Ana Perena | |
---|---|
![]() Suicídio deDido, detalhe que representa Dido suicida socorrida por sua irmã Ana, identificada mais tarde com a deusa romana Ana Perena, porGuercino, 1625,Galeria Spada,Roma |
Ana Perena (emlatimAnna Perenna), namitologia romana, era umadeusa daRoma Antiga que presidia ao curso do ano e do seu retorno perpétuo, e por isso era chamada tambémAnna ac Peranna. Era considerada, igualmente, a deusa da abundância e do alimento. SegundoVirgílio[1] eOvídio,[2] era filha deBelo e irmã e confidente deDido, rainha deCartago.
A festa de Ana Perena caía nosIdos de Março (15 de março), que marcavam a primeira lua cheia do ano no antigocalendário romano lunar, quando março era o primeiro mês do ano. Era celebrada no bosque da deusa na primeira pedra milhar daVia Flamínia. Dela participavam muitosplebeus da cidade.
Macróbio conta que as oferendas feitas a ela eramut annare perannareque commode liceat, isto é, "para passar um bom ano do início ao fim".[3] TambémJoão Laurêncio Lido, escritor de origem grega com obras sobre temas de arqueologia, diz que as orações e sacrifícios públicos eram oferecidos para assegurar um ano próspero.[4]
Em seusFastos, Ovídio faz uma descrição muito viva das diversões e da licenciosidade de sua festa ao ar livre. Conta que eram armadas barracas e construídos pavilhões, nos quais os rapazes deitavam ao lado das moças, e as pessoas pediam a Ana que lhes concedesse vida longa para que pudessem beber muitos cálices de vinho na sua festa.[5]
Ovídio conta que Ana Perena era a mesma Ana que aparece naEneida de Virgílio como irmã de Dido, rainha de Cartago. Depois que esta morreu tragicamente, Cartago foi atacada pelosnúmidas e porJarbas e Ana se viu obrigada a fugir. Embarcou num navio e se refugiou inicialmente emMalta, sob a proteção do rei Bato, para não cair nas mãos de seu irmãoPigmalião.
Obrigada novamente a lançar-se ao mar, naufragou nas costas doLácio, naItália, onde foi recebida carinhosamente porEneias emLavínio, porém sua estada ali despertou os ciúmes deLavínia, que arquitetou um plano contra ela. Dido lhe apareceu em sonho e a aconselhou a deixar a casa do anfitrião. Temendo por sua vida, ela fugiu apressadamente durante a noite e caiu nas águas doNúmico. E, com o nome de Ana Perena, tornou-se umaninfa do rio. Os habitantes da região começaram logo a celebrá-la com festas ao ar livre.
Numa segunda história, Ovídio relata que alguns identificavam Ana Perena com aLua, comTêmis, comIo, filha deÍnaco, ou comAmalteia.[6] Mas afirma que o mais certo é que, durante a revolta dos plebeus romanos em494 a.C., a comida acabou e uma mulher idosa chamada Ana preparava bolos e os levava aos rebeldes todas as manhãs. Os plebeus, em reconhecimento, construíram-lhe uma estátua e a adoraram como deusa.
Numa terceira história, Ovídio conta que, pouco depois que a velha Ana se tornou deusa,Marte pediu-lhe que convencesseMinerva a corresponder ao seu amor. Ana assumiu o aspecto de Minerva e compareceu à presença do deus. Mas, quando Marte levou a suposta noiva ao seu quarto, tirou-lhe o véu e quis beijá-la, descobriu que não era Minerva, e sim a velha Ana, que sorriu para ele com desprezo.
Essa lenda deu motivo para que o povo contasse piadas e cantasse canções grosseiras na festa de Ana Perena. Como a festa da deusa caía no mês de Marte, era razoável que Marte e ela estivessem unidos, pelo menos em alguns ritos da época, como parceiros de culto.
Varrão mencionava que vivia em Cartago uma Ana que, apaixonada por Eneias, teria morrido napira. A informação deve-se ao comentário deSérvio: "Segundo Varrão, não seria Dido, mas Ana, que, movida por seu amor a Eneias, teria encontrado a morte na pira"[7] e "É preciso saber que, para Varrão, Eneias foi amado por Ana".[8] Mas não há notícia alguma sobre as relações que Varrão estabelecia entre essa Ana e Dido.
Existem atualmente referências de culto a Ana Perena em dois lugares. Um em Busceni, naSicília, onde em 1899 foram encontradas inscrições dedicadas a Ana e aApolo, e outro emRoma, onde em 1999 foi descoberta umafonte dedicada aos ritos de Ana Perena.