Ilustração deMonodora myristica mostrando as características morfológicas fundamentais da família.Folhas e fruto deAnnona muricata.Fruta-pinha, o fruto típico das Annonaceae.Sementes deAsimina triloba.Sementes soltas deAnnona cherimola (as de coloração negra, à direita, são frescas e as de coloração castanha, à esquerda, foram deixadas expostas ao ar e à luz durante algumas horas).
Oscaules com lenho característico, apresentando bandas contínuas deparênquima, tangenciais e concêntricas, e vasos pequenos, raios homogéneos a debilmente heterogéneos, uni-seriados ou mais frequentemente multi-seriados. Nodos trilacunares.
As flores são geralmente grandes e vistosas, bissexuadas, diclamídeas; cálicedialissépalo, corola de 3-4pétalas, dialipétala; estames numerosos, espiralados (ou raramente cíclicos), anteras rimosas; gineceu dialicarpelar, comumente pluricarpelar, com carpelos dispostos em espiral, ovário súpero, placentação erta ou marginal, óvulos 1-numerosos. Asflores são solitárias, pareadas ou em fascículos, terminais, axilares ou supra-axilares, aparecendo sobre troncos ou ramos, raramente em rebentos subterrâneos, perfeitas ou unissexuais,actinomorfas,hipóginas, frequentemente com uma únicabráctea adaxial.Receptáculo plano, hemisférico ou cónico.Sépalas (2-)3(-4), num verticilo, valvadas ou imbricadas, livres ou aderentes pelo menos na base, persistentes ou caducas.Pétalas (0-)3-6(-12), usualmente em 2 verticilos de (2-)3(-4) ou num verticilo, valvadas ou imbricadas, livres ou fundidas na base, usualmente alternissépalas, carnosas ou coreáceas, raramente membranosas.Estames numerosos e espiralados, ou 3-15 e verticilados. Por vezes existemestaminódios. Osfilamentos são curtos e livres, raramente longos e monadelfos,anteras lineares, comdeiscência extrorsa ou raramente latrorsa, por vezes transversalmente septadas,conectivo usualmente com um prolongamento truncado, cónico ou piramidal.Carpelos numerosos a 1, apocárpicos a sincárpicos ou paracárpicos,estilos livres ou fundidos, usualmente curtos, cilíndricos,estigmas capitados, oblongos ou em ferradura.Óvulos numerosos a 1 por carpelo, anátropos, complacentação basal ou marginal na sutura ventral em 1-2 filas. Ainflorescência, cimosa, às vezes é reduzida a uma únicaflor.
Ofruto pode ser simples, com cada elemento carnoso ou lenhoso, deiscente ou indeiscente, séssil ou estipitado, ou composto (sincarpo) com numerosos carpelos unisseminados, ou ser unilocular e plurisseminado. A família apresenta enorme variedade de formas e tipos de fruto, mas geralmente ofruto, apocárpico ou sincárpico, é umabaga.
Assementes são usualmente grandes, com ou semarilo, com um sulco periférico nos frutos em folículo deiscente. Oendosperma é abundante,ruminado, usualmente em forma de lâminas irregulares (ruminações laminiformes), duro, oleoso. Oembrião é pequeno e recto.
Opólen é muito delicado, navicular a triangular, globoso ou disciforme, monoaperturado distalmente ou inaperturado, frequentemente em díadas, tríadas ou tétradas, comexina granular ou columelar, por vezes com uma camada basal lamelada, superfície reticulada a atectada.
Os flavonoides e alcaloides contidos nas folhas e na casca de várias espécies da família apresentam propriedades insecticidas.[7]
O composto designado porannonacina contido nas sementes e folhas de muitas Annonaceae, incluindoAnnona muricata (graviola), é umaneurotoxina para os humanos e parece estar ligado ao aparecimento de doençasneurodegenerativas. Resultados experimentais mostram que a afecção conhecida portauopatia, associada a uma acumulação patológica deproteína tau no cérebro, pode ser desencadeada pela annonacina.[8]
As flores são preponderantementeprotóginas. Apolinização de muitas espécies é efectuada por pequenos escaravelhos, principalmente das famíliasNitidulidae eCurculionidae, atraídos por odores florais que imitam fruta apodrecida e que chegam a utilizar as flores como lugar de postura. Contudo, os escaravelhos maiores tendem a destruir partes florais ao alimentarem-se delas. Para se defender destes últimos, algumas espécies impedem o acesso aos carpelos mediante o encerramento das pétalas internas, o que propicia aautopolinização.
A dispersão dos frutos e sementes é fundamentalmente efectuada porzoocoria, sendo os animais mais comuns os primatas, as aves e osquirópteros, mas estão assinalados casos em que a dispersão é feita poriguanas,tartarugas ejacarés. Algumas das espécies com folículos deiscentes são capazes de expulsar as sementes a considerável distância.
As anonáceas em geral são espécies que se desenvolvem em clima tropical, com apenas algumas espécies dos génerosAsimina eDeeringothamnus a ocorrerem em zonas temperadas da América do Norte. Em geral, há um marcado contraste entre as formas do Velho Mundo e as do Novo Mundo.
As formas do Velho Mundo tendem a sertrepadoras ou dehábito muito estendido (reptantes), por vezesescandentes, preferindo as selvas húmidas a baixa altitude, até aos 1500 m de altitude, raramente até aos 2000 m.
Pelo contrário, as formas do Novo Mundo tendem a ser árvores ou arbustos e a crescer em zonas de savana e cerrado, onde algumas espécies estão altamente especializadas comopirófitos, entre as quais algumas espécies deAnnona eDuguetia, não sendo contudo óbice a que algumas espécies, comoRaimondia quinduensis, alcancem os 2600 m de altitude nas montanhas colombianas. Algumas espécies do Novo Mundo são árvorescaducifólias que habitam as selvas caducifólias baixas.
Os membros da família Annonaceae (as anonáceas) formam uma família muito bem definida e natural, de fácil distinção, consideradas sempre como um grupo primitivo deangiospérmicas, e incluídas sempre na ordemMagnoliales ouAnnonales basal, segundo os diferentessistemas de classificação.
A divisão interna da família tradicionalmente agrupava os membros em duas subfamílias, as Annonoideae e as Monodoroideae, tendo a primeira gineceu apocárpico que, na maturidade, dava como fruto um sincarpo plurilocular, enquanto que a segunda apresentava um ovário unilocular com placentação parietal. A primeira subfamília era dividida em três tribos: Uvarieae, Miliuseae e Unoneae. Esta classificação, clássica, que se remonta aosistema de Hutchinson de 1964, foi abandonado por artificial há algumas décadas atrás, tendo em 1993 a família sido subdividida em grupos informais.[11]
Os recentes avanços na metodologia da filogenia morfológica e, sobretudo, da filologia molecular, permitiram assegurar com elevado grau de certeza que naárvore evolutiva da família existem 3 ramos principais: (1) um ramo basal, formada pelo géneroAnaxagorea, que é ogrupo irmão dos outros dois ramos e por consequência de todas as outras anonáceas; (2) um ramo formado pelo denominado "grupoAmbavia" (Ambavia,Cananga,Cleistopholis,Mezzettia eTetrameranthus); e (3) um ramo terminal que engloba o resto dos géneros, no qual se podem distinguir doisclades principais, um com pouca divergência molecular e géneros com poucas espécies (incluindoMalmea,Piptostigma,Miliusa ePolyalthia), e outro clade com mais divergência molecular e géneros maior diversidade de espécies.
Na sua presentecircunscrição taxonómica a família Annonaceae foi subdividida em quatro subfamílias.[12] A estrutura interna da família presentemente mais consensual é a seguinte:[10]
Subfamília AmbavioideaeChatrou, Pirie, Erkens & Couvreur[12] — compreende 9 géneros com cerca de 50 espécies, com distribuição natural em toda acintura tropical:
PorceliaRuiz & Pav. — cerca de 7 espécies, nativas do Neotropis.
TrigynaeaSchltdl. — as cerca de 12 espécies são nativas do norte da América do Sul.
Tribo Xylopieae[12] — agrupa dois géneros pantropicais, com cerca de 260 espécies:
ArtabotrysR.Br. (sin.:RopalopetalumGriff.) — as cerca de 100 espécies são nativas das regiões tropicais da África e Ásia.
XylopiaL. — as cerca de 160 espécies têm distribuição natural nas regiões tropicais da África, do Novo Mundo e doSueste da Ásia.
Tribo DuguetieaeChatrou & R.M.K.Saunders[12] — com 5 géneros e cerca de 100 espécies, com centros de diversidade nas regiões tropicais da América e África:
PopowiaEndl. — as cerca de 26 espécies são nativas das regiões tropicais da Ásia e Austrália.
PseuduvariaMiq. (incluindoCraibellaR.M.K.Saunders et al. eOreomitraDiels)[14] — as cerca de 57 espécies são nativas do Sueste da Ásia, Malésia e Nova Guiné.
SageraeaDalzell — as cerca de 9 espécies são nativas da Indomalésia.
SapranthusSeem. — as cerca de 6 espécies são nativas da América Central.
StelechocarpusHook. f. & Thomson — as cerca de 3 espécies são nativas do Sueste da Ásia e da Malésia.
StenanonaStandl. — as cerca de 14 espécies são nativas do México e da América Central.
TridimerisBaill. — as 2 espécies são nativas do México.
Trivalvaria(Miq.) Miq. — as cerca de 4 espécies são nativas da região que vai deAssam até ao oeste daMalésia.
O principal interesse económico da família está centrado nos grandes frutos comestíveis de algumas espécies sul-americanas: a "anoneira" (Annona cherimola) cujo fruto é a "anona" ou "chirimoia"; aAnnona muricata, cujo fruto é a "graviola"; e aAnnona squamosa, cujo fruto é a "fruta-do-conde". Outras espécies importantes como fruteiras são o "mamoeiro" ou "condessa" (Annona reticulata), a "chirimoia-da-flórida" (Asimina triloba), a "ilama" (Annona diversifolia), asoncoya (Annona purpurea) e aatemoia (um híbrido deA. cherimola andA. squamosa) e o "biribá" (Rollinia mucosa, que merece reclassificação paraAnnona[21]), todas americanas. Os principais géneros que produzem frutos comestíveis sãoAnnona,Anonidium,Asimina,Rollinia eUvaria. O nomes comuns destes frutos variam muito ao nível nacional e regional, sendo nalguns casos usados nomes iguais para espécies diferentes.
Recentemente o consumo dagraviola, o fruto deAnnona muricata, foi fortemente indiciado como o agente causal de uma afecção neurlógica conhecida como "Parkinsonismo atípico", apontando-se aannonacina, presente em muitas das Annonaceae como a causa da donção. Pensa-se que a annonacina seja responsável por até 70% dos casos de parkinsonismo que ocorrem emGuadeloupe devido ao consumo de graviola na comida tradicional e ao uso da planta em medicina natural.[22][23][24][25]
Algumasmadeiras de anonáceas apresentam especial interesse, entre as quais a "yaya" (Oxandra lanceolata) usada no fabrico de alças e de tacos de bilhar. Algumas madeiras são de uso local em construção civil e para postes.
Muitas espécies apresentam usos locais nafarmacopeia damedicina tradicional devido aos seus componentes químicos. Algumas espécies são utilizadas na composição de sebes e de cercas vivas.
A família Annonaceae inclui as seguintes espécies com elevado interesse económico:
↑Chatrou, L. W.; M. D. Pirie; R. H. J. Erkens; T. L. P. Couvreur; K. M. Neubig; J. R. Abbott; J. B. Mols; P. J. M. Maas; R. M. K. Saunders; Mark W. Chase (2012). «A new subfamilial and tribal classification of the pantropical flowering plant family Annonaceae informed by molecular phylogenetics».Botanical Journal of the Linnean Society.169: S. 4–50.doi:10.1111/j.1095-8339.2012.01235.x
↑Doyle, J.A.; H. Sauquet; T. Scharaschkin (2004). «Phylogeny, molecular and fossil dating, and biogeographic history of Annonaceae and Myristicaceae (Magnoliales)».International Journal of Plant Sciences.165 (4): 55–67.doi:10.1086/421068
↑KESSLER, P.J.A. Annonaceae. In: KUBITZKI, K.; ROHWER, J.G.; BITTRICH, V. (Ed.). The families and genera of vascular plants. II. Flowering plants. Dicotyledons. Magnoliid, Hamamelid and Caryophyllid families. Berlin: Springer Verlag, 1993. p. 93-129.
↑abcdefghijklmnopqrstuvL. W. Chatrou, M. D. Pirie, R. H. J. Erkens, T. L. P. Couvreur, K. M. Neubig, J. R. Abbott, J. B. Mols, P. J. M. Maas, R. M. K. Saunders, Mark W. Chase:A new subfamilial and tribal classification of the pantropical flowering plant family Annonaceae informed by molecular phylogenetics. In:Botanical Journal of the Linnean Society, Volume 169, 2012, S. 4–50.doi:10.1111/j.1095-8339.2012.01235.x
↑R. H. J. Erkens, P. J. M. Maas:The Guatteria group disentangled: sinking Guatteriopsis, Guatteriella, and Heteropetalum into Guatteria. In:Rodriguésia, Volume 59, 2008, S. 401–406.PDF.
↑abcT. L. P. Couvreur, P. J. M. Maas, S. Meinke, D. M. Johnson, P. J. A. Keßler:Keys to the genera of Annonaceae. In:Botanical Journal of the Linnean Society, Volume 169, 2012, S. 74–83.doi:10.1111/j.1095-8339.2012.01230.x
↑abLinlinZhou, Y. C. F. Su, P. Chalermglin, R. M. K. Saunders:Molecular phylogenetics of Uvaria (Annonaceae): relationships with Balonga, Dasoclema and Australian species of Melodorum. In:Botanical Journal of the Linnean Society, Volume 163, 2010, S. 33–43.doi:10.1111/j.1095-8339.2010.01045.x
↑T. Chaowasku, P. J. A. Keßler, R. W. J. M. Van der Ham:A taxonomic revision and pollen morphology of the genus Dendrokingstonia (Annonaceae). In:Botanical Journal of the Linnean Society, Volume 168, 2012, S. 76–90.doi:10.1111/j.1095-8339.2011.01187.x
↑I. M.Turner:A new combination in Monocarpia (Annonaceae). In:Edinburgh Journal of Botany, Volume 69, 2012, S. 95–98.doi:10.1017/S0960428611000424
↑T.Chaowasku, D. M. Johnson, R. W. J. M. Van der Ham, L. W. Chatrou:Characterization of Hubera (Annonaceae), a new genus segregated from Polyalthia and allied to Miliusa. In:Phytotaxa, Volume 69, 2012, S. 33–56.PDF
↑abSu Y. C. F. Xue Bine, D. C. Thomas, R. M. K. Saunders:Pruning the polyphyletic genus Polyalthia (Annonaceae) and resurrecting the genus Monoon. In:Taxon, Volume 61, 2012, S. 1021–1039.Abstract.
↑«Annonaceae» (em inglês). The Plant List. 2010. Consultado em 5 de maio de 2017
↑Lannuzel, A; et al. (6 de outubro de 2003). «The mitochondrial complex i inhibitor annonacin is toxic to mesencephalic dopaminergic neurons by impairment of energy metabolism». International Brain Research Organization.Neuroscience.121 (2): 287–296.PMID14521988.doi:10.1016/S0306-4522(03)00441-X
↑Champy, Pierre; et al. (2 de agosto de 2005). «Quantification of acetogenins in Annona muricata linked to atypical parkinsonism in guadeloupe».Movement Disorders.20 (12): 1629–1633.PMID16078200.doi:10.1002/mds.20632
↑Lannuzel A, Höglinger GU, Champy P, Michel PP, Hirsch EC, Ruberg M (2006). «Is atypical parkinsonism in the Caribbean caused by the consumption of Annonacae?».J Neural Transm Suppl. Journal of Neural Transmission. Supplementa.70 (70): 153–7.ISBN978-3-211-28927-3.PMID17017523.doi:10.1007/978-3-211-45295-0_24
↑Caparros-Lefebvre D, Elbaz A (24 de julho de 1999). «Possible relation of atypical parkinsonism in the French West Indies with consumption of tropical plants: a case-control study».Lancet.354 (9175): 281–6.PMID10440304.doi:10.1016/S0140-6736(98)10166-6
↑Pomper, K.W.; et al. (Julho 2008). «Flowering and fruiting characteristics of eight pawpaw [Asimina triloba (L.)] Dunal selections in Kentucky».Journal American Pomological Society.62 (3): 89–97
Chatrou, L. W., Pirie, M. D., Erkens, R. H. J., Couvreur, T. L. P., Neubig, K. M., Abbott, J. R., Mols, J. B., Maas, J. S., Saunders, R. M. K., & Chase, M. W., 2012. A new subfamilial and tribal classification of the pantropical flowering plant family Annonaceae informed by molecular phylogenetics. Bot. J. Linnean Soc. 169: 5-40.
Hutchinson, J. 1964. The genera of flowering plants (Angiospermae). Dicotyledones. Vol. 1. Oxford, Clarendon Press. xiii + 516 págs.
Kessler, P.J.A. 1993. Annonaceae. En: Kubitzki, K., Rohwer, J.G. & Bittrich, V. (Editores). The Families and Genera of Vascular Plants. II. Flowering Plants - Dicotyledons. Springer-Verlag.
Watson, L., and Dallwitz, M.J. 1992 onwards. The families of flowering plants: descriptions, illustrations, identification, and information retrieval. Version: 29th July 2006.http://delta-intkey.com
Robert Kral:Annonaceae in derFlora of North America, Volume 3, 1997:Online. (Abschnitt Beschreibung)
Siddharthan Surveswaran, Rui Jiang Wang, Yvonne C. F. Su, & Richard M. K. Saunders:Generic delimitation and historical biogeography in the early-divergent 'ambavioid' lineage of Annonaceae: Cananga, Cyathocalyx and Drepananthus, In:Taxon, Volume 59, 2010, S. 1721–1734.
Huber, H. (1985) Annonaceae, S. 1–75. In: Dassanayake, M. D. & Fosberg, F. R.(eds.), A revised handbook to the flora of Ceylon, 5. Amerind. Publishing Co., New Delhi, 476 Seiten.
Souza, Vinicius Castro e Lorenzi, Harri: Botânica sistemática - guia ilustrado para identificação das famílias de Angiospermas da flora brasileira, baseado em APG II. Instituto Plantarum, Nova Odessa SP, 2005.ISBN 85-86714-21-6
G. Gottsberger:Pollination and evolution in neotropical Annonaceae, In:Plant Species Biology, Volume 14, 2, 1999, S. 143–152.