Oscrocodilianos oucrocodilos são osrépteis daordemCrocodilia (ouCrocodylia), na qual existem 24 espécies vivas e numerososfósseis. São répteis maioritariamente grandes, predadores e semiaquáticos. Pertencem a esta ordem os crocodilos (famíliaCrocodylidae), osaligátores ecaimões (ambos da famíliaAlligatoridae) e os gaviais (da famíliaGavialidae). Embora por vezes a palavra crocodilo seja utilizada vulgarmente para se referir a todos os membros da ordem, propriamente falando só são verdadeiros crocodilos os da família doscrocodilídeos (Crocodylidae). Surgiram há 83,5 milhões de anos noCretáceo tardio (na épocaCampaniana) e são os parentes vivos mais próximos dasaves, dado que os dois grupos são os únicos sobreviventes do grande grupoArchosauria. O cladoPseudosuchia, que é membro dogrupo total da ordem, surgiu há uns 250 milhões de anos noTriássico, diversificando-se durante oMesozoico.
Répteis de grande porte, compactos e com forma corporal que lembra oslagartos, os crocodilianos apresentam focinhos longos e achatados, caudas comprimidas lateralmente e olhos, ouvidos e narinas voltados para o topo da cabeça. São bons nadadores e em terra podem caminhar naturalmente, com "passo alto" (levantando o corpo do chão) ou com "passo baixo" (perto do chão), e as espécies menores são até mesmo capazes de galopar. A sua pele é grossa e coberta de escamas que não se sobrepõem. Os dentes são cónicos e possuem uma mordida muito poderosa. O coração dos crocodilianos apresentaquatro câmaras; tal como as aves, possuem um sistema unidirecional de ventilação ao redor dos pulmões e, conforme outros répteis não avianos, sãoectotérmicos.
Os crocodilianos encontram-se principalmente em terras baixas dos trópicos, mas os aligátores também vivem no sudeste dosEstados Unidos e norio Yangtzé daChina. São fundamentalmentecarnívoros, e as diversas espécies alimentam-se de animais comopeixes,crustáceos,moluscos, aves emamíferos; algumas espécies como ogavial têm uma alimentação especializada, enquanto que outras como o crocodilo-de-água-salgada (Crocodylus porosus) têm dietas generalistas. Os crocodilianos são tipicamente solitários eterritoriais, embora possam realizar uma alimentação cooperativa. Durante a época reprodutiva, os machosdominantes procuram monopolizar as fêmeas disponíveis. As fêmeas põem ovos em ninhos com a forma de buracos ou montes e, ao contrário da maioria dos outros répteis, cuidam das suas criações acabadas de eclodir.
Existem oito espécies de crocodilos que atacam oshumanos. O maior número de ataques são os protagonizados pelocrocodilo-do-Nilo. Os humanos são a maior ameaça para as populações de crocodilianos devido àcaça ou àdestruição dohabitat, mas a criação de crocodilianos em propriedades agrícolas reduziu em muito o comércio ilegal de peles de crocodilianos selvagens. As representações artísticas e literárias de crocodilianos são frequentes nas culturas humanas de diversas partes do mundo desde pelo menos a época doAntigo Egito. A primeira menção conhecida da história de que os crocodiloschoram pelas suas vítimas data doséculo IX, sendo mais tarde tema em obras de autores comoWilliam Shakespeare de finais do XVI e princípios do XVII.
Durante décadas foram se utilizando indiferentemente as ortografiasCrocodilia eCrocodylia, começando pela redescrição do grupo feito por Schmidt a partir do termo anteriormente conhecido porLoricata.[1] Schmidt usou o termo mais antigoCrocodilia, baseando-se no nome original que havia sido dado por Richard Owen.[2] Pouco depois, Wermuth optou por usarCrocodylia como nome mais apropriado para este grupo redescrito,[3] baseando-se no nome do género-tipoCrocodylus (Laurenti, 1768).[4] Dundee, numa revisão de muitos nomes de répteis e anfíbios, argumentou fortemente em favor deCrocodylia como melhor ortografia para o grupo.[5] Este uso justifica-se pela existência de outros táxons com um "y", como a superordemCrocodylomorpha. No entanto, quando publicou o nome em 1842,Richard Owen utilizou o "i". Essa ortografia também é mais consistente com o termo emgregoκροκόδειλος.[6] Contudo, até à chegada dacladística e danomenclatura filogenética não foram apresentadas justificações mais sólidas para optar por uma ortografia ou por outra.[7]
Antes de 2003,Crocodilia/Crocodylia era um grupo que compreendia tanto os animais modernos de hoje em dia (ogrupo coroa) como os seus parentes mais distantes, mas que agora estão situados em grupos maiores chamadosCrocodylomorpha ePseudosuchia.[7] Com a actual definição,Crocodylia está restrito apenas aos antepassados mais recentes dos crocodilianos actuais (jacarés,crocodilos egaviais), ficando excluídos os mais distantes.[7] Esta distinção é mais importante para ospaleontólogos que estudam a evolução dos crocodilos. Portanto, as ortografias alternativasCrocodilia eCrocodylia são ainda intercambiáveis na literaturaneontológica (que estuda só os organismos existentes, não os extintos).
Crocodilia parece ser umalatinização da palavragregaκροκόδειλος (crocodeilos), que significalagarto ecrocodilo-do-nilo.[8]Crocodylia, tal como Wermuth cunhou, em relação ao géneroCrocodylus, parece que deriva do antigo gregoκρόκη (kroke),[9] que significa praia de cascalho, e deδρîλος ouδρεîλος (dr(e)ílos) que significa "verme". O nome pode referir-se ao hábito que o animal tem de apanhar banhos de sol nas ribeiras de gravilha doNilo.[10]
Esqueleto montado e taxidermia dum crocodilo-do-niloOs crocodilianos, como este caimão-almiscarado, podem submergir na água fazendo emergir na superfície da água apenas os orifícios nasais, olhos e ouvidos
O tamanho dos crocodilianos varia entre o das espécies pequenas dePaleosuchus eOsteolaemus, que atingem entre 1 a 1,5 metro, à do crocodilo-de-água-salgada, que alcança os 7 metros e pode pesar até 2 mil quilogramas, embora algumas das espécies pré-históricas, como oDeinosuchus doCretáceo tardio, eram ainda maiores e alcançavam os 11 metros[11] e 3 450 quilogramas.[12] Costumam apresentardimorfismo sexual, no qual os machos são bem maiores do que as fêmeas.[13] Apesar de apresentarem certa diversidade na forma do focinho e dentes, todas as espécies de crocodilianos possuem essencialmente a mesma morfologia corporal. Têm um corpo robusto com aparência de lagarto, com focinhos alongados e aplanados e costas lateralmente compridas (conduplicadas).[12] As patas são de tamanho reduzido; as patas anteriores têm cinco dedos com pouca ou nenhumamembrana interdigital, e as patas traseiras têm quatro dedos palmados e um quinto dedo rudimentar.[14] O esqueleto é bastante característico dostetrápodes, embora o crânio, pelve e costelas sejam especializados;[13] em particular, osprocessos cartilaginosos das costelas permitem que otórax colapse quando mergulham e a estrutura da pelve pode acomodar grandes massas de comida[15] ou mais ar nos pulmões.[16] Ambos os sexos têmcloaca, uma só câmara com uma única saída na base da cauda na qual se abrem os orifícios intestinal, urinário e o tracto reprodutivo,[13] que abriga o pénis dos machos e o clítoris das fêmeas.[17] O pénis dos crocodilianos está permanentemente erecto e depende de músculos cloacais para a sua eversão, e deligamentos elásticos e umtendão para ser recolhido.[18] Ostestículos ouovários estão localizados perto dosrins.[19]
Os olhos, ouvidos e orifícios nasais dos crocodilianos estão na parte superior da cabeça. Isto permite-lhes caçar as suas presas com a maior parte do seu corpo submerso.[20] Os crocodilianos possuem nos olhos umtapetum lucidum que aperfeiçoa a visão em condições de pouca luminosidade.[14] A sua vista para o ar é muito boa, mas é significativamente pior debaixo de água.[21] Afóvea doutros articulados normalmente é circular, mas nos crocodilos consiste numa barra horizontal formada por muitos receptores apertadamente juntos que cruza a parte do meio daretina. Possuem ainda umamembrana nictitante que cobre os olhos sempre que o animal mergulha por completo. Além disso, algumas glándulas da membrana nictitante segregam um lubrificante salgado que mantém o olho limpo. Quando um crocodiliano abandona a água e se seca, esta substância torna-se visível, parecendo-se com "lágrimas".[14]
Os ouvidos estão adaptados para ouvir tanto no ar como na água, e asmembranas timpânicas estão protegidas por solapas que podem abrir-se ou fechar-se por acção muscular.[22] Os crocodilianos têm uma elevadaamplitude auditiva, com uma sensibilidade comparável à da maioria das aves e mamíferos.[23] Possuem apenas uma câmara olfactiva e oórgão vomeronasal ausenta-se nos adultos,[24] o que indica que toda a percepção olfactiva está limitada aosistema olfactivo. Experimentos feitos com olfactómetros sobre o comportamento indicam que os crocodilos detectam tanto as substâncias químicas que viajam pelo ar como as solúveis em água e utilizam o seu sistema olfactivo para caçar. Quando estão sobre a água, os crocodilos intensificam a sua capacidade de detectar substâncias olorosas voláteis por meio dum bombeio gular, que é um movimento rítmico do fundo dafaringe.[25][26] O seu bem desenvolvidonervo trigémeo permite-lhes detectar vibrações na água.[27] Não conseguem mexer livremente alíngua, que se mantém fortemente fixa por uma membrana rogada.[15] Apesar de océrebro do crocodilo ser bastante pequeno, possuem capacidade de aprendizagem maior do que a maioria dos répteis.[28] Embora não possuam cordas vocais como as dos mamíferos nem desiringe como a das aves,[29] os crocodilianos podem produzir vocalizações fazendo vibrar três abas que têm nalaringe.[30]
Crocodilo-do-nilo enquanto nada. A sequência segue da direita para a esquerda
Os crocodilianos são excelentes nadadores. Durante a locomoção aquática, a sua cauda muscular ondula de um lado para o outro impulsionando-o pela água, enquanto que as patas se mantêm juntas ao corpo para reduzir africção.[20][31] Quando o animal precisa de parar, virar ou realizar manobras em diferentes direcções, estende as patas convenientemente. Os crocodilianos nadam devagar com elegantes movimentos sinuosos da cauda tanto à superfície como debaixo de água, mas quando são perseguidos ou quando são os próprios a perseguir uma presa podem mover-se rapidamente.[32] Os crocodilianos estão menos adaptados para se moverem por terra, e são peculiares entre os articulados porque têm dois modos diferentes de locomoção terrestre, os chamados "passo alto" e o "passo baixo".[14] As articulações dos tornozelos flexionam-se de duas maneiras diferentes ao contrário doutros répteis, uma característica que partilham com alguns dos primeirosarcossauros. Um dos ossos superiores do tornozelo, oastrágalo, move-se com atíbia efíbula. O outro, ocalcâneo, a nível funcional pertence ao pé, e tem uma cavidade na qual se ajusta uma projecção do astrágalo. O resultado é que as patas podem ser estendidas quase que verticalmente abaixo do corpo quando estão em terra, e os pés podem rodar durante a locomoção com movimentos de torção no tornozelo.[33]
Os crocodilianos, como estealigátor-do-mississippi, podem caminhar com "passo alto" com as patas estendidas quase verticalmente, ao contrário doutros répteis
O "passo alto" dos crocodilianos, em que levantam o ventre e a maior parte da cauda mantendo-os acima do chão, é algo único entre os répteis vivos. Em certa medida, faz lembrar o modo de caminhar dos mamíferos, e tem a mesma sequência de movimentos das patas: anterior esquerda, posterior direita, anterior direita, posterior esquerda.[32] O "passo baixo" é parecido com o "passo alto", mas sem elevar o corpo do chão, sendo bastante diferente do caminhar reptante dos lagartos esalamandras. O animal pode mudar duma forma de caminhar para outra instantaneamente, entretanto o "passo alto" é a sua forma usual de locomoção em terra. O animal pode elevar o corpo e adoptar esta postura imediatamente, ou pode dar um ou dois passos com "passo baixo" antes de elevar o corpo. Ao contrário da maioria dos outros articulados terrestres, quando os crocodilianos aumentam o seu passo aumentam a velocidade, na qual a metade inferior de cada pata (em vez de toda a pata) se move para a frente; deste modo, aumenta o comprimento da passada, enquanto que a duração do passo diminui.[34]
Embora sejam normalmente lentos em terra, os crocodilianos são capazes de fazer rápidas e breves corridas, podendo alguns atingir entre 12 e 14 km/h por curtas distâncias.[35] Podem efectuar uma rápida entrada na água a partir das margens lamacentas deitando-se no chão, retorcendo o corpo de um lado para o outro e estendendo as patas. Em algumas espécies como oCrocodylus porosus, a passada pode progredir até atingirem o galope. Isto implica que as patas posteriores impulsionem o corpo para a frente e as patas anteriores passem a suportar o peso. Em seguida, as patas posteriores movem-se para a frente à medida que a coluna vertebral se flexiona dorsoventralmente, e esta sequência de movimentos repete-se.[36] Durante a locomoção terrestre, um crocodiliano pode manter o dorso e a cauda direitos, dado que asescamas estão unidas às vértebras por músculos.[15] Tanto em terra como na água, os crocodilianos podem saltar ou galgar pressionando a cauda e patas traseiras contra o chão e depois lançando-se para o ar.[20][37]
Os crocodilos de 3 metros de comprimento doCretáceo eram bípedes e realmente projetados como oT-Rex.[38]
A forma do focinho dos crocodilianos varia segundo a espécie. Os crocodilos podem apresentar focinhos magros ou largos, enquanto que os aligátores e caimões possuem focinhos predominantemente largos. Os gaviais têm focinhos muito alongados e magros. Os músculos que fecham as mandíbulas são bem mais maciços e potentes do que os que as abrem;[13] assim, uma pessoa é facilmente capaz de fechar a boca dum crocodilo, porém, inversamente, é extremadamente difícil forçar a abertura da boca.[39] Os poderosos músculos que a fecham estão unidos à porção média da mandíbula inferior e a articulação mandibular une-se àarticulação atlanto-occipital, o que permite o animal abrir a boca com um ângulo superior a 75º.[15]
Os crocodilos têm uma das forças de mordida mais poderosas do reino animal. Num estudo publicado em 2003, mediu-se a força da mordida de um aligátor-do-mississippi, que atingiu os 2 125 lbf (9 500 N).[40] Num estudo de 2012, um crocodilo-de-água-salgadaCrocodylus porosus tinha uma força de mordida ainda superior, de 3 700 lbf (16 000 N). Este estudo não encontrou correlação entre a força da mordida e a forma do focinho. Não obstante, as mandíbulas extremadamente delgadas do gavial são relativamente fracas e melhor adaptadas para fechar rápido a boca. Estima-se que a força de mordida do já extintoDeinosuchus podia alcançar os 23 000 lbf (100 000 N),[12] superior inclusive ao dedinossaurosterópodes como oTyrannosaurus.[40]
Os dentes dos crocodilianos variam de grossos a afiados e com forma de agulha. As espécies de focinho largo têm dentes que variam em tamanho, enquanto que os das espécies de focinho estreito são mais uniformes. Os dentes dos crocodilos e gaviais costumam ser mais visíveis que os dos aligátores e caimões quando as mandíbulas estão fechadas.[41] A forma mais simples de distinguir os crocodilos dos aligátores é observar a sua linha mandibular. Os dentes da mandíbula inferior dos aligátores encaixam-se nas cavidades da mandíbula superior, sendo que apenas os dentes superiores ficam à mostra quando têm a boca fechada. Os dentes do maxilar inferior de um crocodilo encaixam-se nas ranhuras situadas na parte externa da mandíbula superior, fazendo com que sejam visíveis tanto os dentes superiores como os inferiores quando fecham a boca.[42]
Os crocodilos sãopolifiodontes e podem substituir cada um dos cerca de 80 dentes até 50 vezes ao longo das suas vidas, que podem durar entre 35 e 75 anos.[43] São os únicos vertebrados não mamíferos comalvéolos dentários.[44] Ao lado de cada dente totalmente crescido existe outro pequeno de substituição e umacélula-troncoodontogenética na lâmina dentária em espera, que pode ser activada quando for preciso.[45] À medida que o animal cresce, a substituição dos dentes torna-se significativamente mais lenta e, eventualmente, para à medida que o animal envelhece.[41]
A pele dos crocodilianos é grossa e cornificada, e é coberta porescamas não sobrepostas chamadasescudos, dispostos em fileiras e padrões regulares. Estas escamas estão a produzir-se continuamente pordivisão celular na camada inferior da epiderme, oestrato germinativo, e a superfície de cada escudo desprende-se periodicamente. A superfície externa dos escudos é constituída porbeta-queratina relativamente rígida, enquanto que a região articular entre os escudos contém somente a mais flexívelalfa-queratina.[46]
Muitos dos escudos encontram-se reforçados por placas ósseas chamadasosteodermas, que são do mesmo tamanho e forma que as escamas superficiais, mas crescem por baixo delas. São mais numerosas no dorso e pescoço do animal e podem formar uma armadura protectora. Normalmente têm cristas grumosas proeminentes, cobertas por uma resistente beta-queratina.[13] A maioria da pele da cabeça está fundida ao crânio.[15] A pele do pescoço e flancos é frouxa, enquanto que a do abdómen e a da parte inferior da cauda está embainhada em grandes escudos quadrados planos dispostos em fileiras bem definidas.[13][47] Os escudos contêm vasos sanguíneos e podem actuar absorvendo ou radiando calor durante atermorregulação.[13] Investigações realizadas também sugerem que osiõesalcalinos libertos no sangue procedentes do cálcio e magnésio dos osteodermos actuam como umtampão quando se encontram muito tempo debaixo de água; de outro modo, com aumento dos níveis dedióxido de carbono causariamacidose.[48]
Alguns escudos contêm um único poro chamado órgão sensorial tegumentário. Os crocodilos e gaviais têm estes escudos em grande parte dos seus corpos, enquanto que os aligátores e caimões só os possuem na cabeça. Não se sabe qual é concretamente a sua função, mas sugere-se que possam ser órgãos mecano-sensoriais.[49] Outra possibilidade é que podem produzir uma secreção oleosa que impede que a lama adira à pele. Existem glándulas tegumentares pares proeminentes nas dobras cutâneas da garganta, e outras nas paredes laterais da cloaca. Propuseram-se várias funções para elas. Podem desempenhar alguma função na comunicação, pois evidências indirectas sugerem quesegregamferomonas usadas no cortejo ou na nidação.[13] A pele dos crocodilianos é forte e pode resistir a danos causados pelos seuscoespecíficos, e osistema imunitário é suficientemente eficaz para curar ferimentos em poucos dias.[50]
Os crocodilianos talvez tenham o sistema circulatório mais complexo de todos os articulados. Possuem umcoração de quatro câmaras e, ao contrário doutros répteis existentes,[51] têm dois ventrículos e umaaorta esquerda e outra direita, que estão conectadas por um orifício chamadoforame de Panizza. Tal como nas aves e mamíferos, os crocodilianos têm válvulas cardíacas que conduzem o fluxo sanguíneo numa só direcção pelas câmaras cardíacas. Também têm válvulas exclusivas com forma de dente que, quando se engrenam, fazem com que o sangue se dirija à aorta esquerda e para fora dos pulmões, e depois de volta para o corpo.[52] Este sistema pode permitir que o animal permaneça submerso por um longo período de tempo, porém esta hipótese tem sido alvo de contestação.[53] Outras possíveis razões para este peculiar sistema circulatório podem estar relacionadas com as necessidades da termorregulação, a prevenção deedemas pulmonares, ou facilitar uma rápida recuperação daacidose metabólica. Reter o dióxido de carbono no corpo permite o aumento dos níveis de secreção ácida gástrica e assim uma maior eficiência digestiva, e o melhor funcionamento de outros órgãos gastrointestinais como opâncreas,baço,intestino delgado efígado.[54]
Quando mergulham, a frequência cardíaca dos crocodilianos torna-se cada vez mais lenta até atingir apenas um ou dois latejos por minuto, sendo que o fluxo sanguíneo para os músculos é consideravelmente reduzido. Quando regressa à superfície para respirar, a suafrequência cardíaca acelera em questão de segundos e os músculos recebem apenas sangue recentemente oxigenado. Diferentemente doutros tantosmamíferos marinhos, os crocodilianos apresentam poucamioglobina para poderem armazenar oxigénio nos músculos. Durante o tempo em que estão debaixo de água, os músculos recebem oxigénio com uma elevada concentração de iõesbicarbonato, o que faz com que ahemoglobina do sangue libereoxigénio.[55]
Vídeo defluoroscopia deraios-X duma fêmea do jacaré-do-mississippi que mostra a contração dos pulmões durante a respiração
Antigamente acreditava-se que os crocodilianos respiravam como os mamíferos, ou seja, o fluxo de ar circulava nos seuspulmões para dentro e para fora de forma mareal; entretanto, os estudos publicados em 2010 e 2013 concluíram que respiram de forma mais parecida com as aves, com fluxos de ar que se movem nos pulmões num circuito unidirecional. Sempre que um crocodiliano inala, o ar flui através datraqueia e dos doisbrônquios primários (vias primárias), que se ramificam noutras vias aéreas secundárias. O ar continua a mover-se através destes, depois passa por vias terciárias mais estreitas, e em seguida por vias secundárias que não haviam ainda sido usadas. O ar flui de volta para as vias primárias e é exalado para o exterior. Estas válvulas aerodinâmicas na árvore bronquial foram hipotetizadas para explicar como é possível que os crocodilianos tenham um fluxo de ar unidireccional sem o auxílio dossacos aéreos que as aves possuem.[56][57]
Os pulmões dos crocodilianos estão ligados ao fígado e àpélvis pelo músculo diafragmático (análogo ao diafragma dos mamíferos). Durante a inalação, os músculos intercostais externos expandem as costelas, permitindo que o animal tome mais ar, enquanto que o músculo isquiopúbico faz com que os quadris se movam para baixo e puxem a barriga para fora, o músculo diafragmático puxe o fígado para trás. Quando exalam, os músculos intercostais internos empurram as costelas para dentro, enquanto que o músculo recto abdominal empurra os quadris e o fígado para a frente e o ventre para dentro.[16][51][58][59] À medida que os pulmões se expandem no espaço anteriormente ocupado pelo fígado e se comprimem quando se movem para trás, esse movimento é designado por "pistão do fígado". Os crocodilos também podem usar esses músculos para ajustar a posição de seus pulmões, controlando assim a sua flutuabilidade na água. O animal afunda quando puxa os pulmões em direção à cauda e flutua quando os puxa para a cabeça. Isto permite que os crocodilianos andem pela água sem criar distúrbios que possam chamar a atenção a possíveis presas. Com isto, também podem girar e retorcer-se, movendo os pulmões lateralmente.[58]
Enquanto nadam e submergem, os crocodilianos parecem utilizar mais o volume pulmonar para a flutuação do que propriamente para armazenar oxigénio.[51] Pouco antes de submergir, o animal exala o ar para reduzir o seu volume pulmonar atingindo uma força ascensional (flutuabilidade) negativa.[60] Quando submersos, os crocodilianos fecham as fossas nasais hermeticamente. Todas as espécies possuem uma válvula palatal, que é uma aba membranosa da pele na parte de trás da cavidade oral que impede que a água flua para o interior da garganta, esófago e traqueia.[13][14] Isso permite que eles abram a boca embaixo d'água sem se afogarem.[14] Normalmente, podem permanecer debaixo de água por até quinze minutos seguidos, no entanto alguns podem conter a respiração por cerca de duas horas em condições ideais.[61] Não se sabe ao certo qual é a profundidade máxima que conseguem alcançar, mas sabe-se que os crocodilos podem mergulhar até pelo menos 20 m.[62]
Os crocodilianos têm dentes que se adaptaram para capturar e agarrar as suas presas, e engolem a comida sem mastigar. O tracto digestivo é relativamente curto, uma vez que a carne é uma substância bastante simples de digerir. O estômago está dividido em duas partes: umamoela muscular que tritura a comida, e uma câmara digestiva na qual asenzimas actuam.[63] O estômago é mais ácido do que o doutros articulados e contém cristas paragastrólitos, que têm uma função na ruptura mecânica da comida engolida inteira ou em grandes quantidades. A digestão é feita mais rapidamente durante o tempo quente.[20] Apresentam uma taxa metabólica muito baixa e, consequentemente, baixas necessidades energéticas. Isto permite-lhes sobreviver durante muitos meses com uma única refeição completa, digerindo a comida lentamente. Podem resistir a um jejum prolongado, vivendo dagordura armazenada entre as refeições. Inclusivamente, as crias recém-nascidas podem resistir cerca de 58 dias sem comida, perdendo nesse período 23% do seu peso corporal.[64] Um crocodilo adulto precisa entre uma décima e uma quinta parte da comida que necessitaria umleão do mesmo peso, podendo viver meio ano sem comer.[64]
Gavial indiano em cativeiro apanhando sol e abrindo a boca
Os crocodilianos são ectotérmicos, produzem pouco calor internamente e dependem de fontes de calor externas para manter a sua temperatura corporal. O sol é a sua principal fonte de calor, enquanto que a imersão na água pode também aumentar a sua temperatura por condução, ou arrefecer o animal se estiver um tempo muito quente. O principal método utilizado para regular a temperatura é comportamental. Por exemplo, um aligátor em regiões temperadas pode começar o dia a tomar banhos de sol em terra. Um animal volumoso aquece-se mais lentamente, mas depois de algum tempo regressa à água, onde mantém exposta ao sol a sua superfície dorsal. Durante a noite permanece submerso, e a sua temperatura baixa lentamente. O período que passa a apanhar sol é maior no Inverno e menor no Verão. Para os crocodilos dos trópicos, evitar o sobreaquecimento torna-se uma preocupação comum. Podem apanhar sol brevemente pela manhã, mas depois vão para a sombra, permanecendo ali o resto do dia, ou mergulham na água para se refrescar. O acto de abrir a boca pode ajudar no arrefecimento dos seus corpos, por meio daevaporação de líquidos do revestimento da boca.[65] De todas estas formas, o nível de temperatura dos crocodilianos mantém-se geralmente entre os 25 e 35 °C, permanecendo principalmente entre os 30 e 33 °C.[66]
As áreas de distribuição dos aligátores da América e da China abrangem regiões que por vezes passam por períodos de congelação no Inverno. Como são ectotérmicos, a temperatura interna do corpo dos crocodilianos baixa à medida que a temperatura desce, e eles ficam num estado inactivo. Voltam a estar activos nos dias quentes, mas geralmente não se alimentam com refeições completas durante o Inverno nessas zonas. Com o tempo frio, permanecem submersos com a cauda em águas mais profundas e menos frias, mantendo à superfície apenas as narinas. Se se forma gelo na água, os crocodilos conservam buracos livres de gelo para poderem respirar, havendo inclusive casos em que se observou que os seus focinhos congelavam no gelo. Através de sensores sensíveis à temperatura implantados em aligátores-do-mississippi selvagens foi possível constatar que as temperaturas do núcleo interno do seu corpo podiam descer até cerca de 5 °C (41 °F) mas, desde que permaneçam capazes de respirar não apresentam efeitos nocivos assim que o tempo aquece.[65]
O crocodilo-de-água-salgadaCrocodylus porosus enquanto descansa numa praia
Nenhuma espécie viva de crocodilianos pode ser considerada verdadeiramente marinha. Apesar de o chamado crocodilo-de-água-salgada (Crocodylus porosus) e o crocodilo-americano (Crocodylus acutus) poderem nadar mar adentro, os seushabitats normais são as desembocaduras derios,estuários,manguezais elagos hipersalinos. Não obstante, várias espécies extintas tinhamhabitats marinhos, incluindo o recentemente extintoGavialis papuensis, que vivia emhabitats completamente marinhos das costas dasIlhas Salomão.[67] Todos os crocodilianos necessitam manter os níveis adequados de concentração de sais nos fluidos corporais. Aosmorregulação está relacionada com a quantidade de sais e água que permuta com o meio ambiente. A absorção de água e sais dá-se pelo recobrimento da boca, sempre que bebem água, quando acidentalmente engolem água ao se alimentarem, e dos sais presentes na comida.[68] O corpo perde água de várias formas, como sempre que respiram, pelaurina efezes, através da pele e pelasglándulas excretoras de sal presentes na língua, as quais só se encontram em crocodilos e gaviais.[69][70] A pele é uma barreira bastante eficiente tanto contra a água como contra iões. A abertura da boca provoca perda de água por evaporação a partir damucosa bucal, e em terra também perdem água através da pele.[69] Os maiores exemplares conservam melhor ahomeostase em momentos de stressosmótico do que os mais pequenos.[71] Os crocodilianos recém-nascidos são muito menos tolerantes à exposição à água salgada do que outros indivíduos juvenis de idade mais avançada, provavelmente porque possuem uma maiorrelação área superficial-volume.[69]
Os rins e o sistema excretor são muito parecidos com os doutros répteis, contudo os crocodilianos não possuembexiga. Em água doce, aosmolalidade (a concentração de soluções que contribuem para apressão osmótica duma dissolução) noplasma sanguíneo é muito maior do que na água que o rodeia. Os animais são bem hidratados, a urina nacloaca é abundante e diluída, e onitrogénio é excretado na forma debicarbonato amónico.[71] A perda desódio é baixa e dá-se sobretudo através da pele em condições de água doce. Na água do mar, ocorre o contrário. A osmolalidade no plasma é menor do que na água que o rodeia, provocando um efeito desidratante para o animal. A urina cloacal é muito mais concentrada, branca e opaca, e os resíduos nitrogenados expulsos encontram-se essencialmente na forma deácido úrico insolúvel.[69][71]
Os crocodilianos são répteis de vida anfíbia, que passam parte do seu tempo na água e outra parte em terra. O último género sobrevivente que era totalmente terrestre,Mekosuchus, extinguiu-se há cerca de 3 000 anos assim que os humanos chegaram às ilhas do Pacífico, como que a extinção foi possivelmente antropogénica.[72] Os crocodilianos são maiormente animais dos trópicos; à excepção dos aligátores autóctones na América do Norte e na China, que vivem no sudeste dos Estados Unidos até muito a norte dostrópicos e norio Yangtzé, respectivamente. O único sítio do mundo onde convivem crocodilos e aligátores é aFlórida, nos Estados Unidos.[73] A maioria dos crocodilos vivem em terras baixas, e alguns podem ser encontrados a 1.000 m de altitude, onde as temperaturas são normalmente 5 °C (9 °F) mais baixas do que na costa. Nenhum deles reside permanentemente no mar, embora haja alguns que se possam aventurar nele, e várias espécies toleram as águas salobras dos estuários, manguezais e a salinidade extrema de lagos hipersalinos.[74] Ocrocodilo-de-água-salgadaCrocodylus porosus é o crocodiliano com uma distribuição mais ampla, estendendo-se desde o leste da Índia àNova Guiné e norte daAustrália. Grande parte do seu êxito deve-se à sua capacidade de nadar pelo mar e colonizar novos lugares, mas não se restringe a ambientes marinhos, passando muito do seu tempo nos estuários, rios e grandes lagos.[75]
As diferentes espécies utilizam vários tipos dehabitats aquáticos. Algumas espécies são relativamente mais terrestres e preferem os pântanos, as lagoas e as ribeiras aos lagos, onde podem apanhar sol, havendo abundância de vida vegetal que pode sustentar uma fauna diversificada. Outros passam mais tempo na água e habitam os troços baixos dos rios, manguezais e estuários. Esteshabitats também possuem uma rica flora, proporcionando comida em abundância. Os gaviais asiáticos encontram peixes dos quais se alimentam em lagoas e remansos de rios com correntes rápidas. Oscaimões-anões do sul da América habitam em correntes rápidas e frias, frequentemente perto de quedas-d'água, e outros caimões vivem em rios lentos e lagos de águas quentes. Os crocodilos habitam principalmente os rios, e o aligátor da China encontra-se em rios lentos turvos que percorrem asplanícies inundáveis da China.[74] O aligátor norte-americano é uma espécie adaptável e habita em pântanos, rios ou lagos de águas límpidas ou quentes. Os factores climáticos também afectam a sua distribuição local. Durante a estação seca, oscaimões podem ficar restringidos a poças profundas dos rios durante vários meses; naestação das chuvas, grande parte da savana dos Llanos (Venezuela) fica desolada, e os crocodilianos espalham-se por toda a planície.[76] Oscrocodilos-do-deserto naMauritânia adaptaram-se ao seu ambiente árido permanecendo em buracos ou tocas num estado de estivação durante os períodos mais secos. Quando chove, estes répteis reúnem-se nas ali chamadasgueltas (poças, lagoas).[77]
Crocodilos americanos apanhando sol
A terra seca é também importante para os crocodilianos, uma vez que lhes proporciona oportunidades para banharem-se ao sol, fazer os ninhos e fugir das temperaturas extremas. Ao abrirem a boca evaporam a humidade e isto tem um efeito refrescante, e várias espécies utilizam tocas pouco fundas em terra para se manterem frescos. Rebolar na lama pode também ajudá-los a evitar o sobreaquecimento.[78] Quatro espécies de crocodilos podem trepar árvores de fácil acesso para apanhar sol em zonas com falta de ribeiras.[79] O tipo de vegetação que beira os rios e lagos habitados por eles é essencialmente a floresta tropical húmida, com manguezais nas zonas de estuário. Estas florestas são de grande importância para estes animais, porque criam micro-habitats adequados nos quais podem prosperar. As raízes das árvores absorvem água quando chove, liberando-a depois lentamente no meio ambiente. Quando se devasta floresta para dar lugar à agricultura, os rios tendem a encher-se delimo, a água escoa rapidamente, os cursos de água podem secar na estação seca e pode haver inundações na estação húmida. A destruição doshabitats florestais é provavelmente uma ameaça maior para os crocodilianos do que acaça.[80]
Os crocodilianos adultos são tipicamenteterritoriais e solitários. Os indivíduos podem defender os locais onde apanham sol, os sítios de nidificação, zonas de alimentação, resguardos e sítios onde passam o Inverno. Os machos dos crocodilos-de-água-salgada estabelecem territórios anuais que abrangem vários locais de nidificação das fêmeas. Algumas espécies são ocasionalmente gregárias, especialmente durante as secas, quando vários indivíduos se reúnem nos sítios com água remanescente da seca. Os indivíduos de algumas espécies podem partilhar sítios para apanhar sol em certos momentos do dia.
Crocodilo-do-nilo emboscando umgnu em migração enquanto atravessa orio Mara
São animais fundamentalmentecarnívoros, e as dietas das diferentes espécies podem variar com relação à forma do focinho e a agudeza dos dentes. As espécies com dentes afiados e focinhos delgados e compridos, como o gavial e o crocodilo-de-água-doce-australiano, estão especializadas para comer peixes, insectos e crustáceos, enquanto que as espécies com focinhos muito largos e dentes grossos, como o aligátor da China e o caimãoC. latirostris, especializaram-se a comer moluscos com conchas duras. As espécies com focinhos e dentes com características intermédias entre as outras duas, como o crocodilo-de-água-salgada e o aligátor-do-mississippi, têm dietas generalizadas e oportunisticamente comem invertebrados, peixes, anfíbios, outros répteis, aves e mamíferos.[12][81] Embora sejam essencialmente carnívoros, várias espécies foram observadas a comer frutas, pelo que podem exercer um importante papel na dispersão desementes nos seushabitats.[82]
Em geral, os crocodilianos são predadores de vigia e emboscada,[12] ainda que as estratégias de caça dependam da espécie e das presas que vão caçar. As presas terrestres são vigiadas na beira da água e depois agarradas e afogadas na água.[20][83] Os gaviais e outras espécies piscívoras movem lateralmente as suas mandíbulas de um lado para o outro para capturar as presas e estes animais podem saltar da água a uma altura considerável para caçar aves, morcegos, e peixes saltadores.[81] Os animais pequenos podem ser mortos com traumatismos cervicais assim que o predador sacode a cabeça.[83] Os caimões usam as suas caudas e corpos para conduzir os peixes para águas pouco profundas.[20] Também escavam para recolher invertebrados que se encontram enterrados nos fundos,[14] e oPaleosuchus trigonatus pode inclusive caçar em terra.[12] Algumas espécies foram observadas fazendo uso de paus e ramos para atrair aves que estão a construir ninhos.[84] Os crocodilos-do-nilo caçam cooperativamente,[20] e vários indivíduos podem alimentar-se de uma mesma carcaça. A maioria das espécies come qualquer coisa apropriada que esteja ao seu alcance e é também denecrófaga oportunista.[14]
Um gavial a comer um peixe
Os crocodilianos são incapazes de mastigar e têm que engolir a comida inteira, pelo que as presas que são muito grandes devem ser despedaçadas. São incapazes de comer um animal grande com uma pele grossa, e podem aguardar até que esta apodreça e se torne simples de rasgar.[81] Para rasgar um pedaço de carne duma grande carcaça, um crocodiliano gira o seu corpo continuamente enquanto o agarra com as mandíbulas, uma manobra conhecida como o "rolo da morte".[85] Durante a alimentação cooperativa, alguns indivíduos podem manter a presa fixa, enquanto que outros realizam os giros. Os animais não lutam nesse momento, e cada um retira-se com um pedaço de carne e espera pela sua vez de se alimentar. Normalmente alimentam-se com a cabeça fora da água.[86] A comida é segurada com as pontas das mandíbulas e atirada para a parte de trás da boca com uma sacudidela da cabeça para cima e depois engolida.[83] Os crocodilos-do-nilo podem armazenar carcaças debaixo d'água para consumo posterior.[14]
Uma progenitora aligátor-do-mississippi com o seu ninho e crias
Os crocodilianos são geralmentepolíginos, e cada macho acasala com tantas fêmeas quanto possa.[87] É possível observarem-se casaismonogâmicos em aligátores-do-mississippi.[88] Os machosdominantes patrulham e defendem territórios que contêm várias fêmeas. Os machos de algumas espécies, como o aligátor-do-mississippi, atraem as fêmeas com um elaboradocortejo sexual. Durante o cortejo, os machos e fêmeas podem esfregar-se um contra o outro, dar voltas ao redor um do outro e realizar exibições de natação. O coito ocorre normalmente na água. Quando a fêmea está pronta para acasalar, ela arqueia as suas costas enquanto mergulha a cabeça e a cauda. O macho esfrega o pescoço da fêmea e depois agarra-a com as suas patas traseiras, posicionando a sua cauda sob a dela para que as cloacas fiquem alinhadas e o seu pénis possa penetrar a fêmea. O acasalamento pode durar até 15 minutos, durante os quais o casal mergulha e regressa à superfície num processo que se repete continuamente.[87] Embora os machos dominantes geralmente monopolizem as fêmeas reprodutoras, sabe-se que existe paternidade múltipla nos aligátores-do-mississippi, em que até três machos podem gerar descendência numa única ninhada. Um mês depois do acasalamento, a fêmea começa a construir oninho.[20]
Ovos do crocodilo-do-nilo
Dependendo da espécie, as fêmeas podem construir ninhos em forma de buracos ou montes,[20] estes últimos feitos de vegetação, folhas caídas, areia ou material dosolo.[71] Constroem os ninhos perto das suas tocas ou covas. Os ninhos de diferentes fêmeas podem esporadicamente ficar bastante próximos, particularmente em espécies que nidificam em buracos. O número de ovos de uma ninhada pode variar entre dez a cinquenta. Os ovos estão protegidos por duras cascas feitas decarbonato de cálcio. O período de incubação é de dois ou três meses.[20] A temperatura de incubação determina o sexo das crias. As temperaturas constantes no ninho acima de 32 °C (90 °F) produzem mais machos, enquanto que temperaturas abaixo de 31 °C (88 °F) produzem mais fêmeas. Porém, o sexo dos crocodilianos pode ser determinado num intervalo muito curto, e os ninhos estão submetidos a mudanças de temperatura; como consequência, a maioria dos ninhos naturais produzem crias dos dois sexos, embora possa também haver ninhadas que deem origem a um só sexo.[71]
As criações podem eclodir todas numa só noite.[89] Os crocodilianos são únicos entre os répteis pela grande quantidade de cuidados parentais que prestam às crias.[20] A mãe ajuda a desenterrar as crias do ninho e transporta-as para a água na sua boca. As crias acabadas de eclodir reúnem-se e permanecem perto da progenitora.[90] No jacaré-de-óculos dos Llanos venezuelanos, várias progenitoras deixam as suas crias numa mesma creche, e uma das mães fica de vigia.[91] As crias de muitas espécies tendem a apanhar sol em grupo durante o dia e dispersam-se durante a noite para se alimentarem.[89] O tempo que demoram para atingirem a idade de independência pode variar. Nos aligátores-do-mississippi, os grupos de jovens associam-se a adultos durante um ou dois anos, enquanto que os crocodilos-de-água-salgada e do-nilo juvenis tornam-se independentes em poucos meses.[20]
A vida social dos crocodilos começa ainda quando estão dentro do ovo, porque as crias começam a comunicar-se entre si antes de eclodirem. Comprovou-se que um leve ruído de repeniques que se faça perto do ninho é repetido pelas crias, uma após a outra. Esta comunicação precoce pode ajudá-las a eclodir simultaneamente. Depois de saírem do ovo, um jovem produz gemidos e grunhidos espontaneamente ou como resultado de estímulos externos e inclusive adultos não aparentados respondem rapidamente a chamadas de angústia dos jovens.[89]
As vocalizações são frequentes quando os jovens se dispersam, e de novo quando se reúnem pela manhã. Os adultos que estão nas proximidades, provavelmente os pais, também dão sinais de aviso na presença de predadores ou alertam as crias sobre a presença de comida. O índice e quantidade de vocalizações varia com a espécie. Os aligátores são os mais ruidosos, enquanto que algumas espécies de crocodilos são quase completamente silenciosas. As fêmeas adultas decrocodilo-da-nova-guiné e docrocodilo-siamês rugem quando se aproxima outro adulto, enquanto que os crocodilos-do-nilo grunhem ou bramem numa situação parecida. O aligátor-do-mississippi é excepcionalmente ruidoso; emite uma série de cerca de sete bramidos ou urros guturais, cada um com um par de segundos, em intervalos de dez segundos.[89] Também faz vários grunhidos e bufos. Os machos produzem vibrações na água para enviar sinaisinfrassónicos que servem para atrair as fêmeas e intimidar os machos rivais.[92] Uma protuberância maior situada na extremidade do focinho do macho dogavial pode servir como ressoador dos sons.[93]
Outra forma de comunicação acústica são os golpes com a cabeça. Estes normalmente começam quando o animal, estando na água, ergue o focinho e mantém-se quieto. Passado algum tempo, abre consideravelmente as mandíbulas e depois fecha-as de repente como se estivesse a morder, o que provoca um forte ruído, e isto é imediatamente seguido por um forte golpe contra a água, depois do qual pode mergulhar a cabeça e produzir muitas borbulhas. Algumas espécies em seguida rugem, enquanto que outras dão pancadas na água com as suas caudas. Os episódios de golpear com a cabeça estendem-se a todo o grupo. O propósito deste comportamento varia, mas parece estar associado com a manutenção de relações sociais, sendo também utilizado no cortejo.[89] Os indivíduos dominantes podem ainda exibir o seu tamanho corporal enquanto nadam na superfície de água, e um subordinado submete-se colocando a cabeça num ângulo agudo com as mandíbulas abertas antes de se retirar para baixo de água.[20]
A taxa de mortalidade dos ovos e crias é elevada, e os ninhos enfrentam perigos como inundações, sobreaquecimento e predação.[20] As cheias dos rios são a principal causa do insucesso reprodutivo dos crocodilos, uma vez que os ninhos ficam alagados, o desenvolvimento dos embriões fica privado de oxigénio ou as crias podem ser varridas pelas águas.[80] Vários predadores, tanto mamíferos quanto reptilianos, podem invadir ninhos e comer ovos de crocodilos. Um dos principais predadores dos ovos de aligátores da Flórida é omapache, que é atraído por rastos olfactivos. O urso-negro-da-flórida (Ursus americanus floridanus) também saqueia os ovos de aligátor.[94][95] Na África, asmangustos,rateis,babuínos,lontras, ossuínosPhacochoerus ePotamochoerus larvatus e a hienaCrocuta crocuta são muito aficcionados em comer ovos de crocodilos, mas considera-se que o varano monitor (Varanus) é o principal saqueador. Osvaranídeos são também o maior perigo para os ovos na Ásia, onde dentre outros predadores de ovos se incluem ascivetas, mangustos,ratos, o ursoMelursus ursinus,chacais ecães.[94]
A despeito dos cuidados maternais que recebem, as crias são muitas vezes predadas.[96] Enquanto as fêmeas transportam sucessivamente algumas crias para a zona do berçário, outras esperam no ninho e são capturadas pelos predadores que têm acesso ao ninho. As crias são uma fonte de comida para a maioria dos animais que se alimentam de ovos, e estão também sujeitas a ataques aquáticos portartarugas, peixes eserpentes. As aves de rapina também provocam baixas, e em todas as desovas pode haver indivíduos mal-formados, o que aumenta a probabilidade de não sobreviverem.[94] No norte da Austrália, a taxa de sobrevivência das criações do crocodilo-de-água-salgada é de apenas 25%, mas a cada ano que sobrevivam a taxa aumenta, podendo alcançar os 60% no quinto ano. As taxas de mortalidade são bastante baixas nos sub-adultos e adultos, embora ocasionalmente sejam capturados por grandes felinos e serpentes.[96] Ojaguar[97] e alontra gigante[98] podem caçar caimões na América do Sul. Noutras partes do mundo, oselefantes ehipopótamos podem matar crocodilos como auto-defesa.[20] Não é consensual entre a comunidade científica sobre se existe muitocanibalismo nos crocodilos. Os adultos não comem normalmente a sua própria descendência, mas existem evidências de que os sub-adultos se alimentam de jovens e de que adultos atacam os sub-adultos. Nos crocodilos-do-nilo, os machos rivais por vezes matam outros durante a época reprodutiva.[94]
O crescimento das crias e jovens depende da disponibilidade de comida, e a maturação sexual está mais relacionada com o comprimento do que com a idade. Os crocodilos de-água-salgada chegam à maturidade quando têm entre 2,2 e 2,5 m, enquanto que os machos maduram aos 3 m. Os crocodilos australianos de água doce demoram dez anos em alcançar a maturidade ao atingirem os 1,4 m. Os caimões-de-lunetas maduram antes, alcançando a maturidade com 1,2 m, entre os quatro e sete anos.[87] Os crocodilianos continuam a crescer durante toda a sua vida. Os machos especialmente continuam a aumentar de peso à medida que se tornam mais velhos, mas isto deve-se principalmente a um aumento de gordura na barriga mais do que a um aumento no comprimento.[99] Os crocodilianos podem viver entre 35 e 75 anos, e a sua idade pode ser determinada pelos anéis de crescimento dos seusossos.[87][99]
Como são predadores muito eficazes, os crocodilos costumam enquadrar-se na parte superior da cadeia alimentar dos seus ambientes aquáticos.[81] Os ninhos na forma de monte construídos por algumas espécies de crocodilos são utilizados por outros animais para os seus próprios interesses. Os montes da nidificação do aligátor-do-mississippi são utilizados por tartarugas e serpentes, tanto para apanhar sol sobre eles como para depositar os seus próprios ovos.[100] A tartaruga-da-flóridaPseudemys nelsoni especializou-se nisso, e os ninhos de aligátor podem ter várias postas de ovos de tartarugas em incubação em conjunto com os ovos do proprietário do ninho. Os aligátores modificam algunshabitats de zonas húmidas em áreas planas como asEverglades construindo pequenas lagoas chamadas "buracos de aligátores", que criamhabitats mais húmidos ou mais secos para outros organismos, como plantas, peixes, invertebrados, anfíbios, répteis e mamíferos. Nas depressões calcárias dos pântanos dos ciprestesTaxodium, os buracos de aligátores costumam ser grandes e profundos. Nas pradarias de marga e clareiras rochosas são geralmente pequenos e pouco profundos, enquanto que nas depressões turfosas das zonas húmidas de pântanos e várzeas são mais variáveis. Os buracos feitos pelo homem não parecem ter um efeito tão significativo.[101]
Na bacia doAmazonas, quando os caimões se tornaram escassos devido à caça excessiva em meados doséculo XX, o número de peixes locais, como o importantepirarucu (Arapaima gigas), também diminuiu. Estas são águas pobres em nutrientes, e a urina e fezes dos caimões podem aumentar a produção primária ao contribuírem com nutrientes para o crescimento vegetativo. Assim, a presença destes répteis poderia beneficiar as populações de peixes,[102] uma vez que parece haver uma correlação entre o número de crocodilos num trecho do rio e a população de peixes.[103]
A principal característica distintiva dostetrápodesdiápsidos é a presença de duas aberturas (fenestras temporais) em cada lado do crânio por trás dos olhos. Os diápsidos vivos são os crocodilos, lagartos, serpentes, tuataras e aves.[104] As características que distinguem os arcossauros doutros diápsidos estão na presença de um par extra de aberturas no crânio (Fenestra anterorbital) na frente das cavidades oculares. Archosauria é ogrupo coroa que contém oancestral comum mais recente dos crocodilos e aves e todos os seus descendentes. Compreende ospseudossúquios (Pseudosuchia, os "falsos crocodilos") e osOrnithosuchia, que por sua vez compreendem osdinossauros e os seus parentes, ospterossauros e as aves.[105]Pseudosuchia define-se como o grupo dos crocodilos vivos e todos os arcossauros mais estreitamente relacionados com os crocodilos do que com as aves. Acredita-se que a separação entre pseudossúquios e aves ocorreu perto da grandeextinção do Permiano-Triássico.[106] Os crocodilos modernos perderam as fenestras anteorbitais,[107] porém estas estavam presentes na maioria dos seus ancestrais fósseis na forma de pequenas aberturas.[108]
Oscrocodilomorfos são os únicospseudossúquios que sobreviveram à grandeextinção do Triássico-Jurássico há 201,3 milhões de anos. Durante o inicio doJurássico, os dinossauros tornaram-se dominantes em terra, e os crocodilos sofreram uma grandediversificação adaptativa para preencher osnichos ecológicos que acabaram por desocupar os grupos recentemente extintos. As evidências fósseis que foram aparecendo indicam que os crocodilomorfos doMesozoico tinham uma diversidade muito maior de formas do que os crocodilos modernos. Alguns converteram-se em pequenos insectívoros mais velozes, outros empiscívoros especializados, e outros emcarnívoros marinhos e terrestres, e alguns converteram-se emherbívoros.[109] A etapa inicial da evolução dos crocodilos consistiu no aparecimento dosprotossúquios, que evoluíram no Triássico tardio e início do Jurássico. Foram seguidos pelosmesossúquios, que se diversificaram muito durante o Jurássico e oTerciário. Outro grupo, oseussúquios, surgiu noCretáceo tardio, há 80 milhões de anos, e compreende todos os crocodilos hoje vivos.[108]
Os protossúquios eram animais pequenos, principalmente terrestres, com focinhos curtos e patas compridas. Tinham uma armadura óssea formada por duas fileiras de placas que se estendiam desde a cabeça até à cauda, armadura esta que a maioria dos crocodilos modernos ainda conserva. As suas vértebras eram convexas nas duas principais superfícies da articulação, e os seus palatos ósseos estavam pouco desenvolvidos. Os mesossúquios sofreram a fusão dosossos palatinos para formar um palato ósseo secundário e uma grande extensão das passagens nasais até perto dosossos pterigoides. Isto permitia que o animal respirasse através dos seus orifícios nasais com a boca aberta embaixo da a água. Os eussúquios continuaram este processo no qual os seus orifícios nasais interiores agora se abriam a partir duma abertura nos ossos pterigoides. As vértebras dos eussúquios tinham uma superfície de articulação côncava e outra convexa, o que permitia que funcionassem como uma articulação de tipoesferoidal entre as vértebras, dando-lhes uma maior flexibilidade e força.[108] O eussúquio mais antigo conhecido é oHylaeochampsa vectiana do Cretáceo inferior dailha de Wight noReino Unido.[110] A estes seguem-se crocodilos como osPristichampsidae, chamados 'crocodilos com cascos', do Paleogeno.[111] Um género que viveu durante o Cretáceo e oPaleogeno foiBorealosuchus da América do Norte, com seis espécies conhecidas, embora a sua posiçãofilogenética não tenha sido determinada com segurança.[112]
Os três ramos primários dosCrocodilia divergiram no final doMesozoico. Os membros mais antigos conhecidos do grupo são os aligatorídeos e gavialídeos que viviam na América do Norte e Europa durante oCampaniano (entre 83,6 e 72,1 milhões de anos atrás). Embora os primeiros crocodiloides conhecidos tenham aparecido noMaastrichtiano (entre 72,1 e 66,0 milhões de anos atrás), essa linhagem deve ter estado presente durante o Campaniano, e entre os aligatoroides e gavialoides mais antigos existem formas muito derivadas, o que indica que o momento da verdadeira divergência entre as três linhagens teve que ser anterior ao Campaniano.[113]
As relaçõesfilogenéticas dos crocodilos foram muito discutidas e os resultados contraditórios. Muitos estudos e os seuscladogramas resultantes, ou "árvores genealógicas" dos crocodilos, apontam que as famílias de "focinhos curtos" dosCrocodylidae eAlligatoridae tinham um parentesco próximo, enquanto que osGavialidae com focinhos longos são um ramo divergente da árvore. O grupo resultante de espécies de focinho curto, nomeadoBrevirostres, era apoiado principalmente por estudos que analisavam somente as características esqueléticas.[114]
Em 2012, Ericksonet al. elaboraram uma filogenia formada a partir dasequenciação do ADN para dar um cladograma demáxima verossimilhança das relações entre os crocodilianos vivos (excluindo ojacaré-do-pantanal, para o qual não havia evidências deADN disponíveis). Neste estudo, rejeitou-se a existência dum grupo diferenciado de Brevirostres, e os gavialídeos de focinho longo estavam mais relacionados com os crocodilos do que com os aligátores.[12]
Existem duas espécies de gavialídeos vivas. Os gaviais podem ser reconhecidos pelo seu comprido e estreito focinho, com uma protuberância na extremidade nos machos. São raros e só se encontram no sul da Ásia.[20]
Os Alligatoridae existentes são duas espécies do género Alligator e seis espécies de caimões agrupados em três géneros. Podem distinguir-se pelo seu focinho largo, no qual o quarto dente da mandíbula inferior não se pode ver quando fecham a boca.[20]
Os Crocodylidae existentes são doze espécies classificadas no género Crocodylus e mais duas espécies classificadas em dois géneros monoespecíficos. Têm uns focinhos muito diversos, mas podem distinguir-se porque o quarto dente da mandíbula inferior é visível quando fecham a boca.[20]
Vista aérea de uma quinta para criação de crocodilos noCamboja
Os aligátores e crocodilos foram criados em quintas pela primeira vez em inícios doséculo XX, mas as instalações utilizadas eram de tipozoo e a sua principal fonte de renda era aatracção turística. Nos inícios da década de 1960, a viabilidade da criação em cativeiro destes répteis à escala comercial foi investigada como resposta ao declínio de muitas espécies de crocodilos em todo mundo. Uma modalidade de criação consiste na criação em fazendas, que implica cruzar e criar animais em cativeiro de maneira autossuficiente, enquanto que outro tipo é a criação na qual se usam os ovos, juvenis ou adultos que se recolhem a cada ano na natureza selvagem. As organizações comerciais devem satisfazer os critérios daConvenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Fauna e da Flora Silvestres Ameaçadas de Extinção (CITES, pelas suas siglas em inglês), demonstrando que, na área em questão, não provocam um impacto negativo sobre as populações selvagens.[115]
A criação em fazendas de aligátores e crocodilos começou pela grande demanda das suas peles, mas agora quase todas as partes do animal podem ser comercializadas. A parte do ventre e os costados são os que produzem uma pele de melhor qualidade, a carne come-se, as vesículas biliares são muito valorizadas no leste da Ásia, e as cabeças são por vezes transformadas em adornos.[116] Namedicina tradicional chinesa, diz-se que a carne de aligátor cura o catarro comum e previne o aparecimento de cancro, enquanto que acredita-se que os vários órgãos internos possuam propriedades medicinais.[117]
Os crocodilos são predadores oportunistas que estão entre os mais perigosos dentro e à beira da água. São conhecidas oito espécies particularmente perigosas que atacam a pessoas e podem fazê-lo para defender os seus territórios, os seus ninhos ou crias; por engano podem atacar animais domésticos como cães; ou mesmo para conseguir comida, uma vez que os crocodilos maiores podem capturar presas tão grandes ou maiores do que os humanos. As espécies sobre as quais existem mais dados são ocrocodilo-de-água-salgada, ocrocodilo-do-nilo e oaligátor-do-mississippi. Outras espécies que por vezes também atacam humanos são ocaimão-preto, ocrocodilo-de-morelet, ocrocodilo-persa, ocrocodilo-americano, ogavial e ocrocodilo-de-água-doce-australiano.[118]
Sinal que adverte para o perigo de aligátores na Flórida
O crocodilo-do-nilo tem a reputação de ser o maior assassino dos grandes animais, incluindo de humanos, no continente africano. Está amplamente distribuído, encontra-se em muitoshabitats e tem coloraçãocríptica. A partir duma posição de espera e com apenas os olhos e orifícios nasais acima da água, pode atacar os animais que vão beber, pescadores, banhistas ou pessoas que vão apanhar água ou lavar a roupa. Assim que agarra as suas presas e as arrasta para a água, a vítima tem poucas possibilidades de escapar. A análise dos ataques mostra que a maioria dá-se durante a época reprodutiva ou quando os crocodilos defendem os seus ninhos ou crias.[119] Embora não se tenha conhecimento de muitos dos ataques, estima-se que aconteçam cerca 300 por ano, 63% dos quais são mortais.[118] Os crocodilos-de-água-salgada selvagens da Austrália fizeram 62 ataques confirmados e não provocados causando lesões ou morte entre 1971 e 2004. Estes animais causaram também mortes na Malásia, Nova Guiné e noutros lugares. São muito territoriais e incomodam-se com a intromissão nos seus territórios de outros crocodilos, humanos ou barcos e canoas. Os ataques podem proceder de animais de vários tamanhos, mas os machos grandes são geralmente os principais responsáveis pelas mortes. À medida que o seu tamanho aumenta, também aumenta a sua necessidade de comer grandes mamíferos, como porcos, vacas, cavalos e humanos, os quais se enquadram todos dentro do tamanho que procuram. A maioria das pessoas atacadas ou estavam a nadar ou a atravessar rios, porém houve dois casos que estavam a dormir nas suas tendas.[120]
Foram registados 242 ataques a humanos não provocados por aligátores-do-mississippi entre 1948 e meados de 2004, causando dezasseis mortes. Dez destas vítimas estavam na água e duas em terra; as circunstâncias dos outros quatro não são conhecidas. A maioria dos ataques ocorre nos meses quentes do ano, embora naFlórida, com o seu clima mais quente, os ataques possam surgir em qualquer época do ano.[118] Os aligátores são considerados menos agressivos do que os crocodilos-de-água-salgada ou do-nilo,[121] mas o aumento da densidade da população humana nos Everglades fez com que as pessoas e os aligátores vivam em estreita proximidade, o que aumenta o risco de ataque.[118][121] Inversamente, naMauritânia, onde o crescimento dos crocodilos fica gravemente atrofiado pelas condições áridas do lugar, as pessoas dali nadam com eles sem serem atacadas.[77]
Várias espécies de crocodilianos são tratadas comomascotes exóticas. São atractivos quando são pequenos, e os proprietários de tendas de animais podem vendê-los facilmente, no entanto, quando os crocodilos crescem muito tornam-se perigosos e bastante dispendiosos para manter. Quando envelhecem, os crocodilos mascotes são com frequência abandonados pelos seus donos, havendo populações de caimões-almiscarados que regressaram à vida selvagem nos Estados Unidos e Cuba. A maioria dos países possui regulamentos rígidos que devem ser cumpridos para se poder utilizar estes répteis como mascotes.[122]
O sangue de aligátores e crocodilos contémpéptidos com propriedadesantibióticas. Isto pode contribuir para a produção de futurosmedicamentos antibacterianos.[123]
Bolsa feita com a pele dum crocodilo anão da África ocidental (Osteolaemus tetraspis) no Museu de História Natural de Londres
A principal ameaça dos crocodilos em todo mundo são as actividades humanas, como a caça e a destruição do seuhabitat. Já na década de 1970, comercializavam-se mais de dois milhões de peles de crocodilos selvagens de diversas espécies, causando uma redução da maioria das populações de crocodilos, em alguns casos levando quase à extinção. Desde 1973 aCITES tentou impedir o tráfico das partes do corpo de animais em perigo, como a pele dos crocodilos. Isto era problemático na década de 1980, uma vez que os crocodilos eram abundantes e perigosos para os humanos nalgumas partes da África, e era ilegal caçá-los. NaConference of the Parties celebrada emBotswana em 1983, argumentou-se em nome das pessoas locais prejudicadas que era razoável vender as peles caçadas dentro da lei. Em finais da década de 1970, os crocodilianos começaram a ser criados em fazendas em diferentes países, que começavam por recolher ovos na natureza. Na década de 1980, as peles de crocodilos cultivadas foram produzidas em número suficiente para destruir o comércio ilegal de crocodilos selvagens. Em 2000, trinta países comercializavam peles de doze espécies de crocodilos, tanto capturados na natureza como criados em cativeiro, e o tráfico ilegal do produto praticamente desapareceu.[124]
Gavial juvenil na Reserva Florestal de Kukrail
Ogavial sofreu um declínio crónico a longo prazo combinado com um rápido declínio a curto prazo, pelo que acabou por figurar na lista da IUCN de espécies "em perigo crítico". Em 1946, a população de gaviais aumentou para entre 5 000 e 10 000 exemplares; mas em 2006, diminuiu para entre 96 e 98%, ficando reduzida a um pequeno número de subpopulações muito separadas de menos de 235 indivíduos. Este declínio a longo prazo teve diversas causas, incluindo a recolha de ovos e a caça para amedicina indígena. O rápido declínio de 58% entre 1997 e 2006 foi causado por um aumento do uso deredes de emalhar e a perda dohabitat das ribeiras fluviais.[125] A população do gavial continua a estar sob ameaça por perigos ambientais como a contaminação pormetais pesados e a infestação porprotozoáriosparasitas,[126] mas em 2013 a população aumentou devido à protecção dos ninhos contra predadores dos ovos.[127] O jacaré-da-china estava historicamente espalhado por todo o leste do sistema do rio Yangtzé, mas actualmente encontra-se restrito a algumas áreas do sudeste da província deAnhui devido àfragmentação dohabitat e à sua degradação. Acredita-se que a população selvagem exista apenas em pequenas lagoas fragmentadas. Em 1972, a espécie foi declarada em perigo de extinção de classe I pelo governo chinês e recebe a máxima protecção legal. Desde 1979, estabeleceram-se programas de criação em cativeiro na China e América do Norte, tendo sido criada uma população saudável em cativeiro.[128] Em 2008, os aligátores criados noZoológico do Bronx foram reintroduzidos com sucesso nailha de Chongming.[129] Ocrocodilo-filipino é talvez o crocodilo mais ameaçado e a IUCN considera-o em perigo crítico. A caça e os hábitos de pesca destrutivos reduziram a sua população para cerca de 100 indivíduos em 2009. Nesse mesmo ano foram libertados na natureza 50 destes crocodilos criados em cativeiro para ajudar a aumentar a população. O apoio por parte das pessoas locais é crucial para a sobrevivência da espécie.[130]
Oaligátor-do-mississippi sofreu um sério declínio devido à caça e perda dehabitat em toda a sua área de distribuição, tendo sido considerado sob ameaça de extinção. Em 1967 foi incluído na lista de espécies em perigo, mas oServiço de Vida Selvagem e Pesca dos Estados Unidos e as agências de vida selvagem estatais dosul dos Estados Unidos deram importantes passos para trabalhar na sua recuperação. A protecção legal permitiu à espécie recuperar-se, e em 1987 retiraram-na da lista de espécies em perigo.[131] Foram feitas muitas investigações sobre a criação de aligátores noRefúgio de Vida Selvagem Rockefeller, uma grande área pantanosa do estado deLuisiana.[132] Os dados resultantes aprimoraram o conhecimento sobre os currais, taxas de população, incubação dos ovos, eclosão, criação e dieta, e esta informação foi utilizada noutros estabelecimentos similares de todo mundo. A renda pela criação de aligátores neste refúgio de vida selvagem contribui para a conservação das zonas pantanosas. Um estudo examinando as fazendas de aligátores nos Estados Unidos mostrou que geraram benefícios significativos para a conservação, e acaça furtiva de aligátores selvagens diminuiu muito.[133]
Os crocodilos desempenham importantes papéis em mitos e lendas de várias culturas do mundo e podem até ter inspirado histórias sobre dragões.[134] Nareligião egípcia antiga,Ammit, o devorador demoníaco das almas indignas, eSuco, o deus do poder, da protecção e da fertilidade, são representados ambos com cabeça de crocodilo. Isto reflecte a visão que tinham noantigo Egito do crocodilo como predador aterrorizante e parte importante doecossistema doNilo. O crocodilo era um dos animais que os egípcios mumificavam.[135] Os crocodilos estavam associados com várias deidades aquáticas dos povos da África ocidental.[136] Durante a época doImpério do Benim, os crocodilos eram considerados os "polícias das águas" e simbolizavam o poder do rei ou oba de castigar os criminosos.[137] OLeviatã descrito noLivro de Jó pode ter sido baseado num crocodilo.[138] NaMesoamérica, osastecas tinham um deus crocodilo da fertilidade chamadoCipactli que protegia as colheitas. Namitologia asteca, a deidade terrestreTlaltecuhtli era por vezes representada como monstro parecido com um crocodilo.[139] Acivilização maia também associava os crocodilos com a fertilidade e a morte.[140]
Ogavial aparece em contos folclóricos da Índia. Numa história, um gavial e um macaco tornam-se amigos quando o macaco dá fruta ao gavial. A esposa do gavial pediu que o seu marido lhe trouxesse o macaco para comer, achando que a fruta faria com que o coração do macaco ficasse doce. O gavial acedeu ao pedido e tratou de atrair o macaco para sua casa, mas acabou por lhe confessar o seu plano. A sua amizade terminou depois disso.[141] Existem histórias similares em lendas dosnativos americanos dos Estados Unidos, e no conto folclóricoafro-americano dum aligátor e ocoelho Br'er.[142]
Num conto folclóricomalaio, ocervo-rato Sang Kancil queria cruzar um rio para chegar às árvores fruteiras da outra margem, mas o crocodilo Sang Buaya estava no rio à espera para comê-lo. Sang Kancil pediu a todos os crocodilos que formassem uma fileira de um lado ao outro do rio para que os pudesse contar para o rei, e fê-los prometer que não o comeriam enquanto os contava. Então foi passando caminhando sobre as suas cabeças, dizendo "Um! Dois! Três!" conforme ia passando. Quando chegou ao outro lado da margem, agradeceu-lhes por ajudar-lhe a cruzar o rio, e poder banquetear-se com frutas. Sang Buaya não se saiu tão bem, uma vez que os outros crocodilos incomodaram-se com o facto de ele permitir que Sang Kancil os enganasse.[143] Uma lenda deTimor-Leste conta como uma criança resgata um gigantesco crocodilo que ficou preso. Em recompensa, o crocodilo protegeu-a durante o resto da sua vida, e quando o crocodilo morreu, o seu dorso de cristas escamosas converteu-se nas montanhas de Timor.[144] Uma história australiana doTempo do Sonho conta como um crocodilo ancestral possuía todo o lume só para ele. Um dia, um "pássaro do arco da velha" roubou uns paus a arder ao crocodilo e deu-o aos humanos. Por isso agora o crocodilo vive na água.[145] Em alguns povos de Nova Guiné o crocodilo é parte importante das suas lendas e crenças, e os homens marcam a sua pele com escarificações imitando a pele do crocodilo.[146]
Crocodilo no bestiário medieval chamado Bestiario de Rochester, de finais doséculo XIII
As histórias antigas descrevem os crocodilos desde dos primeiros registos históricos, embora geralmente essas descrições contenham mais lendas do que factos. O historiador gregoHeródoto (c.440 a.C.) descreveu o crocodilo em detalhe, apesar de grande parte dessa descrição ser fantasiosa; afirmava que deixava a boca aberta para permitir que uma ave "trochilus" (possivelmente umPluvianus aegyptius) entrasse nela para tirar-lhe assanguessugas que encontrava.[147] O crocodilo foi uma das bestas descritas em finais doséculo XIII noBestiário de Rochester, baseado em fontes clássicas, como aHistória Natural dePlínio, o Jovem (c. 79)[148] e asEtimologiae deIsidoro de Sevilha.[149][150] Isidoro afirmava que o crocodilo se chamava assim pela sua cor açafrão (em latimcroceus, 'açafrão'), e que geralmente chegava aos vinte cóvados (10 m) de comprimento. Também dizia que o crocodilo podia ser morto por peixes com as cristas serradas que o cortassem pelo seu tenro ventre, e que o macho e a fêmea se viravam para guardar os ovos.[151]
Desde oséculo IX que os crocodilos são considerados animais que choram pelas suas vítimas segundo a obraBibliotheca deFócio I de Constantinopla.[152] A história foi repetida em relatos posteriores como o deBartolomeu da Inglaterra noséculo XIII.[153] Era muito conhecida em 1400 quando o viajante inglêsJohn Mandeville escreveu a sua descrição dos "cockodrills":[154]
"Naquele país [o doPreste João] e por toda Ind [a Índia] existe uma grande quantidade de crocodilos, que são da forma duma longa serpente, como dito antes. E de noite vivem na água, e de dia em terra, em rochas e covas. E não comem nenhuma carne todo o inverno, mas antes descansam como num sono, tal como as serpentes. Estas serpentes matam homens, e comem-nos chorando; e quando os comem movem a mandíbula superior, e não a inferior, e não possuem língua."[154]
"In that country [of Prester John] and by all Ind [India] be great plenty of cockodrills, that is a manner of a long serpent, as I have said before. And in the night they dwell in the water, and on the day upon the land, in rocks and in caves. And they eat no meat in all the winter, but they lie as in a dream, as do the serpents. These serpents slay men, and they eat them weeping; and when they eat they move the over jaw, and not the nether jaw, and they have no tongue."
Crocodilo agarrando a tromba do Filho do elefante numa dasJust sob stories (Contos de assim foi) deRudyard Kipling. Ilustração de Kipling, 1902
Os crocodilianos, especialmente o crocodilo, foram personagens que apareceram recorrentemente em contos para crianças durante toda a era moderna.Lewis Carroll emAlice no País das Maravilhas (1865) incluiu o poemaHow Doth the Little Crocodile,[155] uma paródia de um poema moralista deIsaac Watts intituladoAgainst Idleness and Mischief ("Contra a ociosidade e ruindade").[156] No romance deJ. M. Barrie,Peter and Wendy (1911), a personagem docapitão Gancho perdera o seu braço por culpa de um crocodilo. Gancho temia os crocodilos, mas era advertido se algum deles se aproximasse pelo tictac de um relógio que trazia.[157] NosJust sob Stories (~Contos de assim foi) deRudyard Kipling (1902), a personagem do Filho do elefante salva a sua tromba da forte mordida do Crocodilo "nas ribeiras do granderio Limpopo gorduroso e verde-cinza".[158]Roald Dahl, na obra de 1978The Enormous Crocodile ("O enorme crocodilo"), ilustrada porQuentin Blake, conta como um crocodilo vagueava pela selva à procura de crianças para comê-las, tentando todo o tipo de truques.[159]
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