Ahistória dos surdos registra seus acontecimentos históricos como grupo, que possui umalíngua, umaidentidade e uma cultura.
Ao longo daseras, osSurdos travaram grandesbatalhas pela afirmação da sua identidade, da comunidade surda, da sualíngua[1] e da suacultura,[2] até alcançarem o reconhecimento que têm hoje, na era moderna.
NoEgito, os surdos eram adorados, como se fossemdeuses, serviam de mediadores entre os deuses e osFaraós, sendo temidos e respeitados pela população.
Na época do povoHebreu, na Lei Hebraica, aparecem pela primeira vez, referências aos Surdos.
NaAntiguidade oschineses lançavam os surdos ao mar, os gauleses os sacrificavam ao DeusTeutates, emEsparta eram lançados do alto dos rochedos. NaGrécia, os Surdos eram encarados como seres incompetentes.Aristóteles,[3] ensinava que os que nasciam surdos, por não possuíremlinguagem, não eram capazes de raciocinar. Essa crença, comum na época, fazia com que, na Grécia, os Surdos não recebessemeducação secular, que não tivessem direitos, que fossem marginalizados (juntamente com os deficientes mentais e os doentes) e que muitas vezes fossem condenados à morte. No entanto, em 360 a.C.,Sócrates, declarou que era aceitável que os Surdos se comunicassem com as mãos e o corpo.Séneca afirmou:
“ | Matam-se cães quando estão com raiva; exterminam-se touros bravios; cortam-se as cabeças das ovelhas enfermas para que as demais não sejam contaminadas; matamos os fetos e os recém-nascidos monstruosos; se nascerem defeituosos e monstruosos, afogamo-los, não devido ao ódio, mas à razão, para distinguirmos as coisas inúteis das saudáveis.[4] | ” |
OsRomanos, influenciados pelo povo grego, tinham ideias semelhantes acerca dos Surdos, vendo-o como ser imperfeito, sem direito a pertencer à sociedade, de acordo comLucrécio ePlínio. Era comum lançarem as crianças surdas (especialmente as pobres) ao rio Tibre, para serem cuidadas pelasNinfas. O imperador Justiniano, em 529 a.C., criou uma lei que impossibilitava os surdos de celebrar contratos, elaborar testamentos e até de possuir propriedades ou reclamar heranças (com excepção dos surdos que falavam).
EmConstantinopla, as regras para os surdos eram basicamente as mesmas. No entanto, lá os Surdos realizavam algumas tarefas, tais como o serviço decorte, como pajens das mulheres, ou comobobos, de entretenimento dosultão.
Mais tarde, Santo Agostinho defendia a ideia de que os pais de filhos Surdos estavam a pagar por algum pecado que haviam cometido. Acreditava que os Surdos podiam comunicar por meio de gestos, que, em equivalência à fala, eram aceites quanto à salvação da alma.
Os cristãos, até àIdade Média, criam que os Surdos, diferente dosouvintes, não possuíam umaalma imortal, uma vez que eram incapazes de proferir ossacramentos.
John Beverley, em 700 d.C., ensinou um Surdo a falar, pela primeira vez (em que há registo). Por essa razão, ele foi considerado por muitos como o primeiroeducador de Surdos.
Foi só no fim daIdade Média e inicio doRenascimento, que saímos da perspetiva religiosa para a perspetiva darazão, em que a deficiência passa a ser analisada sob a óptica médica e científica.
Foi naIdade Moderna que se distinguiu, pela primeira vez,surdez demudez. A expressãosurdo-mudo, deixou de ser a designação do Surdo.
Girolamo Cardano (1501-1576) era um importante médico e filósofo que reconhecia a habilidade do surdo para a razão e dizia " ... Que a surdez e a mudez não é um empecilho para desenvolver a aprendizagem e que o melhor meio para o surdo aprender é atravéz da escrita...". Utilizava a escrita e a linguagem de sinais com os surdos.[5]
Pedro Ponce de León, um monge católico daordem dos beneditinos, inicia, mundialmente, a história dos Surdos, tal como a conhecemos hoje em dia. Para além de fundar uma escola para Surdos, emMadrid, ele dedicou grande parte da sua vida a ensinar os filhos Surdos, de pessoas nobres, nobres esses que de bom grado lhe encarregavam os filhos, para que pudessem ter privilégios perante a lei (assim, a preocupação geral em educar os Surdos, na época, era tão somente económica). León desenvolveu umalfabeto manual, que ajudava os Surdos a soletrar as palavras (há quem defenda a ideia de que esse alfabeto manual foi baseado nos gestos criados pormonges, quecomunicavam entre si desta maneira pelo facto de terem feitovoto de silêncio).
Nesta época era costume que as crianças que recebiam este tipo de educação e tratamento fossem filhas de pessoas que tinham uma situação económica boa. As demais eram colocadas em asilos com pessoas das mais diversas origens e problemas, pois não se acreditava que pudessem se desenvolver em função da sua "anormalidade".[6]
Juan Pablo Bonet, aproveitando o trabalho iniciado por León, foi estudioso dos Surdos e seu educador. Escreveu sobre as maneiras de ensinar os Surdos a ler e a falar, por meio do alfabeto manual. Bonet proibia o uso dalíngua gestual, optando o método oral. O mesmo em (1620) publicou o primeiro livro sobre a educação de surdos, que se baseava no aprendizado por meio de um alfabeto manual e salienta sobre a importância da intervenção antecipada do problema e ressaltou a importância do apoio familiar, sugerindo que quem convivia com o surdo deveria aprender o alfabeto manual.
John Bulwer, médico inglês, acreditava que a língua gestual deveria possuir um lugar de destaque, na educação para os Surdos; foi o primeiro a desenvolver um método para comunicar com os Surdos. Publicou vários livros, que realçam o uso de gestos.
John Wallis (1616-1703), educador de Surdos e estudioso da surdez, depois de tentar ensinar vários Surdos a falar, desistiu desse método de ensino, dedicando-se mais ao ensino da escrita. Usava gestos, no seu ensino.George Dalgarno desenvolveu um sistema inovador de dactilologia.Konrah Amman, defensor daleitura labial, já que considerava que a fala era uma dádiva deDeus que fazia com que a pessoa fosse humana (não considerava os Surdos que não falavam como humanos). Amman não fazia uso da língua gestual, pois acreditava que os gestos atrofiavam amente, embora os usasse como método de ensino, para atingir a oralidade.
Charles Michel de L'Épée, nascido em 1712, ensinava, numa primeira fase, os Surdos, por motivos religiosos. Muitos o consideram criador da língua gestual. Embora saibamos que a mesma já existia antes dele, L'Épée reconheceu que essa língua realmente existia e que se desenvolvia (embora a não considerasse uma língua comgramática). Os seus principais contributos foram:
Jacob Rodrigues Pereira, educador de Surdos que usava gestos mas sempre defendeu a oralização dos Surdos. Nunca publicou nenhum dos seus estudos. Thomas Braidwood, fundou uma escola de Surdos, emEdimburgo (a primeira escola de correcção da fala da Europa). Samuel Heinicke, ensinou vários Surdos a falar, criando e definindo o método hoje conhecido como Oralismo.
Durante o período do Renascimento os surdos passam a ter um novo tratamento. Com novos estudos que possibilitem a instrução dos surdos e que os mesmos pudessem através desse aprendizado desenvolver suas potencialidades. Os surdos passam a se comunicar através da linguagem de sinais e da escrita.
Depois daRevolução Francesa e durante aRevolução Industrial, entrou-se numa era de disputa entre os métodos oralistas e os baseados na língua gestual.Roch-Ambroise Cucurron Sicard foi um abade francês, famoso pelo seu trabalho como educador de Surdos; Sicard fundou a escola de Surdos de Bordéus, em 1782, posteriormente sucedeu a L'Épée, como director do instituto criado pelo mesmo, também apoiou a criação de vários institutos de surdos em todo o país.Pierre Desloges, francês, tornou-se surdo aos 7 anos, devido àvaríola, foi defensor da língua gestual, tendo sido autor do primeiro livro publicado por um surdo, onde revelava a sua indignação contra as ideias do Abade Deschamps, que havia publicado um livro que criticava a língua gestual. Desloges, a esse respeito, declarou o seguinte:
“ | Tal como o francês vê a sua língua desvirtuada por um alemão que apenas conhece algumas palavras da língua francesa, penso que devo defender a minha língua contra as acusações falsas deste autor. | ” |
Desloges, em seu livro, defende a ideia de que a língua gestual (Antiga Língua Gestual Francesa) já existia, mesmo antes do aparecimento das primeiras escolas de surdos, como criação dos surdos e sualíngua natural.
Jean Itard, primeiro médico a interessar-se pelo estudo da surdez e das deficiências auditivas, usava os seguintes métodos nas suas pesquisas: cargas eléctricas, sangramentos, perfuração de tímpanos, entre outras.[7]
Jean Massieu foi um dos primeiros professores surdos do mundo. Laurent Clerc, surdo francês, educador, acompanhouThomas Hopkins Gallaudet, educador ouvinte, aos EUA, onde abriram uma escola para surdos, em Abril de 1817, a Escola de Hartford. Gallaudet instituiu nessa escola a Língua Gestual Americana, passou ainda a seu usado o inglês escrito e o alfabeto manual. Em 1830, quando Gallaudet se reformou, já existiam nos Estados Unidos cerca de 30 escolas para surdos.
Edward Miner Gallaudet, filho de Thomas Gallaudet e também educador de surdos, lutou pela elevação do estatuto do Instituto de Colúmbia a colégio. Esse colégio deu origem, em 1857, àUniversidade Gallaudet, onde for presidente por 40 anos.
Nesse interím,Alexander Graham Bell, cientista estadunidense, trabalhava na oralização dos surdos. Casou com uma surda, Mabel. Bell era grande defensor do oralismo e opunha-se à língua gestual e às comunidades de surdos, uma vez que as considerava como um perigo contra a sociedade. Assim sendo, Bell defendia que os surdos não deveriam poder casar entre si e deveriam obrigatoriamente frequentar escolas normais, regulares. No entanto, em 1887 Bell, no Congresso de Milão, admitiu que os surdos deveriam ser oralizados durante um ano, mas se isso não resultasse, então poderiam ser expostos à língua gestual.[8] Esta luta entre o oralismo e a língua gestual continua até aos nossos dias.[9]
Em 1880 nasceHellen Keller, nos Estados Unidos. Hellen ficou cega e surda aos 19 meses de idade, por causa de uma doença. Aos 7 anos Hellen havia criado cerca de 60 gestos (br: sinais) para se comunicar com os familiares. Anne Sulivan, a professora de Hellen, isolou-a do resto da família, conseguindo assim disciplinar e ensinar Hellen. Sullivan ensina a Hellen usando o método de Tadona, que consiste em tocar os lábios e a garganta da pessoa que fala, sendo isso combinado comdactilologia na palma da mão. Hellen aprendeu a ler inglês, francês, alemão, grego e latim, através dobraile. Aos 24 anos formou-se, em Radcliffe. Foi sufragista, pacifista e apoiante do planeamento familiar. Fundou o Hellen Keller International, uma organização para prevenir a cegueira. Publicou muitos livros e foi galardoada porLydon B. Johnson, com a Presidential Medal od Freedoms.
Quando Sicard morreu, o Instituto Nacional de Surdos-Mudos de Paris iniciou um período conturbado. Além de sucessivos diretores que nunca conseguiram estabelecer uma liderança forte, as questões institucionais eram tratadas como questões familiares e o Institudo começou a perder crédito. Como ao longo de toda a história dos surdos, nesta época a luta entre adeptos do oralismo e do gestualismo continuava, dentro e fora do Instituto.
Bébian fundou uma escola privada para surdos, em Paris, onde usava o seu defendido método oralista, sendo proibido aos alunos do Instituto Nacional que contactassem com Bébian, quer dentro quer fora do Instituto.
Em1829 o Instituto tinha apenas dois professores Surdos e apenas alunos do sexo masculino usufruíam de suas aulas; não existiam pessoas Surdas no conselho diretivo, no conselho consultivo, na formação vocacional, nem mesmo entre os monitores. Por estarem cientes destes problemas, alguns professores uniram-se na tentativa de mudar o rumo da situação e surgem então duas frentes ideológicas, de um lado os defensores do método oralista, de outro lado os defensores do gestualismo.
No final de1830 houve um grande movimento de pessoas Surdas, que mexeu com as bases do instituto. Ferdinad Berthier, líder de uma delegação de surdos, escreveu ao Rei Luís Filipe, de França, pedindo a readmissão de Bébian na direção do Instituto - o que chocou de tal modo a administração do Instituto que apenas aumentou as lutas e os desentendimentos de adeptos oralistas e gestualistas, que entraram em ruptura.
Neste época, quase todas as escolas de Surdos em França usavam os métodos de Bébian na educação dos surdos e criticavam as posições do Instituto.
Em1834, um comité de dez membros Surdos liderados por Berthier organizou um banquete em honra do Abade de L'Épée, banquete esse que se tornou um evento anual, usado pelos Surdos como fórum a fim de publicitar as suas ideias e exigências. Nascia assim o Movimento Surdo, numa época em que pessoas Surdas tomavam conta de suas vidas e tomavam consciência do que os rodeava, lutando por seus direitos e resolvendo seus próprios problemas. Com o tempo, estes banquetes tornaram-se festivais de Língua Gestual.
Em1838 foi fundada a Sociedade Central de Assistência e Educação de Surdos-Mudos - a primeira associação de Surdos do mundo.
Antes do Congresso, na Europa, durante o século XVIII, surgiam duas tendências distintas na educação dos surdos: ogestualismo (ou método francês) e ooralismo (ou método alemão). A grande maioria dos surdos defendia o gestualismo enquanto que apenas os ouvintes apoiavam o oralismo - por exemploBell, nos EUA, fazia campanha a favor deste método, entre muitos outros professores, médicos, etc.
Em1872, no Congresso deVeneza, decidiu-se o seguinte:
OCongresso de Milão, em1880, foi um momento obscuro na História dos surdos, uma vez que lá um grupo de ouvintes, tomou a decisão de excluir a língua gestual do ensino de surdos, substituindo-a pelo oralismo (o comité do congresso era unicamente constituído por ouvintes.).[10] Em consequência disso, o oralismo foi a técnica preferida na educação dos surdos durante fins do século XIX e grande parte do século XX.
O Congresso durou 3 dias, nos quais foram votadas 8 resoluções, sendo que apenas uma (a terceira) foi aprovada por unanimidade. As resoluções são:
Uma década depois doCongresso de Milão, acreditava-se que o ensino da língua gestual quase tinha desaparecido das escolas em toda aEuropa, e o oralismo espalhava-se para outros continentes.
Em resultado da evolução nos campos da tecnologia e da ciência, noséculo XX, particularmente no campo da surdez, a educação dos surdos passou a ser dominada pelo oralismo (que encara a surdez como algo que pode ser corrigido). No entanto, sem a cura da surdez[12] os insucessos do oralismo começaram a ser evidenciados, pois os surdos educados no método não os ajudava a conseguir um emprego, comunicar com ouvintes desconhecidos ou manter uma conversa fluída.[13]
Entretanto, surge o primeiroaparelho auditivo, em 1898.[14] Na Antiguidade, os aparelhos usados eram cornetas, ou tubos acústicos,,[15] mas a ampliação electrónica começou com Bell, em 1876, quando inventou o telefone com a intenção de amplificar o som para a sua esposa e mãe, ambas surdas.[16] ideia que é concretizada em1900, em Viena, por Ferdinand Alt.[17] Só em1948 surgem aparelhos com pilhas incorporadas e em1953 começou a ser usado otransístor em próteses.
Em 1970 aparecem as primeiras tentativas deimplantação coclear. Esse tipo de implante sempre gerou muita controvérsia nas comunidades surdas em todo o mundo. Os argumentos a favor do implante resumem-se ao acesso à língua oral, na idade crítica de aquisição, que a cirurgia é simples e segura e com a possibilidade de proporcionar à criança de ter uma vida social com som, e não com deficiência.[18][19] No entanto, a comunidade surda, como um todo, é contra a implantação coclear em crianças surdas, antes da aquisição da linguagem.[20][21] Pensa a comunidade que obrigar a criança surda a ser ouvinte, mesmo não sendo, influencia outros a negligenciar necessidades e meios de apoio à deficiência. Muitos médicos recomendam que o implante coclear seja acompanhado com a língua gestual, especialmente nos primeiros anos da criança, a fim de assegurar o pleno desenvolvimento cognitivo da criança. Segundo fontes médicas, os riscos do implante coclear incluem: infecção, vertigem, estimulação retardada, forte exposição a campos magnéticos, necessidade de acompanhamento médico por toda a vida.[22][23]
Em1920, antes da chegada dos nazistas ao poder, surgiu nos EUA e na Alemanha um movimento da comunidade médica, com apoio das sociedades em questão, em prol da esterilização de doentes mentais e psicopatas criminosos (na Alemanha este movimento ficou conhecido comohigiene racial). Em 1933, com a chegada dos nazis ao poder, este movimento teve suporte político. Nesse mesmo ano, na Alemanha, foi aprovada uma lei para esterilizar as pessoas que possuíam doenças genéticas transmissíveis, incluindo a surdez.[24][25]
Na época,Berlim continha cerca de vinte e cinco comunidades de Surdos.
Em Junho de1933, o jornal alemão mencionou o primeiro Surdo a pertencer às S.A. e uma unidade militar composta dos Surdos; um ano mais tarde, esta unidade foi dissolvida, sob pretexto de que o grupo não reunia o perfil da imagem donazismo ideal.
Entretanto, os Surdos começaram a perder os seus direitos:
Dados comprovam que, em1937, 95% das crianças surdas pertenciam àjuventude hitleriana, tendo a letraG (em alemão, inicial degehoerlosan) marcada no ombro do casaco.
Posteriormente, assim que começou a guerra, a Alemanha passou da esterilização para a eutanásia, tanto por razões económicas, como por razões ideológicas. Em 1941, era comum o uso de eutanásia nos hospitais, onde eram mortos bebés com deficiência, incluindo surdos.[26] Posteriormente, tornou-se comum a prática do aborto, que era aplicada quando se suspeitava que os fetos poderiam ter deficiências congénitas, ou qualquer tipo de doença, como no caso da surdez.
Poucos surdos escaparam, sobrevivendo em guetos e noscampos de concentração na Alemanha,Polónia eHungria.
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