O autor americanoHenry David Thoreau, em1849, foi o pioneiro a estabelecer a teoria relativa dessa prática num compêndio originalmente, intituladoResistência ao Governo Civil que mais tarde renomeouA Desobediência Civil. A ideia predominante abrangida por esse ensaio era o de auto-aprovação e de como alguém pode estar em boas condições morais enquanto se opõe a quem "explora ou faz sofrer um outro homem"; dizia então que não precisamos lutar fisicamente contra ele, mas sim não apoiá-lo nem deixar que este o apoie estando você contra ele. Este ensaio exerceu uma grande influência sobre muitos praticantes da desobediência civil. Igualmente aí, Thoreau explicava as razões por que se recusara a pagar seus impostos, como um ato de protesto contra a escravidão e contra aGuerra Mexicana.
Mas, antes de Thoreau, existiram outros que, através de teorias próprias mas acessórias a outras teses principais, também realizaram atos de desobediência civil, como fazAntígona, na peçagrega deSófocles. O pioneiro desse pensamento na modernidade, apesar de pouco conhecido, éEtienne de La Boétie (1530-1563), que em seu livroDiscurso da Servidão Voluntária, diz que não é preciso se rebelar contra o tirano, bastaria apenas parar de obedecê-lo. "Não é faça nada contra si mesmo." (Boétie, Etienne de. Discurso da Servidão Voluntária; tradução de Casemiro Linarth. São Paulo: Martin Claret, 2009. p. 36). Também outros teóricos, em especial doIluminismo, trataram de possibilidades de desobediência quando apresentavam suas teses acerca da formação do Estado e da submissão do povo a este, como já explicavamHobbes,Rousseau eKant.
Contudo, é atribuída a Thoreau a formulação do conceito como uma reação contra oEstadoLeviatã de Hobbes. Thoreau foi o primeiro a efectivamente tratar das condutas de desobediência a um governo estabelecido, problema que não era objeto dos teóricos de sua época. Ele também influenciou profundamente o pensamento político e ações de personalidades notáveis comoLeon Tolstoi,Mahatma Gandhi,Martin Luther King Jr.,John Rawls e outros.
Passeatas e manifestações deprotesto, como as campanhas que ocorreram contra ainvasão do Iraque, não são necessariamente desobediência civil, pois muitos cidadãos que dessas campanhas participam continuam apoiando o governo de outras formas.
A desobediência civil serviu também como uma tática da oposiçãopolonesa contra os comunistas (verSolidarność).
Muitos dos que praticam a desobediência civil o fazem desprovidos de crença religiosa, embora integrantes do clero frequentemente participem ou mesmo liderem ações de desobediência civil - a exemplo dos irmãos Berrigan,Daniel ePhilip, padres católicosnorte-americanos que foram presos várias vezes por participarem de atos de desobediência civil, durante manifestações contra a guerra.
Buscando uma forma ativa deresistência, aqueles que praticam a desobediência civil escolhem deliberadamente quebrar certasleis, seja formandopiquetes pacíficos ou ocupando ilegalmente algum prédio. Fazem isso na expectativa de serem presos (ou até mesmo atacados) pelas autoridades sem esboçar resistência.
Segundo os teóricos do direito, a desobediência civil possui cunho jurídico, mas não precisa de leis para garanti-la. Seria uma forma de expressão dodireito de resistência, que é uma espécie de direito de exceção (ou seja, destacado do sistema de direito comum) e, embora tenha cunho jurídico, não necessita de leis para garanti-lo, por ser um meio de garantir outros direitos do Homem. O direito de resistência é o direito de lutar para garantir outros direitos básicos - tais como osdireitos naturais àvida e àliberdade - quando as instituições públicas não cumprem seu papel e não há meios legais de assegurar o exercício desses direitos.[3] Trata-se portanto de manter, proteger ou conquistar direitos negados. SegundoJohn Rawls, a sociedade é "um sistema justo de cooperação social entre pessoas livres e iguais". Todavia, mesmo numa sociedade bem ordenada pode haver instituições políticas, econômicas e sociais injustas. A desobediência civil é como "um aviso prévio da minoria à maioria, um protesto público não violento endereçado ao sentido de justiça da comunidade ou da sociedade como um todo, no intuito de reverter situações de injustiça".[4]
A desobediência civil está no mesmo patamar jurídico do direito degreve (para proteger os direitos dos trabalhadores) e o direito derevolução (para resguardar o direito do povo exercer a sua soberania quando esta é ofendida).[1] A rigor, a desobediência civil é ilegal. No entanto, segundo o pensamento de Rawls, pode ser considerada como ato legítimo, na medida em que se fundamenta no princípio dajustiça. Se a lei não for um instrumento de realização da justiça, o seu descumprimento é legítimo. Vale como uma espécie delegítima defesa contra a arbitrariedade e a injustiça.[4]
↑Segundo os antigosjusnaturalistas, todas asleis humanas deveriam ser medidas pela sua conformidade com o direito natural. Uma lei injusta não seria, portanto, lei. O direito natural era usado não apenas para avaliar a validademoral de diversas leis, mas também para determinar o que as leis queriam dizer.