administrativo, composto por cidadãos eleitos e designado "junta de paróquia". Nos concelhos constituídos por uma única freguesia não existiriam juntas de paróquia, sendo as suas atribuições exercidas diretamente pelas respetivascâmaras municipais.[5][6]
A criação das freguesias surge acompanhada da extinção da maioria dos mais de 800 concelhos que o país tinha no início doséculo XIX, os quais - considerados demasiado pequenos para serem viáveis num mundo moderno - são agregados em municípios de maiores dimensões de modo a obterem a escala necessária para poderem desempenhar as suas atribuições. A maior redução de todas ocorre por via do decreto de 6 de novembro de 1836, o qual suprime 466 concelhos de uma só vez. Assim, para além do reconhecimento de que os núcleos básicos de populações representados pelas paróquias eclesiásticas deveriam dispor de autoridades civis que defendessem os seus interesses, as freguesias surgem também como sucessoras dos inúmeros municípios extintos, assegurando que as populações dos mesmos continuassem a dispor de estruturas de administração local.[7]
Apesar do surgimento de estrutura civil da freguesia, autonomizada da estrutura eclesiástica, existe ainda uma forte ligação entre as duas, competindo, por exemplo, à junta de paróquia a responsabilidade pela conservação da igreja paroquial, pelas despesas do culto divino e pela administração dos rendimentos ou esmolas a aplicar na fábrica da igreja. Para além disso, previa-se que a junta pudesse realizar as suas sessões nasacristia da própria igreja (mas nunca no seu corpo principal).[8][6]
OCódigo Administrativo de 1878, elaborado sob a direção deRodrigues Sampaio viria a consagrar definitivamente a existência da paróquia civil, dando-lhes maior autonomia.[5][9]
Até ao início do século XX, as paróquias civis mantinham duas designações oficiais alternativas ("paróquia" e "freguesia"). Contudo, a lei nº 621 de 23 de junho de 1916 veio estabelecer o termo "freguesia" como sua única denominação oficial, consequentemente passando a junta de paróquia a denominar-se "junta de freguesia". Esta mudança acentuou a diferença entre a circunscrição civil ("freguesia") e a eclesiástica ("paróquia"[nota 1]).[8][10]
Com a entrada em vigor daConstituição de 1976, cada freguesia continua a manter a junta de freguesia como seu órgão executivo colegial, à qual se acrescenta agora aassembleia de freguesia como órgão deliberativo. Em freguesias de população diminuta (consideradas hoje como tal, as que têm menos de 150 eleitores recenseados), a assembleia de freguesia é substituída pelo plenário dos eleitores, funcionando assim em regime dedemocracia direta. A Constituição deixa ainda de prever a função de regedor, que assim é formalmente extinta.[11]
Já em2013, deu-se a maior alteração no número de freguesias desde o século XIX, com a implementação daReorganização Administrativa do Território das Freguesias (RAFT, e também conhecida porLei Relvas, em homenagem ao então ministro dos Assuntos ParlamentaresMiguel Relvas). Foram agregadas algumas freguesias e outras tiveram os seus limites alterados, resultando numa redução do número de freguesias de Portugal de 4259 para 3092.[12][13] Com territórios que vão dos 20 hectares ou 0,2 km² (freguesia deSão Bartolomeu, no concelho deBorba) aos 888 km² (união das freguesias deAlcácer do Sal (Santa Maria do Castelo e Santiago) e Santa Susana, no concelho deAlcácer do Sal), e populações que vão dos 19 (freguesia deMosteiro, no concelho deLajes das Flores,Açores) aos 68 656 habitantes (freguesia deAlgueirão - Mem Martins, no concelho deSintra). O mínimo de freguesias por concelho é de uma (seis concelhos:Alpiarça,Barrancos,Castanheira de Pera,Porto Santo,São Brás de Alportel eSão João da Madeira) e o máximo é de 61 (Barcelos), mas existe o caso especial do concelho do Corvo, que por lei não tem qualquer freguesia.
A freguesia trata-se da subdivisão obrigatória dosconcelhos/municípios de Portugal, onde todos têm pelo menos uma freguesia (cujo território, no caso de ser apenas uma, coincide com o do concelho), havendo no entanto o caso especial domunicípio do Corvo. Por via do artigo 136º doEstatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, o município do Corvo é titular das competências genéricas das freguesias o que faz com que seja normalmente considerado o único município do país sem qualquer freguesia. Contudo e ainda que não disponha dos seus próprios órgãos autárquicos, em algumas situações, o Corvo é contado como uma freguesia que coincide territorialmente com o respetivo município.[14]
Por outro lado, o Sistema Estatístico Europeu (SEE) tem procurado definir para os Estados-Membros níveis hierárquicos deUnidades Administrativas Locais (Local Administrative Units - LAU) que garantam a integração com asNUTS. No caso português, às freguesias correspondem ao nível LAU 2 (antigamente denominada nível NUTS V).
Uma freguesia é governada por umaJunta de Freguesia, um órgão executivo que é eleito pelos membros daAssembleia de Freguesia, à excepção do presidente (o primeiro candidato da lista mais votada é automaticamente nomeado Presidente da Junta). A Assembleia de Freguesia é um órgão eleito diretamente pelos cidadãos recenseados na freguesia, segundo ométodo D'Hondt, através de listas que tradicionalmente são partidárias (que se abriram há poucos anos a listas de independentes). A Constituição prevê que, nas freguesias de população diminuta, a Assembleia de Freguesia seja substituída pelo plenário dos seus cidadãos eleitores.[15]
As autoridades portuguesas estabelecem três tipos diferentes de freguesias, para efeitos de ordenamento do território:
As freguesias estão representadas nos órgãos municipais pelo presidente da Junta, que tem assento, por inerência do cargo, naAssembleia Municipal.[18]
As freguesias são identificadas por um código de seis caracteres, sendo os dois primeiros para o distrito, os dois seguintes para o município, e os dois últimos para a freguesia.
NoBrasil, durante o tempo da colônia, a freguesia era exatamente o mesmo que emPortugal, não havendo distinção entre freguesia eparóquia como descrito acima.
Uma organização semelhante manteve-se durante o tempo doImpério do Brasil no qual a Igreja Católica foi mantida como religião oficial do Estado, que tinha o dever de pagar salários para padres e bispos. Deste modo, era adequado que a estrutura administrativa civil não fosse distinta da estrutura eclesiástica. As províncias eram divididas em municípios que por sua vez eram divididos em freguesias. As freguesias correspondiam às paróquias, mas também havia curatos para serviços religiosos em povoações pequenas e sem autonomia política. Por sua vez, o bispos comandavam asdioceses, típica organização administrativa religiosa, que abrangiam geralmente diversos municípios, ou seja, diversas freguesias.
Com aproclamação da República, houve uma total separação entre aIgreja Católica e o Estado brasileiro, de modo que as antigas províncias transformaram-se em estados autônomos divididos em municípios também autônomos que, por sua vez, podem (ou não) ter seu território dividido para fins puramente administrativos. A Igreja Católica passou a manter uma estrutura administrativa distinta.
Por fim, emCabo Verde mantém-se adivisão administrativa herdada dos tempos portugueses com dezesseteconcelhos subdivididos em 31freguesias.
EmMacau, um antigo território português, continua a estar dividido emfreguesias (que ao todo são sete), embora a partir de 1999 (ano da transição de Macau para aChina), fossem considerados pelo então recém-formado governo daRAEM como divisões simbólicas com poder administrativo nulo.