Autora de obra prolífica, que inclui trabalhos como asnovelasThe Grass is Singing eThe Golden Notebook, sua obra cobre um vasto leque estilístico, indo da autobiografia àficção científica, com claras influências domodernismo. Foi galardoada com oNobel de Literatura de2007, tendo aAcademia Sueca apontado, como razão determinante, a existência na sua obra de características que fazem dela"a contadora épica da experiência feminina, que com cepticismo, ardor e uma força visionária escrutinou uma civilização dividida".[1] Doris Lessing é a 11.ª mulher a ganhar este galardão nos seus 89 anos de história[2][3] e a pessoa mais idosa que jamais o recebeu.[4]
Doris Lessing foi oficialmente batizada como Doris May Tayler, emQuermanxá,[5] noCurdistãoiraniano, onde viveu até os seis anos de idade.[6] Filha do capitão Alfred Tayler e de sua mulher Emily Maude Tayler (nascida McVeagh), ambos cidadãos britânicos nascidos naInglaterra.[7] O seu pai tinha perdido uma perna durante a sua participação naGrande Guerra, e fora durante a sua convalescença da amputação que conhecera a sua futura esposa, entãoenfermeira noRoyal Free Hospital deLondres.[8][9] Após a Guerra, Alfred Tayler, que antes fora bancário, aceitou um emprego noImperial Bank of Persia, que era um bancobritânico[10] que operou como bancoestatal ebanco central do Irã, entre 1889 e 1929,[11] por concessão do governo iraniano ao banqueiroPaul Julius Reuter.
Assim, a família Tayler mudou-se paraQuermanxá,Irã (geralmente chamadoPérsia, no Ocidente, até 1930), onde Doris Lessing nasceu em1919.[12][13]
Em1925, quando a comissão de serviço terminou, a família mudou-se para a colónia britânica daRodésia do Sul (hoje oZimbabwe), onde havia adquirido cerca de milacres (cerca de 405ha) de matagal e o pai se pretendia fixar como agricultor, cultivando alimilho etabaco.
Apesar da rudeza do ambiente que a rodeava, a mãe de Lessing pretendia levar na nova fazenda uma vidaeduardiana, o que talvez pudesse ter sido possível se a exploração prosperasse, o que não aconteceu, já que a fazenda, apesar do investimento e do esforço, não conseguiu atingir as expectativas criadas.[6]
Doris foi educada na Escola Secundária do Convento Dominicano de Salisbúria (actualHarare), uma escola confessional só para raparigas operada pelas irmãsdominicanas.[14] Nunca tendo gostado do ambiente criado pelas freiras que administravam a escola e em conflito permanente com a sua mãe, Doris abandonou a escola aos 13 anos, sendo autodidacta em toda a sua formação posterior.
Com o agudizar do conflito com a mãe, abandonou a casa aos 15 anos de idade, passando a trabalhar como ajudante deama, tomando conta das crianças de uma família. Por essa altura começou a ler materiais sobrepolítica esociologia que lhe eram emprestados pelos patrões.[9] Por essa época, começou a escrever.
Em1937, Doris mudou-se para Salisbúria para trabalhar comotelefonista, casando em1939 com Frank Charles Wisdom, com quem teve dois filhos (um filho e uma filha), antes do casamento se desfazer em1943,[9] quando o casal se separa ficando as crianças com o pai.
Após o seu divórcio, Doris é atraída para oLeft Book Club, um círculo de leitores de inspiraçãocomunista,[6] tendo aí encontrado o seu segundo marido, o alemão Gottfried Lessing,[15] que viria mais tarde a ser nomeado embaixador daRepública Democrática Alemã noUganda, onde foi assassinado em1979 durante arebelião contraIdi Amin Dada.[9] Casaram em1945 e tiveram um filho (Peter Lessing) pouco antes do casamento ter acabado em novo divórcio no ano de1949. Doris, que optou por manter o apelido germânico do segundo marido, partiu então para Londres na companhia do filho.
Pouco depois de se fixar em Londres com o filho Peter, Doris Lessing publica o seu primeiro romance,The Grass Is Singing (A Canção da Relva), saído a público ainda em1949. O seu livro mais famoso, e que representaria o seu lançamento como escritora consagrada, foiThe Golden Notebook (O Carnê Dourado), publicado em1962.
Para demonstrar as dificuldades enfrentadas por novos autores que queiram ver os seus livros editados, em1984, tentou publicar duas novelas sob opseudónimo deJane Somers. As novelas foram rejeitadas pelo seu editor britânico, mas aceitas por outro,Michael Joseph, e pela editora americanaAlfred A. Knopf.[17] A obraThe Diary of a Good Neighbour[18] foi publicada em1983, eIf the Old Could em1984,[19] tendo saído no Reino Unido e nos Estados Unidos da América ambas como escritas "Jane Somers”. Em1984, ambas as novelas foram republicadas (Viking Books), como um volume único, sob o título deThe Diaries of Jane Somers: The Diary of a Good Neighbor and If the Old Could, indicando Doris Lessing como a autora.
A11 de Outubro de2007, Doris Lessing foi anunciada como agraciada doNobel de Literatura.[22] Com 87 anos de idade, ela é a pessoa mais idosa que jamais recebeu aquele galardão[23] e o terceiro laureado mais idoso em qualquer das categorias do Prémio.[24][25] Doris Lessing é a 11.ª mulher a receber o Nobel de Literatura nos seus 106 anos de história.[26] Quando confrontada com a notícia de ser a galardoada de 2007, Doris Lessing disse aos repórteres que se tinham congregado frente à sua casa: "Ganhei todos os prémios existentes na Europa, todos sem excepção, por isso estou encantada por ganhá-los todos. É uma abada geral."[27] O prémio vale £ 765 000 (cerca de € 900 000).[22]
Os temas abordados por Doris Lessing variam extensamente, passando pelo exame das tensões inter-raciais, a política racial, a violência contra as crianças, os movimentos feministas e a exploração do espaço exterior.
A produção literária de Lessing é em geral dividida em três fases distintas, embora interrelacionadas e intercorrentes:
Temas de inspiração comunista (1944-1956), um período em que as temáticas sociais, encaradas de forma radical e sem compromisso, dominavam a sua produção literária. Embora de forma diferente, retornou a esta temática com a sua obraThe Good Terrorist (1985);
Na sérieCanopus em Argos: Arquivos, Doris Lessing conduz o leitor ao mundo dos Impérios de Canopus e Sirius, num universo que aborda a colonização de planetas em esferas muito além do mundo físico das naves espaciais. Por isso mesmo a literatura de Doris Lessing tem sido denominada deficção espacial.
Com a sérieCanopus em Argos: Arquivos, Doris Lessing transcendeu o realismo completamente, contudo restabelecendo-o dentro de um ajuste do espaço-tempo. Criou o que chamaum mundo novo para mim mesma, autoconsistente e com possibilidades infinitas,um reino onde os mitos e lendas dos planetas deixaram de ser apenas manifestações de indivíduos sozinhos, onde sobrevêm os aspectos das rivalidades e das interacções do Império de Canopus com os outros impérios galácticos, Sirius, e seu inimigo, o império Puttoria, com seu planeta criminoso, Shammat.
Quando inquirida sobre qual dos seus livros considerava mais importante, Doris Lessing escolheu a série deficção científica intituladaCanopus in Argos. Aquelas obras demonstram, de muitas perspectivas diferentes, os esforços de uma sociedade avançada em forçar o passo daevolução (veja tambémProgressor eUplift Universe). A sérieCanopus é parcialmente baseada em conceitos doSufismo, nos quais Lessing foi introduzida porIdries Shah. Trabalhos de ficção anteriores sobre o tema doespaço interior, comoBriefing for a Descent into Hell eMemoirs of a Survivor também exploram esses temas. A entrada de Lessing no campo daficção científica não caiu bem entre muitos críticos literários. Por exemplo, noNew York Times, em1982, o críticoJohn Leonard escreveu sobreThe Making of the Representative for Planet 8 que: "Um dos muitos pecados pelos quais oséculo XX será responsabilizado é o de ter desencorajado a Sr.ª Lessing.... Ela agora faz propaganda em favor da nossa insignificância no razzmatazz cósmico.” A essa afirmação Lessing replicou: "O que eles não entenderam foi que a ficção científica é alguma da melhor ficção social dos nossos tempos. Também admiro a ficção científica clássica, comoBlood Music, deGreg Bear. Ele é um grande escritor ".[30]
Ao contrário de alguns autores, conhecidos principalmente pelos seu trabalho considerado como parte damainstream social da sua época, Doris Lessing nunca hesitou admitir que escreveficção científica. Ela foi mesmo a autora convidada de honra na 45.ª World Science Fiction Convention, aWorldcon, fazendo aí um discurso muito bem recebido, no qual descreveu a sua obra de ficção científicaMemoirs of a Survivor como "uma tentativa de autobiografia".[31]
A sua novelaThe Golden Notebook é considerada um clássicofeminista por alguns estudiosos, mas não pela própria autora, que mais tarde escreveu que o tema da novela, centrado na análise de estados de ruptura mental como forma de obter uma cura das angústias próprias e de se auto-libertar de ilusões, tinha sido mal compreendido pelos críticos. Ela também lamenta que os críticos tenham ignorado a estrutura excepcional da novela. Como ela explica emWalking in the Shade, Lessing modelou Molly, em grande parte, sobre a sua boa amiga Joan Rodker, filha do autor e editorJohn Rodker.[32]
Doris Lessing não gosta da ideia de ser considerada como uma autorafeminista. Quando inquirida sobre essa asserção, respondeu:
“
O que as feministas pretendem de mim é algo que ainda não alcançaram, que apenas pode vir da religião. Querem que eu preste testemunho. O que elas realmente gostariam realmente de me ouvir dizer era: 'Oh, irmãs, eu estou lado a lado convosco na vossa luta a caminho de um amanhecer dourado onde todos esses homens brutais não existirão mais.' Será que querem que as pessoas façam declarações simplistas acerca de homens e mulheres? De facto, querem! Com grande pena minha cheguei a esta conclusão.[33]
”
A maior parte do arquivo literário de Doris Lessing é mantida peloHarry Ransom Humanities Research Center, um centro de investigação na área das humanidades integrado naUniversity of Texas at Austin. As 45 caixas de arquivo ali existentes representam a quase totalidade dos manuscritos e originais dactilografados no período anterior a1999. Crê-se que os originais dos primeiros livros de Lessing não existam, porque a escritora não guardava os seus manuscritos.[34] Outras instituições, como aMcFarlin Library daUniversity of Tulsa mantêm colecções menores.[35]
Nobel de Literatura de2007, pela suacapacidade de transmitir o sentido épico da experiência feminina e narrar a divisão da civilização com cepticismo, paixão e força visionária.[36]
Para receber o Prémio Nobel da Literatura de 2007, a escritora escreveu um discurso e enviou-o à sua editora sueca, que o leu na cerimónia na capital sueca.[37]
Doris Lessing disse num programa de rádio da BBC em Maio de 2008 que o facto de ter recebido o prestigiado prémio em 2007 redundou num "maldito desastre". Isto porque a subsequente atenção dos media, com constantes pedidos para entrevistas e sessões de fotografia, lhe tirou toda a energia para escrever uma linha que seja.[3]
A crítica literária em geral recebeu a concessão doNobel de Literatura a Doris Lessing com surpresa e cepticismo, devido a que não aparecia entre os cotados para o galardão de 2007, apesar de ser umaeterna candidata. Autores comoAna María Moix,[38]Rosa Montero,[39]José María Guelbenzu,[40] ouMario Vargas Llosa[41] louvaram seus méritos literários depois da concessão do galardão. Contudo, algumas vozes críticas levantaram-se contra esta decisão:
O crítico literário norte-americanoHarold Bloom definiu a decisão da Academia Sueca como "politicamente correta". "Ainda que a senhora Lessing no começo de sua carreira tenha tido algumas qualidades admiráveis, penso que seu trabalho nos últimos 15 anos é um tijolo… ficção científica de quarta categoria."[42]
TambémUmberto Eco, no mesmo evento em Frankfurt, apesar de considerar que a autora merecia o prémio, admitiu a sua surpresa pela decisão declarando: "é estranho que um autor de língua inglesa venha a ganhar o prémio tão pouco tempo depois deHarold Pinter."[43]
↑Klein, Carole.«Doris Lessing». The New York Times. Consultado em 11 de outubro de 2007
↑abcd«Doris Lessing».kirjasto.sci.fi. Consultado em 11 de outubro de 2007. Arquivado dooriginal em 8 de junho de 2008
↑State Bank or Agent of Empire? The Imperial Bank of Persia's Loan Policy 1920-23 Frances Bostock Iran , Vol. 27, (1989) , pp. 103-113 Published by: British Institute of Persian Studies Article Stable URL:http://www.jstor.org/stable/4299822
↑Lessing é a terceira pessoa mais idosa a receber um Prémio Noberl.Leonid Hurwicz tinha 90 anos de idade quando recebeu o Nobel de Ciências Económicas em 2007.Raymond Davis Jr., também tinha 87 anos de idade quando recebeu oNobel de Física de 2002, sendo 5 dias mais velho que Doris Lessing.