A palavraberbere, incorporada aoportuguês porempréstimo doárabeberber (derivado deber 'homem' com interferência dolatimbarbărus), perdeu muito cedo o seu sentido primeiro de "estrangeiro àcivilização greco-romana". Ela designa hoje umgrupo linguístico norte-africano, e os falantes do berbere são indivíduos pertencentes a um conjunto de tribos que falavam ou falam aindadialetos com base comum, alíngua berbere.
No uso corrente, que segue a tradição árabe, o termo berbere é usado para designar o conjunto de populações doMagrebe. No entanto, o uso da palavra para designarraça é errado. Não existe uma raça berbere, e os falantes das línguas berberes pertencem aetnias bem diversas. A observação mais superficial permite diferenciar umcabila, um mzabita e um targui.
As primeiras influências historicamente atestadas foram dosfenícios e, por intermédio desses, dosgregos, mas elas não parecem ter marcado profundamente os berberes. A longa dominaçãoromana e, depois, abizantina não foram significativamente mais eficazes. Nunca conseguiram submeter completamente todas as populações berberes, e mesmo as tribos submissas se rebelavam frequentemente.
A civilização romana assimilou ecristianizou uma parcela ínfima dos magrebinos: mesmo os convertidos se associavam acismas para afirmar sua independência.
A língua berbere representa, noNorte da África e até noSaara, a única ligação de uma comunidade de dezenas de milhões de pessoas. No entanto, trata-se de uma comunidade que enfrenta dificuldades de comunicação devido à dispersão dos grupos em imensos territórios.
Na origem, o termo "bárbaro" — dolatimbarbarus, derivado dogrego antigo βάρβαρος,bárbaros ("estrangeiro") — era uma palavra utilizada pelosgregos para designar os outros povos, aqueles cuja língua lhes era incompreensível, ou seja, os não gregos. A palavrabárbaros não tinha, originalmente, nuance pejorativa, significando simplesmente "não grego", aplicando-se a toda pessoa cuja língua não era compreendida pelos gregos ou a alguém que se exprimisse poronomatopeias ("bar-bar"), segundo a percepção dos gregos.
A palavraberbere, parece ter surgido após o fim doImpério Romano. O seu uso no período precedente não é admitido por todos os historiadores da Antiguidade.[22]
Os historiadoresárabes, por sua vez, adotaram a palavra "barbaros"[23] (emárabe:بَربَر, pronúncia: [bærbær]), e os europeus passaram a se referir à costa doNorte da África comoBerbéria (ou Barbaria).
Por volta de 12 mil anos atrás, um grupo populacional doOriente Próximo se fixa no Norte da África, quando o Deserto do Saara ainda era uma savana verde, sendo seus membros os ancestrais dos berberes e dosegípcios.[24][25]
As duas divindades básicas da cosmologia berbere, que são uma figura representando o Sol e uma que representa a Lua, são vagamente análogas às dosantigos egípcios, o que sugere uma origem cultural em comum.[26]
Adesertificação do Saara foi lenta e ocorreu entre oito e cinco mil anos atrás. Logo quando este processo começou, houve a divisão entre os berberes e os egípcios, pois houve um deslocamento dos povos que habitavam o Norte da África: um grupo migra para o Vale doNilo, no atualEgito, e funda aldeias agricultoras e, paulatinamente, surge a civilização egípcia; muitos se deslocam para o litoral norte-africano, região de clima mais agradável e com mais recursos, ali desenvolvendo a agricultura, e os que permaneceram no interior do deserto tiveram que adotar um estilo de vida nômade pastoril, fundando assentamentos temporários nas margens deoásis.[27][28]
Em torno de cinco mil anos atrás, grupos de agricultores daPenínsula Ibérica migram para a região do Magrebe, deixando grande legado genético nos povos berberes locais.[24]
Por volta do século V a.C., alguns povos berberes se fixam nas então inabitadasIlhas Canárias, colonizando-as, assim dando origem aosaborígenes canários, comumente denominados “guanches”.[29]
A presença dos ancestrais dos berberes em tempos pré-históricos é evidente naspinturas rupestres encontradas em sítios comoTassili n'Ajjer, retratando uma biodiversidade abundante, o que indica que, na época em que essa arte foi feita, o Deserto do Saara não era uma área árida, mas sim uma região exuberante e rica em recursos.[26]
Durante a Idade Antiga, osgregos e, em menor medida, osromanos, apelidavam os berberes de líbios, pois a região do Magrebe era conhecida comoLíbia.[26]
A existência de poderosas tribos seminômades no Magrebe foi percebida pelos egípcios desde o século XIII a.C. e algumas entraram em conflito com a civilização do Nilo. No entanto, alguns grupos pediram ajuda dos faraós, devido à fixação de colonos gregos naCirenaica.[26]
No século XII a.C., osfenícios, uma civilização com tradição navegante e comercial oriunda do atualLíbano, começam a estabelecer contatos com os povos do Magrebe, com os quais estabelecem relações comerciais. No século IX a.C., esse povo funda, na atual Tunísia, a cidade deCartago. Acivilização cartaginesa, de forte influência fenícia, no seu auge, dominou também aSicília e partes da Península Ibérica. Mais tarde, se formam reinos berberes nas regiões históricas daNumídia (norte da atual Argélia) e daMauritânia (norte do atual Marrocos).[26]
No século II a.C., os romanos conquistam Cartago e transformam os reinos berberes vizinhos em estados-clientes e, algum tempo mais tarde, esses satélites de Roma se tornam províncias.[26]
No século VII, os califados árabes conquistam o Magrebe e, gradualmente, grande parte dos berberes são islamizados e arabizados.[30]
No início do século VIII, a Península Ibérica éinvadida por berberes convertidos aoIslã, apelidados pelos cristãos demouros. Os reinos ibéricos cristãos, ao longo de séculos, lutam para retomar as terras dominadas pelos muçulmanos, a chamadaReconquista.[31]
A conquista árabe e a conversão dos berberes ao Islamismo, no século VII, determinaram duramente seu destino histórico. Essa conversão se estabeleceu completamente somente noséculo XII. O espírito de independência e a tendência ao puritanismo cultural geralmente reconhecidos nos berberes explicam por que eles foram contra a dominação árabe e a ortodoxia islâmica, mas isso não impediu a forte islamização nem aarabização desses povos.
Mapa da Costa Barbaresca (1630)
A primeira classificação das tribos berberes, válida para a segunda metade doséculo XIV, foi fornecida pelo historiador árabeibne Caldune. A leste se situavam osleuatas daCirenaica, deTripolitânia, doJeride e doAurés, a oeste, osbranês e oszenetas. Estes últimos, grandesnômades conquistadores que chegaram na África do Norte no fim do período bizantino, foram os primeiros a serem arabizados. Os branês, aqueles que se designavam Imazighen (homens livres), seriam os berberes mais antigos. Dentre eles estavam osmasmudas, sedentários do Médio e Grande Atlas, e ossanhajas, divididos em sedentários (cotamas daCabília,Gomaras doRife) e grandes nômades doSaara Ocidental (Lentas,Lantunas,Gazulas).
Essa situação e essa nomenclatura não duraria por muito tempo. A imigração árabe e asinvasões hilalianas reforçaram, ao menos nas regiões abertas, a arabização das tribos berberes cuja maioria renunciaria a seu nome antigo para se juntar a um clã árabe com mais prestígio. Outras tribos, no entanto, geralmente que habitavam as montanhas, como as tribos da Aurès e da Grande Cabília, do Rife e doAtlas, apesar de serem muçulmanos e várias vezes reislamizados pelosmarabutos, conservavam sua língua e seus costumes.
É sobretudo na observação desses costumes que foi revelada a originalidade berbere. Esta se manifesta essencialmente pela existência de um direito costumeiro e de uma organização judiciária não atreladas àreligião. As duas características desse direito berbere eram a promessa coletiva como prova e a utilização de regras e de penalidades conhecidas sob o nome de Iqanun.
Quanto àjustiça, ela era julgada pelos juízes-árbitros e pelas assembleias das vilas. No entanto o costume berbere não era um direito completamente laico e não entrava em conflito com as leis religiosas. A organização social era regida pelos laços de sangue, reais ou fictícios, pela prática de trabalhos coletivos, e pelo uso de celeiros coletivos; o que se encontra tanto entre os berberes quanto entre os árabes.
Politicamente os berberes são formados pelas várias uniões dos Estados independentes (reinos de Tahert, deTremecém,Cairuão,Fez, etc.), e de grandes impérios, como oalmorávida e oalmóada. Eles possuem vários tipos de organização:aristocrática,teocrática,monárquica, além dademocrática dosjama'a'qui(na verdade, segundo alguns autores, as assembleias designadas pelosclãs representavam na realidade umaoligarquia dos mais velhos, governando ao nome da tradição).
Apesar de que possa se falar de uma civilização berbere, esta parece pouco original. A parcaliteratura berbere, puramente oral, consiste emfábulas orais,contos ecantos tradicionais ou improvisados; ela é feita sobretudo de empréstimos do Oriente árabe, à exceção de algunspoemas e cantos guerreiros. Na área artística, as formas geométricas se encontram nacerâmica, na bijuteria, naescultura em madeira e natapeçaria.
Chama-sePrimavera berbere as manifestações que explodiram em 1980, quando os falantes do berbere naCabília (Argélia) clamavam pela oficialização da língua.
Em 1996 uma reforma daConstituição argelina reconheceu a importância berbere para o país ao lado do árabe e do islamismo. Paralelamente, as autoridades lançam um Alto Comissariado para o Amazigh (língua berbere).
No ano 2000, a partir deParis, entra no ar a Televisão Berbere.
↑ab«Les Berbères en Afrique du Nord». Chaire pour le développement de la recherche sur la culture d'expression française en Amérique du Nord, Université LavalQuébec, 2016.
↑Scholastic Library Publishing (2005).Lands and Peoples: Africa. [S.l.]: Grolier. p. 135.ISBN0717280241. Consultado em 17 de agosto de 2016; Moors 80% of population of 3,460,000