Beyond Citizen Kane | |
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Muito Além do Cidadão Kane (bra) | |
![]() 1993 • cor e p&b • 103min | |
Gênero | documentário |
Direção | Simon Hartog |
Produção | John Ellis |
Roteiro | Simon Hartog |
Narração | Chris Kelly |
Elenco | Leonel Brizola Chico Buarque Walter Clark Dias Gomes Lula Antônio Carlos Magalhães Armando Nogueira Washington Olivetto |
Edição | John Elis Simon Hartog |
Companhia(s) produtora(s) | Large Door Ltd. |
Distribuição | ![]() |
Lançamento | ![]() |
Idioma | inglês português |
Orçamento | US$ 260 mil |
Beyond Citizen Kane (Muito Além do Cidadão Kane, noBrasil)[1] é umdocumentáriotelevisivobritânico deSimon Hartog exibido em1993 peloChannel 4,[2] emissora pública do Reino Unido. O documentário mostra as relações entre a mídia e o poder do Brasil, focando na análise da figura deRoberto Marinho.[1][3] Embora o documentário tenha sido censurado pela Justiça, aRecordTV comprou os direitos de transmissão exclusiva por 20 mildólares do produtor John Ellis, mas nunca o exibiu até hoje.[1]
A obra detalha a posição dominante daRede Globo na sociedade brasileira, debatendo a influência do grupo, seu poder e suas relações políticas, que os autores do documentário veem como manipuladoras e formadora de opinião.[3] O fundador e ex-presidente da Globo Roberto Marinho foi o principal alvo das críticas do documentário, sendo comparado aCharles Foster Kane, personagem criado em1941 porOrson Welles para o filmeCidadão Kane, umdrama de ficção baseado na trajetória deWilliam Randolph Hearst, magnata da comunicação nosEstados Unidos. Segundo o documentário, a Globo empregaria a mesma manipulação grosseira de notícias para influenciar aopinião pública como fazia Kane no filme.[3]
De acordo com matéria veiculada naFolha Online em 28 de agosto de 2009, a produtora que montou a filmagem é independente e a televisão pública britânica só exibiu o documentário, não tendo qualquer relação com seu desenvolvimento. Já a RecordTV sustenta que aBBC, outra emissora pública do Reino Unido, é quem teria produzido o documentário.[1]
O título teve origem no personagemCharles Foster Kane, criado em 1941 porOrson Welles para o filmeCitizen Kane, que, por sua vez, tratava-se de umdrama de ficção baseado na trajetória deWilliam Randolph Hearst, magnata da comunicação nosEstados Unidos. Segundo o documentário, a Globo empregaria a mesma técnica de manipulação de
O documentário é dividido em 4 partes:
O documentário também acompanha uma controversa negociação envolvendo ações daNEC Corporation e contratos governamentais à época em queJosé Sarney erapresidente da República.[2]
Hartog e equipe falaram com mais de 40 pessoas.[5] O documentário apresenta depoimentos de destacadas personalidades brasileiras, como ocantor ecompositorChico Buarque de Hollanda, que na época tinha um programa na emissora;[2] ospolíticosLeonel Brizola eAntônio Carlos Magalhães; o ex-Ministro da JustiçaArmando Falcão, que diz "revolucionário antes da Revolução de 64. O Doutor Roberto nunca me criou nenhum tipo de dificuldade"; opublicitárioWashington Olivetto; o escritorDias Gomes; osjornalistasWalter Clark,Armando Nogueira eGabriel Priolli e o atual presidente do BrasilLuís Inácio Lula da Silva.[2] O documentário também acompanhou a "família Silva", moradora da periferia da cidade deSalvador, naBahia. Pai, mãe e filhos num barraco sem iluminação, onde o maior foco de luz vem de uma tela de tevê na mesa transmitindo oFantástico.[5]
O próprio GeneralMédici chegou a afirmar, sobre oJornal Nacional, em entrevista: "Sinto-me feliz todas as noites quando ligo a televisão para assistir ao jornal. Enquanto as notícias dão conta de greves, agitações, atentados e conflitos em várias partes do mundo, o Brasil marcha em paz, rumo ao desenvolvimento. É como se eu tomasse um tranquilizante após um dia de trabalho".[6]
O até então diretor doGrupo Abril,Roberto Civita, explicou como sua empresa não conseguiu as concessões que queria na década de 80 após a falência daTV Tupi. Walter Clark, que comandava a Rede Globo antes de Boni, conta queRoberto Marinho o dispensou pois "já tinha montado o trem elétrico e agora podia brincar à vontade. É uma pessoa bem parecida com o Cidadão Kane, mas acho que ele não tem o Rosebud", afirma Walter. "O Doutor Roberto é meu amigo há mais de 30 anos. O pessoal tem muita inveja", dizAntônio Carlos Magalhães, até então ministro do governoJosé Sarney.[5] O então governador do Rio de Janeiro,Leonel Brizola faz uma comparação de Roberto Marinho aJosef Stalin, dizendo que ambos enviavam seus inimigos para "aSibéria do esquecimento".
É mostrada a minissérieAnos Rebeldes, que contava sobre a inquietação dos jovens do Brasil no fim da década de 60.[5] OSBT eSilvio Santos também são citados de forma crítica, com imagens das vinhetas da emissora e de Silvio apresentando o programaPorta da Esperança e o quadro "Pião da Casa Própria". O SBT é apresentado, ao lado daRede Manchete, como concorrente pelo segundo lugar e que "A supremacia de audiência da TV Globo é, às vezes, ameaçada aos domingos pelo programa de 12 horas de Sílvio Santos, em sua própria rede, a SBT". Em seguida, o documentário mostra uma ocasião do programaPorta da Esperança, onde uma filha pede ajuda, pela segunda vez, para reencontrar sua mãe e quem aparece é sua irmã, já que a mãe estava doente.[7]
O documentário foi dublado de forma amadora. Custou cerca deUS$ 260 mil à extinta empresa Large Door, na qual Hartog e Ellis eram sócios.[8]Beyond Citizen Kane nunca foi transmitido pela TV brasileira. "Ele foi feito para uma audiência noReino Unido que não tinha o conhecimento de nada sobre a história do Brasil", diz Ellis em uma entrevista.[4]
ARede Globo tentou comprar os direitos de exibição do programa no Brasil, provavelmente para tentar impedir sua exibição.[1] Entretanto, antes de morrer, Hartog tinha feito um acordo com organizações brasileiras para que os direitos de exibição do documentário não caíssem nas mãos da Globo, a fim de que este pudesse ser amplamente conhecido tanto por organizações políticas quanto culturais.[3]
De acordo com Ellis, nos anos 1990 a direção daRecordTV havia tentado comprar os direitos de exibição do documentário, mas "percebeu que haveria uma disputa judicial com a TV Globo a respeito das muitas imagens retiradas da programação deles. Então decidiu não comprá-lo".[4] No entanto, em agosto de 2009, no auge de uma troca de acusações mútuas entre as emissoras, provocadas por acusações de lavagem de dinheiro daIgreja Universal do Reino de Deus, a Record comprou os direitos de transmissão do documentário por aproximadamente 20 mil dólares, e espera a autorização da justiça para transmiti-lo.[1] No livroNada a Perder 2,Edir Macedo diz: "É um documentário tão revelador que todos os brasileiros têm a obrigação de ver pelo menos uma vez na vida."[9]
Apesar da decisão judicial, muitas cópias ilegais emVHS eDVD do filme vêm circulando no país desde então. O documentário está disponível na íntegra na internet, por meio de redespeer-to-peer e de sites de vídeos como oYouTube.[10]
Em 9 de junho de 1993, oPartido dos Trabalhadores (PT) exibiu no espaço cultural daCâmara dos Deputados para uma público de políticos e jornalistas. A sessão foi divulgada pelo PT e o até então deputado Luiz Gushiken, que adquiriu uma cópia da fita naInglaterra e enviou um exemplar para a Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara.[11]
"Em conversas pessoais durante os intervalos das gravações, ele sempre demonstrou muita surpresa por nós brasileiros não termos jamais produzido um documentário sobre o poder da Globo. E eu pensava com os meus botões: 'quanta ingenuidade!'", diz o produtor Simon Hartog.[11]
O documentário foi transmitido pela primeira vez em 10 de março de 1993 no Channel 4 do Reino Unido. A transmissão foi adiada em cerca de um ano, pois a Rede Globo contestou os produtores deBeyond Citizen Kane, baseando-se em leis britânicas, devido ao uso sem permissão de pequenos fragmentos de programas da emissora para fins de "observação crítica e de revisão".[1][4] Além da Inglaterra, os advogados tentaram impedir a exibição em qualquer país do mundo.[11]
Durante este período, o diretor Simon Hartog morreu após uma longa enfermidade. O processo de edição do documentário foi assumido por seu coprodutor, John Ellis. Quando pôde ser finalmente transmitido, cópias do documentário foram disponibilizadas pelo Channel 4 ao custo de produção.[4][12]
Em 10 de março de 1993, emLondres, foi divulgado pela primeira vez o documentário. Alguns dias depois, oMuseu da Imagem e do Som de São Paulo, com uma cópia pirata obtida diretamente doReino Unido por uma telespectadora anônima, fazia uma apresentação simultânea do documentário, e foram programadadas novas apresentações para os dias 3 e 4 de junho do mesmo ano. Porém, na noite do dia 2, uma ligação telefônica do então Secretário de Cultura do Estado de São Paulo, Ricardo Ohtake, dirigido ao programador do MIS, o jornalistaGeraldo Anhaia Mello, cancelava as apresentações já marcadas.[12] O documentário jamais esteve no circuito de cinemas brasileiros e a exibição que ocorreria noMuseu de Arte Moderna do Rio de Janeiro foi proibida pelo então presidente da República,Itamar Franco.[3]
Era formada uma espécie de cadeia de várias cópias pirateadas em todo o país e era distribuídas por todo o Brasil, e alguns dos principais sindicatos começaram a planejar a exibição do documentário. As versões sobre a proibição variam: Segundo Ohtake garante que não havia por que proibir, a não ser pelo fato de se tratar de uma cópia ilegal. Anhaia Mello, porém, acusa diretamente a intervenção deRoberto Marinho, a subserviência do governador de São Paulo do então e do seu Secretário de Cultura.[12] Após esse ocorrido foi criado uma batalha jurídica de mais de um ano das Organizações Globo contra o Channel 4 tendo a Globo perdido a causa.[12] O filme teve acesso restrito a grupos universitários e só se tornou amplamente visto a partir do ano2000, graças à popularização dainternet.[3]
Quando era funcionário doMuseu da Imagem e do Som de São Paulo (MIS-SP) à época do lançamento do documentário,Geraldo Anhaia Mello havia promovido exibições públicas deste. Quando soube, o então secretário de cultura da cidade, Ricardo Ohtake, proibiu as exibições, com a alegação de que a cópia do acervo era pirata. O pedido de proibição veio deLuiz Antônio Fleury Filho, então governador doSão Paulo. Mello se encarregou de fazer cópias do documentário e, juntamente com outras pessoas, de sua dublagem e distribuição. O livro, que veio logo depois, se trata de uma transcrição em português do roteiro e das entrevistas, exceto alguns trechos de entrevistas de rua ou cenas do acervo da Globo. Os trechos não dublados no vídeo estão presentes na transcrição.[13]
Em entrevista àFolha de S.Paulo, publicada no caderno "Mais!" em fevereiro de 2008, o produtor do documentário, o professor britânico John Ellis do departamento de mídia e artes daUniversidade de Londres, revelou que tanto a Globo quanto a Record tentaram comprar os direitos do filme nos anos 90 - a primeira para engavetá-lo, a segunda para exibi-lo. Ellis teria dito também que o título nunca foi proibido ou embargado pela Justiça brasileira.[1][4]