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The Project Gutenberg eBook ofChronica d'el rei D. Diniz (Vol. II)

This ebook is for the use of anyone anywhere in the United States andmost other parts of the world at no cost and with almost no restrictionswhatsoever. You may copy it, give it away or re-use it under the termsof the Project Gutenberg License included with this ebook or onlineatwww.gutenberg.org. If you are not located in the United States,you will have to check the laws of the country where you are locatedbefore using this eBook.

Title: Chronica d'el rei D. Diniz (Vol. II)

Author: Rui de Pina

Release date: April 14, 2006 [eBook #18167]

Language: Portuguese

Credits: Produced by Rita Farinha and the Online Distributed Proofreading Team at http://www.pgdp.net (This file was produced from images generously made available by National Library of Portugal (Biblioteca Nacional de Portugal).)

*** START OF THE PROJECT GUTENBERG EBOOK CHRONICA D'EL REI D. DINIZ (VOL. II) ***

Produced by Rita Farinha and the Online Distributed

Proofreading Team at http://www.pgdp.net (This file wasproduced from images generously made available by NationalLibrary of Portugal (Biblioteca Nacional de Portugal).)

CHRONICA D'EL-REI D. DINIZ

2 vol. 800 réis

Bibliotheca de Classicos Portuguezes

Proprietario e fundador—Mello d'Azevedo

(VOLUME LXXI)

CHRONICA D'EL-REI D. DINIZ

POR
RUY DE PINA

2.^a edição

VOL. II

ESCRIPTORIO

147—Rua dos Retrozeiros—147

LISBOA

1912

BIBLIOTHECA DE CLASSICOS PORTUGUEZES

Proprietario e fundador

MELLO D'AZEVEDO

Bibliotheca de Classicos Portuguezes

Proprietario e fundador—Mello d'Azevedo

(VOLUME LXXI)

CHRONICA D'EL-REI D. DINIZ

POR
RUY DE PINA

2.^a edição

VOL. II

ESCRIPTORIO

147—Rua dos Retrozeiros—147

LISBOA

1912

CAPITULO XIII

Como ElRei D. Diniz ordenou em Coimbra ho primeiro Estudo, que ouve emPortugal.

ElRei D. Diniz assi como foi dotado de muitas boondades naturaaes, assitambem nom lhe faleceram has outras virtudes em todo Reaes, cuja prova,e exemplo, saõ suas excellentes obras, & mui louvadas, ha todosmostrava, que foi Principe mui prudente, e de mui singular concelho, ena fala Portuguez de seu tempo asaaz copioso, e de muita graça, etratava com grande humanidade ha todos aquelles, que com elleconversavão, e por esso era de todos mui amado especiaalmente, que todosseus cuidados eram honrar, e acrescentar mais sua teerra, e assiprocurar que fosse abastada, e provida daquellas couzas porque seusvassallos, e naturaaes fossem mais nobres, e melhor ensinados, sobre hoquaal se diz que hum dia estando com os seus Prelados, e nobres homensem concelho, lembrandose com mostranças de sentimento, que seus Regnoscareciam de Escolas, e Estudos de que outras teerras eram mui abastadas,lhes falou nesta maneira.

«Aho boom Principe, que da maaõ de Deos aa muitos de reger sobre todolhe conveem, que trabalhe, e cumpre que elle, e os seus subditos sobretodas as virtutudes abracem ha virtude da Justiça, e amem, e sigam osfruitos della, porque hos merecimentos sam taaes ante Deos, e de tantaestima, que nom soomente daa por elles neste mundo alegre, e pacificavida em quanto duramos, mas ainda no outro pera alma nom nega ha gloriaeterna, e bemaventurança pera sempre, certamente ho Rei em hos Regnos,que por graça de Deos lhe sam encomendados nom pode fazer melhoresobras, nem officios de moor valor, que procurar que vivaõ nelles hoshomens em fee, e justiça, e façam obras santas, justas, e onestas, eporque esto se nom póde assi beem conseguir, e aver efeito sem aver noRegno varoens em toda doutrina e ciencias divinas, e humanas beemensinados, e concirando eu que meus Regnos pela Providencia, e boondadede Deos, nom soomente saõ asaaz providos de todolos mantimentos do maar,e teerra, mas abastados de onesta gente darmas, e de boom uzo, eexercicio dellas assi beem dezejo de todo meu coraçam, que tambeem ajaavondança de homens leterados, e mui sabedores, e por esso propus emminha vontade por beem comum de meu Regno, e grande proveito de meusvassalos, e naturaaes, fazer nelle huum Estudo geraal, e muito honrado,onde todalas ciencias se leaõ, e que seja feito nesta Cidade de Coimbra,que hee no meio do Regno, e abastada das couzas necessarias, e asaaztemperada dos ares pera saude dos homens, e poreem ante que ho pozesseem obra volo quiz assi notificar pera me dizerdes vosso concelho, eparecer».

Aho quaal todos responderam louvando muito sua tençam, pedindolhe pormercee, que obra tam sancta, e tam virtuoza, e de tanto proveito, e detanto ennobrecimento de seus Regnos logo ha exequtasse. Pera ho quaalElRei sopricou logo sobresso aho Papa Joaõ XXII que por suas Bullas lheenviou has graças, e privilegios, que lhe foram pedidos, e fundou hodicto Estudo cujos fundamentos parecem agora mui pequenos, e pera ellefez vir boons leterados doutras teerras pera que hos Rex dellas pormandado do Papa, e por requerimento delRei deram consentimento, hosquaaes por salairos ordenados leram nelle algum teempo, e elle foi hoprimeiro Estudo, que ouve em Portugal, mas depois floreceo mais ho daCidade de Lixboa, ha que ho de Coimbra se mudou, onde agora se leemtodas has sete artes, e ciencias pubricamente, e saõ pagos hos Mestrespor salairos dos Rex, que depois Regnaram em Portugal.

CAPITULO XIV

Como foi feito em Portugal Mestre de San-Tiago izento da Ordem de Ucresde Castella.

Hos Comendadores Cavalleiros, e Freires da Ordem de San-Tiago, que aviaem Portugal atee este tempo delRei D. Diniz, todos eram sugeitos ahoMestre de San-Tiago de Castella, cujo Convento, e cabeça era Ucres, dequem por muitas vias, e maneiras recebiam individamente muitos aggravos,e opressoens, chamando-hos sem tempo, e sem necessidade ha Capitulo, epoendo nelles por leves cazos sentenças descomunhões, ha quaal couzasentio muito ElRei D. Diniz, e como era Principe que sempre dezejou, eprocurou acrecentamento, e izençam de seus Regnos, e vassallos, enviounotificar todas estas couzas aho Papa Nicolao IV e supricou ha SuaSãctidade, que desse licença, e autoridade pera que hos dictos Freires,e Comendadores de seus Regnos, podessem antre si eleger Mestre da suaOrdem, que de todo fosse izento do Mestre de Castella, ha que ho Papadeu poder asoluto, e carta de sentença, e em todo satisfez, e dessovieram ha este Regno suas Bullas inteiras, por virtude das quaaeselegeraõ por primeiro Mestre de San-Tiago de Portugal hum D. LourençoAnnes.

Sobre ho quaal ho Mestre com favor delRei de Castella, comodescontentes, e agravados de semelhante izençaõ supricaram aho PapaCelestino, que socedeo ha Nicolao IV e delle ouveram Rescrito sorreticiocom crauzulas revocatorias daa concessoens passadas, annulando a eleiçamdo Mestre de Portugal, e hos Juizes que foram dados por exequtoresprocediam por excomunhoens, e censuras contra ho Regno de Portugal, erequereram Prelados delle, que has fossem cõprir atee antredicto ahosquaaes procedimentos ElRei D. Diniz, e o dicto Mestre, e Freires dePortugal intrepuzeram suas apelaçoens, e devolveram ho feito aho mesmoPapa Celestino que mandando ha seus Leterados conhecer da cauza achouseho Rescrito de Castella, nom seer verdadeiramente impetrado, e ho PapaCelestino aprovou ha sentença pela primeira concessaõ feita, dada peloPapa Nicolao, seu antecessor, e que ho Mestre de San-Tiago de Portugal,e do Algarve nom reconhecesse superioridade salvo aho Papa, e ahos Rexque Regnassem nos Regnos de Portugal, sobre os quaaes letigios sefizeram por ElRei grandes despezas, e deste tempo ateegora, sempre ouveMestre da Ordem de San-Tiago em Portugal, e no Algarve, cujo primeiroConvento foi logo em Alcacer do Sal, e depois se mudou ha Palmella ondeagora estaa.

CAPITULO XV

Do fundamento que teve ha Ordem do Templo de Salamaõ em Jerusalem, ecomo foi desfeita, e se fez ha Ordem de Christo.

No anno de nosso Senhor Jesu Christo de mil cento e oito annos, sendo oPapa na Egreja de Deos Gelazio II, Regnando em Jerusalem Valdovino destenome ho primeiro, e dos Rex de Jerusalem ho segundo, que socedeu ha seuirmaaõ Gudufre primeiro Rei se acha, que dous homens devotos dos quaeshum ouve nome Ugo de Payaõ, naturaal da cerqua de Troya, e outro ho FicuSancto homem Frances, estes com dezejos de servirem ha Deos leixados hosgostos, e doçuras de suas fazendas, e natureza, se foram aa Cidade Santade Jerusalem pera nella viverem, e por sua defençaõ acabarem suas vidas,ahos quaaes o dicto Rei Valdovino porque conheceu que eram homens deboom esforço, e de singular devaçaõ, mandou dar huma pouzada dentro dosseus Paaços, que eram junto com ho Templo de nosso Senhor, e hos Conegosdo dicto Templo lhe deraõ hum Altar, e Capella apartado pera que melhor,e mais quietamente comprissem suas devaçoens.

E por suas boondades que por todos foram vistas, e experimentadas ElRei,e ho Patriarca, e assi hos Perlados, e nobre, e devota gente, que era emJerusalem lhe mandavaõ abastadamente por esmola hos mantimentos, eprovisam, & ho primeiro encargo que o Patriarca por pendença, e remissamde seus peccados lhe deu, foi que com ha gente devota, que se ha ellesquizesse ajuntar, guardassem hos caminhos por onde hos Romeiros vinham aJerusalem, porque dos muitos ladrões, e maalfeitores nom recebessem hosroubos, e danos, que muitas vezes recebiam, ho que elles quanto foipossivel fizeraõ, e continuaraõ com grande honra, trabalho, e muitocuidado atee nove annos, nos quaaes foram grandemente ajudados desmolaspor ElRei, e por ho Patriarca, e por todalas outras naçoens, que eram emJerusalem, e nestes annos nom fizeraõ alguma mudança dos Abitosseculares, cõ que primeiro vieraõ, mas aho anno decimo depois de suachegada lhe foi dada Regra por o Papa Honorio II, ha quaal S. Bernaldocompoz, e lha deu com Abitos brancos por humildade, e nelles por deforahuma Cruz vermelha por sinificaçaõ do sangue de Christo, e tomaraõReligiaõ em que fizeraõ voto de castidade, e obediencia, e renunciaraõpera sempre ho proprio.

Hos quaaes antre todolos outros Cavalleiros, e calidades de Christaãos,que nas partes dultra maar pela Fee, e defensaõ da Teerra Sanctapeleijavam estes sobre todos com mais devaçam, e esforço faziam com maislouvada avantagem, que por seus grandes merecimentos, e serviços, e famaeraõ assi celebrados, e estimados em todo ho mundo, que hos Rex,Principes, e Senhores de toda Christandade avendo nelles has ajudas, eesmolas por mui beem empregadas no fervor desta primitiva devaçaõ, eReligiaõ lhe deraõ em seus Regnos, e Senhorios grãdes teerras, Cidades,Villas, e Castellos, com muitas rendas, e possessoens. E nesta Ordem porsua grande devaçaõ fizeraõ muitas gentes profissam, e antre hosCavalleiros avia outros Religiosos Freires sergentes, que traziaõ hasmesmas Cruzes vermelhas, mas nos mantos avia antre elles deferença, eordenaram antre si pendaõ, e bandeira, que diante elles levava nasbatalhas seu Alferes, e era ametade de branquo, e ametade de preto, porsenefiquaçam que na Fee sempre fossem limpos, castos, e humildosos, efirmes, e no meio della ha Cruz vermelha.

E por serem do principio alojados junto com ho Templo, como atraas dice,por esso foram chamados Templarios, dos quaes ho Papa, e ho Patriarcafizeraõ alguns antre hos outros mais principaes, ha que chamaraõ logoAbbades Bentos, e depois foraõ dictos Mestres, e repartidos pelosRegnos, e Provincias da Christandade, de que soo em Jerusalem aviadestar como estava ho Graõ Mestre delles ha que todos aviaõ dobedecercomo obedeciaõ. Ha este chamavaõ ho Graõ Mestre do Templo de Salamaõ emJerusalem, e no principio, e fundamento consta que hos Cavalleiros, eFreires viviaõ, e guardavaõ ha Religiaõ em muita profissaõ, e louvadoscostumes, por esso foraõ sempre em todos seus feitos muito vitoriosos, ebemaventurados, que por exemplo da verdadeira Fee, muitos delles comgrande confiança, e constancia sofreraõ morte, Cruz, e martyrios,incomportaveis cativeiros, sem mostrarem alguma fraqueza dos corações,nem da fee que sustinham, e tam grande foi ha fama, e boom nome daReligiaõ, e disciplina Militar destes Cavalleiros da Ordem do Templo,que hos Rex Despanha, que naquelle tempo Regnavaõ, porque nella aindaavia grandes Regnos, e poderosos Rex Mouros por conquistar mandaram porelles ha ultra maar, e nas conquistas, e batalhas dos infieis por grãdeajuda hos trouxeram consigo, e assi por armas, boondade, e esforçorespoderaõ sempre aa confiança que delles era conhecida, e por esso namesma Espanha por os Rex, e Principes, e Senhores della, e doutrasgentes particulares em seus testamentos elles foraõ erdados de muitasVillas, teerras, e grãdes rendas, has quaaes elles assi davaõ ha obraspiedozas, e meritorias, e assi has repartiaõ pelos fieis Christaãos quecraramente parecia que todo ho que lhe davaõ por esmola quesse era hoproprio, e verdadeiro patrimonio de Christo.

Mas depois como nellas creceraõ grandes Senhorios, e grandes riquezas,logo segundo se delles diz, ha que muitos nom daõ verdadeira autoridade,ha cobiça ocupou nelles, e em sua Ordem ho galardam dos virtuososmerecimentos passados, porque has virtudes, e boondades em que eramprofessos converteraõ logo em todos seus contrairos, em que fizeraõ hocõtrairo do que ante faziaõ, de maneira, que por autoridade do Papa seizentaraõ da obediencia do Patriarca de Jerusalem, e assi de todolosoutros Prelados, ahos quaaes denegavaõ depois hos dizimos, primicias, erendas com que no principio foraõ delles ajudados, e sustentados,trazendo-os em demandas, e legitios como se diz, que ho fizeraõ no RegnoDaragam onde tiveram guerra contra has Egrejas Catredaes, e riquoshomens daquelle Regno.

CAPITULO XVI

Do principaal fundamento, e verdadeira causa pera esta Ordem dosTemplarios seer destroida.

Por morte do Papa Benedicto XI, que faleceu em Italia na Cidade dePerosa, antre hos Cardeaes, que eram prezentes ouve discordia na criaçaõdo futuro Sumo Pontifice porque huus queriaõ, que fosse Italiano, eoutros procuravam que Frances fosse, Regnando entam em França El ReiFelippe a que por sobre nome diceraõ Fremozo, mas por suas obras desobeja cobiça, e grande tirania, foi avido por asaas feio, e disforme, epor estucia, e engenho de Nicolao Cardeal Partenes, que era Varaõastuto, e mui prudente, foi elegido por Papa, sendo auzente, e nomCardeal D. Reymaõ, Arcebispo de Bordeos, e foi chamado Clemente V, naquaal criaçaõ hos Italianos consentiraõ porque este Arcebispo era grandeimigo deste Rei de França, cuja parcialidade pareceu que seguia, hoquaal Rei por avizo do dicto Cardeal Partenes antes de seer pubricada haeleiçaõ do dicto Arcebispo em huma Abbadia se foi com elle ha ver, econcertar secretamente, e conveio aho dicto Arcebispo pera seer Papaoutorgar, e prometer tudo ho que ElRei de França lhe pedio, porque semsua concordia, e amizade elle nom avia de seer elegido, e criado emPapa, segundo foi certificado, e ali lhe pedio ElRei seis cousas hasquaaes ho Arcebispo cõ juramento sobre ho Sacramento da Ostia que fez, ecom ha refens da hum seu irmaão, e dous sobrinhos que lhe deu, lheprometeu de comprir logo como fosse Papa, das quaaes has cinquo logodeclarou, e huma sem ha dizer reservou em si pera depois a asinar, epedir quando lhe comprisse.

E depois da creaçaõ do Papa hos Cardeaes do Conclave ho avisaraõ ha elleem Bordeos, e ali tomou o dicto nome de Clemente V, dõde tambem mandouahos dictos Cardeaes, que eram em Italia que logo se viessem, comovieraõ ha Leaõ de França, onde avia de seer como foi coroado, e logo alidepois da sua coroaçaõ comprio com ElRei has cinquo cousas, que lheprometera, e assi ha que nom quiz pedir e declarar ha reservou peradepois no anno de Christo de mil tresentos e sete annos. Ho Papa mudousua Corte aa Cidade Pitansis, onde ElRei de França lhe pedio exequçaõ dasexta cousa que lhe pedira, e pera si reservara, ha quaal era quetirasse pera sempre do Catalogo, e numero dos Papas, ho Papa BonifacioVIII seu predecessor, e como de Erege, o tredor lhe mandasse queimar hocorpo e hos ossos.

E ha cauza desto era porque este Papa o tinha excommungado, e privado doRegno de França, e como de juro dado aho Emperador Dalemanha, e porvinguãça desso, ElRei de França manhosa, e encobertamente mandou prendero dicto Bonifacio na Cidade de Pavia em Italia, e dali foi levado haRoma, onde logo faleceu, e por esta cauza ElRei de França, que ficavaexcommungado ha elle Papa de sua memoria tinha grande odio, e porém hoPapa Clemente com ha dezonestidade, e injustiça deste requerimento pelojuramento que tinha feito, e ha refens que tinha dados que corriaõrisquo de morte, foi muito torvado, e posto em pensamento, e avidosobresso concelho por ganhar tempo de dilaçaõ em que ha vontade delRei,por ventura se amanssaria, dilatou ha dicta exequçam da sexta promessapera Concilio géral ha que convocou hos Principes, e Prelados pera aCidade de…. que era fóra da jurdiçam delRei de França, pela quaalcauza, e por logo nom comprir, elle se mostrou do Papa muito aggravado.

E durando has pendenças deste injusto, e torpe requerimento delRei, queho Papa nunqua quiz outorgar, acõteceo que hum Prior de Monte Falcaõ deToloza, que era desta Ordem, e Religiaõ dos Templarios homem perversso,e maao, que por seus erros, e grandes crimes jazia prezo em Pariz,condenado por sentença ha carcere perpetuo, e com elle outro chamado….. homem cheio de todalas maldades, e traiçoens, hos quaes ambos porseerem de mui malinos espiritos, por tentarem algum caminho de suadeliberaçaõ notificaram, e certificaram ha certos officiaes delRei deFrãça, ho quaal sabiam seer Rei grande tirano, e sobre todolos homensmais cobiçoso, que ho Mestre, Cõmendadores, e Freires da Ordem doTemplo, eram todos Ereges, e culpados em tam abominaveis crimes, que porinquiriçaõ logo se provariam por hos quaaes ha Ordem devia seerdesfeita, e ElRei aver pera sua Coroa toda sua fazenda, que em Françaera muita.

Ha quaal couza significada ha ElRei elle movido mais de cobiça, que porguardar verdade, nem fazer justiça requereo aho Papa, e ho inclinoumaliciosamente, que desfizesse esta Ordem cheia de muitos erros, eoffenssas que lhe apontou, ha que o Papa seguundo se diz, pelo afrouxarda promessa do Papa Bonifacio, com que ho apertava logo satisfez, porquesem fazer muito exame, nem ver has certas provas que se requeriam ácercado que contra os Templarios se dizia, nem se guardar alguma ordem dedireito juizo foram em França todos prezos, e seus beens tomados, eElRei hos apropriou logo aa sua Coroa, e assi o notificou logo aho Papa,e mandou por suas Bullas que assi fizessem todolos outros Rex, ePrincipes Christaãos em cujos Regnos, e Senhorios avia a dicta Religião,e foi logo prezo em Paris ho Mestre do Templo, que era hum homem porlinhagem, e autoridade de mui principaal devaçaõ, e avia nome Jacobo, ecom elle sessenta nobres Cavalleiros da dicta Ordem, contra os quaaespor artigos formados se poz: «Que aho tempo de sua profissaõ que todosfaziaõ secreta, cospiaõ em Christo Crucificado, e que indistintamente, eseem escuza, e com especialidades feias, e mui deshonestas, uzavam antresi do abominavel peccado de contra natura, e que juravam que justa, einjustamente sempre assi ajudariaõ, e conservariaõ a dicta Ordem, e queelles Templarios como tredores da Teerra, e Caza Sãcta foram cauza de seperder corrutos de dadivas pelos infieis».

E sobre algumas provas de testemunhas falças, que sobresso foram dadas,ElRei mandou meter estes, e outros muitos ha mui asperos tormentos peraque com elles confeçassem hos delictos que dezejava pera logo aver hasteerras que cobiçava. E porque alguns destes tudo esto navegaõ foraõretornados ahos carceres em que longamente foram reteudos, e por setomar delles ha concruzaõ que ElRei desejava, foram levados fora dePariz, e postos aa vista de poovo em hum alto cadafalço de madeira nùsdas carnes, e atados hos corpos ha senhos paaos, logo ha hum, e depoisaho outro, lhe pozeram fogo ahos pees, e assi pouquo a pouquo, portodolos membros acima atee serem de todo queimados, dizendo ha cada humalto, que se confeçasse seus erros que seriaõ perdoados, e livres compiedade, e mesiricordia, cujos amiguos, e partes movidos de suacompaixam hos conselhavaõ, e amoestavam, que por nom morrerem cõ tantascruezas confeçassem por nom perecerem.

Aho que muitos com medo das atormentadas mortes, que viaõ padecer,confessarão todolos maalles, e erros que lhes eram preguntados, aho queoutros em que avia mais esforço nunqua quizeram obedecer, antes commuitas lagrimas, e grandes prantos que fizeraõ se escuzavaõ affirmando,que dos semelhantes crimes elles, e hos da Ordem eram de todo inocentes,e encomendando suas almas a Deos, e aa Virgem Maria sua madre eraõcontentes de acabar como acabavaõ em tormento de suas vidas, e destesfiquaram reservados, que nom foram aho pubrico tormento, ho dicto JacoboMestre da dieta Ordem em Frãça, e hum Ruy Dalfino seu parceiro, e FreyUgo Paradi, e hum outro dos mais principaaes da Ordem, que jaa foraõofficiaaes da Caza delRei de França, hos quaaes foram levados aa Cidadede Liaõ onde ho Papa, e ElRei eraõ prezentes, ante hos quaaes hossobredictos aconselhados de seus imigos por averem relevamento daprizaõ, e por salvarem has vidas, com mercee, e honra, que lhe foiprometida se diz, que confessaraõ alguns dos crimes, e malleficios quelhes eraõ postos.

E porque ha cõfissaõ destes seendo pubrica parecia, que era provasufficiente pera hos dictos artigos seerem verdadeiros, e beem provados,ho Papa ha requerimento delRei tornou ha enviar ha Pariz hos dictosprezos, onde quiz que pubricamente confeçassem ho que tinhaõ em secretoconfessado, e por autoridade de Juizo enviou dous Cardeaes pera depoisda dicta confissaõ darem ahos culpados alguma pendença piedosa, econdenarem ha dicta Ordem ha perdiçaõ, e destruiçaõ dos beens que tinha,hos quaaes prezos postos em outro pulpito mui alto aa vista dos Cardeaese de muitos poovos, que eram juntos, foi perante elles lido, e pubricadoem alta voz ho processo, que do dicto cazo era feito, em que era escritaha confissaõ que os dictos prezos fizeraõ, ho quaal como foi acabado, hodicto Mestre Jacobo como pessoa mais principaal alevantado em pee, epedindo com grandes brados lugar de silencio se diz, que perante todosdice.

«Que aquelles erros, e crimes porque foram perguntaados Deos sabia queelles nunqua hos cometeraõ, nem hos avia nelles, nem na sua Religiaõ,que sempre fora, e era mui sancta, e hos Freires della de mui honestavida, e de mui limpa conversaçam, e crentes inteiramente na sancta FeeCatolica de Jesu Christo, mas que nem por esso deixava de confessar queera dino da crua morte, que se lhe aparelhava ha quaal elle compaciencia sofreria pois por temor delRei que era prezente, e combranduras do Papa elle malíciozamente, e com grãde mentira confeçaraalguns dos dictos crimes, que nom devera.»

E com esto sem ho acabarem beem douvir se deu toda via sentença contraelle, e hos Cardeaes, e hos outros Prelados se partiram, e logo setornaram aho Papa, pelo quaal ho dicto Mestre, que era cõpadre delRei,com Frei Delfim seu companheiro foraõ levados ante hos Paaços Reaes dePariz onde ElRei era presente, e ali dãdolhe pouquo ha pouquo ho fogopor maior tormento como deram ahos outros, foraõ de todo queimados, semnunqua se quererem desdizer, antes no meio das maiores chamas se diz,que elles nunqua deixaraõ de cõfessar, e defender ha pureza de suaReligiaõ, e que na opiniaõ de todos como verdadeiros Martyres morreraõ,e por taaes se diz, que foraõ avidos, e reverenciados, e seus ossos demuitos guardados, mas Frei Ugo, e outro seu parceiro, e assi outros cõelles com espãto, e temor de taõ cruas mortes confessaraõ hos dictoscrimes contra ha dicta Religiaõ, por salvarem has vidas, que da li hapoucos dias por seus peccados vilmente perderaõ, ha quaal sentença decondenaçaõ cõtra ha dicta Ordem do Templo, Freires, e Cavalleiros della,soccedeo no mez de Dezembro do anno de mil trezentos e nove annos. Noquaal tempo se compriam cento e quorenta e hum annos, que a dicta Ordemfora principiada do tempo do Papa Gelasio, como atraas fiqua.

CAPITULO XVII

Como ho Papa, e ElRei de Frãça noteficaraõ ha ElRei D. Diniz estacondenação dos Templarios, e de sua Ordem.

A qual condenaçaõ, e cauzas della, ho Papa fez saber por sua Bulla haElRei D. Diniz, e cõ mostranças de grande sentimento encomendou, quelogo fizesse em seus Regnos prender todolos Freires da dicta Ordem, ehos remetece ahos Bispos, e Ordinarios, em cujos Bispados fossem prezos,pera delles tirarem inquirições, e sabeerem de seus delictos ha verdade,e averem justo castigo, e aquelles que confeçassem hos dictos crimes, edeles se arrependessem fossem a piedozo perdam recebidos, e assi tomassetodos seus beens, e teerras que tivessem, e sobre estivesse atee sederterminar no Concilio Geral ho que de todo se fizesse, ha quaal couzaElRei de Frãça noteficou ha ElRei de Castella, e ha ElRei D. Diniz, elhes enviou ho treslado do processo, e sentença que contra elles foidada, pedindolhes com razoens, que pareciam teer cor de justiça eonestidade que quizessem em seus Regnos inteiramente cõprir ho que lheho Papa encomendava, e elle nos seus tinha jaa feito, e com hanoteficação deste maal tam grande, e tam universaal, ElRei D. Diniz, etodolos de seu Regno foram mui maravilhados.

E porque has cauzas, e fundamentos do Papa, e delRei de Frãça, porqueinteiramente foi deste cazo informado vinhaõ postas em taal ordem, eassi clarificadas que pareciam mui verdadeiras, crendo ElRei D. Dinizque a dicta Ordem por esso nom escuzaria de seer desfeita, e hos beensdella perdidos, e dados ha ontrem, antes de tudo mandou logo tomar todaha fazenda, e Lugares da dicta ordem, e tudo teve em si, e na pessoa doMestre, que avia nome Vasquo Fernandes, e nos Cavalleiros, e Freires dadicta Ordem nom se acha que ElRei, nem outrem fizessem alguma exequçamde mortes, prizoens, nem outra pena alguma, antes em muitas partesparece claro que muitos destes foraõ recolhidos aa nova Ordem deChristo, que se depois fez, como aho diante direi, e nella viveram beem,e onestamente como boons Religiosos, porque o dicto Vasquo Fernãdes,Mestre que era, foi recolhido aa Ordem de Christo, e lhe deram hacomenda de Castello novo em que viveo, e acabou.

E porque como ha noteficaçaõ deste desfazimento logo geral, se dice queo Papa determinava atrebuir has teerras, e beens desta Ordem do Temploaa Ordem do Esprital de S. Johaõ de Jerusalem, e ha ElRei D. Dinizpareceo que seria grande inconveniente pera ho assecego, e obediencia deseus Regnos ho que assi por iguaal medida tocava ha Castella, envioulogo apõtar especificamente ha ElRei D. Fernando seu genro, que estavano cerquo sobre Algezira, hos pejos que ha elles, e ha estes Regnosnesta concessaõ, se aa Ordem de S. Johaõ se fizesse viria, e ambos poresso se concordaraõ por contrato jurado, com pena de déz mil marquos deprata, que seendo cazo que ho Papa quizesse dar, ou atrebuir estes beensdos Templarios ha quaalquer Ordem sem suas vontaades, e consentimento,que elles contra todos ho defendessem, e nom consentissem, e que hum semho outro cõ ho Papa, nem outro quaalqner se nom podesse sobre este cazoconcordar, nem fazer avença, e concerto, por quaalquer maneira que fossesoo ha dicta pena, sobre fizeraõ contracto escrito, e aselado comjuramentos, e menagens de sempre assi se comprir, e que ElRei Daragam sequizesse, como quiz, fosse nesta cõcordia, e chegouse ho tempo do dictoConcilio, que ho dicto Papa Clemente V atermou ahos Rex, e PrincipesCristaãos pera determinaçaõ da Ordem do Templo, e de suas cousas, e assipera sabeer ho que se determinaria acerqua do Papa Bonifacio VIII queElRei de França requeria ha pagamento de sua memoria, e que seus ossosfossem queimados, ho quaal se celebrou na Cidade de Viena, na Provinciade Narbona, no mez de Outubro da era de mil trezentos e onze annos,(1311) que foram juntos grandes Rex, e Senhores, e assi Embaixadores, eProcuradores, e nelle primeiramente se determinou que ho requerimento,que ElRei de França fazia acerqua de se declarar por Erege ho dicto PapaBonifacio, e seus ossos queimados, e sua memoria perdida, era injusto, etaal que por alguma maneira por muitas cauzas se nom devia comprir.

Do que El-Rei de França se mostrou muito anojado, e aggravado do Papa, eno dicto Concilio foraõ pubricamente lidos hos dictos processosfulminados cõtra hos Templarios, e sua Ordem, pelo quaal depois demuitas amirações, e nom menos opiniens se confirmou ha sentença contraelles, ha saber que fossem todos prezos, e apresentados ha juizo daSancta Egreja, e aquelles que se quizessem arrepender daquellasmaaldades, e tornar ha devida pendença, nom fossem prezos, mas que lhedessem algum remedio saudavel pera suas almas, e hos que pelo contrairo,fossem ostinados, fossem prezos, e de justo juizo punidos, e foi postopor Edito geral pera sempre, que dahi em diante alguem nom entrasse maisna dicta Ordem, e Religiam, nem trouxesse Abito della, nem sechamasseTemplario e que todos seus beens, assi moveis como de rais, que tinhamem toda Christandade fossem, como foram dados, e aplicados aa Ordem doEsprital de S. Johaõ, por seerem hos Cavalleiros della firmes, fieis, econstantes guerreiros pela Fee de Jesu Christo.

Mas ha entrega destes beens nom foi inteiramente feita aa dicta Ordem deS. Johaõ; porque em muitas partes os Rex, e Senhores ouveraõ pera simuitas couzas, e dellas derão ha outras pessoas particulares, que sempredepois has tiveraõ, e logo na concessam destes beens, e fazendas foramtirados aquelles, que ha dicta Ordem do Templo tinha nos Regnos dePortugal, de Castella, e Aragão, cuja aplicaçaõ, e concessaõ, que pelosEmbaixadores destes Rex foi com muitas cauzas, e razoens empedida em senom dar, e fazer ha dicta aa Ordem de S. Johaõ. E mandou ho Papa, eConcilio juntamente que estes beens estivessem assi socrestados atee queho Papa com maior deliberaçaõ, e mais resguardo tornasse aver has dictascouzas, e razoens que hos dictos Rex Despanha tinham alegados, equizessem por si mais alegar, pera hos dictos beens nom seerem dados aadicta Ordem de S. Johaõ, porque depois de todo beem visto, e examinadodeteerminaria ho que fosse justiça.

Hos Embaixadores delRei, D. Diniz, e DelRei de Castella nom partiram daCorte do Papa pera Hespanha, atee ho negocio dos da Ordem do Templo nomaver final concruzaõ. Ahos quaaes pelo Papa foi mandado, que finalmenteapontassem hos fundamentos, que faziaõ, e rezoens que davam pera nomseerem com hos outros dados aa dicta Ordem de S. Johaõ, e dosfundamentos principaaes, e de moor sustancia, que foram apontados, hoprimeiro foi: «Que quando hos Rex Despanha seus antecessores mandaramchamar hos Templarios pera ha guerra, e conquista dos infieis, que nellaavia, tambeem chamaram, e vieram outro si da Ordem do Esprital, e dehuns, e outros por uzarem beem de seus officios de Cavallaria, tinhamdados em seus Regnos, e Senhorios muitas Villas e teerras, e rendas, comque cada Ordem tinha por si grande poder, has quaes todas juntas aaOrdem de S. Johaõ, ella teria dobrada potencia em cazo, que se dicesseque has da dicta Ordem refariam ha guerra contra hos imigos da fee, e noserviço delRei, e do Regno outra tanta gente quanta era ha dosTemplarios quando serviam, esto diceram que seria quando hos da dictaOrdem de S. Johaõ quizessem, cujas vontades por suas grandes forças queteriam, se nom poderiam forçar, nem sojugar de que se seguiria outro tamimpossivel, e grande inconveniente que nom convinha pera ho beem, esegurança dos Regnos, que quando estes do Esprital nom quizessem guardardivida lealdade elles segundo hos muitos Castellos, e Fortalezas quetinham nos estremos de seus Regnos teendo taal desposição, e poderpoderiam meter na teerra, e alevantar no Regno outro novo, e contrairoSenhorio, com que tudo se lhe despedesse, e destroisse, e denegariam haobediencia ahos Rex, e Prelados, como, e quando quizessem segundo emAragam hos dictos Templarios em outros tempos por seu grande poder jaafizeram.»

E alem destas razoens apontaraõ hos dictos Embaixadores outras casi haestas conformes que aqui são escuzadas. Durando ho quaal debate, e antede se concruir ho dicto Papa Clemente V faleceu, e depois de sua morteha dous annos, e tres mezes antre hos Cardeaes ouve discordia antre haeleição do socessor, e cessando seus debates, e seendo conformes foi emeleição criado Papa seu sucessor, ho Papa Johaõ XXII no quaal tempo dadicta discordia, e vocaçam da Cadeira de S. Pedro, hos Embaixadores, eProcuradores dos Regnos se vieraõ ha Espanha, sem se tomar final assentosobre has couzas dos Templarios, que queriaõ, e no mesmo tempo antes dadeterminaçaõ ElRei D. Diniz ouve pera si todalas rendas dos beens, epropriedades delles, e hos converteo no que lhe pareceu serviço de Deos,e beem de seus Regnos, aho qual ho dicto Sancto Padre escreveo, que peradeterminaçam desta couza, que ficara suspensa enviaasse ha elle seusProcuradores, hos quaaes logo enviou hum Pero Martins Conego de Coimbra,e Johaõ Lourenço de Monçaraas Cavalleiro, que eram pessoas de boomsaber, e aacerca delRei de booa auctoridade.

E chegaados ante ho Papa diceraõ ha Sua Santidade em sustancia, e ahosCardeaes que eram presentes has rezoens, e cauzas acima apontadas perahos beens, e fazendas dos Templarios nom virem aa Ordem de S. Johaõ, haquaal se nom podia ajuntar, e encorporar seem grande perjuizo delRei, edo Regno de Portugal, e com esto diceraõ mais que pera Sua Santidade, eho Sagrado Collegio dos Cardeaes mui claramente verem que ElRei D. Diniznom contrariava taal concessão por alguma cobiça que tivesse daver hosbeens, Lugares, e teerras dos dictos Templarios, mas que antes hosqueria pera serviço de Deos, e defençaõ, e exalçamento de sua sanctaFee, que soubessem que ho dicto Rei tinha no seu Regno do Algarve humCastello mui forte, que diziaõ Crasto Marim, que era na frontaria dosMouros Despanha, e Dafriqua, na quaal Fortaleza se podia fazer novoConvento, e nova Religiaõ, em que entrassem novos Cavalleiros de JesuChristo lidadores por defençaõ da sua sancta Fee, e por seuacrecentamento.

Ho quaal Castello lhe aprazia tirar da Coroa de seu Regno, e dalo detodo por seu isento aa dicta nova Ordem que se fizesse em que averiamuitos Cavalleiros de continoa, e forçosa resistencia contra hos imigosda Fee, e que estes beens dos Templarios dividamente se poderiaõconceder, e apropriar, e porém pediam ha Sua Santidade em nome delRei D.Diniz, que assi ho quizesse outorgar, pelo quaal ho Papa, e Cardeaesvendo ha sancta tenção, e boom dezejo delRei aacerca do serviço de Deos,e de sua Fee, satisfez em todo ha suas onestas petiçoens, e ouve porbeem de se fazer ha nova Ordem de Cavallaria de Christo, que agora hee,aa quaal hos dictos beens, e couzas dos dictos Templarios fossem perasempre atrebuidas, e que hos Freires della fizessem sua profissaõ pelaRegra, e Estatutos da Ordem de Calatrava, e que ho Abbade Dalcobaça, quepelo tempo fosse vizitasse esta Ordem; com outras mais crausulas, efolenidades que nas Bulas da nova instituiçaõ saõ conteudas, has quaaeshos dictos Procuradores trouxeram ha ElRei D. Diniz, que era na Villa deSantarem, com que foi mui alegre.

E ali foi feita, estabelecida, e decrarada ha dicta nova Ordem deChristo, e foi logo della ho primeiro Mestre D. Frei Gil Martins, queentão era Mestre Daviz, e foi esto feito, e celebrado na dicta Villa deSantarem no mez de Maio da era de mil trezentos e vinte annos, (1320)avendo jaa doze annos, que ha dicta Ordem do Templo era jaa destroidapor cobiça do dicto Rei Felippe de França, ha cujas culpas Deos que heeem todo justo, nom tardou muito com justiça e pena, porque este ReiFelippe correndo monte ho cavallo em que corria arrastrando como touroho matou, e delle ficaraõ tres filhos, e huma filha Dona Isabel, hasaber ho maior Felippe, e o segundo Luis, e ho menor Carlos, e ha filhaDona Isabel que cazou com ElRei D. Anrique Dingraterra, hos quaaes todosmorreram sem delles ficar erdeiro de França, e ficou desta vez estintaha geraçaõ dos Rex de França, que vieraõ de Ugo Capet.

Nos quaaes annos que ha Ordem de Christo nom foi feita, El-Rei D. Dinizrecolheo pera si has rendas da dicta Ordem do Templo como dice, e dellasouve solene quitaçaõ dada, e outorgada pelo dicto novo Mestre de Christofundada em razoens que pareciaõ asaas justas, e onestas, e porcompensassaõ desso se deu aa dicta Ordem ho Castello de Crasto Marim,onde primeiramente foi ordenado ho Convento della, e depois se mudou aaVilla de Thomar, onde era ho Convento dos do Templo.

Ha quaal Ordem de Christo por proprios Mestes, e com nomes de Mestres segovernou, e regeo atee ho tempo do Ifante D. Anrique, filho legitimodelRei D. Johaõ deste nome ho primeiro de Portugal, que da dicta Ordemfoi ho primeiro, e perpetuo administrador, ho quaal por sua singulardevaçaõ, e grandeza de animo por nom seer cazado, nem teer filhos,acrecentou muito na dicta Ordem ha que procurou, que fossem dadas muitasrendas com jurdiçam do Espiritaal das Ilhas de Guinee, que elleprimeiramente descobrio, e depois ha dicta Ordem em rendas, e comendas,e jurdiçoens, e em privilegios, e liberdades foi muito mais ennobrecida,e acrecentada em tempo delRei D. Manuel N. Senhor, que della tambem porautoridade Apostolica foi perpetuo Governador ha que creceram reçoens,edeficios, e excellentes Ornamentos, e novas comendas, e ha vintena dasgrandes riquezas das Indias, Arabia, Persia, que elle como Princepevirtuozo, e de grande animo, novamente mandou descobrir, e achou, comoem sua Coronica mais propria, e largamente hee decrarado.

CAPITULO XVIII

Da discordia, que ouve antre ElRei D. Dinis, e ho Ifante D. Affonso seufilho erdeiro, e has causas porque.

Atraaz fica escrito has deficuldades, e trabalhos com que ElRei D. Dinizcazou o Ifante D. Affonso seu filho, com ha Ifante Dona Breatiz, filhadelRei D. Sancho de Castella, e por lhe teer grande amor, e afeiçaõ comoha rezaõ requeria, lhe deu sua caza em Lixboa, com muitas, e graãdesfestas, pera que de seus poovos ouve grandes ajudas, e assi se acha, queaalem de muitas Villas, e teerras, que tinha lhe ordenou mais de seuassentamento, em cada hum anno oitenta mil livras, que estimadas segundoha valia da prata daquelle teempo, valiam da moeda dagora trinta e dousmil cruzados, ha rezaõ de duas livras, e meia hum cruzado, que heeverdadeira conta, e asaaz aprovada, como outras vezes jaa dice, e assiem todalas couzas, que occurriam se vio que ho honrava, e estimavamuito, e tinha cuidado de lhe criar seus filhos, porque jaa atee esteteempo elle ouvera ho Ifante D. Affonso, que menino faleceu em Penella,e assi ouve ho Ifante D. Diniz, que seu avoo ElRei D. Diniz com grandeamor criava em sua caza, e nella faleceu moço, porque ElRei foi tamanojado, e triste que nom sabia, nem podia com nenhuma couza seer ledo,nem consolado, e em tanto estremo sentio ha morte deste seu neto, que hoPapa lhe escreveo sobresso hum Breve de consolaçam, cheio de muitaprudencia, e graãdes confortos.

E por estas cauzas aalem das outras obrigações naturaaes, e Reaaes quenelle avia, nom hee de duvidar, que ho Ifante D. Affonso devera semprede amar, e obedecer sobre todos a ElRei D. Diniz seu padre, e assi lheacatar por aver abençam de Deos, e ha sua, ho que em principio de suaidade, em seendo Ifante nom se acha seer assi, antes ho contrairo, cujaverdade, e declaraçam em cazo, que por sua graveza nom seja doce, nemgracioza couza pera ouvir, porém ha necessidade de sua Estoria, queescrevo obriga, e constrange ami que ho nom cale, principaalmente pormostrar, que hos lizongeiros, e maaldizentes antre hos padres, e hosfilhos nunca ajam lugar, nem sejam ouvidos, que se estes nom foramcridos, nom ouvera tantas cauzas de desavença dantre ElRei, e seu filho,e assi pera que se saiba quam grande erro hee daar pena, e castigo haalgumas pessoas por quaalquer maal, que delles seja dicto posto quetraga em si muita cor de verdade, atee elle sem paixaõ nom seer primeirosabido, e justificado, e tambem porque nos erros, e graveza, que se virnas desobediencias, e desacatamentos que ho Ifante teve ha ElRei seupadre se vejam, e resprandeçaõ mais craro has boondades, e merecimentosdos filhos, quando acerqua de seus padres usarem ho contrairo.

E porque nestas desavenças delRei, e de seu filho ouve, e se passaraõmuitas, e mui largas couzas, que seriaõ mui longas pera escrever, eudellas soomente apurarei brevemente has principaaes, e has que pera estaEstoria mais necessarias me parecerem. E segundo ho que acho, e pudecomprender, tres rezoens ouve, e todas sem cauza, nem rezaõ, porque hoIfante D. Affonso se moveo ha esta sua desobediencia contra seu padre,das quaaes ha primeira foi em Beja, por sentir que ElRei D. Diniz queriagrande beem ha D. Affonso Sãches, e aho Conde D. Joaõ Affonso seusfilhos naturaaes, hos quaaes segundo se acha nom serviam, nem catavaõaho Ifante como elle desejava, e merecia, e deste conto nom era ho CondeD. Pedro tambem seu irmaão bastardo, e de todos hos bastardos ho maisvelho, porque sempre seguio ha parte do Ifante, e por esso foi harequerimento de D. Affonso Sanches desterrado de Portugal pera Castella,e todas suas teerras, e fazenda tomadas, e depois retornado, como ahodiante se diraa, e ha segunda cauza foi ha grande cobiça, e desordenadodesejo, que sempre teeve de aver, e cobrar pera si has riquezas, etezouros delRei seu padre, e ha terceira por querer, que em toda maneiraElRei deixasse, e tirasse de si ha Justiça, e Governança do Regno, elivremente ha deixasse ha elle.

E porém em algumas destas couzas nom avia cauza, nem rezaõ que pera hoIfante nom fosse grande erro querellas, e muito mais procurallas, porqueElRei querer beem ha D. Affonso Sanches, e aho Conde D. Joaõ era granderezaõ, e assi por seerem seus filhos, como por hos achar sempre emtodolas couzas mui conformes aa sua vontade, e ha seu serviço muiobedientes, especialmente que ha afeiçaõ, que ElRei lhes mostrava nomempedia, nem mingoava ho do Ifanto seu filho, mas como ho amor, esenhorio sempre querem seer senhores, por esso saõ mui amiude mui cheiosde ciumes, e sospeita, pelo quaal ho beem, que ElRei mostrava ahosoutros seus filhos cauzava na vontade do Ifante mui duvidosa tençaõ, comque enganandose cuidava, que ElRei ho nom amava tanto, quanto devia, epor esso por todolas as maneiras, que podia trabalhava, e procurava deapartar, e desavir estes filhos delRei seu padre, assi como logo fez ahoConde D. Pedro seu irmaão, que era ho maior dos filhos bastardos, hoquaal por couzas craras, que lhe fez entender, ho tirou da obbediencia,e seu serviço delRei que antes andava, e ho recolheo pera si, porquefavorecia sua parte, e dizer, e requerer que ho regimento da Justiça doRegno devia seer todo do Ifante, aho que ElRei contrariava com muitasrezoens asaaz justas, por as quaaes aconselhava ho filho, que o taalrequerimento ouvesse por escuzado.

E porque ho Ifante vio, que ElRei seu padre em nhuma parte destas lhenom satisfazia, aconselhado, e induzido falsamente de hum Gomes LourençoVogado de Beja, filho de hum Carpinteiro, que depois foi Freire deSan-Tiago, teve taaes meios, e inteligencias com a Rainha Dona Maria deCastella sua sogra, que ella enviou pedir ha ElRei D. Diniz, que porquanto desejava ver muito sua filha, e seu genro, e os Ifantes seusnetos, que jaa tinha, ouvesse por beem que elles ha fossem ver haCastella, e porque ElRei por secretos meios que laa trazia soube, eentendeu craramente, que has taaes vistas naõ eram pera algum beem, nemasecego seu, e de seu filho antes pera alguma torvaçaõ, e dano dambos, edo Regno, falou sobresso aho Ifante, e lhe rogou, e encomendou que porsua bençam escuzasse sua ida, ha quaal fosse certo, que ha elles, nem haPortugal nom trazia proveito, antes era fundada, e requerida pera seudesserviço, e dano da teerra, e que abastava por principaal pera elledeixar de hir ha Castella, em cazo que outro nom ouvesse dezejar elle, equerer que nom fosse, ha que elle por aver sua bençaõ devia mais deobedecer que aa Rainha sua sogra.

E com tudo esto, e com mais outras alegaçoens, e inconvenientes queElRei lhe poz, ho Ifante nom desistio de seu proposito, e sem licença, econtra vontade delRei foi todavia, e levou ha Castella ha Ifante DonaBreatiz sua molher, e depois de consultarem em Cidad Rodrigo has couzassobre que foram, que todas eraõ contra ho gosto, honra, e serviçodelRei, ho Ifante se tornou ha Portugal, e nom se passaram muitos dias,que logo nom veio ha ElRei D. Diniz em nome da Rainha Dona Maria sogrado Ifante, hum Pero Rondel Ouvidor da Justiça em caza delRei D. Fernandode Castella, e da sua parte, aa sua grande instancia lhe requereo, epedio que por algumas cauzas coradas, que apontou desse ho Regimento daJustiça aho Ifante D. Affonso seu filho. Do quaal requerimento ElRei cõgrandes estranhamentos se escuzou, maravilhandose muito da boondade, eprudencia da Rainha requerer taal couza, e taõ contraira ha toda rezaõ,e onestidade, porque elle quando em cazo de velhice, ou por outroempedimento que tivera, requerera aho Ifante seu filho pera tomarsemelhante regimento, ainda elle como filho obediente seendo seu paivivo, e em booa idade pera reger como era, se devera desso escuzar,quanto mais querer forçar ho que boom filho nunca fizera, e destareposta delRei ha que ho Ifante era prezente, elle como aggravado, e muianojado se despedio logo de seu pai, e foi sempre andar apartado delle.

CAPITULO XIX

Das couzas que ho Ifante capitulou pera matar Affonso Sãches seuirmaão, ou ho desterrar fóra do Regno.

Porque ha maginaçam, e sospeita que o Ifante tinha do beem, que ElReiqueria ha Affonso Sanches seu filho, ho trazia em muita door, e cuidado,para desto seer livre, elle cõtra ho que ha seu Real sangue, e Estadodevia, fantaziou em sua memoria hum engano com que falsamente, e comalgum achaque ho matasse, ou ElRei ho desterrasse do Regno, e esto fez,que ho Ifante falou secretamente com hum Pedro Guilhelme, e com outroPero Gonçalves, que viviaõ com elle e em que se muito fiava, ahos quaaesmandou que fossem fóra da teerra, e de lá trouxessem escrituras comsinaaes, e mostranças de seerem pubricas, e mui autenticas, everdadeiras, porque craramente se mostrasse, que elles de mandado doIfante foram buscar, e acharaõ homens ha que ho dicto Affonso Sanchespeitara porque trouxessem, e dessem peçonha aho Ifante D. Affonso, deque logo morresse. E estes passado algum tempo depois, que manhosamentepartiram do Regno, tornaraõ ha elle, e trouxeram aho Ifante, que estavaem Coimbra estromentos pubricos escritos em Castelhano, que perante hosJuizes da Cidade, foram logo pubricados, e tomados delles autorizadostrelados, cuja sustancia era.

«Que ahos trinta e hum dias do mez de Novembro da era de mil trezentoscincoenta e sete annos, ante ha porta de Sancta Maria de Magazella,presente Johaõ Pires, que aquelle anno fora Algoazil, e Diogo Dias, eVasco Fernandes Alcaides, e Johaõ Preto, Tabaliam do Lugar, novevaqueiros que vinhaõ por si nomeados, com outros vaqueiros de RuySanches Davilla, trouxeram prezos aho dicto Lugar de Magazela cincohomens do Senhorio de Portugal, antre hos quaaes vinha hum acavallo, queparecia de rezão, e boom entendeer, e que hos dictos vaqueiros disseram,que no Lugar que dizem Aguama termo da Magazela, aquelle homem decavallo com outros traziam prezo outro homem Portuguez, que tinha feiçaõDescudeiro, ho quaal bradando dizia, homens do Senhorio de Castellaacorreime, que Portuguezes me levam prezo pera em sua teerra me matarem,e que ha estes brados hos dictos vaqueiros acodiraõ, e querendo livrarho prezo Portuguez daquelles Portuguezes que ho traziam, que o dictohomem de cavallo dicera apressadamente ahos seus de pee: «Matai estetredor porque nom fique com vida.» E que hum delles lhe dera humalançada por hum braço, e que o de cavallo sobresso lhe arremessara halança que trazia, e ho atrevessara por detraaz atee hos peitos, e que osvaqueiros vendolhe fazer taal crime lançaram maão logo de quatro homensseus, e que ho de cavallo querendolhos tirar, e defender, hum dosvaqueiros arrancou hum dardo, e ho ferio, e ho Escudeiro quando vira hosseus homens prezos, dicera ahos vaqueiros, que nom tinham rezaõ deprenderem, nem fazerem maal ha elle, nem ahos seus, pois nom fizeraõmais maal, que matar seu imigo, e que pera verem que elle demandavarezaõ, que ho deixassem, e que elle era contente de ir ha cavalloperante os Juizes de Maguazela, e que elles depois de ho ouviremmandariam ho que fosse justiça.

E que ante de irem pera ho dicto Lugar, que ho Cavalleiro rogou ahosvaqueiros, que pera certidão do que dizia, chegassem aaquelle lugar ondejazia ho ferido Portuguez, hos quaaes chegando ha elle ho Cavalleirodicera aho ferido. «Amigo eu saão Pero Gonsalves, Escrivão do Ifante D.Affonso de Portugal, e voos sabeis beem ha maaldade, e treição quetendes feita, com Garcia Dalmuche, que eu fiz matar nas manchas Daragampor ambos buscardes, e ordenardes peçonha pera mataarem ho Ifante meusenhor, e agora lembrevos, que estais em tempo da rependimento, e dedizerdes ha verdade, por nom perderdes ha alma, pois jaa perdestes ocorpo.» E que ho ferido respondera, que tudo era verdade, e que por estoelle tinha tratado, e buscado contra ho Ifante aquelles Portuguezes queho traziaõ prezo, ho quaal logo falecera, e que sobre esto em chegandoahos Alguazis do lugar, ho dicto Pero Gonsalves mostrara huma cartaaberta patente do Ifante, porque geraalmente fazia sabeer, que elleenviava ho dicto Pero Gonsalves contra alguns que procuravam de fazermaaos feitos contra elle, e que porem ho encomendava aas Justiças dosLugares pera que lhe dessem ha ajuda, e favor, que elle requeresse, eaalem desto, que ho dicto Pero Gonsalves requeria mais ahos dictosJuizes, que perguntassem hos vaqueiros aacerqua do que ho Escudeiromorto em morrendo confeçara, hos quaaes diceram todo ho que atraaz heeescrito, e mais que ho dicto ferido em querendo morrer dicera.

Eu naci em na maa hora antre todolos homens da teerra, de que saõnaturaal, e assi aquelle por cujo concelho esto fiz, porque certo heeque Garcia Dalmuche, e eu com outros buscamos, e compuzemos peçonha peramatar ho Ifante, mas quiz ha sua booa ventura, que por ella se nom obroucouza, que lhe danasse. E com tudo diceram, que ho Ifante se guardasse,e que perguntado ho ferido pelo nome daquelle do sangue do Infante porcujo concelho, e mandado esta peçonha se ordenava, que elle respondera,que pera que era perguntar ho que todo ho mundo sabia, e que mais nomderia, e com esto pedira confissam, e em lhe tirando ha lança, que tinhaatravessada logo morrera, pelo quaal hos dictos Alguoazis, e Alcaide,visto esto mandaram que ho dicto Pero Gonsalves, e hos seus se fossem embooa ora, e livres, e lhe mandaram daar hos estromentos pubricos, commuitas testemunhas, que sobre esto pediram.»

E depois que estes estromentos em Coimbra se pubricaraõ, de que todosforaõ hi espantados, ho Ifante mandou mostrar ho treslado delles ha seupadre, por Nuno Martins Barreto, e por Ruy Garcia do Cazal, e pedir-lheque logo desse ha Affonso Sanches ha emenda, e castigo, que em tam feiocazo merecia. Do que ElRei foi asaaz maravilhado, e posto em mui tristespensamentos, ainda que logo conheceo, que tudo eram manhozas envençoens,e maal compostas, e ahos messageiros do cazo, respondeu por maneira, queforaõ elles contentes, e sobresto ElRei enviou logo aho Ifante, FernamRodrigues Bugalho, e Lopo Esteves Dalvarengua, pessoas de que fiava,pelos quaaes lhe enviou certificar ho nojo, e tristeza que do cazopassado tinha recebido, ho quaal era de calidade, que fazendose contraho mais pequeno vassallo seu, elle ho estranharia, e puniria muigravemente, quanto mais contra elle seu filho, que elle amava decoração, e suas couzas assi lhe doiam, e tocavam como se fossem feitas,e ordenadas contra sua Reaal pessoa, e que fosse certo, que quaalquerseu irmaão lidimo, se ho tivera, que contra elle fizesse semelhantetreiçam, que seem nhuma piedade lhe mandaria tirar ho coraçaõ pelasespadoas, como aho mais vil homem de sua teerra, e que porem ElRei lherogava, que hos proprios originaes de que vira hos treslados lhequizesse mandar, que logo lhos tornaria, e porque por elles se queriabeem informar pera sabeer ha verdade donde tanto maal nacera, e quaaeseraõ hos participantes nelle, pera tudo emmendar, e castigar com penas,e rigores que elle viria.

Aho que ho Ifante respondeo, que se maravilhava muito delRei seu padre,hum feito tam craro, e de taal importancia querelo poor em vagarias, nasquaaes elle nom queria poor seu corpo, vida, e honra, porque se ElReitivesse vontade de ho estranhar, e punir como lhe enviava dizer asaazprovado estava ho erro pera na exequçaõ delle nom procedereminterlucutorias nem tantas delongas, e que jaa em cazos, que menosrelevavaõ, e comprova que nom era tam abastante, mas por soo prosunçamlhe vira proceder contra muitos, e punillos, e que assi ho devia fazerneste cazo, e que hos originaes por seerem escritos em papel, e por senom perderem tinha mui beem guardados antre duas tavoas, e que ha ElReihos mostraria quando fosse necessario, e que porém, que sobresso mais seavia de fazer com mostranças da meaça.

CAPITULO XX

Da diligencia que ElRei fez pera saber ha verdade dos estromentos deMaguazella.

Com esta reposta do Ifante em que pareceo que elle se cerrava peraprefeitamente se nom saber ha verdade do cazo, que desejava, ElRei peratirar de si sospeiçoens, e escrupulos da vontade, antes de tudo ouve porbeem denviar, como enviou, por messageiro avizado com sua carta de rogoahos do Concelho de Maguazella, encomendandolhes, que do cazo que nosestromemos era particularmente apontado, lhe mandassem dizer ha verdade,e que viesse por todos beem autorizada, hos quaaes juntos todos em seuconsistorio maravilhados primeiramente de taal novidade, responderamlhesustancialmente, que todalas couzas conteudas nos dictos estromentos nemsoomente huma nom fora, nem era verdade, porque naquella Villa nom avia,nem nunca ouvera taaes homens, que fossem justiças, nem Tabalians, nemtaaes vaqueiros, nem memoria de taal feito, como aquelle acontecesse emMaguazella, nem em seu termo, nem em toda aquella Comarqua, sobre quefizeram grandes deligencias de que enviaram ha ElRei D. Diniz suascertidoens asinadas por todos, e aseladas com ho selo do Concelho.

E com esta reposta de Maguazella, em ha falcidade foi ho Ifante beemcompreendido, e ElRei foi muito maravilhado, e recebeo grande nojo, quelhe pareceram começos, e fundamentos que ho Ifante lançava, e fazia peradescobertamente lhe desobedecer, e ho desservir, e pera algumatemperança, e resguardo desto ElRei fez ajuntar em sua Camara ha D.Johaõ Mendes de Briteiros, e Martim Affonso de Souza, e Gonçalo Anes deBerredo, seus sobrinhos, e D. Pedro Estaço Mestre de San-Tiago, e D. GilMartins Mestre de Christo, e D. Vasquo Mestre Daviz, e Vasquo Pereira, eVasquo Martins de Rezende, e outras pessoas nobres de sua Corte, e emConcelho, e perante elles todos fez leer ha carta, e titolo que hos deMaguazella lhe enviaram, e acabada de leer, ElRei perante todos logodice.

«Certo hee, que ha alguns pareceraa esta minha fala escuzada, pois hafaço com paixam, que nom posso dizer has muitas mercees, e grandesbeneficios que tenho feitos aho Ifante meu filho, que apoz elles nomdiga hos erros, e desobediencias, e desagradecimentos, que contra miteem cometidos, e cada dia comete, e porém ha door, que tenho em minhaalma, e ha sanha que encende ho meu coraçam, são tamanhas, que me forçammeu proprio sizo, pera que has nom possa encobrir, e dellas me fazem quevos diga algumas, aho menos pera saberdes minha fortuna, e minhadesculpa, e sobresso procurardes, e dardes ha esto algum remedio, econcelho pois eu jaa nom sei, nem posso.

Beem sabeis todos, quam honradamente, e com quanta prosperidade semprecriei ho Ifante, e quanto de coraçam sempre ho amei, e por este grandeamor, que lhe tinha nom seendo inda em idade de seis annos, lhe dei cazaapartada com muita teerra, e grande contia, e com boons e honradosvassalos, ho que hos Rex de Portugal meus antecessores, ha seus filhoserdeiros de tam pouca idade nunqua costumaram fazer, porque cazados, eem moores idades sempre andavam com seus padres em sua caza, atee quelhe apartavam has suas sem teerem vassalos, nem servidores proprios, epera prova desto sabeis, que como quer que ElRei D. Affonso meu avoo,filho delRei D. Sancho sendo Ifante, fosse cazado com ha Ifante DonaOrraqua, e tivesse filhos, sempre porém andou em caza delRei seu padre,e se ElRei D. Affonso Conde de Bolonha ho fez ha mi, foi em tempo que euavia jaa dezoito annos, e avia catorze que elle jazia em cama seem sepoder soster e alevantar, de maneira que depois, que me apartou caza, easinou teerra nom viveo mais que dezanove mezes, e quantos trabalhos,perigos, e despezas, eu com muitos de minha caza, e teerra passei, porse fazer seu cazamento com ha Ifante Dona Breatis sua molher, vós todosho sabeis pois tambeem ho passastes comigo e ho conhecimento, que elledesto teem, e ho galardam que por esso me daa, sam nojos, edesobediencias que andando em minha caza, e fóra della sempre me fez, eque todas aqui nom diga algumas por minha satisfaçam seraa forçado, queha aponte.

Primeiramente despedindose de mi, e de meu serviço ho Conde D. MartimGil pela contenda, que antre elle e Martim Sanches meu filho avia sobrepartilha derança, por seerem ambos cazados com duas irmãas posto, que eusoubesse que o dicto meu filho fora maltratado, e deserdado contradireito, eu fui favoravel aho dicto Conde, por amor do Ifante meu filhopor seer seu, aacusta do muito dinheiro meu que por composiçam, que deiao dicto Affonso Sanches, hos concordei, e seendo ho Conde meu vassallo,e meu Alferes moor, e Mordomo do Ifante, que eram officios pera me teermuito em mercee, e avia por ello obrigaçam pera me lealmente sempreservir, elle antes, que se de mi espidisse, errando nesso ha lei denobreza, e fidalguia, que como nobre devera guardar, se foi fazervassallo delRei de Castella, e lhe fez preito, e menagem contra misopena de tredor, que toda sua vida ho servisse contra mi, quando ellemandasse, convocando pera si alguns homens honrados do meu Regno, peraque fossem contra meu serviço.

E como quer, que ho Ifante desto fosse beem sabedor, nom estimou ogrande dano, desserviço, e deshonra, que se desso podia seguir ha mi,que sam seu pai, e aa Coroa de meu Regno de que hee successor, mas antespor estos erros ho ama, e estima, e fia mais delle do que antes fazia, eihe escreve cartas de grande favor, e lhe faas mercees como se ha mi, eha elle has merecesse, ha quaal couza nom sei ha quem nom pareça muitoestranha se nom ha elle, que sendo meu filho, e vassallo, e ha quem meusRegnos pertencem de direito ho aa por beem sem teer lembrança destasobrigaçoens polas quaaes de razam naturaal, e divina, devia querer maal,e desamar muito ha quem cõtra miuza de tanta treiçam. Tambem sabeis, queestando Affonso Sanches meu filho, concertado com Dona Isabel sobreescaibo de Medelim por Aguiar, e seendo dia antre elles certo, e asinadopera ho dicto concerto se fazer sopena de dous mil marquos de prata, eindo ha esso ho dicto Affonso Sanches por meu mandado, e consentimentoho Ifante saio ha elle com voos, e tençaõ de ho matar, posto que Ihe eumandasse dizer por Johaõ Rodrigues de Vasconcellos, que o nomperseguisse, e ho deixasse, que hia por meu mandado, elle ho nom quizfazer, e me mandou dizer, que ho que começar a havia de acabar, aho queeu por evitar tamanho maal como se aparelhava, aahi fóra em pessoa, evoos comigo, e porém nom se pacificou ho cazo seem ho dano que vistes.

E outro si Vasquo Paaes Dazevedo, que em Castella contra mi, e meuserviço dice algumas couzas, que nom devia, querendose dellas alimparperante mi, poz ha culpa de maao ha Martim Reimondo, e porque AffonsoMartins Reimondo seu sobrinho, que era presente lhe dice que lhe poeriade praça has maãos, e ho corpo, por prova que seu tio nunqua taaldicera, e que lhe faria confessar, que nom dizia verdade, ho Ifantetomou a parte de Vasquo Paaes, e falou por elle palavras descompostas, epor Affonso Martins querer alimpar, e escuzar seu tio, hos do Ifante hoquizeraõ logo matar, e perante mi seem acatamento de minha pessoa hofizeraõ, seem meu filho tornar a esso, como devera, consentindo emtamanha injuria, como ha mi era feita. E sabeis mais, que dous sabrinhosdo Bispo de Lixboa confiando, e esforçandose como nom deviam, que pelaparte que de mi dava, e booa vontade que tinha ha seu tio, poderiam porfavor escapar de quaalquer crime, e maleficio que cometessem, efizessem, elles sobre segurança mataram pubricamente no meio do dia, eda Cidade hum filho do nobre homem, e boom Cavalleiro Estevam Esteves, epor ha fieldade, e graveza do cazo seer taal hos mandei logo prender, efazer pubricamente justiça, e de todos aquelles que foram em su ajuda, epor esso ho dicto Bispo com meu desamor, porque eu quiz fazer justiça,se foi ha Roma onde por todalas maneiras que pode procurou ho meu nojo,e desserviço do quaal ho Ifante perdeo toda suspeita, e ho teem porboom, e leaal servidor, e fia delle, e lhe faaz honra, e mercee, e hatodolos seus, sabeendo notoriamente que nisso me desserve, e anoja.

E além destas couzas que dice, outras mais desta calidade teem ho Ifantecontra mi feitas, que atee qui soportei, esperando que com crecimeto dosdias, e da honra, e estado que tinha se temperasse, e emendasse, porquecom ha emenda desso, que em si fizesse refreasse ha mi que nom dicessemaal de pessoa de meu sangue, especiaalmente delle, que depois de minhamorte aa esta teerra de soceder em meu lugar: mas porque vejo que ellecada dia, tira ho beem do beem, e acrecenta maal ha maal, ho descubro havoos outros pera que nesso me deis concelho com remedio».

Aho que cada hum dos Senhores, que eram prezentes, responderaõ com hadoor, e tristeza que por esso tinha, e pera booa paaz, e concordia antreElRei e ho Ifante, deram seu voto, e offereceram suas forças, e booavontaade. Mas ho Ifante veendo que has couzas passadas pera morte, oudesterro de Affonso Sanches seu irmaão, nom tinham socedido aa suavontade pera esprimentar se com ho poovo do Regno ho podia fazer,ordenou estando elle em Coimbra, e assi em Santarem onde ElRei era, quese dicesse como por muitos dos seus pubricamente se dizia, que ElRei comasinados, e selos seus, e de trinta, e duas Cidades, e Villasprincipaaes de seus Regnos, enviara cartas de certidaõ aho Papa porquelhe certificava, que ho Ifante D. Affonso por falecimento de sizonaturaal, e por outros grandes defeitos que tinha, nom era auto peraseer Rei, porque como parvo, e desmemoriado andava tirando, e comendohas aranhas das paredes, e que por esso pedia ha Sua Santidade pormerecee, que lhe tirasse a socessaõ, e abilitasse ho dicto AffonsoSanches pera depois de sua morte Regnar, porque pera taal socessaõ eramui pertencente, e que elle das rendas do Regno mantivesse ho Ifante seuirmaão em sua vida.

Das quaaes couzas sendo ElRei D. Diniz certificado, recebeo por ellogrande pezar, e muito sentimento, e enviou logo Lourence Anes Redondo, ePero Esteves seus vassallos aho Ifante, ha que diceram todo o passado,que os seus diziam, e ho nojo em que por esse ElRei estava, pordifamarem seem cauza de sua boondade, e conciencia, e da lealdade, eboom nome das Cidades, e naturaaes de seus Regnos, e ho que desto maissentia assi era que ho Ifante sabeendo que estas falcidades assi sediziam, nom has extranhar, e castigar com grandes penas, e muitaaspereza, como taal cazo requeria, por onde parecia, que ellas naciam detoda sua vontade, e consentimento, mas que pera todos sabeeremcraramente desso ha verdade, e que nunqua taal malicia, e treiçaõ porelle, nem pelos seus fora, nem soomente cuidada, que elle daria por essotaaes penas por dezafio, e reto posessem hos corpos, e has vidas,aaquelles que esto diziam, e asacavam, e que por suas bocas lhe fariamconfessar que eram mui falsos, e tredores, e que pera mais abastança, emoor comprimento elle escrevera logo aho Papa em quem nom avia paixamdodio, temor, nem afeiçaõ, pera que por suas Bullas, e letras patentes,e com outorgua, e aprovaçam dos Cardeaes, enviassem desto testimunho, edizer ha verdade. E esto passou na era de mil trezentos e vinte annos.Mas ho Ifante respondeo que taaes couzas nunqua ouvira, nem sabia dellasparte, e porém ElRei notificou tudo aas Cidades, e Villas de seusRegnos, que sobre esto enviaram logo pubricos estromentos de muitalealdade, afirmando cada hum que combateriam em campo ha quaaesquer quecontra ElRei, e seu Regno taaes treições, e falcidades asacassem, porquenunqua passaraõ assi, nem elles por sua lealdade has consentiriam.

CAPITULO XXI

Dalgumas couzas mais, que ho Ifante fez contra vontade, e serviçoDelRei seu padre.

Como ho Ifante andava posto em desobediencia, e com pouquo acatamentodelRei, nom olhava has couzas de seu serviço, e da justiça com aquelleresguardo, que devia, pelo quaal ElRei era posto em grande cuidado, emuita pena, porque ho Ifante pera mais danamento de sua boondadesoltamente trazia, e acolhia em sua casa muitos maalfeitores obrigadosgrandemente por seus crimes aa justiça, com que hos do Ifante tomavamgrande ouzadia de fazerem ho maal que queriam, porque nom receavam pena,nem castigo dos maales que fizessem, nem ElRei podia delles tomar haemenda, que mereciam, e antre estes era hum Estevão Gonçalves Leitaõ,vassallo do Ifante, e outro seu irmãao, e com outro em sua companhia,partiram de caza do Ifante seendo elle aallem do Douro, e foram teer oocaminho ha Estevaõ Fernandes Cavalleiro, e vassallo delRei, e ha GonçaloFernandes, vassallo de Fernaõ Sanches, e seem cauza ha ambos hosmataram, e acolheraõ-se aa caza do Ifante, que hos nom quiz entregar haElRei, que com grande instancia lhos mandou pedir pera delles fazerjustiça. Outro si, hum Paio de Meira, e Johaõ Coelho vassallos doIfante, hum de huma parte, e outro de outra, sem algum temor delRei, ede suas justiças, fizeram de Cavalleiros, e de outras muitas gentes, humgrande ajuntamento, e ambos ouveraõ peleja em que morreram muitos, antrehos quaaes foi Lopo Gomes Dabreu, que era hum dos melhores Cavalleiros,que avia em sua linhagem.

Pelo quaal insulto, ElRei por seu meirinho hos mandou desterrar fóra doRegno, e elles foraõse logo pera Castella, mas dahi a pouquos dias setornaram pera caza do Ifante, em que acharaõ boom acolhemento, e muitamercee. Outro si, hum Xeres Portel vivendo com o Ifante, com outro foiroubar ho Moesteiro do Marmellar de quanto tinha, e elles, e hos seuspor força se lançaram aas molheres cazadas, e virgens, que acharam pelateerra, e quizeram matar ho Comendador do dicto Lugar se nom seescondera, e cheios de roubos, e de maleficios se foram pera casa doIfante que hos emparou, e favoreceo. E assi depois Affonso Novaes, e MemMartins Barreto, vassallos do Ifante, e seus moradores partiram de suacaza, e com homens de cavallo, e de pee armados, foram sem cauza matarD. Giraldo Bispo Devora, que era do Concelho delRei, e vivia com elle, etambeem muitos homiziados, e maal feitores, que por seus homizidios, efugidas de cadeas, e delitos andavam fóra do Regno, vinhaõse soltamentepera caza do Ifante de quem recebiam emparo, e merecee, hos quaaes emgrande numero ali asinou, e hos cazos porque eram obrigados aa justiça,cuja mais particular declaraçam nom hee aqui necessaria.

E posto que ElRei por muitas vezes, e por muitos com cauzas evidentesenviasse rogar, e mandasse estreitamente aho Ifante, que lançasse de suacasa hos taaes homens maalfeitores, e que dali em diante nom acolhesseoutros semelhantes, elle ho nom queria fazer, antes insistia, e fariatudo contra vontade delRei, pela notificaçam, que ElRei fez aho PapaJohaõ XXII das desobediencias, e pouquo acatamento de que ho Ifanteaacerqua delle uzava. E assi do que neste Regno falsamente se dizia, queElRei asaquando defeitos do dicto Ifante lhe suplicara pela legitimaçamdo dicto Affonso Sanches pera Regnar, e Sua Santidade em reposta destoenviou ha ElRei D. Diniz pera si, e assi a todolos Estados de seusRegnos, suas Bullas patentes, em que cõ palavras de padre boom, epiedozo se doe, e maravilha da discordia antre o pai, e ho filho, e assiafirma, e daa testemunho da verdade, que aquellas difamaçoens, elle comoVigairo indinho de Christo, que do Ceo decendeo por dar testemunho daverdade, afirmava seerem falsas, e que em seu tempo taaes requerimentos,e suplicaçoens nunqua lhe foram feitos, nem has provizoens de taal couzanom se concedaram, nem passaram em seu tempo, nem dos Papas Clemente V eBenito XI seus Predecessores, cujos registros pera moor justificaçamdesto mandara com deligencia buscar, e porèm que ha todos por muitas, ebooas cauzas, que apontou, encomendava que por serviço de Deos, e porboom asecego do Regno procurassem antre todos paaz, e amizade, econcordia, como era rezaõ, ha quaal Bulla ElRei por sua limpeza mandoumostrar aho Ifante, e assi publicar em sua caza, e por todolos Lugaresprincipaaes do Regno, ha que hos poovos respondiam conformes aa verdade,de que se tiraram estormentos pera limpeza delRei, e do Regno.

CAPITULO XXII

Como o Ifante se partio de Coimbra pera Lixboa, e do que lhe aconteceocom ElRei no caminho.

E estas Bullas autentiquas, que ho Papa enviou por certeza que hassospeitas do Ifante contra ElRei, e contra Affonso Sanches, nom eramverdadeiras, nom asocegaram ha vontade do Ifante pera deixar de terodio, e desamor aho dicto Affonso Sanches, porque quando ho defamava, equeria matar, e desterrar, beem sabia que has cauzas, que contra ellepunha, todas eram fingidas; nem abrandou de sua dureza pera com hosrogos do Papa seer obediente ha ElRei seu padre, como por Prégadores, egrandes homens em pubriquo, e em secreto lhe era dicto, antes continuavano que tinha começado, pelo quaal deixando ha Ifante sua molher emCoimbra, e com ella ho Conde D. Pedro seu irmaão, partio da i, e levandocõsiguo hos maalfeitores, e degradados, e outra gente armada, foicaminho de Leiria com fama de ir ha Lixboa em romaria a S. Vicente, masha verdadeira tençam de sua ida, era pera tomar, e teer Lixboa contraElRei seu padre, e ElRei estando em Santarem, e seendo certifiquado damaneira em que ho Ifante ia, ouve taal atrevimento por grande seudesprezo, ca parecia nom aver algum temor, nem vergonha delle, nem desua justiça, especiaalmente pelo Ifante vir com tantos omiziados tamjunto delle, e como quer que ho seu primeiro movimento foi acodir logoha esso com mais trigança, e moor aspereza, porém ouve por beemenviar-lhe primeiro dizer por Pero Esteves, e Gomes Anes seus vassallos,que lhe rogava lançasse fóra de sua companhia hos maalfeitores quelevava, porque com elles mais parecia ir fazer almogavaria em teerra deimigos, que comprir com devaçaõ sua romaria em sua teerra propria.

Aho que ho Ifante nom quiz satisfazer, e neste cazo estes mesageiroslevaraõ provizoens porque em nome delRei ouveraõ hos dictos maalfeitorespor degradados fóra do Regno, ho que com favor do Ifante nunqua quizeraõfazer, e ha cazo ElRei por este cazo em muita sanha, moveo logo contraLixboa, e ha Rainha Dona Isabel sua molher com elle, e indo jaa hoIfante diante, em chegando ElRei aho Lumiar, que he huma legoa deLixboa, soube que ho Ifante seendo avizado da ira delRei, com seu medose partira pera ha Villa de Cintra, e ElRei dice contra hos seus.«Pareceme que ho Ifante meu filho, sabeendo quanto me anojava por elletrazer estes omiziados afastado oito legoas, que agora por me maisdesprazer, e menos acatar se foi com elles, e hos tem comsigo nom maisde quatro, e porque são maales, que pera Deos, e pera ho mundo jaa senom podem sofrer hee beem, que pera mais nom creccerem, vamos logosobrestes homens, que saõ cauza desto, e trabalhemos polos aver».

Pelo quaal ElRei mandou logo fazer prestes sua gente, que muito antemanhaã armados partiram, e foram contra ho lugar onde estava ho Ifante,e dice, que ElRei ordenou esto seer feito mui cedo, e secretamente,porque ha Rainha ho nom soubesse, e da sua ida nom avizasse ho Ifante.Mas ha Rainha maravilhada por sentir no Lugar tanta revolta, e veertanta trigança, e rumores daparelhos darmas, e cavallos, como soube queera contra ho Ifante seu filho, foi posta em muita angustia por taal,que nom sabia que remedio pozesse, e porém se diz, que tantos homensmandou aho Ifante, e pera tantos Lugares, e com taal pressa que antedelRei chegar ha Cintra elle era jaa avizado de sua ida. E em tanto haRainha se socorria ha Deos, ha que em Missas, e orações com muitaslagrimas pedia guardasse ho Ifante da ira delRei seu padre, e por beemde todos hos pozesse em paaz, e amor.

E como ElRei chegou ha Cintra onde era ho Ifante, elle como vio seupendão, e suas gentes, armouse logo, e mandou armar hos seus, epozeraõse contra ElRei em dous lugares com mostrança daspera peleja, haquaal nom ouve, porque ho Ifante, e hos seus por quaalquer cauza, quefosse partiraõ dali, e nom esperaraõ ha ElRei. E esta se acha, que foi aprimeira vez, que ho Ifante se armou contra ElRei seu padre pera comelle pelejar em cazo, que nom pelejasse. ElRei tomou por satisfaçaõ,partirse ho Ifante, e pera ho seguir nom deu lugar ha grande sanha, quecontra elle tinha. ElRei partiose tambem de Cintra, e em chegando aaAldea de Bemfiqua, soube que ho Ifante estava da i huma legoa em humaAldea, que dizem Alvogas, de que ElRei foi muito mais anojado, porquelhe pareceo que ha soberba do Ifante, e seu desprezo contra elle, iacada vez em maior crecimento, pelo quaal ElRei determinou de ir sobre hoIfante ho quaal porque desta determinação foi logo avizado, tambem comhos seus maalfeitores, e com outras gentes com maao concelho esforçado,asentou logo em sua vontade esperar ElRei, e dar-lhe batalha, como sefora a hum imigo estranho.

ElRei como soube ha maneira em que ho Ifante estava lhe mandou dizer:«Que pois ho diabo cujas carreiras elle seguia, ho punha em taaldeterminaçaõ contra elle, que era seu pai, e seu senhor, que esso nomera salvo pera lhe dar ho castigo, que por seus grandes erros merecia, eque por esso esperasse, e nom fogisse». Pelo quaal ho Ifante vendo, quepor forças, e por rezaõ tinha contra ElRei, seu partido mais fraco, nomesperou El-Rei, e se tornou pera Coimbra, e ElRei ha Bemfica, e da i haSantarem, e nom seem muitas lamentaçoens, e grandes maravilhas por verseu filho tam seem razaõ contra si, seem nunqua querer amançar.

CAPITULO XXIII

Como ho Ifante levou ha molher, e hos filhos ha Castella, e hosLugares, que tomou ha ElRei seu padre.

Como ho Ifante foi em Coimbra, logo levou sua molher, e filhos aAlcanizes, que hee em Castella, ho quaal tinha hum Fernam MartinsDafoncequa, e ali ha deixou acompanhada dalguns Escudeiros, e se tornoupera Coimbra, onde por suas cartas cheias de piedades, e palavras,promessas, e necessidades, que apontou logo fez chamamento de todos seusvassallos, e servidores dizendo, que o socorressem, porque ElRei queriavir sobrelle, e destroilo, ou matalo, sem causa. E ElRei que estava emSantarem quando soube ha mudança, que seu filho fizera da molher, e dosfilhos pera Castella, e percebia seem cauza tantas gentes, era por essocada vez mais anojado, porque como prudente sabia, que nom podia delletomar vingança, que pera todos nom fosse mui periguoza, e porémpareceolhe que hos taaes ajuntamentos nom eram se nom pera ho Ifante virsobre elle incitado de algum espirito diabolico ho tentar pera batalha,maravilhado de ho Ifante jaa nom cançar de seus odios, e perseguiçoens.

Ha esto proveo, e atalhou com cartas geraaes, que logo enviou ha todalasCidades, e Villas do Regno encomendandolhes, que se nom enganassem daspalavras coradas, que ho Ifante mandava semear, com que hos enganasse, edesviasse de seu serviço, porque hos afagos, e promessas, que em suascartas aas gentes fazia nom era pera com elles conquistar, nem guerrearse nom ha elle seu padre, e com esto mandou ElRei geraalmente pubriquarpor tredores todos aquelles, que pera taal ajuntamento mais acodisseemaho Ifante, nem com elle andassem, ainda que fossem proprios seusvassallos, contra hos quaaes assi asperamente procederia, como contraaquelles, que cometessem treiçaõ contra ha Reaal pessoa de seu Rei eSenhor, e que da i por diante mandava ha todos seus Alcaides, ejustiças, e ha todolos outros seus naturaaes que ha todos estes quedesobedecessem seu mandado, matassem sem receo dalguma pena, que poresso ouvessem, e assi mandou, e defendeo que nom acolhessem ho Ifante,nem os seus nas Villas, e Castellos, nem lhes dessem mantimentos, nemoutra couza alguma, antes assi ho esquivassem, e fizessem contra elles,como contra imigos delRei, e de seus Regnos, e desto se passaram muitasprovizões, e cartas que foraõ enviadas, e pubriquadas por todo ho Regno.

Mas ho Ifante nos Lugares onde se achava nom consentia daremse taaescartas, nem serem feitas suas pubriquaçoens, nem obedecer ha couza queElRei mandasse. E andando has couzas neste danamento, ElRei apartou desi ha Rainha, e ha mandou Alanquer, com fundamento de fazer seusnegocios secretamente seem ho saber ha Rainha sua molher, de quemprezomia, que ho Ifante era logo avizado, e logo foi certifiquado, quehos da Villa de Leiria, deram nella entrada aho Ifante, e que tinha jaaho Castello, e irado ElRei por este feito moveo, logo contra Leiria comtenção de queimar, e destroir todos aquelles, que foram em consentimentoda entrada do Ifante, porque ha pena destes fosse ahos outros exemplo, equando chegou ha Alcobaça jaa i achou muitos moradores de Leiria, quecom medo de sua ira ali se acoutavaõ, como ha Caza sagrada, que lhespodia valer, hos quaaes posposto todo acatamento Daltares, e dassepulturas dos Rex seus avoos, ha que se abraçavam, mandou ElRei logotirar, e estando pera irozamente delles mandar fazer crua justiça lhechegou recado, que ho Ifante por força entrara ho alcacer de Santarem,ha que ElRei com grande pressa logo acodio e ho Ifante receozo delRei, ede sua ira, e poder que trazia, deixou ha Santarem, e se foi ha TorresNovas, onde se diz, que foi ho enterramento de Affonso Vaas Pemintel,que era seu Cavalleiro, ha que queria grande beem.

E tanto que ElRei chegou ha Santarem, logo mandou ha Lourence AnesRedondo, que jaa estava no alcacer de Leiria, que logo dece passe, ematasse todos aquelles que deraõ entrada da Villa aho Ifante, emcomprimento do quaal, decepou, e queimou nove homens dos melhores, emais principaaes da Villa. ElRei mandou tornar aho Moesteiro Dalcobaçahos prezos, que da i levara pera justiçar, que depois de sua ira seertemperada, ouve por beem que lhes valesse ha Egreja, e mais Alcobaça, emque tinha singular devação. Ho Ifante nom menos perseguido, quedesobediente, e contumaas partio de Torres Novas, e chegou ha Thomar,onde pera si, nem pera hos seus, e suas bestas nom achou algum genero demantimentos, nem forragem, porque atee hos moinhos, e acenhas achou desuas ferramentas, e engenhos, de todo desconcertados, por taal que nompodessem moer mantimentos pera ho Ifante, e com esto elle se foi ahoCastello da Villa, e seem ho poder tomar tomou por força todolosmantimentos, que nella achou, e da i se foi pera Coimbra.

Da quaal se apoderou, e tomou ho Castello ho derradeiro dia de Dezembrode mil trezentos e vinte hum annos, (1321) e logo da i tomou ho Castellode Monte moor ho Velho, donde mandou dizer aho Conde D. Pedro seuirmaão, que andava em Castella desterrado, que se viesse aa Cidade doPorto, porque elle hia pera laa, e no caminho tomou ho Ifante hoCastello da Feira, que hee em teerra de Sancta Maria, de que era Alcaidepor ElRei Gonçalo Rodrigues de Macedo e da i foi tomar ho Castello deGuaia, do quaal e assi do outro de Monte moor que jaa fora tomado, eraAlcaide por ElRei Gonçalo Pires Ribeiro, e da i se foi aho Porto, e hotomou, e ali chegou o Conde D. Pedro, que sempre andou em sua companhia,e da i se foi aa Villa de Guimaraens esforçado de hum Martim Anes deBriteiros, que fez crer aho Ifante que por inteligencias, que tinhadentro na Villa, lhe faria entregar, mas ho Ifante chegou ha ella, achoudefensor dentro Mem Rodrigues de Vasconcelos, que era nobre homem, eboom Cavalleiro, e com elle boons Escudeiros, e outra gente da Villa, ecom quanto foi pelo Ifante grandemente requerido com dadivas, e mercees,e ameaçado com morte, e outras penas pera que lhe entregassem ha Villa,e ho Castello, elle ho nom quiz fazer, dizendo que em quanto ElRei seupadre fosse vivo, ha quem tinha feito menagem, nom entregaria ha Villa,nem o Castello, se nom ha elle, e que atee sobresso morrer hodefenderia.

Ho Ifante mandou combater ha Villa da quaal couza seendo ElRei avizado,ajuntou logo muitas gentes dos Concelhos da Estremadura, e das Ordens, ese veio lançar sobre Coimbra, que estava pelo Ifante, e nom entrou logona cerqua, porque estava beem guardada, e lha defenderam, mas passou noalcacer, que estava acerqua de Saõ Lourenço. E avendo jaa dez dias queho Ifante jazia em cerquo sobre Guimaraens, foi avizado, que ElRei tinhacerquada Coimbra, pelo quaal deixou ho cerquo da Villa, e se veio haCoimbra pera ha socorrer, e com elle ho Conde D. Pedro, e ante quechegasse aa Cidade se preitejou com ElRei, que se alevantasse, comoalevantou, e se fosse ha S. Martinho do Bispo, e ho Ifante chegou aaCidade, e pouzou em Sancta Cruz, e ElRei porque ho Ifante dilatou haconcordia, que prometera, veio-se logo pera S. Francisquo donde se fezmuito dano, e grande estrago no arrabalde, e nos olivaes, porque de humaparte, e da outra eram ali juntos hos mais dos Fidalgos, e gentes queavia em Portugal, e antre huns, e outros avia barreiras, e repairos, deque escaramuçavam, e pelejavam, em que de huma parte, e da outra comdoor de muitos, morria muita gente, porque hos pais seem vontade, ecerta sabedoria matavam hos filhos, e hos filhos ahos pais, e hunsirmaãos, e amigos ha outros seem alguma piedade, nem misericordia.

CAPITULO XXIV

Como ElRei, e ho Ifante foram concordados por meio, e intercessaõ daRainha Dona Isabel, e da maneira que nesso teve, e das menagens que perasegurança desso se fizeram.

E por esta discordia, que antre ElRei, e ho Ifante avia, ha Rainha DonaIsabel era triste, e anojada, e por aver antre elles booa paaz, e amorcomo era rezaõ fazia ha Deos, e mandava fazer muitas oraçoens, edevaçoens, e seendo certifiquada destas mortes, e maales tam grandes quedesta desaventura se seguiam, ella de sua propria, e virtuoza vontadepartio Dalanquer donde estava, e se veio ha Coimbra, e por si falou atodolos Senhores, que eram com ElRei, e com ho Ifante, e assi com hoConde D. Pedro, e com elles por sua sancta intercessam banhada compiedozas lagrimas, asentou que era beem fazerse logo paaz, e concordia,e ha Rainha com ElRei, e com ho Ifante concordou, que ambos se partissemda li, e se fossem ha outros lugares, dõde por pessoas seem sospeita severiam has couzas que ho Ifante requeria pera dellas lhe seremoutorgadas aquellas que fossem de razam, e onestidade, e ElRei comprazer, e consentimento desto, se foi ha Leiria, e ha Rainha, e hoIfante e se foram da i ha Pombal, e ali concertaram.

Que ElRei desse aho Ifante Coimbra, e Monte moor com seus Castellos, eha Fortaleza da See do Porto, porque ha Cidade ainda entam nom eracerquada, e por ellas fez ho Ifante menagem ha ElRei, pera de todasfazer guerra, e manter paaz, como elle mandasse, e assi acrecentou ahoIfante pera seu soportamento, mais contia de dinheiro, e panos aalem doque tinha, e ElRei perdoou aho Ifante, e ahos seus todo ho passado, e hoIfante ahos delRei, e ha rogo do Ifante foi tambem perdoado ho Conde D.Pedro, que foi restituido ha todo ho que tinha, e lhe era tomado, edestas couzas mostrou ho Ifante seer mui ledo, e mui contente, e dice,que nom menos obrigava, e tanta alegria tomava das mercees, eacrecentamentos, que delRei seu padre entam recebia, como de seer seufilho, pera por ellas dahi em diante, beem, e leaalmente ho servirsempre seem algum nojo, nem escandalo. E sobresto lhe fez pobriqua, esolene menagem, e tomou por esso juramento dos Sanctos Evangelhos sobreque poz has maãos e no Altar de S. Martinho do Pombal prezente haRainha, e muitos Fidalgos, que sobpena de seer tredor, e de encorrer namaaldiçaõ de Deos, e na sua, dali em diante sempre ho servisse, e lhefosse obediente assi como deve seer boom filho, e leal vassalo ha seupadre, e ha seu Senhor, e que da i em diante nom acolhesse mais nhunsmaalfeitores, antes hos que podesse aver prenderia, e entregaria haElRei, e ha suas justiças, e hos que trazia lançaria fóra logo de suacaza, e de seu favor.

E pera mais firmeza, e moor segurança rogou, e encomendou aho Conde D.Pedro seu irmaão, e ha Martim Anes de Souza, e ha Gonçale Anes deBriteiros, e Affonso Telles, e ha Gonçale Anes de Berredo, e ha LopoFernandes Pacheco, e ha Paio de Meira, todos riquos homens de Portugal,e ha outros nobres seus vassallos, que fizessem, como fizeram outro taaljuramento, e menagem, como elle tinha feito, e ho Ifante tambem pedio aaRainha por mercee, que pera maior, e mais seguro penhor desta concordia,e porque ElRei da i em diante mais descançasse sobre ello, que tambemella quizesse fazer por elle este juramento, e menagem ha ElRei, e ellatambem assi ho fez, com cada hum dos outros. E outro si ElRei perasatisfaçam do Ifante, e de todos tambem fez no Altar da Capella de S.Simaõ de Leiria, solene juramento de nunqua falecer aho Ifante em algumadestas couzas, que lhe prometera, e outorgara. E foram estes juramentosfeitos no mez de Maio, no anno de mil trezentos e vinte tres, (1323) eacabadas estas concordias de que todo Regno pareceo, que recebia muitoprazer, e descanço, ElRei, e ha Rainha, e ho Ifante se foraõ haSantarém, e da i ha Lixboa, onde todos estiveraõ atee Sancta MariaDagosto, e da i ho Ifante se tornou pera as teerras, que ElRei lhe dera.

CAPITULO XXV

De huma carta ao Papa Johaõ XXII aho Ifante D. Affonso filho delRei D.Diniz, sobre has dezavenças com seu pai.

Destas dezavenças, e roturas, que avia antre ElRei, e seu filho, ante deassi seerem concordados, ho Papa por quaalquer maneira que fosse, foimuito inteiramente informado do que lhe muito pezou, porque tinhagrande, e particular afeição ha ElRei D. Diniz, que ho avia em todo porRei excellente, e por ha Sua Santidade parecer, que seus Sanctosconselhos, e booas amoestaçoens podiaõ nisto muito aproveitar, enviousua carta de Bulla aho Ifante D. Affonso, cujo theor tirado por mifielmente de Latim em lingoagem hee ho que se segue.

JOANNE BISPO

Servo dos servos de Deos

«Aho amado em Christo filho D. Affonso enviamos este escrito de maissaaõ concelho, com muita torvaçam de nossa alma, mui ameude ouvimos comoho imigo semeador de odio, e enveja, por estorvar ho boom estado, e paazdo Regno, e seu louvado regimento com sua maaldade te poz em coraçaõ dete levantares contra teu pai, e como primeiramente soou em nossasorelhas taal fama de desobediencia, que por toda ha teerra hee jaa muiespargida, fez a noos grande nojo, e encheo de muita amargura nossapaternal afeiçam, e pois noos teemos nesta vida taal lugar, e poderporque aho Rei pacifico no dia do grande Juizo, avemos de dar conta dasalmas, aprazate, e nom te agraves se ha tua duramente por seu beemreprendermos, e porque ha palavra de Deos nom seja atada na nossa boca,e falemos com espirito de liberdade, por esso nom podemos encobrirtamanho maal como hee perseguir aquelle que te criou, e gerou, eestragares tam seem tento ha teerra (que atee espargeres por ella hosangue) devias sempre defender, quem hee aquelle que seem grandetorvaçaõ do epirito possa ouvir, que hum Rei tam nobre ha juizo do quaalhos Rex isentos doutras teerras com grande vontade se sometem, eobedecem a seu mandado, e concelho, seja por ti com injurias seem razam,e seem seus merecimentos tam anojado, e perseguido, e porem nom sabemosquaal couza agora digamos primeiro, ou quaal recontaremos porderradeiro, nem sabemos se choremos ho beem que perdes, ou se nos doamosdo maal que fazes, dize em que te errou teu padre, ou de que horeprendes, e que te nom fez de graças e beneficios que devesse fazer,cremos por sua confiança, que nhuma couza de erro te fez, mas afirmamos,que avondança de booa vontade, que te sempre mostrou, foi verdadeiracauza de lhe seeres tam desobediente, mas agora prouvesse ha Deos, queainda melhor soubesses, e entendesses com melhor aviso, e esguardassesno que te compria de fazer, quem he aquelle que seem grande door, etristeza possa recontar, que hos direitos, e obrigaçõens do parentescoantre aquelles, que sam conjuntos com tanta afinidade de sangue, sejamassi quebrantados, quem consentiraa seem amargozo coraçam, que ho filhoante do tempo, nom soomente queira abreviar hos annos de seu padre, masainda que com maliciosos cometimentos se trabalhe de hos acabar maiscedo, ho quaal tu sabe, que jaa mais vive por teu proveito, que peloseu, porque qualquer couza de beem que faz, e ajunta jaa todo he perati, e com muitos trabalhos, e despezas afirmou e acrecentou seu Regno,porque tu depois de sua morte podesses viver nelle, grande, e poderoso,porque te trigas ante tempo por cobrares aquillo, que ha natureza aindate nom quer dar? Nom sabes, que diz Salamaõ, que nom averraa ha bençamno fim dos dias, ho que aa erdade se atrigar primeiro que deve? Tujuntamente perdes ha alma, e ha fama por averes antes de tempo ho quedepois aas de perder, e segues ho contrairo desto nom curando de tuapropria saude.

Has lex, e direitos de todalas naçoens mandam que hos filhos emquaalquer estado alto, e baxo sempre obedeçam ha seus padres, e hosamem. Pois dize, onde hee aqui ho amor, onde hee ha reverencia do filhoaho padre, onde ha lei de natureza, onde finalmente he ho temor de Deos?Ha elle aprouvesse ora que soubesses quam alegre, e quam doce couza heeho filho obedecer, e honrar ha seu padre, e quam maa, e desventurada heeha desobediencia, e desprezo, que ho filho contra elle mostra, demaneira, que como se afasta de obedecer, logo nom parece filho. Nomsabes, que Felipo dos Emperadores ho primeiro Christaão, posto que desseho regimento do Imperio ha seu filho delle em sua vida, lhe nom eramenos obediente, que cada hum de seus Cavalleiros, e avia por grandeprazer teer vivo seu pai, e lhe obedecer? E ho Emperador Decio, quiz emsua vida Coroar seu filho, e elle ho refuzou, dizendo: Receo tomarCoroa, e ho regimento do Imperio, que me pode esquecer cujo filho sam,pelo quaal mais quero nom seer Emperador, que reger, e seer dicto filhodesobediente, Reja ho Imperio meu padre, e ho meu senhorio, de que memais contento seja em sua vida sempre lhe obedecer.

E muitos que ho contrairo desto uzaram perseguindo, e nom obedecendo haseus padres, huns morreram maa morte, outros cairam em taal cativeiro deque nunqua sairam, porem meu filho muito amado rogote, que ames, ehonres a teu padre, e toma aquillo, que a igualdade da natureza em seutempo te ofrecer, e nom queiras aver por força destroido ho Regno, queteu aa de seer, beem sabemos que ho arroido da tempestade diaboliquaarmou ho filho contra ho pai, e armou hum irmaão contra outro, alevantouhos sogeitos contra ho senhor, e porém hos beens, e fazendas emdestroiçam, e hos corpos em estrago, e ho que hee mais amargo, que vospoz has almas em desesperaçam de sua saude, teu padre mostra, e chorahas injurias, que por ti lhe sam feitas, e noos em especial avemoscompaixam delle, quanto ha opiniam do poovo, elle hee por tiinjustamente, e contra razaõ aggravado, e perseguido, que couza hee, quealguns maaldizentes que contigo vivem avorrecidos de Deos, busquandopalavras prazenteiras, e maliciosas de suas lingoas por mordeduraspeçonhentas, e concelhos enganozos sam ouzados de encher tuas orelhas devento prazenteiro, e agradavel com que ho amor natural, que ha teupadre, e ha teu irmaão devias, hee todo corrompido, quaal he hoentendimento assi boom como rudo, que nom entenda quam maa, e quamnojoza couza hee andares armado contra teu padre, e ajuntares ha tiomiziados, e maalfeitores, com que te rebelas contra elle? Quaal couzahee mais contra ha Lei de Deos, e da natureza, que ho padre movido pelainjuria de seu proprio filho, mover tambem armas contra elle? E que poroutra couza nom dizistisses do que fazes, por esta ho devias fazer.

Sabe, que tu nom combates has Villas, e Fortalezas dos imigos, nemganhas teerra alhea, mas destrues ho Regno, que por direito te heedevido, ho quaal parece que nom queres, pois nom obedeces aaquelle, quete gerou. Ó obra merecedora de gram doesto! Ó mancebia mui dina de seerchorada! prouvesse ha Deos filho meu muito amado, que com lima de melhorrazam tu esquaaldrinhasses todas estas couzas, mas certamente ho teuodoor filial jaa perdeo seu boom cheiro, antes hee jaa convertido emfedoranto, ha presença do padre injuriado, quem poderaa sofrer seemamargura, que hum irmaão por soo odio seem outra injuria se mova contraoutro, ha procurarlhe com todas suas forças ha derradeira queda de suamorte, com sua infamia, e desonra tam pubriquada? Ha quem nomavorreceraa muito, que hos sogeitos sejam tam ouzados, que cortados hosnoos, e rota ha preitezia de sua leaaldade, se trabalhem de someter, ederribar ha Reaal Alteza de seu senhor, que segundo por fama commum, emui notoria fomos certifiquados, hos vassalos do mesmo Rei, por teufavor se alevantaram contra elle, querendo querer tam desonesto, queelle nom aja poderio sobre seus Regnos? Pois seendo desto tantas vezescombatido, que queres que nesto façamos, por ventura calarnos-emos e nomte daremos ho saaõ Concelho, que aas mister? Certamente nom.

Antes esguardando todas estas couzas com mui afiquado desejo, como hafilho muito amado te rogamos, que ames, e honres teu padre, e lheobedeças, e por esso teus dias seram longuos sobre ha terra, e esto porteu beem te dizemos, nom te aggraves, porque todo nosso dezejo, e tençamhee que vivas em paaz, e obediencia com elle, pelo quaal com humildozaspreces, rogamos aho mui alto Deos, que sobre toda ha teerra senhorea, emcuja maão saão hos poderios dos homens, e hos direitos dos Regnos, queelle prestes, e beninamente queira esguardar sobre ti, e sobre hosmoradores desses Regnos de guiza, que de voos aparte toda dezavença, ehos coraçoens de todos firme em booa concordia, e humildade, e noos denossa parte devotamente pediremos aaquelle Senhor, cuja providencia emsua ordenança hee certa, e nom enganada, que em taal maneira esforce haReaal seda desse Regno, que aproveite assi, e ahos seus, e hos Reja detaal maneira, que vam pera saude perduravel com folgança de paaz.

E se ho teu Reaal resplandor assi mostrado, nom quizer penssar, eobedecer ha esto que te avemos dicto, obedecendo em tudo ha teu padre,noos por ha que com toda ha afeiçam dezejamos paaz necessaria, e portaal que possamos trazer nosso dezejo ha boom efeito, em ha nossavontade amoestamos filho logo ha ti sopena de excõmunham, e ha todolosoutros de quaalquer estado que sejam assi pessoas Ecclesiasticas, comoseculares, que torvam, ou anojaõ esse Rei, e seu Regno como nom devem,ou contra elle pobriqua, ou em secreto te dam ajuda, conselho, ou favor,daqui em diante se cavidem, e ho nom façam, porque em outra maneiraainda, que seja com grande door nossa, see certo que passados oito diasda pubriquaçam desta nossa carta, noos mandamos aho venerado irmaãoBispo Devora, que logo excommungue ha ti, e ha todos aquelles, que se hati chegarem, ainda que sejam Bispos, e quaaesquer outras maiores, esuperiores pessoas, que torvem ha paaz de teu padre contiguo, seemembargo de quaaesquer privilegios que tenham, que desta nossa carta nomfizerem mençam, paaz, e asecego, venha ha ti e ha esses Regnos comodezejamos, por maneira, que hos perigos das almas sejam escuzados, e hati creça titulo de honra acerqua dos homens, e abastança de merecimentosante Deos».

Esta carta, ou Bulla do Papa foi dada aho Bispo Devora, que ha fizessepubriquar aho Ifante estando ElRei em Lixboa, mas porque ha esse tempoElRei estava jaa em alguma concordia com seu filho, nom foi pubriquada,mas depois em outras voltas, e desobediencias, que ho Ifante cometeu sepubriquou com que ha final paaz antre elles se comprio, como aho diantedirei.

CAPITULO XXVI

Como ha Rainha Dona Maria de Castella depois da morte delRei D.Fernando seu filho, teve vistas com ElRei D. Diniz, ha que trouxe ElReiD. Affonso menino neto dambos, e do que concertaram.

ElRei D. Fernando de Castella, genro delRei D. Diniz faleceu de mortesupitanea em Jaem emprazado de dous seus vassallos, que segundo se dizmandara injustamente matar, como atraaz brevemente toquei, e por suamorte fiquou seu sucessor, e erdeiro ho Ifante D. Affonso seu filhoprimogenito em idade de hum anno, e vinte e seis dias, ho quaal fiquoulogo em poder da Rainha. Dona Constança sua madre, filha delRei D.Diniz, e tambem em poder da Rainha Dona Maria sua avoo, e porque hadicta Rainha Dona Constança da i ha pouquos annos logo faleceu, ho dictoRei D. Affonso fiquou pricipaalmente em poder da dicta Rainha Dona Mariasua avoo, e sobre estas titurias deste Rei, ouve antre hos Ifantes, egrandes Senhores de Castella, grandes competencias, e muitasdifferenças, e discordias, de que se seguio muito maal, e estrago nosRegnos de Castella, e em fim se tomou por concruzam, que com ha dictaRainha Dona Maria fossem juntamente tutores, como foram, ho Ifante D.Pedro, filho da dicta Rainha Dona Maria, e ho Ifante D. Johaõ tiodelRei, filho que fora delRei D. Affonso Decimo, ho quaal Ifante D.Johaõ, que em outro tempo esteve em Portugal, e se chamava Rei de Liamdurando sua titoria, e depois da morte da Rainha Dona Constança, DonaMaria confiando da muita verdade, e grande poder delRei D. Diniz, e assina razam, que tinha daconcelhar, e ajudar ha ElRei D. Affonso seu neto,concertou em Guinaldo Lugar de Castella vistas com elle, aas quaaescontra vontade dos grandes de Castella trouxe ho dicto Rei D. Affonsoseendo mui moço, e ali pratiquaram sobre hos desvairos de Castella, emfim dos quaaes ha Rainha lhe pedio, que se lembrasse delRei seu neto, ede seus Regnos, e que lhos ajudasse ha conservar, e defender polasgrandes necessidades, que desso tinham.

Aho que ElRei respondeo: «Que lhe agradecia muito taal confiança, equando suas forças, poder, e sabeer pera esso lhe comprissem, que nunquacom tudo lhe faleceria, como pelas obras poderia ver.» E com estoconcordado ha Rainha, e ElRei D. Diniz se tornaram pera Portugal, esobre esto passado logo da i ha pouquos dias hos dictos Ifantes D.Pedro, e D. Johaõ tutores, e juntamente com grande poder entraraõ naVeiga de Grada, pera fazerem guerra ahos Mouros, onde seendo ellesperseguidos ambos dafronta, e desmaio, e seem seer feridos morreram emhuma soo hora, ha saber ho Ifante D. Pedro, e logo ho Ifante D. Johaõ,como atraaz brevemente jaa dice, e na Coronica de Castella maiscompridamente se contem da quaal morte dos Ifantes como ElRei D. Dinizfoi sabedor, mostrou receber por esso sentimento, porque eram boonsPrincepes, e com elle muito conjuntos em sangue, e logo enviou seusEmbaixadores ha ElRei, e aa Rainha de Castella, ha notifiquarlhe, que damorte dos Ifantes, lhe pezava muito porque eram boons Cavalleiros, eaviam com elle tam grande divido, e que pois era chegado ho tempo em quelhe compria sua ajuda, e favor, que lhe tinha ofrecido, lhes pedia quelhe fizessem sabeer ho que delle lhes compria, e que fossem certos, queelle em pessoa, e com ajuda, e poder de seus Regnos, contra todos hosiria ajudar, e ElRei, e ha Rainha lhe responderaõ, que taal lembrançacom taal vontade, e ofrecimento lhe gradeciaõ singularmente, que eraõsinaaes com que ho cazo parecia, que lhes tinha grande amor, e quequando lhes comprisse ho enviariam requerer. E pera mais favor dascouzas delRei D. Fernando, ElRei D. Diniz notifiquou aho Papa ho estadoperigozo em que has couzas de Castella pela morte dos Ifantes estavam,pedindo ha Sua Santidade, que ho favorecesse certifiquandolhe com essoha vontade com que estava pera em tudo ho ajudar, e defender, e ho Papalhe respondeo, dandolhe muitas graças, e louvores por sua boondade, emanificencia por querer com tam boom dezejo encarregarse da defenssaõ, eemparo dos Regnos de seu neto.

CAPITULO XXVII

Como ho Ifante D. Affonso se aparelhou pera pelejar com ho Ifante D.Felipe, que contrariava ho asecego de Castella, e como ho Ifante D.Felipe se foi.

Por morte destes Ifantes, e tutores, que dice ElRei D. Affonso, fiquouinda em poder da Rainha Dona Maria sua avoo, pelo quaal D. Johaõ, quediceram o Torto, filho do Ifante D. Johaõ, que morreo na Veiga de Grada,e assi D. Johaõ Manuel, filho do Ifante D. Manuel, e ho Ifante D. Felipetio delRei, filho da Rainha Dona Maria, todos tres tambem contenderaõpera seer tutores delRei com ha Rainha, sobre que outro si ouve grandesdiscordias, debates, e partiçoens de que por seus desvairos, ha que senom achava rezoado meio, que elles quizessem se seguiram outros muitosmaalles, e danos ha Castella, porque cada hum sojugava, e mandavaausolutamente ha parte do Regno, que podia antre hos quaaes era hoIfante D. Felipe, que seem outorga delRei, e do Regno, e por sua soovontade, e cobiça procurava sojugar, e mandar sua parte do Regno, assicomo fizera aa Cidade de Badalhouse, que tinha cerquada, com que suateerra estragava de todo.

E estando ElRei D. Diniz em Santarem, ElRei D. Affonso seu neto lheenviou pedir que por quanto elle estava em Valhadolid donde ainda nompodia sahir, nem remediar por si ho maal, e danos, que ho Ifante D.Felipe fazia, que lhe rogava mui afiquadamente, que se lembrasse daajuda, e defença que muitas vezes lhe prometera, e que em comprimentodella mandasse dizer aho Ifante D. Felipe, que ceçasse, e se apartassedaquella teerra, e dos maalles que nella fazia. E quando por respeitodelRei D. Diniz ho nom quizesse fazer, que entam ho fizesse por aquellaCidade, e por seus vizinhos, como em similhante cazo elle faria poroutros seus naturaaes, que taal padecessem.

Aho quaal ElRei D. Diniz respondeo, que mui degrado ho faria como ellepor obra logo veria, pelo quaal escreveo com trigança aho Ifante D.Affonso seu filho, ha que quiz dar este cargo por moor autoridade, queelle mandasse, como mandou dizer aho Ifante D. Felipe, que por muitascauzas, que lhe apontou, nom fizesse dano, nem maal ahos da Cidade deBadalhouse, e se alevantasse de sobre ella, e que se o fizesse, que lhogradecceria muito, e quando nom quizesse que elle em pessoa lhodefenderia, e porque ho Ifante D. Felipe respondeo aho Ifante, mais duroque temperado, ElRei D. Diniz, que desta reposta foi avizado ouve della,e do Ifante D. Felipe grande desprazer, e mãdou logo ha todos seusvassalos, que com suas gentes, e armas se fossem pera ho Ifante seufilho, aho quaal se ajuntou grãde poder, cõ ho quaal moveo peraBadalhouse, e ho Ifante D. Felipe sabendo de sua ida, e do poder quelevava, alevantouse forçado, e foi pera Sevilha, e ho Ifante D. Affonsochegou ha Elvas onde vio algumas duvidas, que antre hos da Villa, eBadalhouse sobre seus termos, e tomadias avia, e depois de hosconcordar, se tornou pera Santarem onde era ElRei, e da i se foi peraCoimbra onde tinha sua molher, e asento de sua caza.

CAPITULO XXVIII

Como ho Ifante D. Affonso requereo ha ElRei D. Diniz seu padre, quefizesse Cortes aas quaaes depais nom quiz vir.

Avendo jaa hum anno, e sete mezes, que ha concordia antre ElRei, e hoIfante era feita por algumas cauzas, e razoens, que alegou da minguoa deJustiça, e outros defeitos, que dizia aver no Regno, lhe pedio, que peraremedio de tudo fizesse, e quizesse fazer Cortes, has quaaes ElRei pornom aver dellas tanta necessidade quizera escuzar, em fim por satisfazeraho Ifante, e assi pera notifiquar ahos fidalgos, e poovos hos aggravos,e nojos, que do Ifante depois de suas avenças recebera, prouve-lhefazelas em Lixboa pera onde chamou seus poovos, como em taal cazo heecostume, onde tambem foi ho Ifante, e ho dia em que se ouve de fazer hafala pubriqua, e proposiçaõ costumada, ElRei mãdou dizer aho Ifante, queviesse aas Cortes pera nellas estar como ha elle em taal auto convinha,e ho Ifante se escuzou fazelo, e de tantas delongas, e sem razoens uzouaacerqua desso, que ElRei ouve por beem cometelas seem elle, e porqueElRei vio que ho Ifante em todo se desviava do que lhe tinha jurado, eprometido porque ho Conde D. Pedro seu filho, era pessoa de grãdecredito aacerqua do Ifante, e tinha grande caza lhe dice: «Que selembrasse da menagem, e juramento, que em Pombal fizera, e que hos nomquebrasse, nem fosse por algum respeito contra seu serviço». E esto lhedise por alguns alevantamentos, que no Ifante jaa sentia. E ho Conde lherespondeo: «Senhor, eu sei beem ho que sobresso devo fazer, e de mi sedee seguro, que nunqua vos venha nojo, nem desprazer, nem desserviço,porque bem conheço, que nom aa pessoa neste mundo ha que tam obrigadoseja como ha voos». E sobresta segurança dice, que com sua licença sequeria ir ha Santarem com ho Ifante, e que na jornada ho nomdesserveria, e que logo se tornaria pera elle, e assi ho fez.

CAPITULO XXIX

Como ho Ifante sobre huma vinda, que contra vontade delRei quiserafazer ha Lixboa, foram perto de pelejar, e porque ho leixaram de fazer.

Passadas estas couzas, e has Cortes acabadas estando ainda ElRei D.Diniz em Lixboa foi certifiquado, que ho Ifante seu filho de Santaremonde estava queria i vir, e porque soube que nom vinha com sam propozitolhe mandou rogar, e encomendar por sua bençam, sobpena de maldiçam deDeos, e da sua, que por aquella vez escuzasse sua ida, e ho nom quizessenesso anojar, pois sabia que taal ida ha elle nom relevava, e podiacauzar muito maal, e ho Ifante lhe enviou dizer, que nom sabia razaõporque lhe pezasse sendo seu filho, que viesse ha Lixboa, onde elleestava pera ho ver, e servir, e que por esso nom avia de leixar dir. Edesta determinaçam que ho Ifante tomou, pezou muito ha ElRei, e foi poresso contra elle acezo em grande sanha, e sabeendo que ho Ifante todavia proseguia seu caminho, e que era jaa no Lumiar, saio contra elle comsuas gentes armadas, e em saindo, lhe mandou dizer, que logo se tornassepor beem, e quando nom que ho faria tornar por maal, e com seu pezar. Eho Ifante ho nom quiz fazer, antes abalou, e se poz junto com ElReiprocurando todavia contra sua vontade entrar em Lixboa, e hos delReiconcertandose por seu mandado pera lhe defender ha entrada, foram dehuma parte, e da outra postas, e ordenadas suas azes pera batalha, enellas alevantadas humas mesmas bandeiras das Quinas contrairas, e peraesso jaa toquadas trombetas, e anafins, que traziam em se começandoalguma rotura antre hos homens baixos, alguns dambalas partes se diz,que morreram de pedras, e dardos, que se arremessavaõ.

E com esta triste nova, que aa Rainha chegou, ella por escuzar com suasancta pessoa outra maior rotura antre ho pai, e o filho, com grandepezar cavalgou em huma mula, e passando por meio das azes seem algumapessoa ir diante, nem ha levar pela redea, nem tam pouquo esperar pelacompanhia, que ha ella por sua Reaal pessoa se devia, e seem medo dosmuitos perigos ha que se oferecia, chegou logo aho Ifante seu filho, haque estranhou ho cazo muito de taal vinda pois era contra vontade delReiseu padre, acuzando-o pela quebra da menagem que dera, e dos grandesjuramentos que em Pombal ha Deos fizera, rogandolhe que se tornasse, enom anojasse ha ElRei em tantas couzas, e aho menos ho fizesse por seuamor della que por elle, e por seu rogo tinha feitos hos juramentos, eprometimentos, que sabia, hos quaaes porposta ha conciencia, ehonestidade hos via por elle de todo quebrados, e sobresto tornou logoha ElRei cuja ira poz em taal temperança com que outra vez tratou avençaantre elles.

Donde se diz, que ho Ifante jaa sobre concordia com soo seis de cavalloveo falar ha ElRei, e pedirlhe perdam, dizendo, que lhe obedeceria emtodo, como ha ElRei seu padre, e seu Senhor, e que ElRei lhe respondera,que ha elle nom agradecia sua taal obediencia, mas aaquelles seus boons,e naturaaes vassallos que com elle estavam, dizendolhe que se partissese quizesse, e seria beem aconcelhado fazello, e que onde quer que fossese mais lhe dezobedecesse laa ho iria tomar pela garganta. E com esto homandou ir ha Santarem, e ElRei se tornou ha Lixboa.

CAPITULO XXX

Como has gentes delRei, e do Ifante pelejaram sobresto em Santarem e doque se fez.

Passados alguns dias depois deste alvoroço, ElRei se foi de Lixboa peraSantarem, e entrando no termo da Villa foi avizado no caminho, que hosmoradores della por mandado do Ifante que i era, estavam pera ho nomacolher na Villa, mas ElRei com quanto avia entam grandes chuvas nomleixou por esso de continuar seu caminho, e foi pouzar ha humas cazas,que foram de Rodrigo Affonso Redondo, e hos seus se agazalharam em muiestreito lugar que hos do Ifante lhe leixaram, e sobre comer porrazoens, que hos do Ifante ouveram com hos del-Rei, se alevantou humgrande, e perigoso aroido ha que ElRei, e ho Ifante acodiram em pessoascada hum ha seu bando apartado, e porém depois de alguns mortos, eferidos dambalas partes foi procurada, e posta tregoa sobre ha tardeantre ElRei, e ho Ifante, e hos seus, e porque hos Cavalleiros, e nobreshomens que se acharaõ nestas roturas, e pelejas, vendo ho grãde dano,que delles seem cauza se seguia, pediram ha ElRei por mercee, que pormuitas cauzas, e razões mui urgentes, que lhe alegaram lhes desselicença pera entenderem finalmente em sua concordia com ho Ifante.

Aho que ElRei respondeo mui aspero: nom querendo que sobre tantaspaazes, e tantas concordias firmadas, e menagens taõ seem cauzaquebradas se fizessem mais outras com tanta quebra, e desprezo, mas quequeria castigar ho Ifante como merecia, e como faria ha hum seu imigomortaal. E porém tanto aprofiaram aquelles Senhores com ElRei, e assiterçaram Affonso Sanches, e ho Conde D. Pedro seus filhos, que ElReiaprouve estar ha todo boom remedio, e aseceguo que antre elles se desse,pelo quaal se diz, que hos Cavalleiros, e Escudeiros que ElRei consigoali tinha, eram por todos quorenta, e hos do Ifante trezentos e vinte, ehuns destes se ajuntaraõ aho Moesteiro de S. Domingos das Donas, e hosoutros em Sancta Maria de Marvilla, e estes escolheram vinte e coatropessoas, homens de beem, e de conciencia, e de booa inclinaçam, hasaber, doze por parte delRei, e doze por parte do Ifante, que logo foramnomeados, hos quaaes determinassem, e compuzessem todolos debates, econtendas, que entam avia antre ElRei e ho Ifante, e que suadeterminaçam, e composiçaõ fosse inteiramente guardada, e comprida, efosse por maneira feita, que della nom se seguissem mais desvairos,segundo se logo apontaram, e nomearam outras pessoas, que tudo dentro desessenta dias tornassem logo ha concordar em toda sua prosperidade, equalquer dos delRei, e do Ifante que contrairo fosse, que pelo mesmofeito caisse em cazo de treiçam, e nom se de livrar se nom poendo seucorpo ha quatro Cavalleiros, que lho quizessem combater, e nom hofazendo, que ficasse encartado, e quaalquer do povo ho podesse matarseem pena.

E ali pedio ho Ifante ha ElRei, por grande mercee, que tirasse haAffonso Sanches seu filho, ha teerra, e has quantias dos maravedis, quedelle tinha, e assi ho officio de seu Mordomo, e ha Mem Rodrigues deVasconcellos ho Meirinhado moor. Ha que ElRei respondeo: «Que lheparecia couza muito contra razaõ, e seem justiça dar ha estes pena semculpa, e fazerlhes maal tendolhe beem mercee merecida, e que fazendolhonom sabia, que conta daria desso ha Deos, e aho mundo, aho que por suaReaal dinidade era obriguado», e porém por comprir, e asegurar havontade do Ifante seu filho prouvelhe outorgar todo o que quiz, e lhepedio.

E desta vez se partio Affonso Sanches pera Albuquerque cujo era, efiquou vassallo delRei de Castella. E assi foram de huma parte, e daoutra perdoados nesta concordia todos aquelles que serviram, e seguiramquaalquer partido, e assi que se fizesse entrega das couzas, que naspelejas foram tomadas. E concordaram mais, que se ho Ifante D. Pedrofilho do dicto Ifante D. Affonso, que jaa era nacido viesse em taalidade, que sahindo do mandado de seu padre quizesse vir contra ElRei D.Diniz seu avoo, que ho Ifante seu padre sempre fosse contra elle comElRei seu padre, e seem elle. E assi concordaram, que fosse dado maiscerta contia de dinheiro aho dicto Ifante D. Affonso, e que nunqua maislhe podesse pedir, nem ElRei dar, e que pera segurança de todo sepozessem de cada parte dous Castellos, dos quaaes ho Ifante polla suapoz ho Castello de Gaya, e ho Castello da Feira, e ElRei ho Castello deCelorico da Beira, e ho de Faria.

E foram assinados quatro Juizes logo nomeados pera determinaçaõ, seemrevogaçaõ de todalas duvidas e debates que antre ElRei, e ho Ifanteouvesse, hos quaaes nom podessem estar, nem estivessem nos Lugares ondetaaes Juizes se ouvessem de fazer, e que ha parte desobediente, edanifiquada hos Castellos da outra revel fossem logo entregues, e que haparte desobediente pagasse mais duzentas livras de pena has quaaesrepartissem hos Juizes, e Fidalgos do Regno antre si, e que hosFidalgos, e nobres do Regno sob pena de treiçaõ hos fizessem pagarinteiramente ha quaalquer, que esta concordia quebrantasse, e com hadicta pena logo elles se viessem, e servissem ha ElRei, ou aho Ifantequaalquer destes, que aas determinaçoens dos Juizes fosse obediente, eestas concordias, e convenças foram feitas em Santarem ha vinte e sinquode Fevereiro do anno de mil trezentos e vinte e quatro (1324), hum annoantes da morte delRei, que se tornou ha Lixboa, e ho Ifante ha Coimbra.

CAPITULO XXXI

Da morte delRei D. Diniz.

Depois destas concordias acabadas, ElRei D. Diniz se foi ha Lisboa comodice, e da i ha hum anno se partio da dicta Cidade, e se tornou peraSantarem, e indo aacerqua do Lugar, que se diz Villa nova adoeceo deinfirmidade, que consigo traaz todalas dores, e accidentes mortaaes deque se sentio mais maal tratado, e ho Ifante seu filho, que era emLeiria avizado desso por ha Rainha D. Isabel sua mãi, que era com ElReiho veo logo vizitar, e concordaraõ de ho levarem ha Santarem em andas, eem colos de homens, e ha i jouve doente por algum tempo seem algummelhoramento, na quaal ha Rainha sempre foi prezente, e nas couzas desua cura, e remedios era mais diligente, e humildoza que quaalquer outrasimpres molher, que em semilhantes necessidades nom teem quem hasescuze, e vendo ella que has afiquadas dores, e paixoens da doençadelRei eram continuas, e pareciam mortaaes, duvidando da vida delReiestando em sua Camara, e prezente alguns, que i eram, dice ha todosnesta maneira.

«Porque eu tenho grande esperança em Jesu Christo meu Senhor, e nommenos confiança na Glorioza Virgem sua Madre, e assi singular devaçam naOrdem, e Abito de Sancta Clara, assi como sempre ha tiveram aquelles deque descendo, sempre puz em minha vontade, que falecendo primeiro ElReimeu Senhor, e marido, eu acabar ha vida no dicto Abito, e por esso hotenho feito, e aa muitos dias que comigo ho trago, e em minha arqua, portaal que se por ventura acontecesse delRei meu Senhor, primeiro que eufalecer, ho que Deos nom queira, eu vestisse logo ho dicto Abito porlembrança de minha tristeza, e por sinal de tamanha mudança destado, queeu mais nom devo teer, nem por fazer no dicto Abito profissam, nemobedecer ha alguma Ordem que nom hee minha tençam fazello.Especiaalmente porque eu por minha idade, e grandes infirmidades nompoderia soportar hos grandes encargos, e trabalhos da Relegiam, masposto que eu esse Abito vista, e traga, por esso nom leixarei minhaCaza, nem has Donas, e Donzelas, que comigo vivem, mas prazendo ha Deos,espero trazer estas, e tomar outras como filhas, e irmaãs, e cazallas, eaviallas com ho que eu poder de meus beens, e fazenda, porque como dice,eu proponho nom fazer profissaõ nesta Ordem, nem em outra alguma, nemtenho em alguma feito voto pubriquo solene, nem secreto, e esto digoporque em cazo, que no meu corpo vista ho dicto Abito, que minha almafique livre pera de minha fazenda seem algum outro cargo, nem obrigaçamde Relegiam poder despoer livremente todo ho que por beem tiver, e assiho tenho dicto, e decrarado muitas vezes aho Ifante D. Affonso meufilho, e ha Frei Johaõ meu Confessor».

E com esto sendo ha doença delRei cada vez mais perigoza, e mortaal,teendo mui craro conhecimento, que hos dias de sua vida se acabavam,elle como Princepe virtuozo, prudente, e mui catolico, proveo seutestamento, que tinha feito com grande devaçam, e muito temor de Deos, eho confirmou, no quaal mandou, que ho seu corpo se enterrasse no seuMoesteiro de S. Diniz Dodivellas da Ordem de Cistel, on de S. Bernardo,que elle de novo fundou, e dotou, no quaal entam avia oitenta Freiras deCogula com voto de ençarramento, que nom teem has dos outros Moesteirosdesta Ordem, e em que jaa tinha feita sua sepultura, e de sua fazenda,apartou no dicto testamento pera soos descargos de sua alma, trezentas esinquoenta livras, que taxadas pelo preço dagora ha razam da valia daprata, e ouro, que daquelle tempo tinham ho valor, e preço, que agorateem hos ducados, e cruzados douro, como muitas vezes jaa dice, e estasoma mandou que logo se tirasse da torre do tezouro de Lixboa, que agorahee do Tombo em que tinha grandes tezouros, e se entregassem ha seustestamenteiros, de que ho principaal foi ha Rainha Dona Isabel suamolher, e ha estes mandou, que tivessem este dinheiro de sua maão notezouro da See da dicta Cidade, de que cada hum tivesse sua chave peranom aver embargo, nem estorvo quando delle quizessem despender, ecomprir hos legados, e couzas, que ordenava, e leixou ha sua Capellatoda aho dicto Moesteiro Dodivellas.

E toda outra sua fazenda, e baixellas douro, e prata, joias, e colares,pedrarias, e panos aho Ifante D. Affonso seu filho erdeiro, e destescento e corenta mil cruzados ordenou muitas, e grandes esmolasrepartidas por todolos Moesteiros, e Espritaaes, e Cazas piedozas doRegno, e assi certa soma pera cazamentos de moças orfaãs, e pera criaçamde meninos engeitados, e tambem dellas ordenou, que hum Cavalleiro debooa vida, e vergonhosa estivesse em Jerusalem, e servisse por elle naguerra contra hos infieis dous annos, e pera esto ordenou tres millivras, que eraõ mil e duzentos cruzados, e quando se nom achasse taalCavalleiro, ou nom ouvesse desposiçam pera ir ha Ultra-maar, que estedinheiro se convertesse em vistir pobres, e envergonhados, e outro siordenou, que outro boom homem de booa vida, fosse estar em Roma duasquarentenas, e que por elle andasse todalas Estaçoens em que ganham hasIdulgencias plenarias, e ha este ordenou mil livras, e depois destoconfeçando seus peccados com grande contriçaõ, e arrependimento delles,recebendo ho Corpo de N. Senhor, e todolos outros Sacramentos como Reimui Catolico, e fiel Christaão acabou vida dando sua alma ha Deos emSantarem, ha sete dias de Janeiro do anno de mil trezentos e vintesinquo, em idade de sessenta, e quatro annos, dos quaaes Regnou quorentae seis.

E ha Rainha que era prezente se apartou logo em huma Camara, e das maãosde humas Freiras seculares, que consigo trazia recebeo logo, e vestio hoAbito de Sancta Clara, que trazia feito, como jaa dice, e sendo nellevestida ante de se fazer do corpo delRei alguma mudança, ella prezentemuitas que ha ouviam, dice estas palavras: «Pois Deos por seu grandepoder, e profundo Juizo ouve por beem, que ha morte delRei meu Senhor, emarido antepassasse ha minha, e seem a sua vida eu fiquo, e sam tantocomo morta, e de razam eu jaa morri com elle, e por esso eu quis logomudar hos vestidos, e trajos que vedes, que sam este Abito pardo cingidocom esta corda, e este veeo branquo, que ponho sobre minha cabeça porqueha vida, que seem elle viver seja com doo, e tristeza pera sempre, eesto nom faço por seer Freira, nem teer feito algum voto, e obrigaçam deReligiam como teenho dicto, mas por minha humildade, porque nelle sirvaa Deos, nas couzas em que ha sua graça me ajudar».

E com esto acabado ho corpo delRei fiquou concertado, como devia, e commuitas tochas acezas, e acompanhado da mesma Rainha, e do Ifante D.Affonso seu filho, e do Conde D. Pedro, e D. Johaõ Affonso, e doutrosPrelados, e riquos, e nobres homens do Regno, que ali eram juntos, eassi de muitos Clerigos, e Religiozos que com elle iaõ rezando, eencomendando sua alma ha Deos, foi levado aho dicto seu Moesteiro de S.Diniz Dodivellas, onde nom seem grandes prantos, e lamentaçoens foimetido em sua ordenada sepultura, e depois de seu enterramento, fiquou iha Rainha por algum tempo comprindo seus legados, e fazendo outrasmuitas esmolas, devaçoens, e oraçoens, por beneficio, e descargos de suaalma. E da vida que depois esta Rainha, e como acabou, e quantosmilagres fez Deos por seus rogos, e merecimentos, e onde jaas, direi naCoronica delRei D. Affonso seu filho, em cujo tempo, e Regnado elladepois faleceo, que foi onze annos depois da morte delRei D. Diniz, comose diraa.

CAPITULO XXXII

Das obras, e couzas notaveis, que ElRei D. Diniz fez em sua vida.

Has obras, e feiçoens, e couzas notaveis que este mui excellente Rei D.Diniz fez em toda sua vida aalem das que nesta Coronica tenho escritas,em cazo que por desvairados tempos has fizesse, e mandasse fazer, porquede certidam dos annos, e tempos em que semelhantes obras se fizeram,esta Estoria que delle escrevo, nem hos que ha lerem nom teem algumafinal necessidade, e assi juntas se comprendem, e entendem melhor, portanto has reservei pera este derradeiro capitolo, e has mais principaaessaõ estas, primeiramente elle fez muitas Lex, e Ordenaçoens em seutempo, e deu boons foraaes ha muitos Lugares de seus Regnos, fez hoEstudo de Coimbra, que foi o primeiro de Portugal, e fez ho primeiroMestre de San-Tiaguo izento de Castella, e ordenou primeiramente haOrdem de Christo, e fez nella o primeiro Mestre, como jaa dice. Este Reiem seu tempo fez quasi de novo todalas Villas, e Castellos de ribaDodiana, ha saber: Serpa, Moura, Olivença, Campo maior, Ouguella, cujosalcaceres, e Castellos fez de fundamento com muitas despezas, e assi fezna dicta Comarqua dantre Tejo, e Odiana hos Castellos de Monforte, eDarronches, Portalegre, e Marvam, Alegrete, Castello Davide, Borba,Villa Viçoza, Arraiolos, Evora monte, Veiros, e ho Alandroal, Monçaraas,e Noudar, e acrescentou ho Castello de Jurumenha, e fez ho Redondo, e hoAssumar, e fez ha Torre, e Alcacer de Beja, e na Comarqua da Beira, eriba de Coa, fez de novo estes Castellos, ha saber, Avoo, que agora heedo Bispo de Coimbra, ho Sabugal, Alfaiates, Castel Rodriguo, Villarmaior, Castel boom, Almeida, Castel melhor, Castel mendo, Sam Felizesdos Galegos, que tem agora Castella, e nom fez ho Castello de Monfortede riba de Coa, que tambeem lhe foi dado por estar em maa despoziçam dateerra, e sua força pera defençaõ do Regno, nom seer muito necessaria,fez mais Pinhel, e seu Castello, e nas Comarquas dantre Douro, e Minho,e Tralos montes fez estas Villas, e Fortalezas, ha saber, cerquouGuimaraães da cerqua, que agora teem, e Braga, e Miranda de Douro, e seuCastello, e Monçam, e Crasto Laboreiro, e povoou de novo, e fez hosCastellos de Vinhaes, e Villa frol, Alfandega, Mirandella, FreixoDespada Cinta, Villa nova de Cerveira, e fez de novo, e do primeirofundamento Villa Real, que fazem numero de corenta, e coatro Villas,Castellos, e Fortalezas do Regno, de que algumas fez novamente, e outrasreformou, e fez de novo hos Castellos, e assi fez outras muitaspovoaçoens, assi como Muja, Salvateerra, Atalaia, Ceiceira, Montargil, eoutras semilhantes, e fez ha rua nova de Lixboa, e assi ho Moesteiro deSam Diniz Dodivellas em que jaas, ho quaal logo ha pouquos annos, queRegnou mandou começar, e em sua vida se acabou em dés annos, e foi logodado aas molhores Monjas, pera que foi ordenado, porque ho Moesteiro deSancta Clara de Coimbra fez, e dotou ha Rainha Dona Isabel sua molher, enelle jaas, como aho diante direi.

DEO GRATIAS

INDEX DAS COUSAS NOTAVEIS

A

Affonso III (El Rei D.) de Portugal, em que dia, e anno falleceo.
  Fez doação das Villas de Portalegre, e Marvão, e dos Castellos da
    Vide, e Arronches a seu filho o Infante D. Affonso.

Affonso (D.) chamado o Casto filho de D. Pedro Undecimo Rei de Aragão,não cazou mas morreo Religiozo Franciscano.

Affonso (D.) Rei de Castella, Avô del-Rei D. Diniz de Portugal, fezdoação a sua filha a Rainha Dona Beatriz, mãe do dito Rei D. Diniz,das Villas de Niebla, Serpa, Moura e Mourão.

Affonso (Principe D.) Filho herdeiro del-Rei D. Diniz em que anno, e
lugar naceo.
  Tendo sete annos, lhe nomeou seu pae officiaes para a sua caza.
  Em que parte se recebeo com a Infante Dona Beatriz.
  Discordias, que teve injustas com seu pai.
  Parte para Castella contra vontade de seu pai.
  Intenta matar a seu irmão Affonso Sanches, e quanto machinou para
    este fim.
  Continua em machinar novas falsidades contra seu irmão.
  He avizado pelo Papa João XXII, a que dezista do odio contra seu
    irmão, e não cessa de o perseguir.
  Intenta batalhar com seu pai, mas deziste deste intento.
  Toma os Castellos de Coimbra, Montemor e Feira, e a Cidade do Porto.
  Faz levantar o sitio que tinha posto a Badajoz o Infante D. Felippe.

Affonso (Infante D.) Filho del-Rei D. Affonso III de Portugal, cazou
com Dona Violante, filha do Infante D. Manoel, filho del-Rei D.
Fernando II de Castella, e da Infante Dona Constança.
  Que filhos teve deste matrimonio.
  Deu-lhe seu pai as Villas de Portalegre, e Marvão, e os Castellos da
    Vide e Arronches.
  Differenças que teve com seu irmão El-Rei D. Diniz.
  Fez guerra a seu irmão, e mata a D. Lopo Conde, e senhor de Biscaya,
    e a D. Diogo Lopes de Campos.
  Cede das contendas, que tinha com seu irmão por intervenção de sua
    cunhada Santa Izabel.
  Em que anno falleceo, e onde está enterrado.

Affonso (Infante D.) Filho do Infante D. Affonso, e Dona Constançafilha de D. Jaymes primeiro Rei de Aragão, e neto del-Rei D. AffonsoIII de Portugal, foi senhor de Leiria, e falleceu sem filhos.

Affonso Pires de Gusmão, acompanhado de muitos Capitaens entra em
Portugal onde obra algumas hostilidades, e priziona novecentos homens.

Affonso Sanches (D.) Chamado de Albuquerque, foi filho natural del-Rei
D. Diniz.
  Seu filho D. João Affonso de Albuquerque cazou com Dona Izabel,
    filha de D. Tello, e Dona Maria neta del-Rei D. Affonso III de
    Portugal.
  He notavelmente aborrecido por seu irmão o Principe D. Affonso.

Arronches. O seu Castello, foi doado por El-Rei D. Affonsso III de
Portugal a seu filho o Infante D. Affonso.
  He cercado por El-Rei D. Diniz.

B

Beatriz (Dona), mãe del-Rei D. Diniz, foi senhora das Villas de
Niebla, Serpa, Moura, e Mourão por doação que dellas lhe fez seu pai
D. Affonso Rei de Castella.

Benedicto XI. Manda Nuncio para pacificar a El-Rei D. Fernando de
Castella com El-Rei D. Jayme de Aragão, e o Infante D. Affonso de
Lacerda.
  Insinua a El-Rei D. Diniz, que seja medianeiro nestas pazes.

Branca (Dona). Filha de Pedro Annes de Portel, cazou com D. Pedrofilho natural del-Rei D. Diniz.

C

Carlos, Irmão de S. Luiz Rei de França, recebe a investidura dos
Reinos de Secilia, e Napoles do Papa Urbano IV, e vence na batalha de
Benavente a Manfreu Rei de ambas as Secilias, na qual morreo.
  Cerca a Cidade de Messina, e levanta o sitio.
  Queixa-se ao Papa Martinho IV, da violencia com que o queria
    despojar de Secilia El-Rei D. Pedro de Aragão.
  Dezafia a este Rei para Bordeos.
  Morre em Messina.

Celestino V. Confirma o privilegio concedido por seu Antecessor
Niculao IV, de que se elegesse Mestre da Ordem de San-Thiago em
Portugal independente do de Castella.

Clemente V. Como foi eleito, e das promessas, que fez a ElRei Felippede França chamado o Fermozo.

Constança (Rainha Dona), Filha de Manfreu Rei de ambas Secilias,mulher delRei D. Pedro de Aragão, e mãe da Infante Dona Isabel, quecazou com El-Rei D. Diniz de Portugal.

Constança (Dona), Filha de D. Jaymes Decimo Rei de Aragão, e a Rainha
Dona Violante, cazou com o Infante de Castella D. Manoel, Avô da
Infante Dona Constança, mulher que foi delRei D. Pedro I de Portugal.

Constança (Dona). Filha delRei D. Diniz de Portugal, e a Rainha Santa
Isabel, cazou com D. Fernando III de Castella.

Constança (Dona). Filha dos Infantes D. Affonso, e Dona Violante, foicazada com Nuno Gonsalves de Lara de quem não teve geração.

D

Diniz (El-Rei D.) Em que tempo foi aclamado Rei e que idade tinha.
  Virtudes, e acções heroicas, que praticou.
  Hospedou magnificamente no seu Reino a pessoas muito grandes de
    Castella.
  Prendeo a João Nunes de Lara, senhor de Biscáya, e o soltou
    fazendo-lhe grandes mercês.
  Caza com a Infante Dona Isabel, filha delRei D. Pedro IV de Aragão,
    e que idade tinha quando se recebeo.
  Celebrão-se estes despozorios em Trancozo.
  Filhos legitimos, e naturaes que teve.
  Diferenças, que teve com seu irmão o Infante D. Affonso.
  Avista-se com ElRei D. Sancho de Castella, e ajusta com elle os
    cazamentos de seus filhos D. Affonso, e D. Constança.
  Ordena a seu irmão D. Affonso, que se não faça hostilidade alguma
    contra D. Sancho de Castella, e lhe não obedece.
  Manda cercar Arronches, Mourão e Portalegre, onde estava seu irmão.
  Por intervenção de sua espoza Santa Isabel se pacifica com seu
    irmão, e este lhe entrega as Villas e Castellos, que tinha em seu
    poder.
  Manda Embaixadores a ElRei de Castella D. Sancho porque lhe largue
    os Lugares, que lhe tem uzurpado.
  Por morte de D. Sancho manda novos Embaixadores a seu filho D.
    Fernando, e do que lhe disserão os Embaixadores, e de como se
    concertarão estes Principes.
  Prepara se com exercito para vingar a inconstancia das promessas
    delRei de Castella.
  Recebe por seu vassallo a D. Sancho de Ledesma, filho dos Infantes
    D. Pedro, e Dona Margarida, e lhe affirma copioza renda.
  Entra por Castella com exercito, onde faz muitas hostilidades.
  Toma o Castello de Medicina.
  He solicitado por El-Rei de Castella a que celebre com elle pazes, e
    assim o executa.
  Avista-se em Alcanizes com El Rei de Castella para ajustar as pazes,
    e os cazamentos mutuos de seus filhos, e de que modo se celebrou
    este acto.
  Parte de Alcanizes donde traz em sua companhia a Dona Beatriz, filha
    delRei D. Fernando de Castella, para molher de seu filho D.
    Affonso.
  Das pessoas que nomeou para officiaes da Caza que fez ao Principe
    seu filho.
  Escreve-lhe o Papa Benedicto XI para que seja medianeiro entre as
    discordias delRei de Castella, e o de Aragão.
  Parte a Castella acompanhado da Rainha Santa Isabel, e muitos
    Cavalleiros a compor as discordias, que havia entre os Reis de
    Castella e Aragão.
  Passa a Granada com Santa Isabel, onde é recebido magnificamente por
    ElRei D. Jaymes e a Rainha Dona Maria.
  He arbitro em Tarraçona entre as contendas que havia entre D.
    Fernando de Castella, e D. Jaymes de Aragão sobre o Reino de
    Murcia, e como os compoz.
  Voltando de Tarraçona é recebido por El-Rei de Castella e a Rainha
    Dona Maria, onde deu preciosas joias a D. Affonso de Lacerda.
  Firma pazes com os Reis de Castella e Aragão.
  Não aceita dés mil dobras de ouro a ElRei D. Jaymes de Aragão que
    lhe tinha emprestado.
  Dá muitas e preciosas joias á Rainha Dona Branca, mulher delRei de
    Aragão, e aos Senhores daquella Côrte.
  A meza de prata em que comia mandou dar a um Fidalgo que por
    esquecimento não tinha sido premiado como os outros.
  Que idade tinha, e em que anno fez esta jornada a Castella.
  Manda Martim Gonsalves de Souza seu Alferes mór com setecentos
    cavallos a ElRei D. Fernando para ajuda da guerra contra os mouros
    e lhe empresta dezasseis mil, e seis marcos de prata para o mesmo
    fim.
  Funda em Coimbra os primeiros estudos, que houve em Portugal, e como
    alcançou do Papa João XXII privilegios para elles.
  Izenta os Cavalleiros de San-Thiago da obediencia do Mestre de
    Castella, e institue Mestre em Portugal por Bulla de Niculao IV.
  Ajusta com D. Fernando de Castella os bens dos Templarios dos seus
    Reinos não fossem dados pelo Papa a outra Ordem.
  Representa por seus Embaixadores ao Papa João XXII não ser
    conveniente, que as rendas dos Templarios se dessem aos do
    Hospital de S. João.
  Institue a Ordem Militar de Jesus Christo a quem assina as rendas
    que erão dos Templarios.
  Assina para gasto de seu filho D. Affonso quando cazou com a Infante
    Dona Beatriz, alem de muitas Villas que lhe deu, outenta mil
    livras de prata.
  Sentimento que teve com a morte de seu neto o Infante D. Diniz.
  Relatão-se as discordias que teve com o Principe seu filho.
  Manda o processo que este Princepe tinha machinado para matar seu
    irmão D. Affonso Sanches, e acha ser falso.
  Pratica que fez na prezença dos seus vassalos quando descubrio ser
    falso tudo quanto tinha machinado o Princepe seu filho contra D.
    Affonso Sanches seu irmão.
  He buscado por seu filho para lhe dar batalha.
  Manda a Lourenço Annes Redondo, que mate a todos os que deram
    entrada em Santarem ao Princepe seu filho, e assim se executa.
  Por intervenção da Rainha Santa Isabel, se concerta com seu filhe D.
    Affonso.
  Avista-se em Guinaldo com a Rainha Dona Maria, e o que aqui passou.
  Significa aos Reis de Castella o sentimento que teve com a morte dos
    Infantes D. Pedro e D. João.
  Pede-lhe seu neto El-Rei D. Affonso de Castella os danos que fazia
    naquelle Reino seu tio o Infante D. Felippe, e o obriga a levantar
    o sitio de Badajoz.
  Celebra Côrtes em Lisboa, onde não assiste o Princepe D. Affonso seu
    filho.
  Sem embargo de que não queria que entrasse em Lisboa seu filho, este
    o executa com gente armada de que se seguirão muitas mortes.
  Em Santarem depois de uma grande contenda, se compõem com o
    Princepe.
  Legados que dispoz, antes de morrer.
  Em que lugar, dia e anno morreo.
  Foi levado a enterrar ao Mosteiro de S. Diniz de Odivellas que elle
    fundara.
  Das açoens heroicas que obrou, e das Villas, e Cidades que fundou, e
    reedificou.

Diogo Garcia, Chanceller mór do sello da puridade delRei D. Diniz, eMordomo mór da Rainha Dona Constança sua mulher assiste em Tarraçona como mesmo Princepe para compor as discordias, que havia entre D. Fernandode Castella, e D. Jaymes de Aragão.

F

Filippe (El-Rei de França) chamado o Fermozo, como concorreu para ser
Pontifice Clemente V a quem pedio que queimasse o corpo de Bonifacio
VIII.
  Á sua instancia, extinguiu o Papa a Ordem dos Templarios.
  Morre desgraçadamente, e que filhos deixou.

Felippe, (Ifante D.) Tio delRei de Castella, cerca a Badajoz, e éobrigado a levantar o sitio pelo Princepe D. Affonso, filho delRei D.Diniz.

Fernando, (El-Rei D.) Terceiro de Castella, cazou com Dona Constança
filha delRei D. Diniz, e Santa Isabel.
  Com que circunstancias, e conveniencias foi contratado este casamento.
  He requerido por El-Rei D. Diniz, que largue os Lugares, que lhe tinha
    uzurpado, e da pratica que lhe fizerão João Annes Redondo, e Mem
    Rodrigues Rebotim Embaixadores de Portugal.
  Recebe-se por palavras de prezente com a Infante Dona Constança, e da
    pratica que fez aos circunstantes.
  Sahe a receber a El-Rei D. Diniz com o Infante D. João na Villa de
    Coelhar.
  Pede soccorro a D. Diniz para continuar a guerra contra os Mouros, e
    lhe manda setecentos cavallos, e lhe empresta para a mesma empreza
    dezasseis mil, e seiscentos marcos de prata.
  Dá-lhe em caução deste emprestimo as Cidades de Badalhouse, Alconchel,
    e Brugilhos.
  Cerca Algezira, e levanta o sitio.
  Onde morreo, e de que idade.

G

Gibraltar foi tomado aos Mouros por João Nunes de Lara.

Gil Martins, (D. Fr.) He eleito primeiro Mestre da Ordem militar de Jesu
Christo, instituida por ElRei D. Diniz.

Guimarães, o seu Castello é defendido por Mem Rodrigues de Vasconcellos,contra a invasão do Infante D. Affonso.

H

Henrique (Infante D.) Filho delRei D. João I de Portugal, foi perpetuoadministrador da Ordem de Christo.

Honorio II. Deu regra aos Templarios.

I

Isabel, (Rainha Santa) Filha de D. Pedro Undecimo Rei de Aragão, sendo
pretendida de muitos Princepes para espoza, é preferido entre todos
ElRei D. Diniz de Portugal.
  Acompanhada do Bispo de Valença, e outros Cavalleiros, parte para
    Portugal, e como della se despedio seu pai.
  Sahe a recebella em Castella seu primo com irmão, o Infante D. Sancho,
    e das palavras, que lhe disse.
  Chega a Bragança, onde é cortejado pelo Infante D. Affonso irmão
    delRei D. Diniz, e outros Cavalleiros.
  Virtudes que praticou em toda a sua vida, e milagres que fez.
  Por sua intervenção, e deligencia, se ajustarão as discordias del-Rei
    D. Diniz com o Princepe seu filho.
  Segunda vez pacifica ao mesmo Princepe com seu pai.
  Por morte de seu Espozo se veste no habito de Santa Clara.
  Edifica o Convento desta Santa em Coimbra, e o dotou da sua fazenda, e
    nelle está sepultada.

Isabel (D.) Filha do Infante D. Affonso de Portugal, e a Infante DonaViolante, foi casada com D. João o Torto, filho do Infante D. Joãochamado Rei de Lião.

Isabel (D.) Filha de D. Jaimes Decimo Rei de Aragão, e da Rainha DonaViolante, cazou com o Princepe D. Felippe filho herdeiro de São Luiz Reide França.

J

Jaymes (D.) Decimo Rei de Aragão, e avô paterno da Infante Dona Isabel,
mulher de D. Diniz de Portugal como naceo, e a cauza porque lhe puzerão
o nome de Jaime.
  Tomou segunda vez Valença de Aragão aos Mouros.
  Acabou a vida feito Monge.
  Cazou com Dona Lianor filha delRei D. Affonso Nono de Castella, e foi
    separado pela Igreja deste matrimonio.
  Casa segunda vez com Dona Violante, filha de D. André Rei de Ungria de
    quem teve muitos filhos.

Jaimes, (D.) Rei de Malhorca, e Minorca, foi filho de D. Jaimes Decimo
Rei de Aragão, e da Rainha Dona Violante.

Jaimes, (D.) Filho de D. Pedro Undecimo Rei de Aragão a quem ficou o
Reino de Secilia, foi depois Rei de Aragão.

João XXII. Concede privilegios para os Estudos que em Coimbra instituio
ElRei D. Diniz.
  Expede uma Bulla na qual consola a D. Diniz nas discordias que tinha
    com o Princepe seu filho.
  Escreve huma carta a este mesmo Princepe sobre as discordias, que
    tinha com seu pai.

João, (D.) Infante de Castella sendo desterrado daquelle Reino, érecebido em Portugal por seu tio ElRei D. Diniz.

João Affonso (D.) Foi filho natural delRei D. Diniz.

João Nunes de Lara, Senhor de Biscaya, foi preso por ElRei D. Diniz aquem mandou soltar, e lhe fez grandes merces. Tomou Gibraltar aos Mouros.

João Velho, com Vasquo Pires, e João Martins são mandados por
Embaixadores a Aragão a ajustar o cazamento delRei D. Diniz com a
Infante Dona Isabel filha de D. Pedro Rei de Aragão.

L

Lianor (Rainha Dona) Filha de Affonso Nono de Castella, irmã de DonaUrraqua Rainha de Portugal, casou com D. Jaimes Decimo Rei de Aragão, eé separada de seu marido pela Igreja.

Lopo (D.) Conde, e Senhor de Biscaya, é morto em Alfaro pelo Infante D.
Affonso irmão delRei D. Diniz.

Lourenço Annes (D.) É eleito primeiro Mestre em Portugal dos Cavalleirosde San-Tiago.

M

Manfreu Rei de ambas Secilias de quem foi filho.
  Matou com veneno a seu pai, e irmão.
  É morto em a batalha junto de Benavente em Italia que lhe deu o
    Princepe Carlos, irmão de São Luiz Rei de França.

Manoel (El-Rei D.) Foi perpetuo administrador da Ordem de Christo.

Maria (Dona) Filha natural del-Rei D. Diniz, foi casada com D. João de
Lacerda.

Maria (Dona) Filha natural delRei D. Diniz, foi Freira no Mosteiro de
Odivellas.

Maria (Dona) Filha dos Infantes D. Affonso, e Dona Violante, foi cazadacom D. Tello, Filho do Infante D. Affonso de Molina.

Martim Gonçalves de Souza, Alferes mór delRei D. Diniz, é mandado poreste Princepe com setecentos cavallos a ajudar a ElRei de Castella naguerra contra os Mouros.

Mem Rodrigues de Vasconcellos, sustenta o Castello de Guimarães por D.
Diniz contra a invasão do Princepe D. Affonso.

Messina, cercada pelo Infante Carlos irmão de São Luis Rei de França, elevanta o sitio obrigado por D. Pedro Rei de Aragão.

Mouros, ganhão as Fortalezas de Quesada, e Alcaudete com outros
Castellos no arrebalde de Jaen.

N

Nicoleo IV concede a ElRei D. Diniz, que os Cavalleiros de San-Tiago seeximão da obediencia do Mestre de Castella.

Nuno Gonçalves de Lara, filho de João Nunes de Lara, cazou com Dona
Constança filha dos Infantes D. Affonso, e Dona Violante.

O

Ordem Militar de Jesu Christo, quando foi instituida por ElRei D. Diniz,e quem foi o seu primeiro Mestre.

Orraqua Vasques, é curada milagrosamente de um achaque pela Rainha Santa
Isabel.

P

Pedro (D.) undecimo Rei de Aragão, foi filho de D. Jaimes, e a Rainha
Dona Violante, e pai da Infante Santa Isabel.
  Com quem cazou.
  Recebe obediencia do Reino de Secilia.
  É desafiado para Bordeos pelo Infante D. Carlos irmão de São Luis Rei
    de França.
  É excommungado pelo Papa.
  Morreo violentamente sobre o cerco de Girona.
  Filhos que teve.
  Pratica que fez a sua filha quando partio para se receber com ElRei D.
    Diniz.

Pedro, (D.) Filho natural delRei D. Diniz, cazou com Dona Branca filhade Pedro Annes Portel.

Pedro, (D.) Conde de Barcellos filho natural delRei D. Diniz, foi oautor das linhagens de Portugal.

S

Sancho (El-Rei D.) de Castella ajusta com ElRei D. Diniz cazar seus
filhos D. Fernando, e Dona Beatriz com os Infantes D. Affonso, e Dona
Constança, filhos daquelle Princepe.
  Falta ás condições prometidas para estes despozorios.
  Manda uma armada sobre o Algarve com que fez muitas hostilidades.
  Manda por seu Embaixador o Bispo de Palença a tratar pazes com D.
    Diniz, e não conclue o que intenta.
  Em que lugar, e anno morreu.

Sancho, (Infante D.) primo com irmão da Infante Dona Isabel, veiorecebella a Castella quando vinha desposarse com ElRei D. Diniz dePortugal.

Sancho (D.) Arcebispo de Toledo, e filho de D. Jaimes Decimo Rei deAragão, e da Rainha Dona Violante, foi morto na batalha de Andaluziacontra os Mouros.

Sancho de Ledesma, (D.) Filho dos Infantes D. Pedro, e Dona Margarida,descontente delRei de Castella, veio fazerse vassallo delRei D. Diniz, oqual lhe assinou uma grande renda. Volta para Castella.

T

Tello (D.) filho do Infante D. Affonso de Molina, cazou com Dona Maria,filha dos Infantes D. Affonso, e Dona Violante, e neto de Affonso III dePortugal.

Templarios, quem forão os seus instituidores em Jerusalem, e que habitos
trazião.
  Ações heroicas, e virtuozas que obravão.
  São extinctos violentamente por Clemente V á instancia de Felippe de
    França chamado o Fermozo.
  No Concilio celebrado em Vianna da Provincia de Narbona se promulgou a
    extenção desta Ordem.
  As rendas desta Ordem são applicadas á do Hospital de S. João.

U

Urbano IV. Dá a investidura dos Reinos da Secilia, e Napoles ao Princepe
Carlos irmão de S. Luiz Rei de França.

V

Valdovino Rei de Jurusalem manda hospedar dentro do seu Palacio aosprimeiros fundadores da Ordem do Templo.

Vasco Fernandes, Mestre dos Templarios em Portugal quando se extinguiuesta Ordem.

Violante (Dona) Filha de D. André Rei de Ungria, caza com D. Jaimes
Decimo Rei de Aragão, de quem teve muitos filhos.

Violante (Dona) filha de D. Jaimes Decimo Rei de Aragão, e da Rainha
Dona Violante, cazou com D. Affonso Decimo de Castella avô delRei D.
Diniz de Portugal.

Violante (Dona) Filha de D. Pedro undecimo Rei de Aragão, cazou com
ElRei Carlos irmão de São Luis Bispo de Toloza.

Violante (Dona) Filha do Infante D. Manoel filho delRei D. Fernando de
Castella, e da Infante Dona Constança foi cazada com o Infante D.
Affonso filho de Affonso III, de Portugal, e que filhos teve.

Fim da Chronica d'ElRei D. Diniz

INDICE DOS CAPITULOS

I—Como El-Rei D. Diniz sendo Ifante, foi levantado por Rei, eobedecido, e das virtudes que teve

II—Como El-Rei D. Diniz cazou com Dona Isabel, filha del-Rei D. PedroDaraguam, e da Rainha Dona Constança, e de suas grandes virtudes, esantidade

III—Do Fundamento, e cousas, que ouve pera El-Rei D. Diniz aver algumas
Villas, e Castellos de riba Dodiana, que forão de Castella

IV—Dos filhos legitimos, que El Rei D. Diniz ouve da Rainha D. Isabel,e assi doutros bastardos

V—Do desacordo, que ouve entre El-Rei D. Diniz, e o Ifante D. Affonsoseu irmão

VI—Do que succedeu do Casamento do Ifante D. Affonso, filho del-Rei D.
Diniz, e do Ifante D. Fernando, filho del-Rei D. Sancho de Castella

VII—Como El-Rei D. Diniz entrou em Castella, e da crua guerra, que deuma parte e da outra se fazia

VIII—Dos grandes males, e danos que de um Reino a outro se faziam, edalguns Luguares de Castella, que os Mouros tomaram

IX—Da razam porque El-Rei D. Diniz desistio desta guerra, e se tornou a
Portugal

X—Dos casamentos, e Escaibos que depois da concordia se fizerão antreestes Rex em Alcanizes

XI—Como El-Rei D. Fernando cazou com a Ifante Dona Constança, e oIfante D. Affonso de Portugal com a Ifante Dona Beatriz de Castella, edas Menagens, que sobreesso se fizerão, e da decisão, que fez nascontendas que havia antre os Princepes Despanha, e da grandeza, eprudencia com que nella se ouve, e muitas mercees que fez

XII—Das ajudas, que El Rei D. Fernando de Castella, ouve delRei D.
Diniz, pera a guerra dos Mouros de Grada

XIII—Como El-Rei D. Diniz ordenou em Coimbra o primeiro Estudo, queouve em Portugal

XIV—Como foi feito em Portugal Mestre de San-Tiago izento da Ordem de
Ucres de Castella

XV—Do fundamento que teve a Ordem do Templo de Salamão em Jerusalem, ecomo foi desfeita, e se fez a Ordem de Christo

XVI—Do principaal fundamento, e verdadeira cauza pera esta Ordem dos
Templarios ser destroida

XVII—Como o Papa, e El-Rei de França notificarão a El Rei D. Diniz estacondenação dos Templarios, e de sua Ordem

XVIII—Da discordia, que ouve antre El-Rei D. Diniz, e o Ifante D.
Affonso seu filho herdeiro, e as cauzas porque

XIX—Das couzas que o Ifante capitulou pera matar Affonso Sãches seuirmaão, ou o desterrar fóra do Regno

XX—Da diligencia que El-Rei fez pera saber a verdade dos estromentos de
Maguazella

XXI—Dalgumas couzas mais, que o Ifante fez contra vontade, e serviçodel-Rei seu padre

XXII—Como o Ifante se partio de Coimbra pera Lixboa, e do que lheaconteceo com El-Rei no Caminho

XXIII—Como o Ifante levou a molher, e os filhos a Castella, e os
Lugares, que tomou a El-Rei seu padre

XXIV—Como El Rei, e o Ifante foram concordados por meio, e intercessãoda Rainha Dona Isabel, e da maneira que nesso teve, e das menagens quepera segurança desso se fizerão

XXV—De huma carta do Papa João XXII ao Ifante D. Affonso filho del-Rei
D. Diniz, sobre as desavenças com seu pai

XXVI—Como a Rainha Dona Maria de Castella depois da morte del-Rei D.
Fernando seu filho, teve vistas com El-Rei D. Diniz, a que trouxe El-Rei
D. Affonso menino neto dambos, e do que concertaram

XXVII—Como o Ifante D. Affonso se apparelhou pera pelejar com o Ifante
D. Felipe, que contrariava o asecego de Castella, e como o Ifante D.
Felipe se foi

XXVIII—Como o Ifante D. Affonso requereo a El-Rei D. Diniz seu padre,que fizesse Cortes ás quaes depois nom quiz vir

XXIX—Como o Ifante sobre uma vinda, que contra vontade del-Rei quizerafazer a Lixboa, foram perto de pelejar, e porque o leixaram de fazer

XXX—Como as gentes del-Rei, e do Ifante pelejaram sobresto em Santarem,e do que se fez

XXXI—Da morte del-Rei D. Diniz

XXXII—Das obras, e couzas notaveis, que El-Rei D. Diniz fez em sua vida

CHRONICA D'EL-REI D. DINIZ

2 vol. 800 réis

*** END OF THE PROJECT GUTENBERG EBOOK CHRONICA D'EL REI D. DINIZ (VOL. II) ***
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